Egídio Viganò
MARIA RENOVA A FAMÍLIA SALESIANA DE DOM BOSCO
Atos do Conselho Superior
Ano LIX – JANEIRO-junho, 1978
N. 289
Introdução – Levemos Nossa Senhora para casa – Fundamo-nos na realidade objetiva – Motivações para a renovação da nossa devoção – A opção mariana de Dom Bosco – Elementos característicos da sua devoção – A Auxiliadora e o carisma salesiano – Concretitude do nosso propósito de relançamento mariano – E concluo
Roma, 25 de março de 1978
Solenidade da Anunciação
Caríssimos:
Saúdo-vos com alegria e esperança e desejo partilhar fraternalmente convosco alguns pensamentos que tenho no coração.
Cada um de nós costuma meditar nos acontecimentos da própria existência, pessoais, eclesiais e salesianos, imitando humildemente a Virgem Maria, que sabia conservar e aprofundar com todo o carinho dentro de si a lembrança dos fatos mais significativos da sua vocação.1
A Providência transtornou há alguns meses a minha existência designando-me para vosso Reitor-Mor. Já se está tornando um hábito para mim a consciência das graves responsabilidades inerentes a este “serviço de família”, que exige verdadeira paternidade espiritual em profunda sintonia com Dom Bosco. Menos mal que em casa nos ajudamos mutuamente.
O Senhor, entretanto, me ajuda a perceber a beleza e a abundância de graça e, sobretudo, a ajuda materna de Maria que acompanham tal ministério, com a alegria de poder entrar em comunhão convosco, com cada um e com cada comunidade, para refletirmos e crescermos juntos na gratidão e na fidelidade.
Queria ter o estilo simples e penetrante de Dom Bosco e a facilidade de comunhão que possuíam os outros sucessores, mas, à míngua de afabilidade e simplicidade, supra ao menos a sinceridade e a solidez.
Estou a escrever-lhes na oitava da Páscoa trazendo no coração o clima profundo e alegre da Ressurreição; o maior dia que o Senhor fez! Apareceu-nos então a máxima novidade, impressionante e radical, que deita abaixo uma visão secularista do mundo e obriga a reler todos os seus valores de um ângulo humanamente impensável que os torna relativos e os assume.
Como deve ter custado a Nosso Senhor fazer compreender aos Apóstolos o que era e o que comportava na realidade a sua Ressurreição! Com ela inicia-se a “Nova Humanidade”: o homem atinge a plenitude do projeto de Deus Pai a seu respeito, descobre a verdadeira meta da sua existência e adquire a dimensão genuína da sua história.
Estamos no centro do Evangelho, do qual podemos perceber com penetrante clareza o mistério do batismo e o significado da profissão religiosa, a verdadeira missão da Igreja no mundo e o nosso papel de Salesianos entre os jovens, e dominar todo o horizonte tanto do dinamismo salvífico dos que creem como das atividades técnicas, econômicas, culturais e políticas do homem com os seus verdadeiros objetivos.
A Páscoa é precisamente o vértice do qual vemos e julgamos tudo na fé. É desse cume pascal e na perspectiva da Ressurreição que vos convido a refletir um pouco sobre as nossas relações com a Virgem Maria, Mãe de Deus.
Levemos Nossa Senhora para casa!
O CG21 convida-nos a renovar a dimensão mariana da nossa Vocação.
Parece este o momento favorável de revermos juntos as nossas convicções sobre Maria e de fazermos cuidadoso exame da nossa devoção à Auxiliadora. Quais são as relações entre a pessoa viva de Maria e nós? Até que ponto a devoção a Nossa Senhora é hoje real e sentida nos nossos corações e nas nossas atividades pastorais? Seria exagero dizer que a dimensão mariana se acha em decadência entre nós? Não haverá talvez necessidade urgente de novo espaço para Maria na nossa Família?
Na tarde de Sexta-Feira Santa, enquanto ouvia a proclamação da Paixão segundo João, impressionei-me vivamente com a importância que o evangelista dá às palavras de Jesus moribundo dirigidas à sua Mãe: “Mulher, eis aí o teu Filho!”, e ao discípulo predileto que lhe estava ao lado; “Eis aí tua mãe!”; e o que acrescentou logo a seguir; “desde aquele momento o discípulo levou-a para a sua casa”.2
É um testamento e um programa.
Pensei instintivamente na nossa Congregação e em toda a Família Salesiana que deveria, hoje, aprofundar novamente o realismo da maternidade espiritual de Maria e reviver a atitude e o projeto do discípulo. E dizia de mim para mim: sim, devemos repetir-nos uns aos outros como programa para a nossa renovação a afirmação do evangelista: “Levemos Maria para casa!”.
Seremos desta sorte “discípulos prediletos” porque zelaremos melhor pela nossa filiação batismal e sentiremos de maneira mais concreta os efeitos benéficos da maternidade de Maria.
E lembrava o afeto e o realismo com que Dom Bosco cuidou filialmente da presença de Nossa Senhora em casa, projetando e realizando as suas múltiplas iniciativas sempre em diálogo com Ela.
No Domingo de Páscoa então cintilou com clareza em minha mente o aspecto profundamente realista da função materna de Maria na vida da Igreja.
Meditando o significado objetivo da Ressurreição de Cristo, não à maneira de milagre como a de Lázaro que voltou temporariamente à vida mortal, mas enquanto transfiguração definitiva da existência humana e como plenitude efetiva de uma Vida nova, vencedora do mal e da morte e participante da glória de Deus, vi emergir de novo a figura singular da Mãe de Cristo. Com efeito, a transfiguração pascal da Ressurreição é um dado concreto realizado, até agora, tão-somente em dois indivíduos da estirpe humana: Jesus e Maria!
Dois de nós, vivem Eles a Ressurreição pascal como primícias e início de todo o gênero humano renovado. São o “homem novo” e a “mulher nova”: o segundo Adão e a segunda Eva.
E isso não apenas como modelo a imitar ou simples meta a atingir, mas realmente como o único princípio eficaz de regeneração e de vida para todos.
Fundamo-nos na realidade objetiva
Queria salientar com particular insistência que isso é um “fato”, ou seja, uma realidade objetiva que existe e é ativa antes e fora da nossa consciência; não é uma “teoria” religiosa ou um nosso modo “devoto” de sentir, mas um verdadeiro “dado” extrínseco, de per si, ao nosso pensamento subjetivo, e ao qual temos acesso com a seriedade do conhecimento humano guiado pela fé.
Na base das nossas convicções de fé encontra-se uma realidade concreta: isto é, pessoas vivas e fatos. Sobre tal objetividade devemos fazer crescer o aprofundamento da nossa doutrina mariana e a expressão da nossa piedade.
Crer na Ressurreição, e afirmar por isso que Cristo subiu e Maria foi assunta ao céu, não quer dizer que eles vivem num “astro distante” de onde poderiam vir à terra numa viagem extraordinária de astronautas; significa, ao invés, que estão deveras para nós, presentes e atuantes no nosso mundo mediante a nova realidade pascal da Ressurreição.
