301-350|pt|309 - Ato de entrega confiante a Maria...


Egídio Viganò



ATO DE ENTREGA CONFIANTE DA CONGREGAÇÃO

A MARIA AUXILIADORA – MÃE DA IGREJA



Atos do Conselho Superior



Ano LXIV – JULHO-SETEMBRO, 1983



N. 309




A) NOTÍCIAS: A santa morte do pranteado P. Renato Ziggiotti. A solene beatificação de Dom Luís Versiglia e do Padre Calisto Caravario.

B) ATO DE ENTREGA CONFIANÇA DA CONSAGRAÇÃO A MARIA AUXILIADORA — MAE DA IGREJA. — Nos umbrais de uma nova etapa da vida da Congregação. — O Significado deste nosso ato religioso. Confiando em Maria “Auxiliadora”, preparemos o Advento do 2000. — Queremos ser corajosos missionários da juventude. — Educadores da graça. — Porque falamos de “entrega”. — Confiança e esperança.

C) APÊNDICE





Roma, 31 de maio de 1983

Queridos Irmãos,



dois acontecimentos merecem uma lem­brança especial neste nosso encontro trimestral. O primeiro é a santa morte do pranteado P. Renato Ziggiotti, Reitor-Mor emérito, 5º Su­cessor de Dom Bosco, que se deu em Albaré (Verona), em 19 de abril passado. O segundo é a beatificação de Dom Luís Versiglia e do P. Calisto Caravario, proclamada solenemente pelo Papa João Paulo II em 15 de maio, na praça de São Pedro.



1. A figura do Padre Renato Ziggiotti, que será oportunamente comemorado em outro órgão, mostra-nos o rosto genuíno de um gran­de filho de Dom Bosco. Faz-nos rememorar, com os seus 12 anos de reitorado, um período mui delicado e característico da história da Congregação.

Após longo serviço prestado como Diretor, Inspetor, Conselheiro Escolar Geral, e Prefeito ou Vigário do Reitor-Mor, coube-lhe guiar a nossa Família no fim, podemos dizer, de uma era cultural, após o grande conflito mundial de 1939-1945 e na imediata preparação e desenvol­vimento do Concílio Ecumênico Vaticano II, quando já começava a fazer-se sentir a aurora de uma nova época histórica, acompanhada dos equívocos da contestação, que preanunciava os acontecimentos de 1968, com suas tensões e agitações.

À frente da Congregação, soube o P. Rena­to Ziggiotti testemunhar com constante simpa­tia os valores permanentes da vocação salesia­na. Numa hora de dilacerações, teceu a unidade de todas as casas e de todos os irmãos; quando os olhos de muitos voltavam-se para o futuro mais que para o passado, insistiu sobre o conheci­mento e o amor de Dom Bosco Fundador, como indispensável ponto de referência no caminho do futuro; quando cresciam as incertezas e se anunciava intensa busca de identidade, ele pro­clamava com a sua vida uma determinação convicta, um incansável empenho animado de forte espírito de sacrifício, um inabalável senti­do de Deus, devoção filial a Maria, profundo e preocupado entusiasmo pelos jovens, mais in­tensa dedicação às vocações e à formação, uma humildade que o tornou capaz de entregar opor­tunamente a outros o timão da Congregação, uma alegria intensa e inexaurível. Testemunhou os valores permanentes da Vocação salesiana.

Agradecemos a Deus haver-nos dado um irmão dessa têmpera e estatura, que soube ser tão dócil ao Espírito do Senhor que pôde levar a Congregação a preparar-se, na unidade e na fidelidade, para as prementes exigências dos novos tempos.



2. A beatificação dos nossos dois primei­ros missionários mártires enriqueceu a Família Salesiana com nova dimensão eclesial. Fez-nos tomar consciência disso primeiramente a pro­funda e profética homilia do Santo Padre, e, depois, a douta, documentada e apaixonada palestra de Dom Antônio M. Javierre, Secretá­rio da Sagrada Congregação para a Educação Católica, durante a solene comemoração dos dois bem-aventurados mártires, na sala magna da nossa Universidade Pontifícia. Ficou comprovada, com esta beatificação, uma nova di­mensão fundamental da santidade dos filhos de Dom Bosco: a de considerar o martírio qual meta intrínseca ao espírito do “Da mihi animas”, que Dom Bosco definia “martírio de caridade e de sacrifício para o bem de outrem”.

