Viganò Egídio
1988 NOS CONVIDA A UMA ESPECIAL RENOVAÇÃO DA PROFISSÃO
Atos do Conselho Geral
Ano LXVII – outubro-dezembro, 1986
N. 319
50 anos de vida salesiana — Profissão religiosa e as mudanças conciliares — O árduo processo de identificação — Releitura da santidade de Dom Bosco — A garantia da sua Escola espiritual — O espirito de Dom Bosco na perspectiva de 1988 — Um tipo de reflexão a ser provocada — Propósitos de santidade salesiana — Conclusão.
Roma, 1º de setembro de 1986
Queridos Irmãos,
vos escrevo no dia do aniversário da minha primeira Profissão religiosa. Passaram-se já 50 anos: meio século! Praticamente a metade dos cem anos que nos preparamos a celebrar em 1988. Terminei o noviciado dois anos após a canonização de Dom Bosco e comemoro o jubileu de ouro de Profissão alguns anos antes das celebrações centenárias de sua morte. Um espaço de tempo suficientemente longo e significativo para estimular algumas reflexões sobre a experiência salesiana.
A Profissão foi para mim o início de um modo concreto da sequela de Cristo, de um compromisso apostólico na Igreja, de uma predileção pelos jovens, de uma inculturação missionária em outro continente e de uma consciência de identidade salesiana num contexto cultural pluralista. Possibilitou uma espécie de aventura cristã, não pensada e nem programada, que manifesta, olhando estes decênios à luz da fé, a presença criativa do Espírito, a participação na missão salvadora do Filho e a fonte perene da misericórdia infinita do Pai.
Profissão religiosa e mudanças conciliares
Na metade do caminho destes meus 50 anos de vida salesiana está a participação às quatro sessões do Concílio Ecumênico Vaticano II, o acontecimento eclesial do século, visita do Espírito Santo à Igreja, “grande profecia” para o terceiro milênio do Cristianismo.
Durante os quatro anos deste extraordinário acontecimento vi rejuvenescer o sentido da Profissão salesiana.
Na Igreja cresceu a vontade de realizar uma guinada decisiva apesar do protesto de alguns elementos frenadores, que se foram sobrepondo como o pó do tempo: a superação de uma mentalidade estática, um tanto legalista, com a pretensão de autarquia, satisfeita do seu passado, trancada em estruturas de outras épocas, centralizadora e instigadora de perigosas reações. Um clima semelhante estava bastante difundido e precisava ser renovado com a passagem de um vento novo.
O Concílio fez experimentar uma estimulante volta às fontes. Exigiu uma fidelidade à Profissão, mas profunda e seriamente inserida no mistério de Cristo, na santidade e na missão específica do Fundador, na sua originalidade pastoral; voltada a um sentido apostólico de maior relação com o mundo para servir e promover o homem, à criatividade e dinamismo da ação; valorizando a dimensão social na nossa prática dos conselhos evangélicos, a exigência de relançar os leigos com uma consciência mais ampla do carisma de Dom Bosco como Movimento de pessoas e como mensagem de santidade juvenil e popular.
O árduo processo de identificação
Esta mudança conciliar exigiu da Congregação, como de todos os Institutos religiosos, um intenso trabalho de busca e definição da própria identidade diante das grandes mudanças da cultura emergente.
Viver a Profissão salesiana, no espaço destes vinte anos, neste complexo processo de identificação, exigiu um prolongado esforço de reflexão e de diálogo, vividos na participação ativa em quatro Capítulos gerais (XIX, XX, XXI, XXII), colaborando com todos os irmãos na reelaboração das Constituições e dos Regulamentos gerais.
O fato ainda de ter recebido, durante este período, a obediência de viver a Profissão salesiana na qualidade antes de Conselheiro geral para a formação e depois de Reitor-Mor, trouxe para mim uma responsabilidade mais viva. Ao concluir o último CG 22, um dos momentos de alegria mais autenticamente salesiana foi certamente o de renovar a Profissão com o novo texto das Constituições, após ter confiado solenemente a inteira Congregação à Virgem Auxiliadora, nossa bondosa Mestra e Guia.
O que mais intensamente veio crescendo foi a figura de Dom Bosco como nosso Fundador e Modelo, um presente para a Igreja e para nós, suscitado e harmonizado pelo Espírito Santo com qualidades e dotes proféticos de santidade e ação, que ultrapassam a cultura do seu tempo para projetar-se mais além dos limites geográficos do Piemonte e das conjunturas históricas.
