Viganò Egídio
SÃO JOÃO BOSCO: “IUVENTUTIS PATER ET MAGISTER”
Atos do Conselho Geral
Ano LXX – abril-junho, 1989
N. 329
A Carta “Centesimo Exeunte”. — Um título a ser aprofundado e interiorizado. — O título de “Pai”. — O título de “Mestre”. — A ligação viva com “a juventude”. — Impulso para a “Nova Evangelização”. — Ensaio eclesial do Sistema Preventivo.
Roma, 24 de fevereiro de 1989
Queridos Irmãos,
Concluímos as celebrações do primeiro ano centenário da morte do nosso Pai e Fundador Dom Bosco. Chegam notícias do mundo todo dos momentos extraordinários, vividos na animação, na meditação e na perspectiva de generosos compromissos. Descobrimos que a personalidade histórica do nosso Santo é muito grande e interessa a vastos setores da vida cultural e social. Ficamos felizes, não por uma ingênua satisfação de amor próprio corporativo, mas porque contemplamos mais claramente nele as maravilhas do Espírito do Senhor.
Experimentamos uma verdadeira alegria de fé, pois aumentou o apreço pela nossa vocação e a dedicação à nossa missão.
Deus seja louvado!
A carta do papa “Centesimo Exeunte”
Exatamente à conclusão do centenário — 24 de janeiro p.p., festa do nosso Padroeiro São Francisco de Sales e memória da Auxiliadora — o Sumo Pontífice João Paulo II nos fez um magnífico presente, tanto mais apreciável quanto menos previsto: o título oficial de “Pai e Mestre da juventude”, dado a Dom Bosco. Presente que, enquanto nos enche de alegria, deve levar-nos a uma mais meditada reflexão e a uma mais consciente responsabilidade, não desligada de uma viva gratidão ao Vigário de Cristo.
É um título nascido em si quase espontaneamente, podemos dizer desde sempre, na linguagem familiar das casas salesianas. Prova disso é uma declaração do Card. Cagliero de 1922, durante as celebrações das bodas sacerdotais de diamante do seu antigo colega Pe. Francesia, ordenado com ele em 1862. Falando de si mesmo e do amigo, disse: “Se conquistamos um lugar de destaque na sociedade, se conseguimos fazer um pouco de bem, (e o bem, posso-vos assegurar, sempre procuramos fazê-lo toda vez que nos foi possível) somos devedores, depois de Deus, a uma só pessoa: não ao nosso pai, que ambos perdemos quando crianças, não às nossas mães, piedosas e santas, incapazes porém de nos ajudar, mas a Dom Bosco, que chamamos de pai dos jovens, que continuamos a venerar e a chamar pai e mestre, até hoje, e que esperamos poder venerar como santo também sobre a terra, antes de podermos agradecê-lo no Paraíso”.1
Chamar Dom Bosco “pai e mestre” é, portanto, para nós, uma expressão familiar de admiração e afeto; penso que possa ser aplicado também a outros insignes educadores e fundadores.
O que a Carta “Centesimo Exeunte” traz de absolutamente novo é o fato que a suprema autoridade da Igreja, em termos oficiais e solenes, tenha declarado Dom Bosco não um genérico pai e mestre dos jovens, mas o “Pai e Mestre da Juventude” por excelência em nível de Igreja universal: isto é, estendido à compreensão dos jovens de todos os continentes, hoje e amanhã. De fato, o Sucessor de Pedro declarou e proclamou, em virtude do poder apostólico, São João Bosco “Pai e Mestre da Juventude”, estabelecendo que “com esse título Ele seja honrado e invocado em toda a Igreja, não só pelos membros da grande Família Salesiana, mas por todos aqueles que se interessam pela causa dos jovens, e buscam promover a sua educação para contribuir na edificação de uma nova humanidade”.2
A clara indicação abraça, obviamente, as várias dimensões da sua rica personalidade e da sua peculiar missão, mas exalta sobretudo a sua santidade pedagógica e a genialidade metodológica, qual “monumento basilar — nas palavras do Papa — da história da Igreja”. De fato, Dom Bosco “deixou — é sempre o Papa quem fala — uma concepção, um ensinamento, um método que é já um patrimônio adquirido”. Ele “nos convida não tanto a nos dedicar de qualquer maneira aos jovens, mas ‘a educar com um projeto’“. Ou seja, com o seu sistema completo, que “sem nada tirar da contribuição enriquecedora e específica de outros educadores passados ou do seu tempo, permanece um ponto básico por ter conseguido unificar em uma síntese os complexos elementos destinados a promover o desenvolvimento completo do garoto e do jovem”.3
Um título a ser aprofundado e interiorizado
Será necessário, portanto, antes de tudo, que na Congregação nos dediquemos em aprofundar o significado deste título tão característico.
