Juan Edmundo Vecchi
JUNTOS PARA O CG24
Atos do Conselho Geral
Ano LXXVII – janeiro – março - 1996
N. 355
Introdução - 1. Um acontecimento extraordinário - 2. Acontecimento de comunhão - 3. O significado do CG24 - 4. A comunicação entre a comunidade capitular e as comunidades locais - 5. A comunidade, sujeito realizador do Capítulo Geral - 6. Dois níveis de reflexão e de compromisso comunitário - Conclusão.
Roma, 8 de dezembro de 1995
Queridos irmãos,
quando receberem esta carta já estaremos às portas do CG24. Estivemos empenhados em sua preparação com o mesmo cuidado e paixão a ele dedicados pelo P. Egídio Viganò, desde a escolha do tema, da avaliação atenta dos problemas doutrinais e práticos que comportava e do estudo das modalidades de trabalho.
Introdução
Os capitulares já têm, há algum tempo, traduzido em várias línguas, o documento pré-capitular, que recolhe a síntese orgânica das contribuições vindas das Inspetorias e algumas linhas de reflexão para o Capítulo Geral.
É fruto do trabalho da Comissão Pré-capitular, composta por dezesseis irmãos vindos de outras tantas Inspetorias e de treze nações, reunida por três semanas na Casa Geral, sob a guia do Regulador do CG24, P. Antonio Martinelli.
A comissão trabalhou em clima de fraternidade, com ritmo intenso, alternando momentos de escuta e diálogo, de estudo e oração, utilizando também modernos instrumentos de coleta, catalogação e fichamento do material. O que permitiu chegar ao resultado julgado positivo por todos os membros da Comissão e outras pessoas que o leram antes da aprovação para envio.
Da documentação chegada se conclui que o tema capitular envolveu a Congregação em nível de reflexão e de revisão da praxe. Aprecia-se a diversidade de tons e nuances vindas de todas as partes da Congregação, que confluiu, por assim dizer, num único esforço de encarnar Dom Bosco hoje.
Agradeço a todos aqueles que, nas Inspetorias, na Direção Geral, na Comissão Pré-capitular, se entregaram com afinco, permitindo-nos olhar para a frente, para sua celebração, com fundadas esperanças. Entendo, com estas páginas, convidar irmãos e comunidades a participarem dele espiritualmente e a se prepararem para acolher os seus ensinamentos, criando condições, desde agora, para sua imediata aplicação.
1. Um acontecimento extraordinário
Os Capítulos Gerais marcaram a vida da Congregação. Alguns deles recolheram, depois de sucessivas e pacientes revisões, normas e formas de vida que, graças às suas deliberações, se tornaram estáveis e participadas. Outros criaram papéis e organismos que determinaram novos desenvolvimentos em setores importantes de atividade. Outros ainda consolidaram aspectos da formação espiritual e cultural. Algum deles foi objeto de atenção particular por parte de estudiosos,1 pela incidência que tiveram em nosso caminho histórico.
Alguns Capítulos, mais longos e participados, nos são bem conhecidos. Repassando-os um a um, com paciência, e relacionando-os entre si, vemos que também os menos lembrados deram alguns impulsos, que assumidos pelo governo ordinário, atualizaram e reforçaram a nossa identidade.
Nesse sentido, todos eles foram sinais de unidade e consolidaram essa identidade, discernindo o que a graça da vocação ia sugerindo em tempos que, certamente, se sucediam em ritmo mais lento dos nossos.
A preparação e acolhida na fé foram, e ainda são hoje, condições essenciais para a eficácia dos Capítulos gerais. Nada há neles de automático.
O CG continua antes de tudo um apelo à nossa liberdade, que reconhece com simplicidade e docilidade interior que ele “tem na Sociedade a autoridade suprema”.2 Não só nem principalmente em senso jurídico, mas sobretudo em senso carismático: é a mediação que melhor nos indica os caminhos a tomar e as energias a ativar no momento que vivemos.