Maria, pois, é hoje uma personagem realmente viva e atuante entre nós; a sua assunção, pela qual participa plenamente da Ressurreição de Cristo, é um dado de fé; a sua maternidade universal é testemunhada pela Igreja como uma realidade de graça, objetiva e cotidiana.
Afirma explicitamente o Concílio Ecumênico Vaticano II: a maternidade espiritual de Maria “na economia da graça perdura ininterruptamente, a partir do consentimento que ela fielmente prestou na Anunciação, que sob a cruz resolutamente manteve, até à perpétua consumação de todos os eleitos. Assunta aos céus, não abandonou este salvífico múnus, mas por sua multíplice intercessão prossegue em granjear-nos os dons da salvação eterna. Por sua maternal caridade cuida dos irmãos de seu Filho, que ainda peregrinam rodeados de perigos e dificuldades, até que sejam conduzidos à feliz pátria”.3
Com razão, pois, “a Bem-aventurada Virgem Maria é invocada na Igreja com os títulos de Advogada, Auxiliadora, Socorro, Medianeira... A Igreja não hesita em proclamar esse múnus subordinado de Maria. Pois de contínuo o experimenta e recomenda-o ao coração dos fiéis para que, encorajados por esta maternal proteção, mais intimamente adiram ao Mediador e Salvador”.4
Partir de um quadro de referência tão fortemente realista dará às nossas reflexões especial seriedade e força, sem cedimentos a atitudes superficiais de sentimentalismo.
Lamentavelmente pode-se encontrar aqui e acolá uma incontrolada exuberância de fantasia morbosa com expressões de uma piedade duvidosa (apoiadas quem sabe em pseudorrevelações); isso tira credibilidade à devoção mariana e pode contribuir para desviar o precioso patrimônio, que hoje se está a redescobrir e é tão caro à nossa missão, da religiosidade popular.
Ao propormo-nos a imitar o discípulo predileto em “levar Maria para casa”, entendemos aprofundar com seriedade o forte realismo da Ressurreição no sulco da tradição eclesial, segundo o estilo de concretitude tão de acordo com o espírito de Dom Bosco e tão característico da sua devoção a Nossa Senhora sob o título de Auxiliadora.
Motivações para a renovação da nossa devoção
Não são irrelevantes as motivações que nos levam a relançar a devoção a Maria Auxiliadora em toda a Família Salesiana.
Lembremos as mais importantes: servirão para iluminar e fundamentar melhor o nosso compromisso.
— Devemos primeiramente tomar em consideração a virada cultural que se produziu com o emergir de um novo conhecimento dos valores humanos; ele conferiu aos usos sociais, aos modos de expressão literária e artística, aos meios de comunicação e à sensibilidade da opinião pública, um estilo verdadeiramente novo que influi também sobre a manifestação das convicções religiosas.
Isso pode haver produzido certa desafeição a um determinado tipo de expressão religiosa com uma momentânea desorientação em grandes faixas e ao depois dúvidas também doutrinais em certas pessoas. Pensamos, por exemplo, como o novo dado cultural da promoção da mulher influi certamente sobre a devoção mariana.
O Papa nos exorta a prestar grande atenção “também às aquisições seguras e comprovadas das ciências humanas” para nos empenharmos em eliminar “a discrepância entre certos conteúdos (do culto mariano) e as hodiernas concepções antropológicas e a realidade psicossociológica, profundamente mudada, em que vivem e operam os homens do nosso tempo”.5 Isso tudo exige por certo um novo compromisso de nossa parte.
— Outra forte motivação é o grande acontecimento espiritual e pastoral do Concílio Ecumênico Vaticano II.
Como sabemos, ele tratou profundamente de toda a vida eclesial e de maneira particular do culto mariano. Quem não lembra a acesa discussão dos Padres Conciliares a respeito das consequentes exigências de renovação em vista da escolha concreta feita nessa ocasião?
A linha mariana do Vaticano II segue uma trajetória nova, caracterizada pelo mistério total da Igreja. A exortação apostólica Marialis Cultus de Paulo VI explicita-lhe de maneira ordenada as linhas diretrizes e responsabiliza diretamente também as Famílias religiosas (como a nossa) quanto à necessidade de favorecer “uma genuína atividade criadora e de proceder, ao mesmo tempo, a uma diligente revisão dos exercícios de piedade para com a Virgem; revisão, que esperamos respeitosa da sã tradição e aberta para acolher as legítimas instâncias dos homens do nosso tempo”.6
Em particular, a Constituição dogmática sobre a liturgia fomentou após o Concílio uma promoção mais genuína e criativa do culto cristão; ora “o desenvolvimento da devoção à Virgem Maria, inserida no sulco do único culto cristão, é elemento qualificador da genuína piedade da Igreja”.7
Portanto, todo o sentido do movimento litúrgico e da reforma do culto cristão exigem acurada revisão e novo impulso também da nossa devoção mariana.
Assistimos, além disso, a um interessante redescobrimento da “piedade popular”,8 como um “lugar teológico-pastoral” de importância concreta para uma renovação realista. Nesse redescobrimento há uma consideração especial e uma reavaliação prática e respeitosa do “povo” no interior da comunhão eclesial, e um discernimento mais compreensivo, ainda que sadiamente crítico do seu “sentido religioso”.
São duas categorias, de “povo” e de “sentido religioso”, que devem ter uma ressonância de especial simpatia na vocação salesiana.
Pois bem, uma característica da piedade popular, comum nas várias latitudes, é precisamente a devoção mariana; deverá, pois, ser estudada e atualizada também por nós para que a saibamos fomentar com agudo discernimento, não há dúvida, mas também com sintonia e criatividade pedagógico-pastoral.
Há ainda um motivo muito profundo e íntimo que nos deve concitar a um consciencioso relançamento mariano: é o fato de considerar a nossa Vocação como um “carisma do Espírito Santo”, de Quem Maria é a “esposa” e o “templo vivo”.9
Ora, nós hoje “estamos vivendo na Igreja um momento privilegiado do Espírito” com os seus dons e carismas10 e, portanto, um momento particularmente ligado ao papel especial de Maria: a sua função materna na vida da Igreja é um fato ligado a todo “nascimento” e “renascimento” no Espírito.
Por conseguinte, assim como Dom Bosco soube venerar de forma especial e prestar culto a Nossa Senhora para o “nascimento” da Congregação e da Família Salesiana, com não menor amor e iniciativa devemos hoje sabê-la venerar de forma especial e prestar-lhe culto para a renovação, que é um “renascimento”, da nossa Vocação hoje.
Não haverá para nós refundação e retomada sem a Auxiliadora; veremos em contrapartida crescer com sua proteção materna os efeitos do renascimento até “de maneira miraculosa”.