Os nossos centros de cultura e os nossos estudiosos poderão continuar um trabalho já seriamente iniciado nas melhores obras de alguns deles e, ultimamente, com iniciativas qualificadas quais: o Seminário sobre “A experiência pedagógica de Dom Bosco” realizado na Fundação Cini na ilha de S. Jorge de Veneza;4 o primeiro Congresso internacional de “Estudos sobre São João Bosco” feito na nossa Universidade de Roma;5 e o Simpósio sobre “Dom Bosco Fundador” realizado na Casa geral na ‘via della Pisana’.6
Foram alguns momentos fortes de reflexão, não em relação direta a este título (na época ainda não proclamado), mas aos seus conteúdos substanciais e às estimulantes perspectivas que dele derivam. Todos os irmãos são chamados a se confrontar e a se medir cotidianamente com os conteúdos do título, olhando Dom Bosco como modelo supremo de paternidade salesiana e de pedagogia salesiana.
Se é verdade que a própria formulação do título já estava presente na liturgia própria da festa de Dom Bosco e no uso de algumas orações com as quais nos dirigimos a ele, agora, porém, que a feliz expressão é declarada título eclesial a ser-lhe oficialmente conferido, deveríamos saber explicá-la para comunicar a todos os ricos conteúdos.
Não é próprio de uma circular do Reitor-Mor tentar uma espécie de estudo, também se breve, sobre o assunto, mas sim apontar motivações espirituais para interiorizar o significado e senti-lo como estímulo enriquecedor da nossa mentalidade.
Nesse título, de fato, podemos ver condensados, unificados e propostos, como aludia pouco antes, os principais valores da viva herança que nos foi deixada por Dom Bosco:
o seu estilo de santidade: o amor ativo;
a sua escolha do campo apostólico: a juventude;
a sua estratégia de compromisso: o Sistema Preventivo;
o seu programa de ação: a educação;
o segredo do seu estilo: a perspicaz intuição do coração juvenil.
Aqui, convido-os simplesmente a meditar alguns conteúdos do título, referindo-os claramente ao mistério de Deus, uno e trino: ao amor do Pai rico em misericórdia; à solidariedade do Filho que se fez por nós “caminho, verdade e vida”;7 à criatividade do Espírito Santo que é dom de juventude transformante para o mundo através dos séculos.
Não deve parecer uma indicação leviana: a SS. Trindade é o verdadeiro, o supremo e central mistério da nossa fé, e tal deve sê-lo na vida e na nossa reflexão. Como escreveu um teólogo oriental, “o Santo é um ícone de Deus trinitário”. Dom Bosco foi um santo marcado por este mistério de Deus. A peculiar santidade do seu “da mihi animas” reflete essencialmente as riquezas pastorais e pedagógicas da caridade trinitária, merecendo-lhe uma denominação tão nobre e tão singularmente distintiva.
O título de “Pai”
Dom Bosco foi entre os jovens um profeta da bondade; com razão o Papa o chamou várias vezes “génio do coração”. A bondade é uma atitude constante da pessoa; se traduz cotidianamente em uma contemplação das contínuas manifestações do amor de Deus e uma conseguinte metodologia de amabilidade que distingue todas as atividades apostólicas.
Nessa íntima atitude está também inserido o seu papel eclesial de Fundador enquanto pai fecundo que deixa em herança um patrimônio evangélico a tantos filhos e filhas que prolongam a sua missão entre os jovens.