Aborrece - dizia o P. Egídio Viganò - quando visitando a Congregação, acontece de encontrar alguma Inspetoria que, por razões diversas, ficou atrás em dois ou três Capítulos. Adverte-se logo que o atraso não toca somente os seus pequenos limites, mas a vida da Congregação e a dimensão eclesial da vocação salesiana.
É fácil perceber, de fato, que os nossos Capítulos Gerais são celebrados em estrita conexão com caminhos eclesiais essenciais. Assim, a título de exemplo, se o CG23 representou o esforço qualificado da Congregação para entrar em sintonia com a “Nova Evangelização”, o CG24 tem em programa colocar a Congregação no passo da Christifideles Laici e na reflexão sobre a Vida consagrada feita pelo Sínodo dos Bispos.
Participar, então, dos Capítulos, quer dizer entrar com nossa modalidade própria no movimento da Igreja.
2. Acontecimento de comunhão
Muitas vezes os meios de comunicação aproximam os Capítulos gerais dos religiosos e os Sínodos a uma constituinte, um parlamento, um congresso ou colégio eleitoral. São as categorias de que dispõem e, acreditam, mais compreensíveis às pessoas. É claro que a semelhança é só material.
Temos experiência que um CG é bem mais de órgão técnico ou jurídico, reunido para despachar determinadas incumbências, como eleição do Conselho Geral, estudo de um tema, retoques a Constituições e Regulamentos.
Introduzindo o primeiro Capítulo Geral, aberto em Lanzo em 5 de setembro de 1877, Dom Bosco afirmava: “O Divino Salvador diz no Santo Evangelho que onde dois ou três estão reunidos no seu nome, ele mesmo se encontra ali no meio deles [...]. Podemos, pois, estar certos, que o Senhor estará em nosso meio e conduzirá, ele mesmo, as coisas de modo que tudo redunde para sua maior glória”.3
Sublinhava assim o caráter de acontecimento que tem a celebração de um CG. Apresentava-nos, de alguma forma, o perfil que o artigo 146 das Constituições dá ao CG, quando o descreve como encontro fraterno, lugar da comum sensibilidade “às necessidades dos tempos e lugares”, e da resposta a um “determinado momento da história”.
A dimensão principal do CG é a comunhão. Que se substancia nos meses de intensa vida comum, enriquecida pela múltipla proveniência dos capitulares e de sua variada experiência. Realiza-se através da autenticidade e novidade do encontro pessoal, que alimenta a alegria de se descobrirem diversos, mas irmãos. Vive do intercâmbio contínuo de homens conscientes de terem todos alguma coisa a dar e alguma coisa a receber nesse encontro na casa de Dom Bosco. Alimenta-se da força da liturgia e da Eucaristia. Sabe externar os traços característicos da alegria salesiana. A comunhão se exprime, então, no estilo de fraternidade típica de nossas comunidades.
Nesse clima, quase por osmose, acontece a comunicação mais intensa, aprecia-se a diferença e a articulação das culturas, percebem-se os desafios oferecidos pelas diversas religiões, evidencia-se com alegria a flexibilidade do carisma salesiano, que se curva cuidadosamente sobre os problemas que atingem todos os jovens do mundo. Constitui-se a convergência que se evidenciará nos grupos e assembleias, discussões e votações.
Essa expressão de comunhão envolve cada comunidade local e inspetorial e estabelece uma ligação entre todas elas. A busca de unidade, manifestada e atuada nas comunidades dispersas em todo o mundo, atinge nela sua máxima extensão e intensidade.
O CG, por isso, durante os meses de reunião, quer estar em profunda comunhão com cada irmão. As comunidades locais e inspetoriais, os tempos e os lugares onde elas atuam permanecem a referência essencial e contínua de sua reflexão. Parte delas, nelas pensa, para elas trabalha.
