A MENSAGEM DO REITOR-MOR
Pe. Ángel Fernández Artime
«O MAIOR DE TUDO É O AMOR»
(São Paulo)
Este é o tempo do sacrifício. Em provas difíceis como estas o amor dá-nos a vida.
Meus queridos amigos do Boletim, escrevo num momento em que todos estamos atónitos e confusos. E penso no mês de maio, o mês dedicado à Mãe. Em todo o mundo salesiano nos confiámos à nossa mãe comum, Maria Auxiliadora, e rezámos pedindo ao Senhor, com a sua mediação, auxílio e conforto nestas horas terríveis para todos. Além disso, com o receio das dificuldades que teremos de enfrentar “depois”.
Mas acontece que no meio de tanta dor, pranto e morte, mesmo nas perdas mais dolorosas, descobrimos pessoas que são “palavra de Deus” e sua mediação para nós com o seu testemunho de fé e de força. Não me atrevo a usar palavras minhas, desde que conheci as de outras pessoas, carregadas de autenticidade e de fé provada, verdadeiras testemunhos de “abandono a Deus”.
Assim ofereço-vos este testemunho real. Graças a ele, descobrimos que “milagre” são as pessoas.
Acaba de perder o marido. Casaram há 23 anos e tiveram 5 filhos formando uma bela família. Hoje, aos 50 anos de idade, o coronovirus levou-lhe o marido.
Tudo começou com uma doença, no dia do aniversário de uma das suas filhas. Acordou com febre alta. Tinha sintomas semelhantes aos da epidemia, congestão e uma tosse que julgavam passageira. Todavia, com o passar das horas , o quadro tornou-se mais complicado.
Não tinha dificuldade em respirar, mas sentia vertigens. Chamou-se a ambulância e foi levado ao hospital. Ao princípio ficou em observação. Não suspeitavam em absoluto que estivesse infetado de cronovirus. Além disso, naquela altura não havia o material necessário para o teste do Covid-19. Apesar de tudo, naquela mesma noite, ficou em isolamento preventivo.
No dia seguinte ficou em cuidados intensivos, onde lhe foi foi feito o teste. Os médicos disseram à esposa que já não podia estar junto dele, que tinha de voltar para casa. Pouco depois, foi chamada ao hospital para se despedir do marido porque a situação dele era muito delicada.
Ela chegou ao hospital com um sacerdote para lhe administrar o sacramento da Santa Unção e despediu-se dele. Naquele mesma tarde foram informados de que o teste do coronovirus dera positivo e desde então ela ficou já de quarentena em casa, enquanto o marido passou as últimas horas no hospital. Sozinho.
Diz que durante todo este tempo o que mais lhe custou foi não poder ir vê-lo, estar com ele e falar com ele. Estava em isolamento e não deixavam entrar ninguém. Todo o hospital tinha pacientes infetados de coronavirus e ninguém podia entrar.
«Confio em Deus»
Ao mesmo tempo, em casa, esta mulher e mãe viveu esta dor com um coração enorme. «É muito difícil, mas Cristo tem-me nos seus braços. Sentir que Ele está comigo na cruz e eu com Ele e nos sustentamos reciprocamente, e saber que também o meu marido está nas suas mãos, dá-me força».
Esta mãe e os seus filhos encontraram conforto na oração: «Rezamos o terço todos os dias e fazemos a novena a S. José que terminámos e recomeçámos. Rezamos também por todos os que se encontram em situações semelhantes».
Com uma fé admirável, confidencia: «Foram dias em que estive muito mal, mas agora vejo tudo com mais paz, com mais aceitação. Viver com resignação ajuda a viver com menos desespero o sofrimento de o não ver, mas com a paz de que no fim é a vontade de Deus, sempre, amen». Poucos dias antes da morte do marido, sentia que queria compartilhar com os outros como é que eles estavam a viver em família.
O seu testemunho ensina-nos que, embora não estejamos preparados para provas difíceis como estas, sentir a presença amorosa de Deus dá-nos força e ajuda-nos a viver o sofrimento «com menos desespero», afirma esta mulher crente que sabe que o amor não conhece limites e que é importante agarrar-se à cruz, sobretudo em momentos como estes.
Dois dias antes da morte do marido, enviou esta mensagem: «Muito obrigado por tantas mensagens de apoio e de oração. Estou viva. Conforta-me saber que há muitas pessoas que rezam por ele. Que no fim, se não curar, é porque há um bem maior. É uma ferida a sangrar, com muita força, mas ao mesmo tempo Deus permite-me ver o amor dos outros, ver como nos ama Ele. E isto é muito mais importante e maior do que nós mesmos».
Esta mulher e sua família, quando receberam a notícia da morte do marido e pai, uniram-se mais do que nunca. Continuam a respirar aquele amor com a certeza de não estar sós. Somente um coração que ama profundamente pode dizer: «Foi para o céu, com Jesus. Confio em Deus, que me dá força e paz».
Deixo-vos este testemunho. Porventura outras pessoas viverão perdidas com desespero situações semelhantes. Haverá quem não compreenda que se pode reagir como esta mulher e esta mãe. Mas devemos aceitar que todas as pessoas são únicas e irrepetíveis, e neste caso a Fé fez transcender e superar a perda de uma pessoa tão amada, apesar de a dor e o grande vazio da perda existirem sempre.
Dom Bosco recomendou-nos sempre que tenhamos confiança em Maria Auxiliadora, e veremos o que são milagres. A nossa tendência natural, rápida e imediata é considerar milagre só a cura de um cancro ou de uma doença semelhante…, mas o que foi vivido no coração desta mulher e mãe e dos seus cinco filhos é um milagre vivido na Fé.
Não percamos esta Fé nem a Esperança que deve caraterizar-nos. Que Maria Auxiliadora continue a levar-nos pela mão como Mãe, pois o que Jesus disse é sempre absolutamente verdadeiro para todos: «Mulher, este é o teu filho; filho, esta é a tua mãe» (Jo 19, 26-27).