O apóstolo Paulo nos assegura que toda paternidade nos céus e sobre a terra recebe o nome do Princípio primeiro de todo amor.8 Isto significa não só que toda Família que olha para o seu Fundador encontra nele a paternidade de Deus, mas também que ele testemunha e transmite a realidade viva dos sentimentos interiores e das expressões de afeto divinos.
Deus Pai, que é criador onipotente, manifesta a sua divindade sobretudo na insondável riqueza da misericórdia: “tanto amou o mundo até entregar o seu único Filho”.9
Dom Bosco testemunhou exatamente o mistério desta paternidade misericordiosa entregando-se totalmente aos jovens: “eu por vós estudo, por vós trabalho, por vós vivo, por vós estou também disposto a dar a vida”.10
E esta doação total de si, Dom Bosco a manifestou em uma constante e familiar atitude de amabilidade: ele ensinou não só a amar, mas também — e de maneira cotidiana e sincera — a “fazer-se amar”. O aspecto ascético da sua santidade fez com que privilegiasse aquelas virtudes sociais que atraem a confiança, que abrem os corações à convivência familiar, que levam a dialogar e a compreender, que se traduzem naquela modalidade de relações que — como escreve o apóstolo — é “paciente e benigna, não é invejosa nem se vangloria ou se enche de orgulho, é respeitosa e não procura o próprio interesse, não é colérica e esquece as ofensas, não se alegra com a injustiça porque a verdade é o seu júbilo, tudo suporta e nunca perde a esperança”.11 A ação apostólica de Dom Bosco, de fato “apoia-se toda sobre as palavras de São Paulo” que proclama o mistério da caridade.12
Deve-se acrescentar, com uma profundidade ainda maior, que para Dom Bosco a palavra “pai” não significa só “bom e amável como um pai”, nem só “pai-fundador” de uma Família espiritual, mas indica, mais vitalmente o ato apostólico de gerar a nova vida, a consciência evangélica e a prática de uma responsabilidade que cuida, educa e faz crescer os jovens até a maturidade cristã da filiação adotiva. Ele é “pai da juventude” porque escutou o chamado de Deus a “ser pai de verdade” de tantos jovens necessitados e a gerá-los na graça de “filhos de Deus”, no sentido profundo do apóstolo Paulo: “poderão ter de fato até dez mil mestres na fé, mas não muitos mais. Pois bem, eu me tornei pai de vocês na fé em Jesus Cristo, quando lhes anunciei a sua palavra”;13 “meus filhos, por vocês eu sofro novamente as dores do parto, até que for claro que Cristo está no meio de vocês”.14
Este rápido aceno à paternidade de Dom Bosco, manifestada na sua “pedagogia do amor” e na “amabilidade”, é uma brevíssima indicação — também se sugestiva — de um tema que é verdadeiramente central em nosso espírito salesiano. Disse-o com autoridade o seu terceiro sucessor, Pe. Filipe Rinaldi: “toda a vida de Dom Bosco é um tratado completo da paternidade que vem do Pai celeste (Ef 3,15) e que ele praticou aqui em máximo grau, quase único, em favor da juventude e para com todos, nas mil contingências da vida, para alívio de todas as misérias temporais e espirituais, com total dedicação e sacrifício de si, na grandeza do seu coração, incomensurável como a areia do mar, tornando-se tudo para todos para ganhar as almas juvenis e levá-las a nosso Senhor”.15
Podemos acrescentar que o momento principal do qual procedia cotidianamente a fecundidade da sua paternidade espiritual era o exercício do seu ministério sacerdotal no sacramento da Penitência.
É urgente, portanto, recuperar e aprofundar o sentido desta paternidade tipicamente “oratoriana” nos múltiplos fatos humanos e divinos que a compõem. É uma tarefa a que não pode fugir todo discípulo de Dom Bosco. Porque, se é verdade que especialmente Inspetores e Diretores devem encarnar esta paternidade segundo modalidades próprias e qualificadas,16 também os outros — sacerdotes, coadjutores, clérigos —, enquanto educadores dos jovens desejosos de serem amados e acompanhados nas diferentes fases do seu desenvolvimento, devem saber se comportar — cada qual em sua tarefa — como verdadeiros pais: responsáveis, pacientes, generosos, animadores.