Anunciando o sexto Capítulo Geral, o beato P. Rua exprimia o desejo de comunhão com todos os irmãos do mundo, fazendo suas as palavras do apóstolo: “Não cesso de dar graças por cada um de vós, fazendo memória vossa em minha oração” (Ef 1,6).4 É legítimo crer que, quanto mais estivermos unidos, tanto mais eficaz será o CG24 para toda a Congregação.
Essa experiência de comunhão, e a unidade que ela cria, não é fugaz. Não se dissolve, mas se difunde com a conclusão do CG.
Sem que se o proponha, mas com segura eficácia, o CG plasma “testemunhas do acontecimento”. A participação nele não é o último empenho do capitular. Ele, em primeira pessoa, junto aos irmãos das casas e da Inspetoria, será chamado a contar a experiência e a mostrar o novo coração salesiano, ao qual cada Capítulo tende, através do conjunto de seus trabalhos. Transmitirá a visão universal da Congregação, as mil faces de sua presença e a unidade de espírito e de finalidades.
Cada capitular se sente presente no CG, em nome de vocês e porquê de vocês recebeu o “mandato”; mas cultiva igualmente a esperança de ser também esperado por vocês, para dar o testemunho que não pode ser dado totalmente nem por um texto escrito, nem por um vídeo, nem pelo fluxo das informações que será certamente garantida. A confirmação e desenvolvimento dessas informações serão provavelmente buscadas nas palavras da testemunha.
Como síntese conclusiva dos trabalhos do primeiro CG, o P. Ceria apresenta as palavras do Padre Secondo Franco, S.J., que tinha ajudado os salesianos em sua preparação: “Finalidade primeira dos capitulares - tinha dito - devia ser a formação da consciência religiosa dos irmãos”.5 Cada Capítulo é um dom feito à Congregação para a eficácia de sua missão, feito a cada um de nós para crescermos na fidelidade à nossa vocação.
Em se tratando então de graça vocacional e não de tempos institucionais, a preparação, o estilo de comunhão, a vontade de acolhida e de realização são as atitudes espirituais a serem cultivadas, desde agora, em nós.
3. O Significado do CG24
O CG24 é um Capítulo Geral ordinário. Desenvolve e aprofunda um aspecto da nossa identidade e do nosso projeto de ação, já estudado em outras ocasiões. Quer colocar-se, particularmente, em continuidade com o CG23 e potenciar suas orientações a respeito da corresponsabilidade e da formação dos leigos em vista da educação dos jovens à fé.
Era vivo, nos membros do Conselho Geral e nos Inspetores e Conselhos Inspetoriais que estudaram algumas propostas de temas para este CG, o desejo de manter uma ligação orgânica tanto com os Capítulos anteriores como com o caminho percorrido durante o último sexênio que se qualificou com iniciativas como o “Projeto Leigos” e a “Carta de comunhão na Família Salesiana”.
Isso deveria permitir uma caminhada pós-capitular em continuidade substancial, mas com progresso significativo em relação aos itinerários percorridos até hoje. É quanto sublinha o documento pré-capitular: “O horizonte - diz - é a missão. Neste sentido, o tema se coloca no centro da reflexão feita pela Congregação desde do CGE e que percorreu os Capítulos Gerais posteriores até chegar ao presente Capítulo”.6
Contemplando a celebração do primeiro CG, Dom Bosco comentava: “Ele fará com que a Congregação tome um novo aspecto. Será um grande passo. É belo ver como ano após ano se dê sempre um passo avante”.7
Dom Bosco esperava, então, do seu primeiro Capítulo (e faz bem crê-lo diante do nosso 24º) um duplo fruto. O de dar à Congregação um novo aspecto, isto é, colocar em foco as linhas de sua fisionomia, aperfeiçoando sua identidade; e o de dar um passo avante na direção indicada pelos sinais dos tempos, pela situação da Igreja e pelas necessidades urgentes dos jovens.
Deve-se apenas notar que a relação com os leigos, colocada como tema do CG24, toca a forma substancial da Congregação Salesiana e seja um encontro urgente em que a Congregação é chamada a dar de fato um passo, ou talvez uma corrida, avante. Bastaria, como prova, olhar o espaço que o primeiro CG de 1877 dedicou ao tema dos Cooperadores Salesianos.