Nisto Dom Bosco insistia com frequência. “O primeiro passo que devem dar os que querem seguir a Deus é o de renunciar a si mesmos e carregar a cruz empós Ele”.1 E, coisa rara, porque Dom Bosco pouco explicava suas sentenças, numa carta de 1867, dirigida a todos os Salesia­nos, assim precisava o seu pensamento: “Isto é o que faz na nossa Sociedade aquele que con­some suas forças no sagrado ministério, no ensino ou em outro exercício sacerdotal, até uma morte também violenta de cárcere, exílio, ferro, água, fogo...”.2

Os dois beatos selaram com o derramamento do sangue o amor de predileção pelos jovens. “É sempre pelo seu testemunho de fé — disse-nos o Papa —, que o Mártir é morto... (Isto pode também acontecer) por causa de certa ação moral, que encontra na fé o seu princípio e a sua razão de ser. (Trata-se, em tal caso, de) um testemunho implícito e indireto (da fé), mas não menos real, antes, em certo sentido, mais completo, enquanto realizado nos próprios frutos da fé, que são as obras da sua caridade”.3

E mais adiante, na sua homilia, o Papa dá extraordinária importância profética ao martírio dos nossos dois irmãos quando afirma: “O San­gue dos dois beatos está nos alicerces da Igreja chinesa, como o sangue de Pedro está nos ali­cerces da Igreja de Roma. Devemos, pois, enten­der o testemunho de seu amor e serviço como um sinal da profunda conveniência entre o Evan­gelho e os valores mais altos da cultura e da espiritualidade da China. Não se pode separar, em tal testemunho, o sacrifício oferecido a Deus e o dom de si feito ao povo e à Igreja da China”.4

Por isso o Santo Padre faz votos por que “a feliz circunstância deste rito de beatificação” suscite e reforce um progresso do diálogo entre Evangelho e cultura em favor do imenso povo chinês.5

Sentimo-nos assim eclesialmente ligados, além do empenho missionário em geral e do Projeto-África em especial, também a esta gran­de expectativa da Igreja ante a China conti­nental.

E então, queridos irmãos, devemos pensar que Nosso Senhor nos pede muito mais do que já estamos fazendo, com as forças limitadas de que dispomos. É mesmo verdade! Deus nos compromete sempre mais para lá das nossas forças. E é bonito que assim seja, porque deve­mos sentir-nos objetivamente nas Suas mãos, amparados pelo Seu poder e impelidos pelo Seu Espírito a participar sempre mais ativamente numa hora de expansão da Igreja. Nela também nós havemos de crescer, se não nos fecharmos no já feito e não pouparmos, com cálculos caseiros, as nossas forças. Somos cha­mados a nutrir deveras uma confiança concre­ta na eficácia da ressurreição de Cristo e de Maria, a estar seguros de que a nossa Família espiritual nasceu na magnanimidade e é alimen­tada por uma íntima energia superior. O nosso Fundador anima-nos, dizendo: “trabalhar a mais não poder”.6

O P. Albera, citando São Francisco de Sales, dizia: “Confiando na proteção (de Maria), empenhemo-nos em grandes coisas; se a amar­mos com ardente afeto, Ela nos alcançará tudo o que desejarmos”.7 A já centenária experiência da nossa existência vocacional chama-nos “a grandes coisas”.

E é precisamente sobre o tema de uma especial confiança na Auxiliadora que lhes ofe­reço algumas reflexões na perspectiva dos nossos crescentes compromissos futuros.





ATO DE ENTREGA CONFIANTE DA CONGREGAÇÃO

A MARIA AUXILIADORA — MÃE DA IGREJA



O próximo Capítulo Geral põe termo, de certa maneira, ao processo de identificação pós-conciliar querido pela Igreja e exigido pelo emergir de uma nova época cultural, que coinci­de com a preparação do terceiro milênio da Igre­ja. Como nos inícios, sempre que começamos, deve-se evidenciar de maneira clara e indispen­sável a presença de Maria.



Nos umbrais de nova etapa da vida da Congregação



O empenho capitular do nosso trabalho conclusivo com relação às Constituições e aos Regulamentos, além de ser um ponto de che­gada (como já lhes dizia ao convocar o CG22),8 será sobretudo uma plataforma autorizada de relançamento da nossa Vocação na Igreja: “O CG22 deveria colocar as bases de uma dese­jada fase de mais intensa genuinidade salesia­na”, quer no espírito dos irmãos e das comuni­dades locais, quer na magnanimidade dos em­penhos apostólicos inspetoriais e mundiais. Ouvimos nossos grandes predecessores sussur­rarem ao nosso coração: “empenhem-se mesmo em grandes coisas”!

Mas só saberemos fazer isso se “confiarmos na proteção” de Nossa Senhora, como fez o nosso Pai Dom Bosco. Por isso, julguei oportu­no, também a pedido de vários irmãos, convi­dá-los a realizar um solene Ato de Entrega de toda a Congregação a Maria Auxiliadora-Mãe da Igreja, por ocasião do próximo Capítulo Geral.