A santidade dinâmica de Dom Bosco se configura cada vez mais claramente como o ideal da Profissão salesiana, elevada a “consagração apostólica” na Igreja.
Releitura da santidade de Dom Bosco
Após a reflexão de tantos anos, é possível resumir em poucas linhas programáticas o ideal da santidade de Dom Bosco como objetivo a ser alcançado com a nossa Profissão.
Partindo da certeza que a santidade é una e multiforme,1 percebe-se em Dom Bosco a presença de valores fundamentais, comuns a todos, e ao mesmo tempo os traços de um estilo todo seu.
A santidade é “una”, e consiste para todos no exercício convicto da fé, da esperança e de uma caridade pronta a qualquer sacrifício; é associação da mística e da ascética que proclama a plenitude da vida no Espírito: um amor que leva a abraçar a cruz!
A santidade é “multiforme”, portanto todo grupo, aliás cada pessoa, participa da vida e da missão da Igreja, em situações e com modalidades diferentes, também de expressão da mesma Graça.
Em outras ocasiões escrevi sobre o tema da nossa santidade: na circular de dezembro de 1981 refleti convosco sobre a maneira de “Reprojetar juntos a santidade”,2 em setembro de 1983 apresentei o tema “Dom Bosco Santo”,3 e na “Boa Noite” do dia da minha reeleição, na véspera do 50º da canonização do nosso Fundador, apresentei este sexênio vinculado a este aspecto.4 O da santidade é um tema inesgotável que deve estar constantemente presente diante da nossa consciência. Acrescentaremos, por isso, algumas outras reflexões.
O próprio Dom Bosco condensou a mística e a ascese, que marcaram o seu estilo de vida, em duas frases características do nosso espírito salesiano; em seguida concretizou sua participação na missão da Igreja numa precisa escolha do campo de ação, vivida com critérios e estilo originais.
Vejamos estas três dimensões que são como que a releitura sintética da experiência espiritual do nosso Pai.
Antes de tudo a “mística”, ou seja, a vida de fé, esperança e caridade, condensada na frase “da mihi animas” e alicerçada na radicalidade da doação de si na prática dos conselhos evangélicos. Isto traz consigo uma maneira de contemplar a bondade do Pai, de ouvir a Palavra da salvação e de participar do seu Amor transformador, que nutre no coração uma união ininterrupta com Deus. Ela se exprime no êxtase de uma incansável ação apostólica: é a interioridade que se entrega à missão. Esta mística se alimenta no encontro cotidiano com Cristo, que nos liberta em nossos compromissos de todo perigo de esgotamento da dimensão pastoral.
A dimensão de “ascese”, que é domínio de si — espírito de sacrifício — e compromisso de fidelidade, é expressa por Dom Bosco na frase “trabalho e temperança”, reforçada, também aqui, na radicalidade daquelas renúncias que são próprias da prática dos conselhos evangélicos. Um programa que, no estilo do nosso Fundador, adapta-se facilmente às mudanças culturais e que recebe confirmação e maior compreensão no avanço das disciplinas antropológicas: o realismo da doação de si por amor ao próximo à luz da caridade trazida por Cristo ao mundo. Para sermos verdadeiros discípulos de Cristo é indispensável cultivar o espírito de sacrifício, de custódia do coração e de renúncia, que nos ajuda a evitar o insidioso desagregar-se da disciplina religiosa.
Por fim, “a escolha do campo de ação” para participar ativamente na missão da Igreja, é a de uma fecunda pastoral juvenil e popular. Ela precisa ser continuamente avaliada em relação às situações da sociedade humana, a começar pelos “pequenos e pobres” que encontramos bem perto de nós. A predileção pelos jovens define o campo desta escolha, que se caracteriza por um estilo e por critérios de aproximação que Dom Bosco definiu “Sistema Preventivo”.
Trata-se de uma modalidade de convivência, de diálogo, de evangelização e de promoção que se assenta sobre três vigas mestras:
o bom senso (“razão”), como expressão de uma inteligência equilibrada e perspicaz, conhecedora do coração humano e das realidades sociais;
a dimensão religiosa (“religião”), como visão convicta do Transcendente, portadora de valores culturais e elemento indispensável na formação de cada uma das pessoas;
o calor e a sinceridade do afeto (“amabilidade”), como atmosfera de confiança, de diálogo e de convivência familiar com os destinatários de nossas obras.