4. A comunicação entre a comunidade capitular e as comunidades locais
A respeito de quanto foi dito acima, resulta que, no CG24, será toda a Congregação a se reunir e exprimir. Tenhamos este entre os aspectos mais importantes do nosso Capítulo, ao qual serão gratas algumas atenções particulares por parte das comunidades locais.
Oração e sacrifício
Os frutos que esperamos do CG24 fazem pensar na semeadura evangélica. A eles também se aplicará a parábola: uma parte da semente caiu pela estrada e vieram os pássaros e a devoraram. Outra parte caiu em lugar pedregoso, onde não havia muita terra. Logo brotou, porque o terreno não era profundo... Outra parte caiu em terra boa e produziu fruto, alguma cem, outra sessenta, outra trinta.8
A fecundidade depende da graça e das disposições interiores. Ambas se pedem com a oração confiante e constante. Não gostaria que esse convite fosse sentido como expediente genérico ou exortação de rotina. Deve-se pensar nas capacidades e disposições espirituais exigidas de cada capitular para compreender, discernir, purificar-se de apegos impróprios, convergir e decidir o que seja mais de acordo com o projeto de Deus. E não menos com as atitudes de quem recebe a mensagem e é chamado a concretizá-la: capacidade de escuta, disponibilidade, confiança, prontidão em experimentar a aplicação.
Será na oração que o Espírito nos educará a colocar os problemas que estão no centro da nossa atenção num horizonte de fé, a predispor o coração para acolher os frutos do CG24, a obter luz e graça para os irmãos que atuam na Assembleia capitular. “Se o pensamento não se fertiliza no terreno de Deus, é destinado a se achatar na dimensão humana, onde se gratificará em florescências caducas”.9
Sintamos a necessidade da oração sobretudo na escolha, iluminada e livre de qualquer consideração humana, dos Superiores que deverão orientar a Congregação no próximo sexênio. O saudoso P. Egídio Viganò pedia a todos os irmãos na carta de convocação do CG24, “participação e corresponsabilidade, através da oração abundante para que o Senhor conceda à Congregação os Superiores exigidos pelo atual momento histórico da Igreja, do mundo e dos jovens”.10 Será essa talvez a tarefa mais relevante e grávida de consequências de todo o Capítulo geral.
A informação
O Regulamento do CG dá particular atenção à informação. Ela será confiada a uma comissão capitular e se servirá da estrutura e do pessoal adido à ANS.
Temos hoje, em relação aos Capítulos anteriores, um equipamento melhor para comunicar: internet, correio eletrônico, fax, etc. Entramos também nós na época da comunicação em tempo real. O CG24 é uma excelente ocasião - para quem disso tivesse possibilidade e ainda não o tivesse realizado - para aperfeiçoar os próprios instrumentos de ligação com o Centro da Congregação.
Desejamos que a crescida capacidade de informação nos permita realizar e degustar uma comunhão maior. Sabemos que nem os instrumentos nem o fluxo constante de notícias produzem automaticamente essa comunhão. Temos experiência quotidiana disso. Depois de ver um telejornal, permanecemos muitas vezes distantes dos fatos e das pessoas que ele nos apresentou.
A desejada participação acontecerá se das duas partes, CG e comunidades locais, na curiosidade do estilo jornalístico, voltado a buscar e dar vazão de notícias interessantes “dos telhados para baixo”, prevalecer o esforço de difundir e receber as “boas notícias”, que nos levam ao coração dos problemas, dão as dimensões reais do carisma, ajudam a sentir a presença do Espírito e abrem os olhos para os tempos e oportunidades que Deus nos oferece. E, sobretudo, se as informações forem difundidas e valorizadas nas comunidades locais e na Família Salesiana, através dos meios oportunos.