No encerramento dos Exercícios Espirituais que precedem a abertura oficial do Capítulo, sábado, 14 de janeiro de 1984, os Capitulares, em nome das comunidades inspetoriais, repre­sentando todos os irmãos e toda a Congregação, farão um especial Ato de Entrega confiante a Maria. Convido as comunidades locais, e cada um em particular, a unirem-se neste Ato, celebrando-o também em cada casa. Todos os Inspetores, com o próprio conselho, vejam a melhor forma de o preparar e realizar em cada uma das comunidades locais. Quereríamos preparar-nos devidamente, procurando captar a importância espiritual e salesiana de tal gesto mariano para o relançamento da nossa Voca­ção, nos umbrais, como costuma dizer o Papa, do Advento do 2000.









O significado deste nosso ato religioso



Quer ser um gesto de fé e de esperança. Inserimo-lo num clima de projeto de futuro: o CG22, mais que uma meta, é um campo-base de partida. Mais, mais para o alto, mais para a frente!

Acima de tudo, nosso Ato de Entrega à Auxiliadora será profundamente comunitário. Queremos entregar à guarda maternal de Nossa Senhora, aos seus cuidados, às suas solícitas iniciativas, ao seu poder de intercessão, à sua privilegiada e materna capacidade de conduzir a Cristo, toda a Congregação, enquanto comu­nidade mundial, como comunhão na identidade do espírito e da missão em todas as Inspetorias e Casas.

Maria, que entre nós “tudo fez”, ajude-nos a crescer na unidade e na fidelidade ao Funda­dor através da adaptação oportuna à multiformidade das situações.

Esta dimensão comunitária comporta, por sua natureza, que a confiança seja também um ato pessoal de cada um dos sócios: cada irmão deve experimentar na sua própria consciência a vontade de abandonar-se confiantemente a uma Pessoa tão fiel e a uma Mãe tão influente na economia da salvação.

Confiamos a nossa Congregação e todos os seus membros a Maria porque com Ela nos sentimos parte viva da Igreja, da qual Ela é Mãe, Auxílio e Modelo, e partilhamos generosa­mente sua missão no mundo, sobretudo em favor da juventude, a fim de que com eficácia atualizada, concorramos para testemunhar e edificar o Reino de Cristo e de Deus entre os jovens.

Tal entrega confiante implica de si mesma uma visão mais clara e consciente da nossa especial consagração sacramental e religiosa. Favorecerá assim uma recuperação de fideli­dade. Há uma relação objetiva e vínculos con­cretos entre o nosso ser cristão e religioso e a função eclesial de Maria. No Ato de Entrega entendemos considerar isso mais constante e atentamente. Maria nos ajudará a viver fiel­mente a Vocação salesiana, a perceber-lhe a beleza, a realizar sua missão. Ensinar-nos-á a viver quotidianamente, nas suas várias expres­sões, a síntese salesiana da nossa espiritualidade como está resumida na bela oração que reza­mos à Auxiliadora, todas as manhãs, após a meditação. É uma oração muito significativa para nós! Com ela nos colocamos sob a prote­ção materna de Maria, entregamo-nos a Ela e pedimos o dom da fidelidade, renovando a ofer­ta de nós mesmos ao Senhor na dedicação à missão juvenil, de cujo espírito se traça um quadro dinâmico e prático de santidade.

(N. B.: para saber com segurança a que oração nos referimos, ponho em apêndice o texto oficial, tal qual deveria ser recitado em todas as Inspetorias e casas.)

Este nosso gesto mariano é também empe­nho de crescimento da nossa consciência de filhos, que está no centro de toda a vida cristã: filhos de Deus em Cristo, mas também filhos de Maria, Mãe de Deus no Cristo. A filiação im­plica verdadeira pertença de “consanguinidade” espiritual, um parentesco vital de graça, que orienta a liberdade para crescer na órbita evan­gélica da obediência: “por Maria a Cristo; filhos no Filho”!

Entregar-se” a Maria e pertencer mais conscientemente a Ela não significa reduzir os espaços da própria liberdade, mas afirmar os verdadeiros, escolhidos com predileção, qual ambiente favorável de família, no qual se deve lançar o amadurecimento cristão e a reta expansão do próprio amor.

Algum santo falou também de “servidão” ou “escravidão materna”, não tanto para embo­tar ou cancelar a iniciativa da liberdade, quanto para indicar com incisiva expressividade o sen­tido de pertença total (totus tuus!) como ple­nitude de amor e afirmação de liberdade san­tificada. Nos nossos noviciados e nos centros de formação este “sentido de pertença total a Maria” foi, por longos anos, uma praxe inteira­mente livre, mas quase ordinária e comum.

Nosso Pai e Fundador Dom Bosco sugeria que se tornasse mais consciente e exigente o aspecto de confiança mariana com um ato de filiação. Num opúsculo de 1869, publicado nas Leituras Católicas, para uso da Associação dos devotos de Nossa Senhora Auxiliadora (por ele havia pouco fundada), propunha um “Ato de filiação com o qual se toma Maria Virgem por Mãe”.