Tanto mais que Maria é justamente um modelo peculiar de docilidade à renovação na hora da dificílima transição do Antigo ao Novo Testamento: Ela dá aí a todos a maior lição de fidelidade ao essencial e de total abertura à ação imprevisível do Espírito Santo.
— Há ainda uma razão deduzida de um aspecto característico da devoção à Auxiliadora: trata-se de uma dimensão mariana que é, por natureza, feita justamente para os tempos difíceis.
Manifestava-o Dom Bosco ao P. Cagliero com a famosa afirmação: “Nossa Senhora quer que a honremos sob o título de Auxilium Christianorum: os tempos correm tão tristes que temos mesmo necessidade de que a Virgem Santíssima nos ajude a conservar e defender a fé cristã”.11
Estamos vivendo e experimentando hoje dificuldades verdadeiramente graves e inéditas, tanto para a fé dos crentes, para a vida da Igreja e para o ministério dos seus Pastores, como para as reformas sociais e políticas, para a educação integral dos jovens e para a promoção das classes populares.
Se a dimensão mariana da Auxiliadora se ajusta especificamente às horas de dificuldade e se Dom Bosco e a sua Família foram suscitados pelo Espírito como instrumentos especializados e eficazes para propagar a sua devoção na Igreja, dever-se-á concluir que as dificuldades atuais, tão complexas e problemáticas, da Igreja e da Sociedade exigem com urgência um cuidadoso relançamento mariano.
Outra razão, mais particularmente específica para nós, é a correlação íntima que há entre o nosso espírito salesiano e a devoção a Maria Auxiliadora.
Não foi por acaso que Dom Bosco chegou a essa devoção; e ela não depende de alguma aparição local; apresenta-se antes como a maturação de toda uma linha espiritual e apostólica que se foi esclarecendo e desenvolvendo com a influência de determinadas conjunturas históricas, lidas à luz de um profundo diálogo pessoal com o Espírito Santo no contexto daqueles toques marianos característicos tão familiares no dia-a-dia da vida de Dom Bosco.
A Auxiliadora aparece como o vértice do que Dom Bosco sentia de Maria: advogada, socorro, mãe dos jovens, protetora do povo cristão, vencedora do demônio, triunfadora das heresias, auxílio da Igreja em dificuldade, baluarte do Papa e dos Pastores assediados pelas forças do mal.
Tal devoção à Mãe de Deus é a concretização prática da santidade da ação que caracterizou a espiritualidade de Dom Bosco. Bastaria pensar no seu diálogo com o pintor Lorenzone, pedindo-lhe representasse Nossa Senhora no centro de todo um gigantesco dinamismo eclesial,12 ou contemplar o atual quadro da basílica de Valdocco para descobrir, diria quase, uma conaturalidade entre espírito salesiano entretecido de apostolado eclesial e devoção a Maria Auxiliadora.
Se, pois, todo o movimento conciliar de renovação dos Religiosos leva a uma reatualização da sua espiritualidade específica, isso deverá significar para nós um forte relançamento do componente mariano do nosso carisma.
Por todas essas razões, e por um especial influxo do Espírito Santo, o último CG exigiu um compromisso explícito de renovação do aspecto mariano da nossa vocação: “O CG21, em espírito de fidelidade a Dom Bosco à luz do Vaticano II e da Marialis Cultus de Paulo VI, convida todos os Salesianos a redescobrir e valorizar a presença de Maria na própria vida e na ação educativa entre os jovens”.13
Também a Superiora Geral das FMA com todo o seu Conselho, em visita fraterna à nossa assembleia capitular, assumiu, com entusiasmo e desejo de agir, o compromisso sugerido pelo Reitor-Mor de se sentirem privilegiadas nas iniciativas de animação mariana em toda a Família salesiana.
Por conseguinte: sentimo-nos hoje chamados juntamente com as FMA e com todos os grupos da Família Salesiana a criar um clima e a programar atividades concretas para fazer conhecer e amar Nossa Senhora, sobretudo pelas novas gerações de jovens que têm mais do que nunca fome e sede das grandes realidades da Páscoa cristã.
Também para elas devem hoje valer e traduzir-se na prática as palavras proféticas de Maria: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada”.14
A opção mariana de Dom Bosco
É por certo iluminante lembrar, embora sucintamente, alguns dados acerca do itinerário com que Dom Bosco chegou à sua ardente devoção a Maria sob o título de “Auxílio dos cristãos”. Poderão servir para que melhor percebamos a fisionomia espiritual da sua e nossa vocação.
Sabemos que João Bosco nasceu e foi educado num ambiente profundamente mariano por tradição de Igreja local e piedade familiar.
Basta lembrar como, dias depois da sua vestidura em outubro de 1835, na vigília da partida para o seminário, mamãe Margarida o chamou e disse-lhe estas memoráveis palavras: “Joãozinho (...) quando vieste ao mundo, consagrei-te à Bem-aventurada Virgem Maria: quando começaste os estudos recomendei-te a devoção a essa nossa Mãe; recomendo-te agora que sejas todo seu; ama os companheiros devotos de Maria; e se te tornares sacerdote, recomenda e propaga sempre a devoção de Maria”.15
Parece-me particularmente interessante observar que já aos 9 anos, no famoso sonho (que se há de repetir várias vezes e ao qual Dom Bosco atribui particular incidência na sua vida) Maria se apresenta à sua consciência de fé como uma personagem importante interessada diretamente num projeto de missão para a sua vida; é uma Senhora que demonstra particulares preocupações “pastorais” para com a juventude: apresentou-se-lhe de fato “à maneira de uma Pastorinha”. Notamos logo, aqui, que não é Joãozinho que escolhe Maria, mas que é justamente Maria que toma a iniciativa da escolha: a pedido do seu Filho, será a Inspiradora e a Mestra da sua vocação.
Este sentido íntimo de um relacionamento pessoal de Maria com ele, ajudará espontaneamente Dom Bosco a desenvolver no seu coração uma atenção e um afeto que vão para lá das várias festas de vários títulos marianos, localmente mais venerados, que certamente ele apreciava e sabia festejar com entusiasmo.
Será sempre característico nele essa atitude de relacionamento pessoal com Nossa Senhora: a sua devoção mariana visa a considerar diretamente a pessoa viva de Maria e nela contempla e admira todas as suas grandezas, as multíplices funções e os muitos títulos de veneração a ela atribuídos.
Foi-se desta sorte consolidando no coração de Dom Bosco um tipo de devoção mariana que não é de um setor ou unilateral, mas compreensivo e total, centrado diretamente no aspecto vivo e real mais eclesialmente apropriado da pessoa de Maria.