O Pe. Rinaldi, ao término dos Exercícios Espirituais dos noviços em Villa Moglia — no ano de 1930 — não hesitava em afirmar (aos noviços!): “também vocês são pais dos jovens que lhes serão confiados, devem amá-los, ajudá-los como faria um verdadeiro pai”.17
O título de “Mestre”
A palavra “mestre” está estritamente ligada com aquela de “pai”. Também aqui, não é suficiente dizer que Dom Bosco é um educador genial que ensina um método eficaz de formação: não é só o competente indicador de uma boa metodologia.
Ele é “mestre” antes de tudo porque entre as suas tarefas paternas privilegiou aquela de tornar conhecido o verdadeiro sentido da vida, de comunicar a energia dos valores cristãos, a prática das virtudes batismais, ensinando sobretudo de maneira peculiar adaptada à juventude o caminho genuíno do amor, com uma pedagogia de santidade. É suficiente pensar em que sentido foi mestre espiritual de Domingos Savio, de Miguel Magone, de Francisco Besucco, dos jovens do seu Oratório. Também neste caso, a lição mais convincente dos seus ensinamentos foi sobretudo o diálogo penetrante da confissão.
Nele as duas características de “pai e mestre” são vividas e aplicadas de maneira inseparável.
A palavra “mestre” refere-se, portanto, àquela sabedoria do coração com que Dom Bosco soube testemunhar e transmitir os critérios básicos e a maneira eficaz para enfrentar as tarefas complexas da educação.
João Paulo II apresentara São João Bosco, na Carta “Iuvenum Patris”, como um exímio “Mestre para a educação”, porque soube elaborar uma síntese vital entre prática educativa e sabedoria pastoral, entre promoção humana e evangelização. “Hoje mais do que nunca — disse o Papa — há necessidade de uma metodologia pedagógica que saiba assumir as contribuições das ciências humanas da educação, elevando-as ao nível vivificante da caridade pastoral. Existe verdadeira fome de sabedoria pastoral, que não se satisfaz em “decifrar” e “interpretar” o homem, mas que se compromete eficazmente em transformá-lo à luz daquelas finalidades e com a força daqueles dinamismos, que Deus mesmo colocou no coração da Igreja e da humanidade”.18
Neste sentido Dom Bosco imita Cristo, “inventor” da pastoral e único supremo Mestre de salvação pascal. Deus Pai enviou o seu Unigênito ao mundo como Verbo de verdade salvífica: “no passado — diz a carta aos Hebreus — Deus falou muitas vezes e de diferentes maneiras aos nossos pais, através dos profetas. Agora, no entanto falou-nos através do Filho”.19 Jesus, de fato, “veio ao mundo para dar testemunho da verdade”;20 só a sua verdade “nos torna livres.21
Aplicar a Dom Bosco o título de “Mestre” significa reconhecer nele uma particular leitura do acontecimento Cristo e uma capacidade pedagógica de comunicar o Evangelho. Faz isso com uma prática educativa que se movimenta, como disse o Santo Padre, no interior do próprio crescimento humano com critérios metodológicos em sintonia com as interpelações vivas da juventude e das classes populares.
O conceito de “preventividade” que caracteriza o seu método foi descrito na recente Carta “Centesimo Exeunte”, como “centralizado na importância de prevenir nos jovens o surgir de experiências negativas; de educar ‘positivamente’ com válidas propostas e exemplos, fazendo apelo à liberdade interior de que são dotados, de estabelecer com eles relações de autêntica familiaridade, de estimular enfim as capacidades inatas, baseando-se na razão, na religião e na amabilidade”.22
A nossa Congregação divulgou a singular validade aprendida através da peculiar experiência vivida e transmitida pelo Fundador para ser fielmente guardada, inteligentemente aprofundada, constantemente reatualizada e corajosamente desenvolvida no múltiplo devir das culturas. Os seus primeiros discípulos repetiam, dele, aquilo que afirmava do Salvador o Apóstolo predileto: “nós o ouvimos, nós o vimos com os nossos olhos, o contemplamos, o tocamos com as nossas mãos. Somos suas testemunhas e por isso falamos”.23
“O essencial do seu ensinamento permanece, as peculiaridades do seu espírito, as suas intuições, o seu estilo, o seu carisma, não perdem valor, porque inspirados na transcendente pedagogia de Deus. Neste nosso tempo difícil, ele continua a ser mestre, propondo uma “nova educação” que é ao mesmo tempo criativa e fiel”.24
A ligação viva com a “Juventude”
A relação das palavras “Pai e Mestre” com “juventude” define explicitamente a escolha da área da caridade pastoral de Dom Bosco: são os jovens, de preferência aqueles necessitados e das classes populares.