A fórmula por ele redigida para tal Ato é uma oração de entrega confiante, que concen­tra a atenção e a súplica em Jesus Cristo, “pri­meiro princípio e último fim”; Ele no seu Tes­tamento da cruz dá “ao predileto Apóstolo São João a qualidade e o título de filho da ‘sua’ Mãe Maria”. Depois dirige diretamente a oração do devoto a Nossa Senhora, para pedir-lhe que “possa pertencer a Ela” como filho, que “a tenha por Mãe”; com efeito, “confiando” na sua bondade, “elege-a” para Mãe, suplicando-lhe que o “receba”; “faz-lhe uma doação total e irrevogável de si mesmo” e “se abandona” nos seus braços, confiando na sua “materna proteção”.

Estão aí bem expressos, nessa fórmula de Dom Bosco, o significado próprio do gesto de confiança e também suas exigências e compro­missos fundamentais. É um ato de fé, que reno­va a consciência batismal da filiação. A própria redação do “Ato” é um testemunho de intuição eclesial, aberta à maturação posterior na linha da renovação pós-conciliar mariana.

O ato de filiação propagado pelo nosso Fundador sublinha, por parte do devoto, a sua livre iniciativa de reconhecer e cuidar da espe­cial função materna de Maria, a entrega con­fiante de si a Ela, uma disponibilidade filial para deixar-se conduzir, a segurança de uma ajuda adequada e uma atitude de devoção, que através de Maria volta-se totalmente para Cris­to, a fim de viver melhor e em plenitude as riquezas do seu mistério.

A data de redação e os conteúdos deste texto mariano de Dom Bosco fazem reportar espontaneamente este ato de filiação ao nome caracterizante dado às “suas” Irmãs, as “Filhas de Maria Auxiliadora”, que ele quis como mo­delo de entrega filial à Auxiliadora. No artigo 4 das Constituições renovadas das FMA se lê: “Somos uma família religiosa que é toda de Maria. Dom Bosco quis que fôssemos ‘monu­mento vivo’ de sua gratidão à Auxiliadora e nos pede que sejamos o seu ‘agradecimento’ prolon­gado no tempo. Sentimos Maria presente em nossa vida e a Ela nos entregamos totalmente”.



Confiando em Maria “Auxiliadora”, preparemos o Advento do 2000



Dom Bosco amadureceu sua devoção ma­riana contemplando apostolicamente Maria qual Auxílio do povo cristão e Mãe da Igreja. Não é este um aspecto indiferente para o nosso Ato de Entrega. Entendemos entregar-nos a nós mesmos a uma Mãe operosa, sempre solícita com relação à Igreja, nas vicissitudes da histó­ria de todos os séculos.

Nossa participação na missão do Povo de Deus privilegia a pastoral juvenil e, portanto, sublinha em Maria a sua preocupação maternal para com os jovens, os problemas culturais da educação, a pedagogia das vocações, com sensi­bilidades apostólicas nos projetos por uma Socie­dade nova e uma Comunidade cristã mais empenhada.



A entrega confiante a Maria, vista como Auxiliadora — Mãe da Igreja, exige de nós uma particular atitude eclesial de adesão e afeto para com o “Papa e os Bispos”. Aderimos com atenção ao seu Magistério e à sua Guia pastoral, como mediação qualificada de Cristo-Cabeça sobre todo o seu Corpo; somos sensíveis às urgências da Igreja universal e particular, e nos esforçamos em colaborar de forma generosa e concreta, após haver atualizado e reformulado para tal fim nossos critérios de identidade e comunhão.

O Ato de Entrega deverá renovar na Con­gregação, com a ajuda de Maria, esta importante característica de especial fidelidade ao Papa e aos Bispos, que nos foi legada por Dom Bosco e necessitada hoje de sincero e sacrifi­cado testemunho.

A estima convicta e a continuada e atenta referência, na nossa vida espiritual e pastoral, ao peculiar Carisma de discernimento dos Pas­tores colocados por Cristo e assistidos pelo seu Espírito na guia do Povo de Deus nas conjun­turas do devir humano, é um dos grandes valo­res eclesiais que pedimos à Auxiliadora saiba­mos robustecer e fazer crescer na Congregação.



Outro aspecto, que nos propomos inten­sificar com nossa entrega a Maria e do qual Ela é modelo excelso e fonte inexaurível, é o da “bondade”. Trata-se daquele bom senso do co­ração, da simplicidade contente, da “bondade feita sistema”, que constitui de certo modo o nosso “quarto voto”, incluído propositalmente, segundo a intenção do Fundador, no nosso nome programático de “Salesianos”.

