Viganò Egídio
A ASSOCIAÇÃO DOS COOPERADOS SALESIANOS
Atos do Conselho Geral
Ano LXVII – julho-setembro, 1986
N. 318
1. Apresentação aos irmãos: A ação perseverante de Dom Bosco desde o Pe. Rua até hoje — É hora de relançar. 2. À luz do itinerário de Dom Bosco Fundador: Importância da reelaboração do Regulamento — O itinerário do discernimento fundacional — A grande vitalidade do Carisma — Responsabilidade dos animadores. Aspectos essenciais da vossa identidade de seculares salesianos: A energia da caridade entre os leigos — O espírito salesiano de Dom Bosco. Para uma revitalização da Associação: Alguns aspectos operacionais — Movimento espiritual. A presença viva da Auxiliadora.
Roma, Festa do S. Coração, 1986
Queridos Irmãos,
uma saudação cordial de todos os membros do Conselho Geral e minha, estamos reunidos em seção plenária: rezamos e trabalhamos intensamente por vós.
Desejo através desta convidar-vos a ler com atenção a carta que escrevi aos nossos Cooperadores e que vos ofereço neste número de Atos.
Como sabeis, no dia 9 de maio p.p., a Sé Apostólica aprovou, através da Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares, o novo texto do “Regulamento de vida apostólica” da Associação dos Cooperadores Salesianos. A data é significativa pois 110 anos atrás, exatamente no dia 9 de maio de 1876, o Papa Pio IX, grande amigo de Dom Bosco e seu guia na delicada obra de Fundador, reconhecia a então “Pia União”, cujo Regulamento fora redigido com o cuidado e a grande experiência do nosso amado Pai.
Eu quis promulgar o importante documento alguns dias depois, o 24 de maio, solenidade de Nossa Senhora Auxiliadora, na Basílica de Valdocco repleta de fiéis e de membros da nossa Família.
A ação perseverante de Dom Bosco
Dom Bosco não considerou concluída a sua longa e trabalhosa missão de Fundador até que não conseguiu dar uma estrutura válida e uma Carteira de identidade própria a esta Associação. Ela esteve presente, em certa maneira e como semente, já desde os inícios do seu projeto em favor das Obras dos Oratórios.
Após a aprovação de 1876 Dom Bosco cuidou pessoalmente da organização e da difusão dos Cooperadores, iniciou (1877) a publicação do Boletim Salesiano, formulou orientações e diretrizes para os irmãos.
No primeiro Capítulo Geral da nossa Sociedade (1877), a que Dom Bosco dava particular importância (“Desejo que este Capítulo marque época na Congregação, assim, falecendo eu, ver-se-ão as coisas arrumadas e ajeitadas”),1 queria que fosse discutido (na quarta Conferência Geral) o tema dos Cooperadores e do Boletim Salesiano: uma associação para nós importantíssima, que é a alma da nossa Congregação e que nos serve para realizar o bem juntos e com o auxílio de bons fiéis que vivem no mundo... praticando o espírito dos salesianos... Estes Cooperadores devem se multiplicar o quanto possível... Os Diretores e em geral todos os Sócios Salesianos para aumentar o seu número falem sempre bem desta associação... e só se faça a proposta a pessoas já conhecidas por sua piedade e honorabilidade.2
O próprio Dom Bosco dedicou-se a fazer as primeiras conferências para orientar e consolidar a Associação. Lemos nas Memórias Biográficas que no mês de janeiro de 1878 ele realizou a primeira conferência, em Roma, na igreja das nobres “Oblatas di Tor de Specchi”, presente o cardeal Mônaco La Valletta, Vigário de sua Santidade. E no dia 16 de maio realizou a segunda conferência em Turim na igreja de São Francisco de Sales.3 Insistia muitas vezes sobre a originalidade do apostolado dos Cooperadores, sua importância providencial e as “grandes coisas” que o Senhor teria realizado através deles juntamente conosco.
Pouco por vez foram-se precisando também os aspectos organizativos e normativos.
Desde o Pe. Rua até hoje
No Capítulo Geral X (1904), o Pe. Rua já podia codificar algumas normas para os irmãos sobre a promoção da Associação num regulamento (37 artigos) “para uso dos Sócios Salesianos com relação à Pia União dos Cooperadores”. Dizia-se:
• que todo Salesiano “não deixe de tornar conhecida e estimada ainda mais esta Pia União”;
• que os Inspetores “escolham um irmão que se dedique, em ajudá-lo e sob sua orientação, a tudo aquilo que se refira ao desenvolvimento e ao regular funcionamento da Pia União na sua Inspetoria”;
• que haja em cada casa “um encarregado especial para os Cooperadores, em auxílio ao Diretor”.