Modelo permanente desta escolha e deste estilo é a experiência de Dom Bosco no Oratório de Valdocco.5
Tantos anos de Profissão salesiana confirmam a validade, a beleza e a atualidade deste tipo de santidade, que fez de Dom Bosco um dos mais importantes Fundadores de Famílias espirituais na Igreja.
A garantia da sua Escola espiritual
Dom Bosco, nascido na floração de Santos que embelezou o Piemonte no século passado, teve o mérito de iniciar uma autêntica “Escola de santidade”. Se têm valor para o seu tempo as várias obras apostólicas que iniciou, o ter promovido com sucesso uma peculiar modalidade de santidade lhe garante uma genialidade espiritual que o insere entre os grandes da Igreja com uma fecundidade capaz de se encarnar mais ainda através dos séculos.
Para tornar a santidade uma mensagem atraente e válida para todos os seus destinatários, Dom Bosco quis apresentar a sua essência com simplicidade e realismo, adaptando-a à idade, às situações de vida e ao ambiente cultural.
O bem-aventurado Miguel Rua, santa Maria Domingas Mazzarello, são Domingos Savio, aos quais podemos acrescentar de alguma maneira também os bem-aventurados Luís Orione e Luís Guanella, experimentaram diretamente o influxo do seu peculiar estilo de santidade. O programa de espiritualidade juvenil vivido por são Domingos Savio é particularmente significativo; o próprio Dom Bosco o descreveu e aprofundou na biografia do seu jovem aluno, ampla e inteligentemente comentada pelo Pe. Alberto Caviglia. Igualmente claro se apresenta o esquema de santidade salesiana se estudarmos, sob o aspecto típico da sua espiritualidade, as várias biografias escritas por Dom Bosco e as vidas de outros nossos santos, bem-aventurados e servos de Deus.
Também o Pe. Filipe Rinaldi é testemunha direta do influxo pessoal de Dom Bosco: cito-o de maneira particular porque durante este mês de outubro a Congregação para as causas dos Santos iniciará o exame de suas virtudes heroicas; confiamos que este seja o primeiro passo para um próximo reconhecimento mais alto.
A proposta da Escola evangélica de Dom Bosco certamente não se esgotou nos santos, bem-aventurados e servos de Deus que lembramos acima. Existe também outro aspecto, ao qual ainda não se deu a devida atenção e que também possui uma importância significativa e privilegiada para o discurso sobre sua típica “experiência do Espírito”.6 Quero me referir às primeiras comunidades formadoras da Congregação em que, no final da vida de Dom Bosco e logo após sua morte, os seus primeiros discípulos fizeram florescer a santidade salesiana: Foglizzo como Noviciado e Valsalice como Pós-noviciado. Ali atuaram o Pe. Rua, o Pe. Barberis, o Pe. Bianchi, o Pe. Piscetta (para só citar alguns deles) e é singular que nestas comunidades, pouco tempo depois do desaparecimento do querido Pai, se formaram e trabalharam (num período de poucos anos, ou até quase contemporaneamente) um bom número de nossos irmãos servos de Deus dos quais está em andamento a causa de beatificação e canonização: o venerável André Beltrami, o venerável príncipe Augusto Czartoryski, o servo de Deus Luís Variara, o bem-aventurado Dom Luís Versiglia, o servo de Deus Vicente Cimatti. Aquelas duas comunidades de formação salesiana são na verdade uma continuação fecunda da autêntica Escola evangélica iniciada por Dom Bosco.
É prova mais do que evidente o fato que vários dos irmãos acima lembrados sentiram o primeiro impulso em direção à santidade num encontro, talvez até casual, mas determinante com a pessoa do santo Fundador: o Pe. Beltrami, estudante em Lanzo, leu uma composição em homenagem a Dom Bosco e escutou dele uma palavra que orientou a sua vida; Dom Versiglia fez a mesma experiência; o príncipe Czartoryski foi conquistado por Dom Bosco num encontro em Paris; o Pe. Variara viu uma só vez o olhar penetrante do Pai e ficou fascinado por toda a vida; o Pe. Cimatti, nos braços da mãe, olhou de longe a Dom Bosco e animou mais tarde todo o seu apostolado com a intuição daquele encontro de sua primeira infância.
Sem dúvida não foi simplesmente o acaso a endereçar estes futuros bem-aventurados e servos de Deus no caminho trilhado por Dom Bosco!