É, como sabemos, um estilo e um critério pastoral que deve permear toda a nossa atividade apostólica, as modalidades da nossa con­vivência, a maleabilidade da aproximação e o método do diálogo, a nossa atitude de amizade, pelo que não nos basta amar os jovens, mas nos sentimos movidos a cultivar uma espiritua­lidade que nos habilita a fazer-nos amar por eles: em suma, aquele rico “espírito de família” que Dom Bosco definiu com a expressão Sis­tema preventivo. O CG21 nos estimulou a reatualizar esta preciosa herança. Maria nos ajudará a vivê-la sempre mais intensamente, como praxe que promove e harmoniza todos os componentes do nosso espírito.



Além disso, entregues à Auxiliadora, nos sentiremos convidados insistentemente por Ela, Mãe da Igreja peregrina, à operosidade apostó­lica, para a edificação do Reino de Cristo e de Deus.

Repensaremos em profundidade o rico e caracterizante espírito do Da mihi animas, que nos faz contemplar a Deus de um ângulo original, e que Dom Bosco traduziu, como apli­cação prática e vivida, no exigente programa de doação de si, expresso no lema salesiano trabalho e temperança.

Confiemos na ajuda de Maria, Inspiradora da Obra Salesiana, para saber imitar as virtudes de Dom Bosco e intensificar a nossa laboriosidade como expressão de zelo apostólico e de ascese religiosa que faz da vida um sacrifício quotidiano oferecido a Deus para a salvação do homem.9



Queremos ser corajosos missionários da juventude



A operosidade da Auxiliadora em favor do Povo de Deus, peregrino na história, empenha intrepidamente na luta entre o bem e o mal, com clara convicção de que a Igreja Católica é “o germe e o início do Reino de Cristo e de Deus”, enviada para anunciá-lo e instaurá-lo em todos os povos.10

Sabemos que o título “Auxilium Christianorum” reporta-se a tempos difíceis de prova­ções, de perigos públicos, de graves dificuldades para a fé, e a batalhas significativas para a liberdade social dos povos crentes. Falando da devoção a Maria Auxílio e Mãe da Igreja, Dom Bosco lembra, no seu opúsculo As maravilhas da Mãe de Deus invocada sob o título de Maria Auxiliadora,11 que “não se trata tanto de invo­car a Maria por interesses privados, mas pelos gravíssimos e iminentes perigos que podem ameaçar os fiéis. Hoje é a mesma Igreja cató­lica que é assaltada: é assaltada nas suas fun­ções, nas suas sagradas instituições, no seu Chefe, na sua doutrina, na sua disciplina: é assaltada como Igreja católica, como centro da verdade, como mestra de todos os fiéis”.

A entrega a Maria, Auxiliadora dos Cristãos — Mãe da Igreja, exige de nós a coragem e a cons­tância dos profetas e dos lutadores pacíficos, assim como foi Dom Bosco em conjunturas muito inseguras e complexas. Para ele, porém, a Auxiliadora não era nem a Senhora da guerri­lha nem a máscara religiosa para camuflar uma opção política. Menos ainda era uma espécie de sucedâneo do medo e da alienação. Era um verdadeiro, concreto, exigente e também arris­cado empenho histórico. Em todas as situações a coragem da fé, a criatividade do amor e a constância da paciência podem e devem fazer de nós defensores e anunciadores indomáveis da verdade evangélica e dos fiéis e incansáveis colaboradores, como dizíamos, do Papa e dos Pastores.

A coleta da liturgia renovada da festa de Nossa Senhora Auxiliadora exprime belamente o tipo de intrepidez e de capacidade de luta que a entrega à Auxiliadora deve robustecer em nós: “Concedei, por sua intercessão que a vossa Igreja sempre tenha força de superar na pa­ciência e vencer no amor todas as crises inter­nas e externas, a fim de ser para todos os homens sinal e portadora do Cristo Salvador”.12

A nossa “força” é o “poder do Espírito San­to” de quem nos falam com insistência a Escri­tura e a Liturgia. É uma energia espiritual, à primeira vista imperceptível, humilde e quase clandestina, mas real e invencível, que não teme nenhum inimigo e infunde coragem para anun­ciar e fazer crescer o Evangelho em todas as situações. O que conta é sentir-se verdadeiramen­te habitados pelo divino Espírito e viver em união com Ele. Desta “vida interior” brota a audácia e a constância da “paciência” para en­frentar e “superar” todo gênero de dificuldades; dela se alimenta a criatividade e a maleabilidade do “amor” para agir pastoralmente, até “supe­rar”, não somente algum obstáculo, não somente certos contrastes externos de abusos e prepo­tências, mas “todas as provas internas e exter­nas”. Hoje, com efeito, surgiram para a Igreja muitas dificuldades também “internas”, de tipo ideológico e disciplinar, que lhe enfraquecem a identidade e podem desviar-lhe a plena fideli­dade à missão de Cristo sobre a terra. Pois bem: “Pecado algum do mundo — disse o Papa em Fátima — pode jamais superar o Amor”!