Com ele, também os seus filhos e as suas filhas são chamados a serem “sempre e em todos os lugares — como nos disse João Paulo II — missionários dos jovens”.25
E a sua escolha da juventude não é só uma indicação dos “destinatários”, mas comporta todo um clima evangélico de vida, uma sensibilidade de futuro, uma preciosa intuição para ler a realidade a partir “dos pequenos e dos pobres”; esta visão torna-se, de fato, uma espécie de injeção quotidiana de juventude e de simpatia (para ele e para os seus educadores) para reinterpretar a sociedade. É suficiente refletir sobre o que afirma a recente Exortação Apostólica “Christifideles laici”: “Nos jovens, efetivamente, a Igreja lê o seu caminho para o futuro que a espera e encontra a imagem e o convite daquela alegre juventude com que o Espírito de Cristo constantemente a enriquece”.26
Também na Mensagem do Concílio Vaticano II aos jovens, os Pastores lembravam que se trabalhou, durante quatro anos, para rejuvenescer o rosto da Igreja com a finalidade de melhor corresponder ao plano do Ressuscitado eternamente jovem: a sua Esposa “possui o que faz a força e a beleza dos jovens; a capacidade de se alegrar com aquilo que começa, de se dar sem esperar em troca, de se renovar e de tentar novas conquistas. Olhai-a, e vós encontrareis n’Ela o rosto de Cristo, o verdadeiro herói, humilde e sábio, o profeta da verdade e do amor, o companheiro e o amigo dos jovens”.27
Esta saudade de juventude nos faz pensar, voltando ao Mistério de Deus, na força renovadora do Espírito Santo, que é, na história, poder de novidade e de santificação. Ele é a alma da Igreja, a fonte inesgotável da sua juventude, o autor daquela especial retomada de poder criativo que transforma o mundo. Por obra do Espírito, de fato, a criação geme e sofre as dores do parto.28
O Espírito é, portanto, portador de energias inéditas. Leva à realização toda a exaltante comunicação de Deus ao homem, introduzindo na história o que de mais novo a vivifica e a faz chegar à sua meta: “quem semeia no Espírito, do Espírito recolherá vida eterna”.29
Esta vida nova e eterna está presente nos corações de todos os crentes: nos jovens, enriquecendo-os com uma vida de fé que os torna na verdade esperança da Igreja e da Sociedade (vivemos isso com alegria em Turim no “Confronto DB/88”); nos adultos educadores, dotando-os de vigor evangélico, de reta perceptibilidade dos valores da renovação, de simpatia em relação à idade que começa, de viva acolhida das instâncias juvenis, de um amigável acompanhamento ajudando os jovens a discernir o seu projeto de vida, de partilhada percepção dos valores emergentes da justiça, da não-violência, da paz, da solidariedade, da ecologia.
Toda a Igreja, diz o Papa, está convidada a olhar de maneira especial a si mesma nos jovens; é chamada a reviver o amor de predileção que Cristo testemunhou ao jovem do Evangelho: “Jesus, fixando-o, amou-o”.30
É este um dos aspectos mais urgentes do Dom do Espírito para todo o Povo de Deus e, de modo particular, para nós.
Impulso para a “Nova Evangelização”
Devemos considerar o título também como um forte apelo e um premente estímulo para os atuais compromissos da “nova evangelização”: trata-se de uma hora maravilhosa, mas dramática da história.