A informação sobre o CG24 empenha, pois, as comunidades a verificarem e colocarem em evidência a própria comunicação interna e convida cada irmão, no espírito das Constituições, a renovar o empenho de participação dos momentos comunitários mais significativos.
O estudo
É preciso preparar o terreno, junto com a celebração e acolhida do CG24, também com uma oportuna atualização sobre os atuais fenômenos e sensibilidades, especialmente no seio da Igreja. Trata-se de uma tarefa indispensável para quem vem a Roma, mas também para quem acompanha o Capítulo, ficando em casa. Fazem parte disso a leitura dos grandes documentos do Magistério eclesial, especialmente os mais recentes, os estudos de história e de espiritualidade salesiana, os Atos dos principais encontros de leigos dos últimos anos, as Constituições ou Estatutos renovados das componentes laicais da Família Salesiana.
Comenta-se, às vezes, sobre a excessiva abundância desses documentos. Mas não é necessário lê-los todos neste breve tempo. O ruim seria não se aproximar de nenhum deles. O conjunto oferece uma grande possibilidade de opção para as pessoas individualmente e para a meditação das comunidades.
O estudo nos permitirá ir além dos lugares comuns sobre os leigos, aprofundar a nossa sintonia com a nova figura do leigo, auspiciada pela Igreja, descobrir aquilo que nos une aos muitos leigos de boa vontade, com os quais, também no mundo secularizado, somos chamados a percorrer alguns trechos de estrada para levar salvação aos jovens e esperança ao mundo.
Trata-se, em outras palavras, de não considerar concluído, em nível de comunidade, o trabalho de reflexão iniciado pelos Capítulos Inspetoriais, mas de continuar a caminhada começada, nas direções já individuadas.
O documento capitular releva que surgem “da leitura da situação feita pelos Capítulos inspetoriais, programas e questionamentos que remetem à história salesiana, a fim de confrontar e delinear um quadro operativo de futuro. Algumas áreas já foram privilegiadas:
a experiência histórica de Dom Bosco, lida em perspectiva da relação com os leigos;
o vasto movimento de pessoas envolvidas na missão salesiana, orientadas pelo núcleo animador que vivia em Valdocco;
a espiritualidade cristã na interpretação salesiana da secularidade”.11
5. A comunidade, sujeito realizador do Capítulo Geral
Já se viu no passado CG23 que qualquer orientação operativa se apoia num fator determinante: a qualidade da comunidade salesiana. O que faz parte da mesma natureza da nossa vocação.
A atividade apenas individual não alcança a plenitude e a capacidade de testemunho e de irradiação da missão salesiana. E, d'outra parte, não vai além de generosos ideais, a predisposição de planos para a Congregação ou para o carisma que não levem em conta o estado das comunidades.
A mesma insistência dos últimos vinte anos sobre o planejamento em geral, e sobre o Projeto Educativo em particular, sugere uma referência essencial à comunidade salesiana como sujeito de formação, proposta e ação apostólica.
Pondo-se à escuta das contribuições vindas das Inspetorias, a Comissão Pré-capitular sublinha a centralidade que a comunidade local tem em levar à prática eventuais orientações de mudança: “A missão salesiana se faz, na prática quotidiana, projeto comunitário realizado por uma comunidade educativo-pastoral. Por isso, sujeito responsável do projeto é um conjunto de pessoas organizadas em comunidade educativa, onde os salesianos SDB constituem o núcleo animador de outras forças, com os grupos da Família Salesiana que participam plenamente do carisma de Dom Bosco”.12
Não bastará individuar a área laical como nevrálgica para a missão salesiana, nem o sucesso do CG24, nem a força estimulante de um documento conclusivo equilibrado e bem interligado para realizar, com os leigos, o salto avante de que falamos. Isso dependerá da renovada motivação missionária de nossas comunidades, da vivacidade com que exprimem a espiritualidade salesiana, da sua capacidade de comunicação e participação.