A exortação final retomaria as palavras do Regulamento de Dom Bosco: “Todos os membros da Pia Sociedade Salesiana considerem os Cooperadores como outros irmãos em Jesus Cristo, e prestem-lhes auxílio toda vez que a própria obra possa ser de ajuda para a maior glória de Deus e a salvação das almas”.4
Após o Concílio Vaticano II, no Capítulo Geral Especial (1971), os capitulares, que debateram o tema da “Família Salesiana” e reestudaram a identidade dos Cooperadores, redigiram uma proposta à mensagem recebida. Afirma-se: “Na fidelidade dinâmica ao Fundador nos declaramos desejosos e prontos a “revitalizar a vossa Associação, para que, finalmente, se complete o genial projeto tão querido ao Fundador”. Tomamos clara consciência que seria uma traição se não conseguíssemos realizar este trabalho, e acreditamos que com razão vós estais lançando este apelo”.5
Este solene compromisso está presente no nosso texto constitucional aprovado pela Sé Apostólica (1984), onde afirma explicitamente a particular responsabilidade dos salesianos com relação a eles,6 e confere ao Conselheiro para a Família Salesiana a tarefa de “orientar” e de “assistir” as Inspetorias “para que em seus territórios se desenvolva a Associação dos Cooperadores Salesianos”.7
Nos Regulamentos Gerais, ainda se estabelece que: “Cada comunidade sinta o dever de apoiar e incentivar a Associação dos Cooperadores Salesianos em benefício da Igreja. Contribua para a formação dos seus membros, faça conhecer e promova essa vocação, sobretudo entre os jovens mais engajados e entre os colaboradores leigos”.8
Também no texto renovado do Regulamento dos Cooperadores, após ter descrito o ministério do Reitor-Mor como Moderador supremo da Associação, que “seja garantia de fidelidade ao Projeto do Fundador e promova o seu crescimento”, lembra a peculiar e indispensável tarefa que têm os Inspetores e Diretores: “os Inspetores salesianos — lê-se no texto —, no contexto das responsabilidades específicas da Sociedade de São Francisco de Sales, tornam presente o serviço do Reitor-Mor em nível local e garantem, com a colaboração dos Diretores, sobretudo os vínculos da unidade e da comunhão. Providenciam a assistência espiritual dos centros e envolvem suas comunidades religiosas na generosa tarefa deste serviço de animação”.9
É a hora de relançar
Queridos Inspetores, queridos Diretores e Irmãos todos, estas indicações de toda a nossa tradição e da nossa Regra de vida são um apelo urgente ao trabalho apostólico. Se quisermos reapresentar em sua integridade o carisma de Dom Bosco nesta vigília das celebrações centenárias do 88, devemos nos sentir portadores de uma “particular responsabilidade” em promover e animar um “vasto movimento de pessoas”,10 cuidando em particular da Associação dos Cooperadores. Desde as nossas primeiras origens eles estiveram presentes na missão juvenil e popular comum, que nos questiona continuamente mais além das obras existentes.
O projeto de Dom Bosco sobre os Cooperadores nos faz entender a audaz e genuína dimensão apostólica do carisma salesiano na união de muitas forças para o serviço do Reino. Nós e os Cooperadores estamos a serviço de uma mesma missão!
Nós somos para eles os irmãos “consagrados”, “vínculo seguro e estável desejado expressamente por Dom Bosco... (como) centro propulsor deste movimento de batizados”.11
Eles são para nós, seguindo a forte afirmação de Dom Bosco “uma associação importantíssima, que é a alma da nossa Congregação”, os Cooperadores de fato nos impulsionam a uma maior e mais dinâmica fidelidade à vocação salesiana comum,12 lembrando-nos o critério permanente de nossa ação apostólica que coloca no centro do coração salesiano a experiência oratoriana.13
Deixando de lado o critério das obras, esta experiência precisa de numerosos operadores, muito mais da presença necessária dos Salesianos e das Filhas de Maria Auxiliadora. De fato, são tão graves e múltiplas as necessidades da juventude abandonada, que exigem cada vez mais abundantes forças apostólicas; é tão complexa a área de ação educativa e cultural que requer, com os consagrados e sacerdotes, a presença ativa e competente dos leigos generosos; é tão vasta e mutável a problemática juvenil que requer, além da renovação das obras já tão benéficas, uma contínua criatividade e audácia de presença apostólica e, não poucas vezes, em setores onde só os leigos podem estar presentes e trabalhar eficazmente. A missão salesiana, à luz da contribuição que podem dar os Cooperadores, nos obriga a não ficarmos fechados em casa, mas em ter aquele olhar social e eclesial que impulsionava o nosso Pai a buscar muitas forças para responder aos desafios dos problemas juvenis e populares da sociedade.