Tudo isso é um claro sinal de como entre os irmãos era experimentada a grandeza e a atração da santidade de Dom Bosco e como na Congregação e na nossa Família criou-se um impulso espiritual que caracterizou sua fisionomia. Aqui está o segredo da audácia missionária das origens; aqui a energia para a maravilhosa expansão da Família salesiana em todos os continentes; aqui a razão de sua flexibilidade na inculturação, fruto de um natural instinto de universalidade.
Que a energia de santidade fosse conatural na vida dos nossos grandes missionários e missionárias das primeiras horas, está demonstrado também pelo surpreendente fato que exatamente na Patagônia — primeira terra da aventura missionária salesiana — tenham sido elevados ao vértice da santidade juvenil os veneráveis Zeferino Namuncurá e Laura Vicuña.
Entre os bem-aventurados, veneráveis e servos de Deus candidatos aos altares podemos ainda lembrar, como testemunhas na Escola de santidade de Dom Bosco que se prolonga no tempo: o bem-aventurado Calisto Caravário, mártir em terras chinesas; os numerosos mártires espanhóis que testemunharam a sua fé nos dramáticos acontecimentos da guerra civil; Dom Luís Olivares, incansável Pastor entre o seu povo; o Pe. Rodolfo Komórek, grande por seu espírito de oração e de mortificação; o Pe. José Quádrio, professor de teologia e estudioso do mistério da Assunção; o irmão leigo Simão Srugi, conterrâneo de Jesus, expressão humilde e profética do ecumenismo: ele, melquita, tornou-se salesiano e foi caridoso promotor do diálogo com os muçulmanos; e o senhor Artêmides Zatti, benemérito samaritano da Patagônia, terra que se estava abrindo naquela época à civilização e que carecia dos modernos serviços sanitários: fundou em Viedma o primeiro hospital da cidade.
Entre as Filhas de Maria Auxiliadora podemos lembrar a venerável Tereza Valsé-Pantellini; as servas de Deus Madalena Morano, Carmen Moreno, Amparo Carbonell, Eusébia Palomino, Maria Troncatti, Laura Meozzi e Maria Romero.
Entre os Cooperadores lembramos a venerável Dorotéia Chopitea, grande benfeitora; o cardeal José Guarino, amigo de Dom Bosco e fundador de um Instituto religioso feminino; Alexandrina da Costa, admirável no sofrimento; José Toniolo, grande leigo comprometido com o mundo social.
E entre os Ex-alunos, o venerável Alberto Marvelli, grande animador oratoriano e da Ação católica; o heroico militar Salvo D'Aquisto, que sacrificou sua vida por amor ao próximo; e o barão Antônio Petix, incansável apóstolo entre os próprios Ex-alunos.
Estes nossos candidatos aos altares, que chegam a mais de uma centena,7 são só a ponta de um iceberg, que manifesta a presença viva do espírito de Dom Bosco entre os vários grupos da sua Família e entre os destinatários nas diferentes presenças apostólicas: um espírito sempre exuberante de vitalidade, flexibilidade e fecundidade, que testemunha um especial plano de Deus no dom da santidade apostólica entregue a Dom Bosco como Fundador.
O espírito de Dom Bosco na perspectiva de 1988
Se a Escola da santidade salesiana é a principal herança de Dom Bosco Fundador, as celebrações centenárias do aniversário da sua morte deverão sobretudo se distinguir por um compromisso marcante no interesse e na fidelidade em relançar seus conteúdos evangélicos.
Trata-se, certamente, de um dom do Espírito Santo, antes de ser um programa nosso; sabemos, porém, que Ele não retoma o que doou, aliás Ele quis, com o grande acontecimento que foi o Concílio, renovar e atualizar o seu presente como profecia preciosa e válida para a cultura atual. Se rezarmos com esta finalidade e nos comprometermos, aparecerão frutos abundantes.
Eis porque nos propomos realizar em 1988 um ano de reflexão e de propósitos sobre a santidade salesiana à luz das grandes orientações conciliares do Vaticano II.
Podemos dizer que as iniciativas de preparação esboçadas até agora nos orientam principalmente neste sentido.