A preparação ao próximo CG23 mantém-nos a todos ocupados em discernir e projetar o que devemos fazer a respeito. O Papa também se referiu com satisfação a este “trabalho e desafio” capitulares que queremos enfrentar para educar os jovens à fé, ligando-o exatamente com a proclamação do título. Trata-se de um tema gerador “que toca profundamente toda a Igreja — nos disse o Papa —. O seu alcance não depende somente de determinadas características da atual condição juvenil, mas deriva de uma situação de cultura emergente numa hora de intensa mudança, ao aproximar-se o terceiro milênio cristão. É uma hora de grande responsabilidade eclesial e de fascinante compromisso no caminho da evangelização”.31
A escolha preferencial de Dom Bosco pelos jovens requer coragem de revisão e de criatividade. O “recomeçar a partir dos últimos” — como se diz hoje — oferece um leque de intervenções particularmente iluminadoras. Os Bispos italianos afirmaram que precisamente os últimos “são o sinal dramático da crise atual”.32 “Demoliremos, antes de mais nada, os ídolos que nós construímos: dinheiro, poder, consumo, gastos, tendência a viver acima das nossas possibilidades. Redescobriremos depois os valores do bem comum”.33 “O País não crescerá a não ser juntos”.34 Esta visão leva em profundidade a um confronto cultural para uma exigente mudança de mentalidade na percepção dos pontos estratégicos de evangelização. Dom Bosco lançou uma pastoral renovadora exatamente porque colocou-se nesta penetrante perspectiva de observação: a partir dos últimos compreende-se melhor os problemas de todos.
Olhou aos jovens, porém, não só porque necessitados e abandonados, não só porque pobres e marginalizados, não só porque últimos e vítimas de estruturas inadequadas, mas também e de maneira intensa — que permeou toda a sua metodologia — porque intuiu e valorizou a riqueza do seu coração, portadores de novos valores na esperança.
Por isso, a convivência com eles levou-o a construir um ambiente de alegria alicerçado sobre convicções de verdadeira possibilidade de êxito. Ele nunca foi um profeta de catástrofes ou um contestador amargo, alimentado de pessimismo e agitador de tristezas. Apresentou-se como discípulo do Senhor na alegria, mensageiro da vitória pascal, confiante nas forças juvenis não cobertas pelas rugas ou pelos cabelos brancos, guia de novas levas que caminham na busca da verdade salvífica atraídas pelos grandes ideais e animadas por generosas aspirações.
O arcebispo de Turim, Card. Anastácio Ballestrero, na conclusão das celebrações centenárias em Valdocco, disse na homilia do dia 31 de janeiro p.p.: “Temos hoje gerações muito tristes, temos criaturas muito sérias que vivem sempre angustiadas por problemas, por pesadelos, por interrogativos tristes e desalentadores, mas a alegria de Cristo, que São João Bosco tanto proclamou e tanto incentivou, deve encontrar-nos sempre fiéis: é um exemplo que ele nos dá, é um legado que nos deixa, e é também uma esperança que vive em todos nós”.
É este um importante aspecto que entra indispensavelmente na interpretação do seu título de “Pai e Mestre da juventude”.
Lançamento eclesial do sistema preventivo
Se consideramos o que S.S. João Paulo II escreveu e disse durante o ano centenário, desde a Carta “Iuvenum Patris” aos discursos e homilias feitas na peregrinação a Turim e arredores, ao documento “Centesimo Exeunte” e à alocução feita por ocasião da audiência especial pedida pelo Reitor-Mor com o seu Conselho para manifestar um dever de gratidão, deveríamos concluir que o título contém em uma brevíssima e feliz síntese o título mais autorizado da vocação e missão de Dom Bosco, do seu carisma no Povo de Deus. Podemos dizer que constitui um lançamento eclesial do seu Sistema Preventivo.
O Papa meditou muito sobre Dom Bosco e quis, por Sua iniciativa pessoal e como ponto alto das celebrações, conferir-lhe este título porque ficou “plenamente convencido do fato que ele realizou a sua pessoal santidade através do trabalho educativo, vivido com zelo e coração apostólico, e que a sua vida, a sua espiritualidade, os seus escritos e a sua obra oferecem grandes luzes evangélicas e válidos critérios metodológicos para a formação do Homem novo”.35
Para toda a Igreja, e especialmente para a nossa Família, é um forte incentivo a valorizar sempre mais os critérios pedagógicos e pastorais de Dom Bosco e a viver e agir de verdade como competentes “missionários dos jovens”.