Escreve o P. Alberto Caviglia: “Note-se. Falando da devoção a Maria, deixamos de lado qualquer título comemorativo, exortativo ou devocional. É Maria, Nossa Senhora, sem mais. Vulgarmente diríamos: Qual Nossa Senhora indicava Dom Bosco e de qual era devoto Domingos Savio? Todas e nenhuma. No primeiro sonho dos nove anos, apareceu a Dom Bosco menino não, digamos assim, uma Nossa Senhora com algum título, mas Nossa Senhora, Maria, a Mãe de Jesus. No tempo de que estamos a falar o Santo Mestre era devoto da Consolata (dela é a primeira estatuazinha da Capela Pinardi), a Nossa Senhora dos turinenses: entretanto com o movimento religioso que levou a Igreja à definição da Imaculada, foi-se orientando para ela e, com espírito profundamente católico, e multo lúcida compreensão, transformou o artigo de fé em amor e devoção, e esta tornou-se por longo tempo, e sob certos aspectos, a sua Nossa Senhora. E foi a que desde o começo apontou a Savio; de modo que o santo discípulo teve naquela primeira celebração o seu primeiro momento, e dava o nome de Imaculada Conceição à Companhia por ele iniciada”.16
Semelhante atitude, unida à sua peculiar índole prática e ao característico sentido histórico, levou Dom Bosco a inserir-se sempre no âmago do movimento mariano de atualidade mais eclesial.
Nos primeiros vinte anos do seu ministério sacerdotal, exprimiu esta sua compreensiva devoção mariana destacando a graça singular de Maria de ser Imaculada. A festa de 8 de dezembro permanece definitivamente central na sua metodologia pastoral e espiritual. Coincide também com a data do início das suas obras mais significativas.
Dom Bosco vivia com inteligente entusiasmo o clima eclesial que precedeu e acompanhou a proclamação do dogma da Imaculada Conceição (1854) e que viu as aparições de Lourdes (1858).
Lembramos, por exemplo, a importância que tinha no seu compromisso educativo a “Companhia da Imaculada”, que foi em Valdocco a escola de preparação do seu primeiro menino santo, Domingos Savio, e dos primeiros membros da futura Sociedade de S. Francisco de Sales. É sintomático acrescentar que, paralelamente, em Mornese, a “União das Filhas da Imaculada” serviu para preparar as primeiras sócias do futuro Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora.
A escolha da Imaculada nos mostra, portanto, um Dom Bosco inserido no coração do movimento mariano para além dos títulos e devoções locais; é seguir e venerar Maria, a sua Inspiradora e Mestra, como se vai fazendo vitalmente presente na atualidade da Igreja.
Mas é claro que Dom Bosco tende a transcender o aspecto estritamente formal do dogma da Imaculada Conceição; não se limita à prerrogativa da ausência n’Ela do pecado original; nem se detém nunca simplesmente nas grandezas, que lhe eram tão caras, da dignidade individual de Maria em si mesma (a sua plenitude de santidade, a sua virgindade incorrupta e a sua gloriosa assunção), mas tende a considerá-las, como objetivamente são, em relação à sua função pessoal de Mãe de Cristo e de todos os homens seus irmãos.
A vocação apostólica de Dom Bosco leva-o a descobrir e a sublinhar o que desde o sonho dos 9 anos era como a imagem original da sua “Mestra”: a sua função de maternidade espiritual.
Assim, na prática, percebe-se facilmente em Dom Bosco a clara tendência para confiar um papel de ajuda e proteção à Imaculada na obra educativa e a valorizar a sua plenitude de graça como fonte de patrocínio para a salvação.
Já a partir de 1848 começa a escrever em algumas imagens colocadas em sua escrivaninha o título “Auxilium Christianorum”. Antes de 1862, tal título ainda não aparece, nem como centro nem como síntese. Mas já se anuncia um crescendo de sintomas, provenientes quer das conjunturas da vida da Igreja, quer da índole própria da vocação de Dom Bosco, que o levam sempre mais claramente a considerar a Imaculada como a protetora que vence a serpente maligna e lhe esmaga a cabeça.
Com os anos 60, na plena maturidade de Dom Bosco, e mais exatamente em 1862, é que vemos emergir nele a escolha mariana da Auxiliadora.
E será a escolha mariana definitiva: o ponto de chegada de incessante crescimento vocacional e o centro de expansão do seu carisma de Fundador. Na Auxiliadora Dom Bosco reconhece finalmente delineada a fisionomia exata da Senhora que deu começo à sua vocação e foi e será sempre a Inspiradora e Mestra da mesma.
“Uma experiência de dezoito séculos — escreve Dom Bosco baseando-se em fontes autorizadas — faz-nos ver de modo luminoso que Maria continuou do céu e com o maior sucesso a missão de Mãe da Igreja e Auxiliadora dos cristãos que tinha começado na terra”.17
Notamos que a escolha da Auxiliadora coincide com alguns dados de particular interesse para a nossa reflexão.
Dom Bosco percebia com sofrida atenção18 as notáveis e crescentes dificuldades que se apresentavam à Igreja: os graves problemas das relações entre fé e política, a queda (mais de um milênio depois) dos estados pontifícios, a delicada situação do Papado e das sedes episcopais, a necessidade urgente de um novo tipo de pastoral e de novas relações entre hierarquia e laicato, as incipientes ideologias de massa, etc.
É indispensável lembrar que a história da Igreja, na metade do Oitocentos, “caracteriza-se por um violento encontro entre velho e novo, entre liberalismo e conservadorismo, entre estruturas de uma sociedade oficialmente cristã e a afirmação sempre mais decidida da cidade secular”. A vida inteira da Igreja sente-se envolvida nos seus múltiplos aspectos: questões doutrinais, religiosidade popular, métodos pastorais, primeiras afirmações do laicato, peculiaridades das igrejas locais. “De aí emerge o quadro de um período nodal na história da Igreja, que repropõe os termos do confronto entre o cristianismo e as culturas das diversas épocas históricas com as quais vem a encontrar-se”.19
Além disso, Dom Bosco ficara impressionado com os acontecimentos marianos de Espoleto, vistos pelo arcebispo Arnaldi (que mantinha correspondência com Turim) e pela imprensa católica como manifestação de Maria Auxiliadora; Ela, do próprio centro da Itália, trazia esperança àquela hora de trepidação para a sorte da Igreja e do Papa. Tal intervenção miraculosa fazia lembrar a feliz solução das vicissitudes de Pio VII (e de Dom Franzoni em Turim) e assim haviam feito explodir um verdadeiro entusiasmo mariano entre os fiéis de toda a península (e de Turim).
Sabemos ainda como Dom Bosco conservava e aprofundava no seu coração o sentido da presença de Maria na sua vocação e na vida da Igreja. As suas meditações e intuições pessoais a respeito vemo-las expressas quer em algumas afirmações, p. ex., a já citada ao P. João Cagliero (cf. nota 11), quer no sonho das duas colunas justamente de 1862, quer na especial benevolência para o título da basílica em construção por parte de Pio IX.20
Por fim, muito influiu a construção do templo de Maria Auxiliadora em Valdocco, concluída em apenas três anos de maneira que o próprio Dom Bosco considerava realmente portentosa. Não era uma igreja paroquial ereta para um serviço local já pastoralmente programado, mas devia ser um lugar mariano de culto de toda a cidade, nação e mundo, aberto às exigências espirituais e apostólicas mais universais.