Convocação, corresponsabilidade, animação e formação dos leigos exigirão uma mobilização da comunidade inspetorial e local e a sua capacidade de criar condições para a aplicação daquilo que o CG24 será capaz de estabelecer.
Ocorre, por isso, verificar logo a vida das comunidades locais e a sua união operativa com a comunidade inspetorial; encorajar o hábito do discernimento, que as leve a fazer opções de concentração de recursos sobre os aspectos mais importantes e fecundos; rever o nível de animação e de corresponsabilidade que elas exprimem.
Parece particularmente urgente o compromisso de formação permanente, que leva progressivamente a uma aumentada consciência, vitalidade e prontidão na comunicação do espírito salesiano. “A emergência formação - nota o documento pré-capitular - percorre transversalmente o discurso sobre os protagonistas da missão, ambientes, iniciativas, estruturas de coordenação. Surge de todos os lugares um pedido insistente de formação comum, onde salesianos SDB e leigos sejam contemporaneamente destinatários e agentes de formação”.13
Isso combina com o que a Christifideles Laici releva como conclusão do parágrafo dedicado à “Formação reciprocamente recebida e dada por todos”: “Formar aqueles que, por sua vez, deverão se empenhar na formação dos fiéis leigos constitui uma exigência primária para garantir a formação geral e capilar de todos os fiéis leigos”.14
Não é exagerado afirmar que cada salesiano, pelo ministério que lhe é confiado - e que vai da escola à catequese, à celebração dos sacramentos, à assistência e ao aconselhamento - é, por vocação, formador de formadores. Cada um deve, então, cultivar “a convicção, antes de tudo, que não se dá formação verdadeira e eficaz se cada um não assumir e não desenvolver por si mesmo a responsabilidade da própria formação”.15 O hábito positivo à autoformação leva ao gosto do crescimento contínuo próprio e alheio, e se torna um modo característico de responder ao impulso do Espírito, que se serve de tudo para nos plasmar à imagem de Cristo.
Essa relação entre qualidade comunitária e possibilidade de animação vai-se afirmando quase com caráter de lei. Insistiram recentemente sobre isso o documento “A vida fraterna em comunidade” e o Sínodo sobre a Vida consagrada. Lemos no primeiro: para “relações frutuosas, baseadas em relações de madura corresponsabilidade”... “é necessário ter: comunidades religiosas com uma clara identidade carismática, assimilada e vivida, ou seja, com capacidade de também transmiti-la a outros, com disponibilidade à partilha; comunidades religiosas com uma intensa espiritualidade e com missionariedade entusiasta para comunicar o mesmo espírito e o mesmo ímpeto evangelizador; comunidades religiosas que saibam animar e encorajar os leigos a compartilharem o carisma do próprio instituto, segundo a própria índole secular e segundo o próprio estilo de vida”.16
6. Dois níveis de reflexão e de compromisso comunitário
A reflexão sobre o papel indispensável da comunidade salesiana leva a tirar consequências operativas em dois níveis.
Antes de tudo em nível de animação e governo da Inspetoria, onde se programa o número das comunidades, se aprova e revê o seu Projeto Educativo-Pastoral, se determina a sua consistência quantitativa e qualitativa em estreita relação com a missão entregue a cada uma delas.
A tarefa de prover que cada comunidade tenha robustez suficiente para garantir vida comum, eficácia da missão, possibilidade de oferecer caminhos formativos diversificados, capacidade de proposta vocacional é confiada à responsabilidade do Inspetor com o seu Conselho.
Em nível de comunidade local, depois, é preciso cultivar a consciência de que “viver e trabalhar juntos”17 é o nosso modo próprio de “ser igreja”, deixando-nos habitar pelo Espírito de comunhão, que nos leva a atuar como membros do corpo e ramos da videira. E é também o único modo possível de exprimir as riquezas do carisma salesiano e do Sistema preventivo.