Para nós Salesianos depois, de maneira toda particular, este título deve representar o lema ou a palavra de ordem do centenário, que nos impulsione adiante para fazer frutificar os tantos dons recebidos porque queremos enriquecer com imensa atualidade o precioso carisma do Fundador.
Sejamos em todos os lugares sinais e portadores!
Os conteúdos do título devem entrar para formar parte viva do enriquecimento interior das nossas atitudes, das nossas convicções e da nossa criatividade apostólica.
Dediquemo-nos sem demora a intensificar a seriedade dos estudos sobre a nossa missão e sobre o espírito do Fundador, mas ao mesmo tempo e sobretudo cresçamos naquela conatural familiaridade com o Espírito Santo que nos torna testemunhas e comunicadores do extraordinário dom que Deus semeou nele para a juventude.
Será este o compromisso mais frutuoso de renovação: para a nossa interioridade apostólica, para a criatividade na pastoral, para o critério oratoriano de relançamento, para a metodologia da bondade, para uma viva e atual espiritualidade juvenil, para um crescente envolvimento dos fiéis leigos, para um generoso desenvolvimento missionário, para um mais eficaz compromisso em favor das vocações, para uma válida competência na nova evangelização, para poder caminhar melhor com os jovens no difícil processo da santidade.
Dirijamo-nos com confiança ao nosso querido Fundador para que interceda e nos ajude a sermos fiéis, e rezemos:
“Ó Pai e Mestre da Juventude,
São João Bosco,
ensina-nos a ser a cada dia
sinais e portadores do amor de Deus aos jovens;
e faze que, guiados por Maria,
percorramos alegremente com eles
o caminho que conduz ao Amor!”
Antes de concluir, queridos Irmãos, peço-lhes um favor: que cada Casa expresse a mais viva gratidão ao Papa João Paulo II com uma celebração eucarística segundo as Suas intenções. Várias comunidades já tomaram esta iniciativa, mas acredito seja dever que a realizem todas. Dom Bosco interceda eficazmente e sempre em favor do Sucessor de Pedro, que guia nestes anos, difíceis e promissores, a Igreja de Cristo.
Cordiais saudações e votos de bem a todos.
S eu afeiçoadíssimo no Senhor,
P. Egídio Viganò
1 E. Ceria, Annali della Società Salesiana, IV p. 106, SEI, Turim 1951.
2 Discurso ao Conselho geral SDB, 4 de fevereiro de 1989, em L’Osservatore Romano” 5-2-1989.
3 Ib.
4 13-5 de outubro de 1988.
5 16-20 de janeiro de 1989.
6 22-26 de janeiro de 1989
7 Jo 14,6.
8 Cf. Ef 3,15.
9 Jo 3,16.
10 Cronaca dell’Oratorio, D. RUFFINO, ASC 110.
11 1Cor 13,4-7.
12 Cf. G. BOSCO, Scritti pedagogici e spirituali, LAS, Roma, 1987, p. 194.
13 1Cor 4,15.
14 Gl 4,19. Cf. Também 1Ts 2,11; Fm 1,10.
15 Atti del Capitolo Superiore, 24 de abril de 1933, p. 939ss.
16 Cf. os respectivos manuais.
17 Testemunho de um noviço do tempo.
18 Discurso citado na nota 2.
19 Hb 1,1-2.
20 Jo 18,37.
21 Cf. Jo 8, 32.
22 Centesimo Exeunte.
23 Cf. 1Jo 1,1-2.
24 Iuvenum Patris 13.
25 Discurso citado na nota 2.
26 ChL 46.
27 8 de dezembro de 1965.
28 Cf. Rm 8,22.
29 Gl 6,8.
30 Mc 10,21.
31 Discurso citado na nota 2.
32 La chiesa italiana e le prospettive del paese, Documento del Consiglio permanente, 4; em “Enchiridion CEI”, 3, 1980-1983. Ed. Dehoniane, Bolonha.
33 Ib. 6.
34 Ib. 8.
35 Discurso citado na nota 2.