2018|pt|03: O milagre continua

A MENSAGEM DO REITOR-MOR

Pe. ÁNGEL FERNÁNDEZ ARTIME

O MILAGRE CONTINUA

Uma carta na minha mesa de trabalho, uma caligrafia grande e clara e uma oferta que era uma magnífica e tocante surpresa.



O Evangelho está vivo. Sempre. Assim pode acontecer-nos viver no nosso quotidiano uma página evangélica. Pessoalmente muitas vezes vivi uma das páginas mais encantadoras do Evangelho, aquela em que Jesus elogia a mísera oferta (insignificante aos olhos humanos) da pobre viúva que lança no tesouro do Templo tudo aquilo que tinha para viver.

Aos olhos de Deus era uma oferta total.

A última vez, aconteceu-me no regresso das intensas e belíssimas Jornadas de Espiritualidade da Família Salesiana em Valdocco (Turim) em que participaram 367 pessoas pertencentes a 22 dos 31 grupos oficiais, como ramos, desta grande árvore que é a Família Salesiana de Dom Bosco.

Na minha mesa de trabalho, encontrei um sobrescrito com uma carta. Vinha de uma pequena cidade francesa. Espero que, respeitando o devido anonimato, a remetente da carta goste que eu fale dela, porque tudo aquilo que é belo e bom deve ser conhecido.

Quem me escrevia era uma senhora com muita idade, 92 anos, emigrante italiana, esposa e mãe de família, que recentemente enviuvou.

O que distinguia esta carta das centenas de outras semelhantes que chegam diariamente? Tinha-a tornado especial a remetente com a sua caligrafia grande e clara, “toda do seu punho”. A carta era acompanhada de uma oferta para os mais pobres em qualquer lugar das Missões Salesianas no mundo.

Nada de excecional também nisto, dado que há muitas pessoas que enviam os seus humildes donativos para os mais pobres e, com isto, se consegue fazer muito bem.

Aquilo que tornava especial o gesto da senhora era o que oferecia. Tratava-se de algo verdadeiramente seu e de fortíssimo valor sentimental. Oferecia as alianças de casamento, a sua e a do seu falecido marido, juntante com a caixa de prata que tinha servido para lhe levar a Santíssima Eucaristia a casa durante a doença.

Confesso que fiquei muito comovido. Reli a carta várias vezes e contemplei as duas alianças, humilde e precioso sinal do amor de duas pessoas.

Prometi que seria eu mesmo a levar pessoalmente aquela oferta, transformada em dinheiro, a uma das nossas missões mais pobres. Servirá para as ajudas mais básicas às famílias mais pobres e para a educação de uma menina a fim de lhe dar um futuro mais digno e feliz. Creio que, como mulher, a senhora ficaria feliz por saber que os símbolos do seu amor se transformaram na possibilidade de um futuro mais sereno para uma menina necessitada.

Estou convencido que também a alimentação que for adquirida com este donativo terá um valor muito especial.



Finalmente uma “boa notícia”


Estamos todos desconcertados com a crónica diária desta nossa sociedade global. É inquietante ver com que facilidade nos habituamos à morte. A morte da natureza, destruída pela poluição industrial; a morte nas estradas; a morte pela violência; a morte daqueles que não chegam a nascer; a morte das almas.

É insuportável ver com que indiferença escutamos cifras aterradoras que nos falam da morte de milhões de famintos no mundo, e com que passividade contemplamos a violência silenciosa, mas eficaz e constante, de estruturas injustas que fazem afundar os débeis na marginalização.

E pensava: porque é que um gesto tão profundamente humano e repleto de sentimentos verdadeiros a favor dos outros como o daquela viúva não pode ser uma notícia? A sua mensagem silenciosa e discreta é uma verdadeira e grande “boa notícia”.

O escritor Alessandro d’Avenia narra a história de um menino que, na escola, tinha desenhado um céu estrelado. Indicando o desenho, a professora perguntou-lhe, com um grande sorriso: «De que são feitas as estrtelas?».

«De luz», respondeu o menino seguro, sem compreender o que estava a dizer.

«E porquê?», perguntou a professora, levada pelo entusiasmo.

A mãe fixava o filho, que olhava para ela em busca de uma resposta a uma coisa que ninguém sabe.

«Porquê, André?», perguntou a mãe com doçura.

«Porque a Terra está cheia de escuridão».

Se este mundo está cheio de gente que “vive na escuridão”, a viúva francesa acendeu uma luz. E estou certo que também vós, como eu, vos sentis felizes com isso.


Um augúrio de Timor Leste


Estou a escrever de Timor Leste, no meio de pessoas muito simples, que vivem de modo modesto, mas são amáveis e generosas, dotadas de uma grande fé, embora provadas pelo sofrimento e pelo sacrifício.

Celebrámos há pouco a Festa de Dom Bosco. Daqui a pouco, em Fatumaca, celebrarei com milhares de pessoas um encontro e uma Eucaristia com os membros da Associação Devotos de Maria Auxiliadora.

E vejo como o carisma salesiano continua a lançar raízes nesta nação boa, religiosa e acolhedora.

Também este é o nosso mundo. Também estas são notícias.

A todos vós, o meu augúrio de toda a graça e bênção.