Em nível de Congregação nos colocamos, sobretudo após a aprovação do novo texto das Constituições e dos Regulamentos, numa espécie de “estado de noviciado” para um prolongado e intenso trabalho de formação permanente. Queremos, em 1988, realizar uma solene renovação da nossa Profissão religiosa, como expressão viva daquela consagração apostólica que o texto das Constituições, no espírito do Concílio, nos ensinou a conhecer melhor, a valorizar e a testemunhar com mais autêntica profundidade e profética atualidade. Intensificando assim a nossa caridade pastoral poderemos demonstrar ao mundo a vitalidade do carisma de Dom Bosco.
Em nível de Família Salesiana sentimo-nos em comunhão mais intensa com os outros Grupos que, como nós, renovaram os textos fundamentais de sua identidade na fidelidade às suas origens e ao Concílio. Queremos trabalhar juntos para relançar o grande projeto do Fundador, sobretudo envolvendo numerosos e corajosos leigos nas Associações dos Cooperadores e dos Ex-alunos. É nosso propósito animar um vasto Movimento espiritual e apostólico de pessoas que se interessem pelos problemas da juventude e da educação.
Em nível dos jovens, nossos destinatários, estamos comprometidos desde algum tempo na redefinição e na promoção de uma espiritualidade juvenil que seja a alma e o objetivo, de maneira gradual e apropriada, das nossas variadas atividades.
É sintomático que, por interesse e solicitude do arcebispo de Turim, S. Em.cia o cardeal Anastásio Ballestrero, obteve-se junto do Santo Padre a proclamação de um especial “Ano Santo dos jovens” na Igreja particular de Turim nos meses que decorrem entre o 31 de janeiro de 1988 a 31 de janeiro de 1989. O argumento central de reflexão que caracterizaria este “Ano de graça para a juventude” serão os conteúdos proféticos do Vaticano II.
Consideramos nossa tarefa especial a de entregar a mensagem do Concílio aos jovens a caminho do ano 2000!
As condições para este jubileu extraordinário serão proximamente determinadas pela Sé Apostólica e serão comunicadas oportunamente a todos. No entanto pode-se desde já pensar no clima de preparação, nos programas a serem elaborados, nas peregrinações a serem organizadas, na santidade a ser conhecida e amada.
A proclamação de um Ano Santo especial amplia para uma dimensão eclesial as celebrações de 1988. Será interessante abrindo nossos horizontes mais além da Família Salesiana sensibilizar Pastores e fiéis das Igrejas locais onde vivemos e colaboramos, e apresentar a figura de Dom Bosco como um santo moderno suscitado por Deus qual providencial “Amigo da juventude”, especialmente mais necessitada e popular. É uma perspectiva fabulosa!
Um tipo de reflexão a ser provocada
Parece-me oportuno sugerir aqui aos diferentes animadores das Inspetorias, como orientação prática, alguns temas para reflexão. Trata-se só de uma indicação certamente não completa, para analisar alguns aspectos que deverão concorrer para criar o clima das celebrações. Alguns temas são próprios mais para a reflexão dos irmãos, outros podem ser estendidos a toda a Família Salesiana, outros são mais indicados para os jovens, e outros para todos. É desejável que estes temas sirvam para estimular a fantasia e para formular outros mais adequados ao próprio ambiente, na mesma linha, com vistas ao grande objetivo a ser alcançado.
Eis, portanto, como exemplo, um elenco de temas:
A Relação conclusiva do Sínodo extraordinário de 1985.
Os sinais dos tempos e a profecia do Vaticano II.
A novidade e a importância vital da liturgia da Nova Aliança.
A centralidade da Eucaristia e da Penitência na nossa pastoral.
A carta de João Paulo II aos jovens — 1985.
Os atuais desafios para uma espiritualidade juvenil.
Os novos problemas da evangelização das culturas.
Urgência em saber inculturar o “Sistema preventivo”.
O Oratório, nosso critério permanente de pastoral juvenil.
Educação cristã e sociedade civil.
O sentido de Igreja vivido por Dom Bosco.
A contribuição de Dom Bosco nos assuntos sociais.
Profissão salesiana e consagração apostólica.
Prática dos Conselhos evangélicos e necessidade da ascese.
A atualidade de Dom Bosco como modelo de santidade.
Estes temas e outros possíveis deveriam ser desenvolvidos como resposta aos desafios que as várias situações apresentam, buscando constantemente as luzes abundantes do Concílio.
O desenvolvimento destes temas ajudará na assimilação das grandes orientações do Magistério e das diretrizes da Congregação para viver hoje a nossa Profissão religiosa e para testemunhar aos jovens e ao povo do nosso tempo a peculiar mensagem da Escola evangélica de Dom Bosco.