A confiante entrega à Auxiliadora quer asse­gurar em nós um empenho cotidiano contra qualquer superficialidade espiritual que nos tira o “poder do Espírito Santo”; queremos ter a força de viver com constância, trabalhar incan­savelmente, testemunhar com coragem e lutar evangelicamente na mais explícita lealdade à missão “pastoral” da Igreja católica, muitas vezes incompreendida, em religiosa sintonia com os seus Pastores.



Educadores da graça



Além disso, entregamo-nos confiantemente a Maria para poder realizar com maior atualidade e eficácia nosso serviço pedagógico à ju­ventude. Nossa Senhora, “Mãe da divina graça”, guiou Dom Bosco para ser o grande profeta moderno da santidade dos jovens.

Coube-me a sorte de poder participar com alegria, na primeira semana de abril passado, na peregrinação de mais de 500 jovens franceses aos lugares emblemáticos das nossas origens.

Eles próprios, na reflexão e na oração, quiseram proclamar a colina dos Becchi como “a montanha das bem-aventuranças juvenis”.

É uma bela intuição, que define com acuida­de a nossa originalidade carismática.

Nós Salesianos temos na Igreja, por inicia­tiva de Maria, uma tarefa audaz e urgente: pro­clamar no Povo de Deus o apelo do Evangelho aos jovens para que sejam concretamente san­tos. Devemos saber não só essa verdadeira possibilidade, mas também e sobretudo cons­truir pedagogicamente o testemunho vivo da santidade juvenil, como fez Dom Bosco com Domingos Savio e com tantos outros jovens em Valdocco.

Entregamo-nos confiantemente a Maria para alcançar, com a sua intercessão, o aprofunda­mento e a adesão efetiva aos substanciais crité­rios de “sagrada pedagogia” com os quais o nosso Fundador e Pai soube construir o ambien­te educativo e o clima espiritual da “Obra dos Oratórios”.

Ser portadores na Igreja de uma profecia concreta de espiritualidade juvenil é nossa missão e responsabilidade prioritária. Recebe­mos em herança o delicadíssimo compromisso de ser “educadores da graça”, ou seja, de saber anunciar e fazer crescer os jovens de hoje no mistério de Cristo e da vida no seu Espírito. É uma herança sublime e não fácil que exige de nós profundidade espiritual, sensibilidade de futuro, sintonia com o Espírito Santo, comunhão convicta com a esperança de uma Igreja pere­grina que se prepara para iniciar, com uma santidade renovada e empenhada, seu terceiro milênio de presença e de fermento na história humana. Há, hoje, urgente necessidade desta profecia em todo o mundo, e não nos devería­mos ver enumerados nunca entre os menos entusiastas e competentes em proclamá-la e tra­duzi-la em realidade, com pedagogia atualizada e válida.13

É justamente esta a nossa missão específi­ca! Entreguemo-nos, pois, confiantes à Auxilia­dora, na certeza de realizar um gesto delicadamente salesiano.



Porque falamos de “entrega”



Antes do Vaticano II, costumava-se falar de “ato de consagração” a Nossa Senhora. O Con­cílio precisou o verdadeiro significado teologal do termo “consagração”, embora não tenha podido mudar o uso corrente do vocábulo pro­posto com outros significados menos exatos teologicamente. Desde então, começou-se a cuidar de maior precisão no uso eclesial desse termo.14 O Papa atual, João Paulo II, possibili­tou o emprego de outra palavra, “entrega”, para melhor indicar a relação de afeto, de doação, de colocar-se à disposição, de pertença, de livre “servidão”, de confiança e de apoio com relação ao patrocínio materno de Maria, colaboradora de Cristo pelo Reino.

O Santo Padre, com efeito, em 8 de dezem­bro de 1981, na basílica de Santa Maria Maior, comemorando o 1550º aniversário do Concílio de Éfeso, “entregou” solenemente toda a famí­lia humana à santa e poderosa Mãe de Deus.

Alguém poderá perguntar que diferença existe entre “ato de consagração” e “ato de entrega”. Não se trata somente de mudança de termos, mas de aprofundamento de conceitos. Para o Vaticano II, a “consagração” é um ato efetuado por Deus: é um dinamismo que desce do alto para selar um projeto divino confiado a quem é chamado: o homem “é consagrado” por Deus através da Igreja.15 Falando depois do ato pessoal de resposta à consagração, o Concílio prefere dizer dos consagrados que eles ofereceram totalmente a própria vida ao serviço de Deus” (“mancipaverunt”), e que se empenham na Igreja com uma “doação de si” (“suipsius donatio”).16