Sabe-se que o templo é um lugar que oferece ao mundo a presença de Deus e de Cristo, como também de Maria. A teologia do templo acha-se ligada às iniciativas gratuitas de Deus para inserir-se concretamente na história para a salvação dos homens.
Podemos dizer que para Dom Bosco a construção da igreja em Valdocco tornou-se de fato uma expressão concreta e palpável da profunda teologia do templo, vista através da presença materna e ativa de Maria: aquele templo é um “santuário mariano” que se torna o “sinal privilegiado”, o “lugar sagrado” da presença protetora de Maria Auxílio dos Cristãos: “haec domus mea, inde gloria mea”!
Isso explica também por que Dom Bosco se dedicou inteiramente naqueles anos a tal empreendimento: “Somente quem pôde testemunhá-lo — afirma o P. Albera — pode fazer uma justa ideia do trabalho e dos sacrifícios que o nosso Venerável Pai se impôs durante três anos para levar a termo a obra... por muitos tida como um empreendimento temerário muito superior às forças do humilde padre que lhe metera ombros”.21
Pois bem: sejam quais forem as motivações concretas nas origens da escolha do título “Auxilium Christianorum”, já de per si rico de história e de urgente atualidade em vista das conjunturas sociorreligiosas, parece-nos que foi depois determinante para Dom Bosco o fato de haver experimentado, dia após dia, que Maria praticamente construiu para si a “sua Casa” nos terrenos do Oratório e dela tomou posse para de lá irradiar o seu patrocínio.
O modo com que Dom Bosco fala dessa “Casa da Auxiliadora” destaca menos as alusões históricas, e muito mais as afirmações de presença viva, de fonte a jorrar graça, de contínuo relançamento de operosidade apostólica, de clima de esperança e de vontade de compromisso com a Igreja e com o Papa.
Apresenta-se à nossa consideração uma verdadeira “epopeia dos fatos”, que se segue à construção da basílica e que ilumina mais vitalmente a escolha mariana de Dom Bosco.
Penso que deveríamos refletir mais sobre as consequências “espirituais” que tem para Dom Bosco (e para nós) o fato da construção desse templo, o seu significado efetivo e a sua função fontal na configuração definitiva do seu Carisma e as consequências concretas na fundação e desenvolvimento da Família Salesiana.
A partir da existência do santuário, a Auxiliadora é a expressão mariana que caracterizará sempre o espírito e o apostolado de Dom Bosco: a sua vocação apostólica lhe parecerá toda ela obra de Maria Auxiliadora, e as múltiplas e grandes iniciativas, sobretudo a Sociedade de S. Francisco de Sales, o Instituto das FMA e a grande Família Salesiana, serão vistas por ele como fundação querida e cuidada pela Auxiliadora.
Acredito que se pode afirmar que a existência do Santuário se tornou, pela experiência viva de muitas graças concretas, mais significativa de quanto pensava inicialmente o próprio Dom Bosco; a luz que irradia do templo de Valdocco transcende as preocupações pastorais de bairro e a própria história do título para criar uma realidade em parte nova e maior; um lugar privilegiado da presença materna e socorro de Maria.
E isso deverá por certo ter consequências também para o nosso relançamento mariano.
Elementos característicos da sua devoção
Pode-se falar de uma “originalidade” na nossa devoção à Auxiliadora pela qual, querendo inserir-nos no coração do movimento mariano mais atual, se devam sublinhar e cuidar alguns aspectos característicos que resultam distintivos dessa devoção?
Formulamos a pergunta partindo de uma preocupação particularmente prática: a resposta servirá para iluminar os aspectos a destacar na nossa renovação.
Dom Bosco foi um dos grandes, entre os devotos de Maria através dos séculos; foi-o de forma característica com uma modalidade peculiar, inserido explicitamente no vivo do movimento mariano mais atual e mais incisivo para a Igreja do seu tempo.
Notemo-lo bem: não inventou; inseriu-se na devoção à Auxiliadora. Entrou no sulco de uma tradição já antiga e específica, mas soube dar-lhe uma fisionomia e um estilo tão peculiar, que depois dele a Auxiliadora passou também a ser chamada familiarmente “a Virgem de Dom Bosco”!
Tentemos estudar brevemente alguns elementos que, salientados fortemente pelo nosso fundador, contribuem para dar a esta devoção uma fisionomia e um estilo característico.
— Primeiramente, a viva consciência da presença pessoal de Maria na história da salvação comporta na devoção de Dom Bosco, como já observamos, a atitude constante de estabelecer relações vitais com Ela (unindo, certamente, Maria a Cristo num binômio inseparável de salvação: as duas colunas do seu sonho!).
Segue-se de aí que a devoção mariana se refere sempre diretamente à “pessoa” de Nossa Senhora com todas as suas grandezas e títulos; portanto, não se exprime nunca em alguma forma de concorrência com as outras devoções, mas antes em uma forma de convergência intensiva e de projeção operativa, pelo que todo título e toda festa mariana é amada e celebrada sublinhando a sua contribuição de “auxílio” para a salvação humana.
Essa consciência da presença pessoal de Maria Auxiliadora, Dom Bosco sente-a concretamente na própria vida como um dado objetivo basilar, um elemento fundamental de toda a sua vocação quer enquanto define o destino e o estilo da sua missão apostólica, quer enquanto vai delineando a fisionomia do seu espírito evangélico.
— Outro elemento característico são os pressupostos doutrinais da devoção à Auxiliadora.
Dom Bosco, embora tomando-os dos autores de maior crédito, individuou-os e aprofundou com particular vigor teológico e com concretitude pastoral. Eles iluminam a índole própria da devoção e do culto a Maria “Auxílio dos Cristãos” e devem ser cultivados e aprofundados nos seus devotos. Referem-se especificamente à mediação vitoriosa de Maria em favor da fé do povo cristão e em auxílio à Igreja Católica guiada pelo Papa e pelos Bispos.
“A necessidade — escreve o nosso Fundador — hoje universalmente sentida de invocar a Maria não é particular, mas geral; não são apenas tíbios a afervorar, pecadores a converter, inocentes a conservar. Tais coisas são sempre úteis em todos os lugares, para qualquer pessoa. Mas é a própria Igreja Católica que é assaltada. É assaltada nas suas funções, nas suas sagradas instituições, no seu chefe, na sua doutrina, na sua disciplina; é assaltada como Igreja Católica, como centro da verdade, como mestra de todos os fiéis”.22
Este aspecto característico de “ajuda eclesial”, que para Dom Bosco fundamenta o título de Auxiliadora, não parece o tenham ligado outros devotos ou carismáticos a títulos marianos.