Propósitos de santidade salesiana
Ultimamente na Itália alguns escritores criticaram como culturalmente superada a santidade de Dom Bosco; um até falou da necessidade de uma “anti-hagiografia” para restabelecer uma visão mais autêntica da mensagem do Evangelho de Cristo! Há quem fale e escreva sobre a santidade desconhecendo o espírito com o qual a viveu Dom Bosco, ou a confunde com determinadas atitudes culturais da época. Há, também, quem não conhece ou não atribui um diligente cuidado à Escola espiritual que se desenvolveu ao redor do nosso Pai e Fundador.
Penso que também estas críticas podem ser úteis, antes de mais nada para evitar uma certa mitologia hagiográfica e para repensar com profundidade a essência mesma da santidade, que nunca se reduz a um simples moralismo e que é preciso cuidadosamente distinguir da roupagem cultural de seu tempo.
Estimulam-nos ainda a precisar com mais clareza a multiformidade presente historicamente nas modalidades concretas de testemunhar a mensagem evangélica, individualizando os elementos permanentes da natureza própria do caminho evangélico traçado por Dom Bosco. Nós, com o auxílio do Espírito de Deus e protegidos maternalmente por Nossa Senhora Auxiliadora, nos dedicamos com seriedade, ao longo destes vinte anos de busca, a este delicado trabalho. Prova disso são os últimos três Capítulos Gerais e o texto renovado das Constituições.
Numa sociedade em contínuo processo de secularização, onde a santidade parece estar sendo marginalizada como um resíduo do passado porque não teria mais valores a oferecer ao homem de uma cultura mais científica e técnica, o encontro para as celebrações em 1988 convida-nos a um compromisso fundamental: renovar para os novos tempos a Profissão salesiana!
Este compromisso comporta um tríplice propósito:
reconsiderar com clareza a essência evangélica da santidade;
individualizar os valores permanentes da índole própria do espírito de Dom Bosco;
enfrentar metodologicamente o desafio de uma constante inculturação do carisma salesiano.
Este apelo para atualizar a santidade de Dom Bosco nos é dirigido pela própria Igreja, através dos seus Pastores do Vaticano II, das novas gerações de inumeráveis jovens que veem em nossa Profissão religiosa “o dom mais precioso que podemos oferecer” à sua esperança.8
Conclusão
Queridos irmãos, a Relação final do Sínodo extraordinário dos Bispos afirma explicitamente que: “Nas circunstâncias mais difíceis para toda a história da Igreja, os santos e as santas sempre foram fonte e origem de renovação. Hoje temos muita necessidade de santos, graça esta que devemos continuamente implorar a Deus. Os Institutos de vida consagrada, mediante a profissão dos conselhos evangélicos devem estar conscientes da sua especial missão na Igreja de hoje, e nós devemos encorajá-los nesta sua missão”.9
Eis um apelo autorizado para aprofundar o verdadeiro significado da nossa Profissão e a testemunhá-lo naquilo que possui de mais íntimo e de mais fecundo, a santidade apostólica. As Constituições nos lembram que “a fidelidade ao compromisso assumido com a profissão religiosa é resposta sempre renovada à Aliança especial que o Senhor fez conosco. A nossa perseverança se apoia totalmente na fidelidade de Deus, que nos amou por primeiro, e é alimentada pela graça da sua consagração. É ainda sustentada pelo amor aos jovens aos quais somos enviados, e se manifesta na gratidão para com o Senhor pelos dons que a vida salesiana nos oferece”.10
Dom Bosco, no centenário de sua morte, interceda para que todos saibamos renovar e testemunhar a nossa Profissão religiosa de acordo com o projeto de santidade apostólica apresentado nas Constituições salesianas!
Uma saudação fraternal com os votos de uma intensa preparação espiritual para 1988. Rezo por todos vós!
Com gratidão e afeto no Senhor
1 Lumen Gentium, 41.
2 ACS 303, janeiro-março 1982.
3 ACS 310, outubro-dezembro 1983.
4 CG 22, Documentos n. 4.
5 Cf. Constituições 40.
6 Cf. Mutae relationes, 11.
7 Cf. Elenco SDB 1986, 2º vol. p. 194-196.
8 Cf. Constituições 25.
9 “Relatio finalis”, II, A, 4.
10 Constituições 195.