Falando da redescoberta dos valores da “Profissão perpétua”, nós já havíamos refletido sobre este aspecto:17 no ato da profissão religiosa nós nos “oferecemos” e Deus, através da Igreja, nos “consagra”. Basta pensar no que acontece na “consagração” sacramental do Batismo (e também da Crisma e da Ordem sagrada para entender esta diferença de dinamismos: um descendente (a consagração) e o outro ascendente (a oblação de si): “vós vos tornastes ‘consagrados’ — já dizia Cirilo de Jerusalém – quando recebestes o sinal do Espírito Santo...”. E depois acrescentava: “Cristo não foi ungido pelos homens com óleo ou outro unguento material, mas o Pai o ungiu de Espírito Santo... que é chamado óleo de alegria porque é Ele o autor da alegria espiritual”.18

É bom ter uma visão teologal clara de “consagrar”, que vem do alto, e de doar-se ou “oferecer-se” ou “entregar-se”, que procede de nós. A consagração realiza-a Deus através da Igreja; ela é substancialmente a do Batismo, da Crisma, da Ordem (para quem é diácono ou padre), e a da Profissão religiosa, que tem raízes profundas na consagração batismal, levada à sua plenitude e caracterizada em forma especial19 por uma marca ou selo do Espírito do Senhor no ato da oblação de si através do compromisso dos conselhos evangélicos.

O Espírito Santo é acertadamente chamado pelos Padres de “Selo”, porque com Ele o Pai ungiu o Cristo no Batismo20 e unge e marca os Cristãos.21

O Ato de Entrega a Maria, para nós já consagrados religiosamente pelo Espírito Santo, quer ser, porém, iluminado e consciente cuidado, defesa e desenvolvimento da genuinidade da nossa consagração cristã, religiosa e apostólica. Mais que um gesto devocional epidérmico e transi­tório, é a confirmação e o relançamento de toda a nossa realidade batismal e salesiana.

O Ato de Entrega não cria novas relações de consagração, mas renova, aprofunda, garan­te, faz frutificar os que já existem, descobrindo seus vínculos escondidos com Maria, Esposa do Espírito Santo e Mãe da Igreja. Com efeito, Ela exerce no mundo uma função salvífica subor­dinada,22 pela qual confiamos na sua maternal iniciativa de Auxílio do povo cristão. Há, na “consagração” operada pelo Espírito Santo, vín­culos com Maria que derivam da própria econo­mia da Redenção; é no próprio projeto divino que se vê associada Maria a Cristo, como nova Eva ao novo Adão: “esta tarefa subordinada de Maria reconhece-a a Igreja abertamente, conti­nuamente o experimenta e recomenda ao cora­ção dos fiéis, para que, encorajados por essa maternal proteção, mais intimamente adiram ao Mediador e Salvador”.23

A ignorância e o descuido dessa objetiva relação mariana seriam para nós, por certo, grave defeito.

A nossa filiação batismal acha-se vinculada também à maternidade de Maria “tipo da Igre­ja”24 e o Ato de Entrega sublinha a sua característica consciên­cia filial.

O amadurecimento crismal na coragem fe­cunda do testemunho está vinculado à fortaleza de Maria, cheia de Espírito Santo25 e o Ato de Entrega intensifica-lhe as exigências.

A diaconia da Ordem está também vincula­da a Maria, “a Mãe do sumo e eterno Sacerdote (da Nova Aliança), a Rainha dos Apóstolos, a ajuda dos presbíteros no seu ministério”.26

A especial sequela do Cristo assumida com a profissão religiosa está vinculada a Maria, Virgem Pobre e Obediente, como primeira e mais alta discípula do Cristo “cuja vida é regra de conduta para todos”,27 e proclama de manei­ra peculiar seus valores originais.

Enfim, a própria Vocação salesiana, com seu espírito característico e sua missão, acha-se historicamente vinculada a Maria que, como diz o Fundador, é sua Inspiradora, Mestra e Guia. O Ato de Entrega reconhece-lhe a maternal intervenção e cuida de sua presença contínua e ativa.

O nosso Ato de Entrega, pois, quer reconhe­cer e confirmar as relações profundas e vitais que nos unem a Maria, quer como cristãos quer como religiosos e salesianos.

Proclamamo-nos conscientemente em ínti­ma relação com Ela, aprofundando os conteúdos da consagração com que o divino Espírito nos assinalou com a marca de Cristo, tomamos mais claramente consciência dos vínculos espirituais e de graça do nosso ser cristão e salesiano; propomo-nos adesão mais sentida e fidelidade mais iluminada.

É como quando o filho cresce e chega a mais maduro uso da razão: suas relações com a mãe deveriam tornar-se mais pessoais, mais conscientes e, por isso mesmo, mais estáveis e profundas.



Confiança e esperança



Portanto, queridos irmãos, nosso solene Ato de Entrega à Auxiliadora – Mãe da Igreja é rico de significados e perspectivas.