Já existe por certo uma literatura nossa, bastante significativa, sobre estes pressupostos doutrinais,23 mas é necessário que às reflexões feitas até agora se vão acrescentando, depois da guinada conciliar, outras de particular atualidade segundo a visão renovada do mistério da Igreja.
Começamos notando que já Dom Bosco uniu o título de “Auxiliadora” ao de “Mãe da Igreja” que nós, com alegria, vimos proclamado por Paulo VI no fim do Vaticano II.24 Devemos relevar que é justamente “o sentido vivo da Igreja” o elemento mais caraterizante da doutrina da Auxiliadora.
Com quanta atualidade se pode relançar essa devoção se considerarmos o interesse com que se vem desenvolvendo, hoje, a sugestiva relação “Maria-Igreja”.
Maria, com efeito, é “já” aquilo a que tende a Igreja: é dela a profecia e o fermento. Ajuda a Igreja a realizar a sua função de “segunda Eva” numa maternidade virginal de graça. Assim “o mistério da Igreja se encontra mediante o rosto de Maria. Olhando para Ela, vê-se a Igreja viver: são os seus olhos que explicam os mistérios”.25
Até um escritor não católico afirma: “pode-se dizer que não existe uma justa visão da Igreja senão onde há um lugar para Maria na fé e na piedade. A renovação da Igreja está estreitamente ligada ao relançamento de uma sadia piedade mariana. Perde-se o sentido da Igreja-Mãe onde se perde o sentido da vocação materna da Virgem Maria”.26
O seu papel materno representa o fulcro da relação de Maria com a Igreja: ambas existem e são santas em função da maternidade e ambas geram na virgindade.
Há assim um nexo íntimo entre “maternidade” e “evangelização”, entre “Maria-Igreja” e “ação apostólica”.
Isso tudo resulta significativamente atual para a nossa espiritualidade e tem consequências operativas determinantes. Portanto, a devoção à Auxiliadora animada pelo mais vivo sentido eclesial aparece em Dom Bosco como uma escolha doutrinal precursora que liga a “piedade mariana” com o “sentido da Igreja” numa peculiar forma de mútua inseparabilidade e crescimento comum.
— A doutrina da Auxiliadora comporta, como consequência necessária, uma atitude de compromisso operativo incansável e corajoso que foi, em Dom Bosco, um dos aspectos mais característicos da sua devoção mariana: a Consolata, ou a Salete, ou a Imaculada Conceição não teriam oferecido uma apropriada exigência prática caracterizante dele e dos numerosos devotos (de modo particular a Família Salesiana) com a mesma força e a mesma fisionomia apostólica com que os define a Auxiliadora.
O “sentido da Igreja” traduz-se cotidianamente numa consciência ativa de “membro” com uma profunda espiritualidade da ação.
Isso comporta não só uma atitude constantemente generosa de operosidade apostólica em geral, mas um verdadeiro empenho “eclesial”; ou seja, uma operosidade explicitamente guiada pela consciência clara de ser e de agir como membro corresponsável pelo Corpo de Cristo que é a Igreja. Mas a Igreja considerada não em sentido vago, mas sim enquanto “constituída e organizada como sociedade, subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele”.27
Um compromisso, pois, particularmente definido pela concretitude histórica e situacional da vida católica. Essa opção realista, que pode até levar ao martírio, aproxima-se necessariamente de posições de luta que poderiam assumir, em determinadas situações, também o aspecto de uma opção política; é o que acontece de certo modo, justamente nos anos 60, na Itália das aparições de Espoleto e da queda de Roma. Pois bem, Dom Bosco excele no fazer da devoção à Auxiliadora um compromisso real com a Igreja Católica, evitando sempre transformá-la numa bandeira temporal em prol da revolução ou da antirrevolução do momento.
Para manter tal atitude inspira-se no critério prático característico da “atividade materna”, que não é movida por ideologias abstratas, mas por exigências vitais, que faz todo o bem que pode ainda que não possa chegar ao ótimo, e que cuida mais do tecido delicado da vida que da elaboração dos grandes programas.
Pode ser sintomático constatar que não há lugar para semelhante atividade vital (e, portanto, não se encontra elemento de paralelismo com Maria) nas mais famosas ideologias sociais, por exemplo no marxismo, que, entretanto, mostram coincidências paralelas com a estruturação eclesiástica.
O realismo pedagógico de Dom Bosco exprimiu mediante a sua devoção mariana uma autêntica “mística da ação”, no sentido profundo de S. Francisco de Sales,28 unida permanentemente a uma forte, ainda que por vezes oculta, “ascese da ação”.
Por isso, permitia-me observar aos Capitulares que a devoção à Auxiliadora “está ligada aos acontecimentos concretos da existência, imerge no curso vivo da história, nos seus labirintos e paixões, mas permanece claramente escatológica (Dom Bosco diria ‘religiosa’); não se transforma numa ‘cruzada de cristandade’; sente e participa nas vicissitudes socioculturais e nas contínuas organizações novas dos povos no processo ininterrupto de um novo grau de libertação, mas não se faz nunca política; é realista, mas transcendente, em plena sintonia com a missão específica da Igreja”.29
A Auxiliadora e o carisma salesiano
Dá-se por certo, e isso nos causa profunda gratidão, uma íntima correlação entre a devoção à Auxiliadora e a nossa Vocação salesiana. Não é difícil demonstrá-lo, no que concerne à sua origem, em Dom Bosco: do sonho dos 9 anos nos Becchi ao de Barcelona em 1886, do catecismo iniciado com Bartolomeu Garelli ao modo com que alcançou a aprovação das Constituições da Sociedade de S. Francisco de Sales, da sua convicção íntima, expressa em multíplices afirmações, aos fatos prodigiosos por ele realizados. Mas as origens não são senão as primícias da sua plena realidade.
O nosso Fundador nos assegura que sem o concurso materno e ininterrupto de Maria, a Vocação Salesiana é inexplicável, no seu nascimento, no seu desenvolvimento, e sempre.
Muitas vezes, ele próprio confessou que Nossa Senhora é a “fundadora” e a “sustentadora”, e nos garante que “a nossa Congregação está destinada a coisas grandíssimas e a espalhar-se pelo mundo inteiro, se os Salesianos forem sempre fiéis às Regras que Maria Santíssima lhes deu”.30
Deixou até escapar esta exclamação: “Maria nos quer bem demais!”.31
O P. Rua, o grande “continuador” da vocação de Dom Bosco, que “ensina os Salesianos a permanecerem Salesianos” — como nos disse Paulo VI32 — acentuou com insistência a relação íntima entre vocação salesiana e devoção à Auxiliadora.33
Parece-nos particularmente sugestivo sublinhar uma sua interessante observação ao assistir à coroação de Nossa Senhora em Valdocco, a 17 de maio de 1903; após descrever com entusiasmo transbordante a cerimônia, acrescenta: “Não duvido absolutamente que crescendo entre os Salesianos a devoção a Maria Auxiliadora, irá crescendo também a estima e o afeto para com Dom Bosco, e igualmente o compromisso de conservar-lhe o espírito e imitar-lhe as virtudes”.34
Há, aqui, a intuição claríssima da inter-relação vital que se dá entre a devoção à Auxiliadora e a nossa espiritualidade.