O espirito de família, tão caro a Dom Bosco e à tradição salesiana, tem em sua raiz a experiência de uma comunidade que se sente família de Deus, uma vez que nela “se reflete o mistério da Trindade”.18
E, também, família humana, porque a acolhida e o afeto maduro invadem relações e clima. Não podemos, portanto, viver e agir como navegantes solitários. Devemos fazê-lo como apóstolos que sabem ser a comunhão o seu primeiro testemunho e missão.
É preciso examinar quanto o espírito do “século”, com seu subjetivismo de pensamento e individualismo de vida, possa ter corroído a nossa consciência pessoal e o nosso estilo. É necessário, portanto, renovar o empenho para que a comunidade salesiana se torne casa onde os irmãos são felizes por viverem juntos, se sentem sujeitos de uma missão e sustentam quem precisa ver que o Espírito de Deus, ao criar comunhão, é mais forte que a carne e o sangue: famílias, comunidades paroquiais, grupos, a gente que vive ao nosso redor.
Conclusão
Caminhamos para o CG24 em profunda comunhão com toda a Igreja. Ouçamo-lo nas palavras de João Paulo II: “Uma grande esperança anima a Igreja na vigília do terceiro milênio da era cristã. Ela se prepara para nele entrar com um forte empenho de renovação de todas as suas forças, entre as quais o laicato cristão”. O Santo Padre está convencido - e se certificou disso peregrinando pelo mundo todo - que “se pode falar de uma nova vida laical, rica de um imenso potencial humano”, que participa “sempre mais ativamente também do esforço missionário da Igreja”.19
Chega assim progressivamente ao amadurecimento um dos frutos do Concílio Vaticano II, que afirmou manifestar-se nos leigos, em todo o seu esplendor, a face do povo de Deus.20
O CG24 coloca-nos na estrada-mestra aberta pelo Concílio, que corre entre o contínuo retorno às fontes,21 para uma fidelidade carismática, e a “leitura dos sinais dos tempos”,22 através dos quais o Espírito guia a sua Igreja e chama a Vida consagrada a uma constante renovação.
Concluindo o terceiro Capítulo Geral, realizado em Valsalice em 1883, Dom Bosco se dirigiu aos seus salesianos dizendo: “Retornando a vossas casas saudareis os irmãos e todos os jovenzinhos. Levai o pensamento de que a glória da Congregação está convosco: tudo está em vossas mãos. Não faltará o auxílio de Deus”.23
É uma palavra que vale para nós. “Tudo está em vossas mãos”. Todos juntos preparamos o CG24, todos juntos o celebraremos, todos juntos assumimos a responsabilidade - cada um segundo suas possibilidades e o ministério que lhe é confiado - de fazer viver os seus ensinamentos, salesianos e leigos juntos, para a salvação dos jovens.
Afeiçoadíssimo em Dom Bosco,
P. Juan E. Vecchi
Vigário do Reitor-Mor
1 Verhulst M., Note storiche sul Capitolo Generale I della Società Salesiana (1877), in “Salesianum” 43 (1981) pp. 849-882; Wirth M., Don Bosco e i salesiani, LDC, Torino-Leumann, 1969, cap. XXIV, pp. 291-300.
2 Const. 147.
3 MB XIII, 251.
4 Carta circular de 19.03.1892.
5 Cf. MB XIII, 294.
6 Doc. pré-capitular, Introdução, n. 1
7 MB XIII, 243.
8 Cf. Mt 13,4-9.
9 Bosco V., Il Capitolo: momento di profezia per tenere il passo di Dio, LDC, Torino-Leumann, 1980, p. 86.
10 ACG 350, p. 6.
11 Doc. pré-capitular, n. 183.
12 Doc. pré-capitular, n. 1.
13 Doc. pré-capitular, n. 220.
14 ChL, 63.
15 Ib.
16 Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de vida Apostólica, A vida fraterna em comunidade, n. 70.
17 Const. 49.
18 Ib.
19 João Paulo II, Discurso, 21 de setembro de 1995.
20 Cf. LG 32.
21 Cf. PC 2.
22 Cf. GS 4.
23 MB XVI, 418.