Faz-nos adquirir consciência mais profunda da história da salvação. Revigora a nossa fide­lidade dinâmica à Vocação salesiana. Põe o nosso futuro próximo nas mãos maternais de Maria. Assegura-nos que temos a possibilidade de resolver e superar, com a ajuda do Alto, os problemas e as dificuldades próprios desta hora de aceleração da história. Estimula-nos a ter uma magnanimidade operosa nas iniciativas apostólicas. E, sobretudo, nos conduz a maior e filial profundidade da nossa vida no Espírito Santo, cultivando a interioridade, a dimensão contemplativa, a oração, a práxis ascética, a caridade fraterna, as iniciativas de reconciliação, os valores do sofrimento, em suma, todo o clima espiritual e pastoral da Casa.

A entrega confiante a Maria nos fará pro­gredir “continuamente na fé, na esperança e na caridade e procurar e seguir em tudo a divina vontade”.28

Ó Maria Auxiliadora, Mãe da Igreja, Inspi­radora e Guia da Família Salesiana, Vós intuis maternalmente o coração de todos os irmãos, Vós iluminais e defendeis a sua consagração apostólica, Vós conheceis e promoveis o projeto educativo-pastoral a eles confiado, Vós com­preendeis suas fraquezas, limitações e sofrimen­tos, Vós amais a juventude confiada a cada um deles como dom de predileção. Pois bem, ó Santa Virgem Mãe de Deus, poderoso auxílio do Papa, dos Pastores e de todos os seus colabora­dores, tomai sob o vosso atencioso patrocínio esta humilde e laboriosa Sociedade de São Francisco de Sales. Ela, com filial confiança, quer entregar-se solenemente a Vós; e Vós, que fostes a mestra de Dom Bosco, ensinai-lhe a imitar todas as suas virtudes!

Com esta atitude de oração, preparemo-nos, queridos irmãos, para o próximo Capítulo Geral, tão importante para o futuro da Congregação e de toda a Família Salesiana.

Uma cordial saudação no Senhor.

P. Egidio Viganò

Reitor-Mor



Apêndice



ORAÇÃO QUOTIDIANA

DO SALESIANO A NOSSA SENHORA AUXILIADORA





Ó Santíssima e Imaculada Virgem Auxiliadora, Mãe da Igreja,

fundadora e guia da nossa Família Salesiana, nós nos colocamos sob a vossa proteção materna e vos prometemos trabalhar sempre na fidelidade à missão salesiana, para a maior glória de Deus e a salvação do mundo.



Confiantes na vossa intercessão,

nós vos pedimos pela Igreja,

pela Congregação e pela Família Salesiana,

pelos jovens, especialmente os mais pobres,

por todos os homens remidos por Cristo.



Ensinai-nos,

vós que fostes a mestra de Dom Bosco,

a copiar em nós as virtudes

do nosso santo Fundador,

e de modo especial sua união com Deus,

sua vida casta, humilde e pobre,

o amor ao trabalho e à temperança,

a bondade e a doação ilimitada aos irmãos,

sua fidelidade ao Papa e aos Pastores da Igreja.



Fazei, ó Maria Auxiliadora,

que sejamos fiéis e generosos até à morte

no serviço a Deus,

e possamos um dia ser acolhidos

na alegria da Casa do Pai. Amém.”



1 G. BOSCO, Il cristiano guidato alla verità secondo lo spirito di S. Vincenzo de’ Paoli, 1848, p. 139.

2 Epistolario di San Giovanni Bosco (edição de Eugenio Ceria), SEI, 1955, vol. I, p. 464.

3 L’Osservatore Romano, 16-17 de maio de 1983.

4 Ib.

5 Cf. ib.

6 MB XII, 288.

7 Lettere circolari di Don Paolo Albera ai Salesiani, Direzione Generale Opere Salesiane, Turim 1965, p. 286.

8 Cf. ACS 305.

9 Cf. Const. 42 e 49.

10 Cf. LG 5.

11 Turim, 1968.

12 Cf. LG 8.

13 Cf. o convite do Papa aos jovens para o Ano Santo.

14 Ver, por ex., também a fórmula da nossa profissão religiosa: cf. Const. 74.

15 Cf. LG 44: o religioso consecratur”, em forma passiva e subentendendo “a Deo”. Cf. Esquema Constitutionis Dogmaticae de Ecclesia; Modi – V – Caput VI, De Religiosis, pág. 7. Resp. ad 24.

16 Cf. PC 5.

17 Cf. ACS 295, pág. 20ss.

18 S. Cirilo, Catechesi 21, Mistagogica, 1-3, PG 33, 1087-1091.

19 Cf. PC 5.

20 Jo 6,27; At 10,38.

21 2Cor 1,22; Ef 1,13; 4,30.

22 LG 62.

23 Ib.

24 LG 63, 64.

25 LG 65.

26 PO 18.

27 PC 25.

28 LG 65.

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