Também o P. Albera, ao fazer refletir com sua delicada sensibilidade sobre os aspectos mais espirituais da nossa vocação, insiste na contínua presença de Maria; assim escreve: “falando aos seus filhos espirituais, (Dom Bosco) não se cansava de repetir que a obra que havia empreendido fora-lhe inspirada por Maria Santíssima, que Maria era o seu válido apoio, e que por isso ela nada tinha a temer das oposições dos seus adversários”.35
Poderia considerar-se particularmente sugestiva, neste argumento, uma alusão sua a S. Francisco de Sales, que é o grande “mestre da salesianidade” na história da vida espiritual. Ao descrever a magnanimidade quase temerária do nosso Fundador, sobretudo na construção do templo de Valdocco, o P. Albera descobre nessa extraordinária coragem um elemento de “salesianidade”: “mostra-se assim, afirma, discípulo do nosso S. Francisco de Sales, que deixara escrito ‘Conheço plenamente a felicidade que é ser filho, indigno embora, de tão gloriosa Mãe. Confiantes na sua proteção, fazemos grandes coisas; se a amarmos com ardente afeto, Ela nos alcançará tudo quanto desejarmos’”.36
Muito útil seria, sem dúvida, aprofundar o significado e a função da devoção à Auxiliadora na nossa espiritualidade salesiana.
Basta-nos aqui indicar de maneira sucinta alguma sugestão a fim de melhor inspirar o nosso relançamento mariano.
Sabemos que uma espiritualidade é verdadeiramente tal se chega a formar um todo orgânico, onde cada elemento tem a sua função e a sua colocação exata.
Deslocar, ou não considerar, ou suprimir este ou aquele elemento seria começar a estragar tudo.
Ora: a devoção à Auxiliadora é de fato, como vimos, um fator integrante do “fenômeno salesiano” na Igreja porque passa a fazer parte vital da sua totalidade. Não teria sentido, antes seria prejudicial, tentar separar a nossa espiritualidade da devoção a Maria Auxiliadora, assim como não se pode separar, porque seria absurdo, Dom Bosco de Nossa Senhora.
A devoção à Auxiliadora é um elemento imprescindível do nosso Carisma; impregna-lhe a fisionomia e revitaliza os seus componentes.
Sem uma sadia vitalidade da dimensão mariana, a nossa espiritualidade sofreria em vigor e em fecundidade; ao passo que o cuidado oportuno de um profundo relançamento mariano fará revitalizar toda a vocação salesiana.
Basta observar como a nossa devoção à Auxiliadora se acha em estreitíssimo intercâmbio vital tanto com a “missão” salesiana como com o “espírito” próprio do nosso Carisma.
Primeiramente, a sua íntima vinculação com a missão salesiana; é Maria, a “Pastorinha” dos sonhos, que lhe indica a índole própria e aponta os destinatários, confiando-nos o campo da “pastoral juvenil”; é a sua característica de Auxiliadora que abre a missão salesiana aos grandes horizontes dos problemas sociorreligiosos da atualidade, e a uma clara escolha de serviço à Igreja universal e de colaboração com os seus Pastores; é a sua bondade materna que inspira a nossa criteriologia pastoral e nos ensina um método de aproximação aos nossos destinatários.
Depois, a sua profunda relação com o espírito salesiano: ele encontra em Maria, vista como Auxiliadora, a sua inspiração e modelo. Um espírito centrado na “caridade pastoral”, inspirado no amor materno de Nossa Senhora e arraigado no amor materno da Igreja, que implica aguçada escuta da iniciativa de Deus, adesão total a Cristo e plena disponibilidade aos seus caminhos; um espírito impregnado de esperança (certo da “ajuda” do Alto) num clima interior de substancial otimismo na avaliação dos recursos naturais e sobrenaturais do homem; um espírito de fecundidade apostólica vivificado pelo zelo pela Igreja; um espírito de operosa iniciativa e maleabilidade apropriado às vicissitudes cambiantes da realidade; um espírito de bondade e de comportamento familiar com a riqueza e simplicidade de atitudes que têm sua sede na sinceridade do coração; um espírito de magnanimidade (como no “magnificat”) que tem a humilde ousadia de fazer todo o bem que se pode, mesmo quando parece temerário, deixando-se guiar pela coragem da fé e do bom senso, para além dos extremismos ou perfeccionismos.
Podemos concluir essas observações dizendo que, assim como na vida de Dom Bosco a devoção à Auxiliadora, explicitada na plena maturidade da sua vocação, é ao mesmo tempo o ponto terminal de um itinerário de crescimento e a plataforma de lançamento de todo o seu vasto projeto apostólico, do mesmo modo na espiritualidade salesiana ela constitui a síntese concreta dos seus vários componentes e a fonte vital do seu dinamismo e da sua fecundidade. Por consequência, o que foi na hora da fundação deverá voltar a ser nas horas da refundação.
Concretitude do nosso propósito de relançamento mariano
Renovar uma devoção não significa simplesmente mudar ou intensificar determinadas práticas religiosas. Certamente há que atualizar a nossa piedade mariana, mas para fazer isso é primeiramente necessário garantir os valores fundamentais da nossa fé, os pressupostos doutrinais e a atitude pessoal e comunitária que de aí deriva. A fé e a piedade devem mover-se ao mesmo passo; se é verdade que na piedade vive a fé (“lex orandi, lex credendi”), é também verdade, sobretudo num processo de renovação, que a doutrina da fé deve guiar a piedade (“lex credendi, legem statuat orandi”).37
Como com justiça se observou: “O reconhecimento do papel da Virgem Maria na história da salvação e na vida da Igreja implica uma piedade que seja consequente com a verdade que lhe diz respeito”.38
Ora, se na devoção à Auxiliadora há aspectos doutrinais característicos, aprofundados e renovados pelo Vaticano II será preciso que os conheçamos bem e que deles saibamos fazer derivar também um tom especial de renovação na nossa correspondente piedade.
Isso tocará diretamente os nossos compromissos de relançamento em vários setores de iniciativas práticas.
Não posso descer, aqui, a pormenores; devem eles ser considerados e programados sobretudo localmente. Indico apenas algumas grandes linhas de ação para que sirvam de inspiração e guia nos vários programas.
1º — A formação doutrinal apresenta-se logo como o primeiro elemento por que zelar; devemos rever e atualizar a nossa mentalidade e os nossos conhecimentos sobre dois campos complementares:
sobre a figura de Maria na história da salvação à luz das orientações conciliares;
e sobre os pressupostos doutrinais do título “Auxilium Christianorum” em relação com a espiritualidade do Carisma de Dom Bosco.
Eis uma vasta tarefa de estudo, divulgação e formação, tanto inicial como permanente.