É preciso sublinhar, sobretudo, a razão fundamental que toca a nossa identidade própria de herdeiros do patrimônio de Dom Bosco. Após a aprovação pós-conciliar das Constituições das Filhas de Maria Auxiliadora (1982) e das nossas (1984), a recente aprovação do “Regulamento de vida apostólica” dos Cooperadores (1986) traz consigo a visão completa de como se deve buscar a renovação e viver, com atualidade e na perspectiva do futuro, o carisma do nosso Fundador. Ele foi confiado simultaneamente e principalmente a estes três grupos, centralizados no serviço de unidade do seu Sucessor. Devemos, portanto, tomar consciência, que começa uma nova era para a nossa Família, e que se tornam mais concretas e vastas as exigências da nossa fidelidade renovada ao Fundador.
A partir desta perspectiva vê-se melhor porque deve crescer a comunhão de espírito e a colaboração de trabalho nestes três grupos. Não podemos assumir uma atitude de defesa nas metas alcançadas, mas é preciso reconquistar aquele dinamismo de “movimento de pessoas”, que foi característica do maravilhoso apostolado de Dom Bosco. “Se um pobre padre — dizia o nosso Pai numa conferência aos Diretores, em 1876 — com nada e com menos de nada, porque massacrado por todos e de todos os lados, conseguiu levar as coisas até ao ponto que se encontram hoje; se, afirmo novamente, um só fez tudo isso que vós vedes e com nada, que bem Deus não esperará de trezentas pessoas (era o número dos irmãos naquele ano) sadias, fortes, com boa vontade, instruídas, e com meios poderosos que agora temos? O que não podereis fazer apoiados na Divina Providência?
Deus espera de vós grandes coisas; eu as vejo claramente e presentes em toda parte... Se alguém lembrar estas minhas palavras no próximo ano, eu vos poderei fazer ver as grandes coisas que o Senhor se dignou iniciar este ano, e especialmente uma que vos maravilhará (referia-se à fundação da Associação dos Cooperadores)... Estas, quando estiver na eternidade, trarão grandes consequências para a salvação das almas, a glória de Deus; serão um bem para a Igreja Universal, e serão razão de glória — sim, deixai que diga esta palavra — para a nossa Congregação... vós mesmos ficareis maravilhados em ver como conseguistes realizar tudo isto diante dos olhos do universo e para o bem da sociedade”.14
Será, portanto, necessário, queridos Irmãos, que cada Inspetoria reorganize a Associação dos Cooperadores. Cada sócio deveria ter uma cópia do novo Regulamento da Associação: a sua leitura ajudará a refletir sobre os conteúdos do art. 5° das nossas Constituições e sobre os art. 36, 38, 39 dos nossos Regulamentos.
Cada Inspetor, juntamente com seu conselho e com os Diretores, estude este documento, para renovar e intensificar as iniciativas a serem promovidas nas casas. Trata-se de uma porção viva do nosso carisma; a ele Dom Bosco atribuía a possibilidade de realizar “grandes coisas”. Não é uma obra a mais; é parte de nós mesmos; é uma grande quantidade de energia no “Movimento”; é uma promessa de uma mais intensa fecundidade; é um crescimento na fidelidade ao Fundador e uma exigência de identidade salesiana.
Na conferência aos Diretores, acima citada, o nosso Pai concluía afirmando: “Deus foi Quem tudo começou. Ele mesmo deu-lhes o impulso e a vitalidade que têm. Ele com o passar dos anos as sustentará. Ele as levará à realização. Deus está disposto a realizar todas estas grandes coisas que contribuirão no aumento maravilhoso dos sócios. Uma só coisa Ele nos pede: que nós não nos tornemos indignos de tamanha bondade e misericórdia. Enquanto correspondermos às suas graças com o trabalho, com a moralidade, com o bom exemplo, Deus servir-se-á de nós, e vós ficareis maravilhados que se tenha realizado tanto, e que tenhais realizado tanto..., devemos exclamar: “anima possum in Eo qui me confortat”.15
Queridos irmãos, a atenta reflexão sobre a carta aos Cooperadores (transmitida nestes Atos) e sobre o seu novo Regulamento inspire propósitos práticos em cada Inspetoria e em cada casa.
Dom Bosco interceda por nós e nos estimule!
Com afeto,
Ver carta do Reitor-Mor aos Cooperadores nos mesmos Atos do Conselho Geral
1 MB 13, 243.
2 Cf. Marcel Verhulst, “I verbali dei 1° Capitolo Generale Salesiano - 1877”, Ed. critica, UPS, 1980, p. 126-141; p. 366-372; tese de doutoramento datilografada.
3 Cf. MB 13, 624ss.
4 Cf. Guido Favini, “II cammino di una grande idea”, LDC, Torino, 1962, p. 199.
5 CGE n. 734.
6 Const. 5.
7 Const. 137.
8 Regul. 38.
9 Regul. Cooperadores 23.
10 Const. 5.
11 CGE n. 732
12 Cf. CGE n. 733.
13 Cf. Const. 40.
14 MB 12, 82-83.
15 MB 12, 83.