O nosso Fundador permanece o modelo e o mestre neste campo; lembremos de modo especial dos seus escritos sobre a Auxiliadora.39
2º — O culto e a piedade marianos constituem a vida de uma genuína devoção. Possuímos, para essa renovação, a importante Exortação apostólica “Marialis Cultus” de Paulo VI. Tenhamo-la em grande apreço. Lembremo-nos de que nesse campo a Igreja progrediu muito quer no que diz respeito ao culto litúrgico (cf. primeira parte da MC, n. 1-23), quer no que se refere mais propriamente à piedade mariana (cf. segunda parte da MC, n. 24-39). Saber exprimir a nossa devoção mariana através da participação viva e inteligente no ciclo litúrgico constitui a meta mais significativa e mais pedagógica do nosso relançamento.
Na renovação da piedade mariana, o Papa sugere quatro preciosas orientações “que se devem ter presentes ao rever ou criar exercícios e práticas de piedade”; são a orientação bíblica (MC n. 30), litúrgica (MC n. 31), ecumênica (MC n. 32-33), a antropológica (MC n. 34-27).
O aprofundamento e aplicação de cada uma dessas orientações exigem uma revisão a fundo do modo com que concretizamos a nossa devoção.
Quanto aos exercícios piedosos (cf. MC n. 40-55), além do Terço, queria acrescentar para nós a “bênção de Maria Auxiliadora” composta pelo próprio Dom Bosco e aprovada exatamente 100 anos faz pelo papa Leão XIII,40 a festa de Maria Auxiliadora em maio e a prática tradicional do 24 do mês.
Será além disso necessário incrementar fortemente o significado e o alcance espiritual do Santuário da Auxiliadora em Valdocco.
3º — Os grandes horizontes de empenho eclesial, vistos no realismo de cada situação local, segundo as exigências desta hora tão rica de futuro, devem tornar-se o horizonte em que se move a nossa coragem evangelizadora e a nossa inventiva pastoral. Eis um campo vasto e concreto em que devemos dar uma profunda guinada apostólica, atualizando e nutrindo a nossa mentalidade com os grandes problemas pastorais da Igreja e com as prementes exigências culturais do mundo de hoje, sobretudo em vista da juventude e das classes populares.
Dom Bosco encontrou justamente nessa área o espaço preferido da sua inexaurível operosidade. A devoção à Auxiliadora deve-nos tornar fermento cristão na construção da nova Sociedade, mediante os jovens e as classes populares.
4º — Por fim, o cuidado das vocações foi em Dom Bosco uma das expressões mais eficazes da sua devoção mariana; a instituição da Obra de Maria Auxiliadora para as vocações, que lhe era tão cara, serve-nos de sinal e estímulo. Devemos empenhar-nos com Maria em renovar a fundo toda a nossa pastoral vocacional; ela exigirá de nós a reatualização dos grandes valores do Sistema Preventivo e nos ensinará a medir a nossa profundidade espiritual e autenticidade apostólica com o metro das vocações.
Se soubermos animar a Família Salesiana nessas quatro grandes áreas de renovação, e se, juntamente com os vários grupos da Família, soubermos programar uma realização, talvez modesta em si, mas consciente e constante, veremos rejuvenescer e crescer, com o auxílio de Maria, o nosso Carisma na Igreja.
E a Auxiliadora tornar-se-á de fato também o fermento de uma comunhão mais profunda entre os vários ramos salesianos: Ela aparecerá mais explicitamente a “Mãe da Família Salesiana”!
Dom Bosco “não se contentou com amar a Auxiliadora; muito fez por torná-la amada! Existe uma espécie de pacto entre Maria Auxiliadora e a Família Salesiana. Maria ajuda a sua Família e desenvolve as suas obras. Por sua vez todos os membros e ramos da Família, cada um à sua maneira, difundem o culto da Auxiliadora entre os adultos e os jovens. É um aspecto do serviço salesiano à Igreja. É o significado da inscrição luminosa que Dom Bosco havia lido na grande igreja dos seus sonhos, e que de fato fez esculpir no frontão da basílica de Turim: ‘Haec est domus mea, inde gloria mea; Esta é a minha casa, de aqui há de difundir-se a minha glória’. A basílica viva somos nós”.41
E concluo
Caríssimos, o CG21 faz votos por uma verdadeira recuperação da nossa devoção à Auxiliadora; com ela há de tornar-se mais genuína e concreta a animação salesiana de que tanta necessidade se sente nas comunidades e com a qual havemos de reatualizar o Carisma do nosso Fundador.
Peço aos Irmãos de todas as casas que estudem localmente as possibilidades e os métodos, e empenho os Inspetores com os seus Conselhos a inserirem acurada pastoral mariana nas programações inspetoriais, em diálogo também com os outros grupos da Família Salesiana, especialmente com as FMA.
Um crescimento imediato da devoção à Auxiliadora dará novamente a todos oxigênio e esperança e trará verdadeiro proveito à Igreja. “Ao homem contemporâneo — lembra-nos Paulo VI —, não raro atormentado entre a angústia e a esperança, prostrado pelo conhecimento das suas limitações e assaltado por aspirações sem limites, perturbado na alma e dividido no coração, com a mente suspensa ante o enigma da morte, oprimido pela solidão apesar de tender à comunhão, presa da náusea e do fastio, a bem-aventurada Virgem Maria, contemplada nos eventos evangélicos e na realidade que já possui na cidade de Deus, oferece uma visão serena e uma palavra tranquilizadora: a vitória da esperança sobre a angústia, da comunhão sobre a solidão, da paz sobre a perturbação, da alegria e da beleza sobre o tédio e o fastio, das perspectivas eternas sobre as temporais, da vida sobre a morte”.42
Caríssimos, voltemos a ouvir hoje, como dirigida a nós, uma das últimas recomendações de Dom Bosco: “A Santíssima Virgem Maria continuará certamente a proteger a nossa Congregação e as obras salesianas, se continuarmos a confiar i nela e a promover-lhe o culto”.43
Prometamos a Dom Bosco que de fato o havemos de fazer com filial capacidade de agir, imitando a sua grande confiança e operante ousadia.
Saúdo-vos cordialmente, dando-vos com alegria a bênção de Maria Auxiliadora.
P.
Egídio
Viganò
Reitor-Mor
1 Cf. Lc 2,51.
2 Jo 19,26-27.
3 LG 62.
4 Ib.
5 MC 34.
6 MC 24; cf. 40.
7 Paulo VI, MC – Introdução.
8 Cf. EM 48.
9 Cf. LG 52, 53, 63, 64, 65; AG 4; etc.
10 EM 75.
11 MB VII, 334.
12 MB VIII, 4.
13 Com a sigla CG21 indica-se o texto Documentos Capitulares do Capítulo Geral 21 da Sociedade Salesiana (Roma 1978).
14 Lc 1,48.
15 MB I, 373.
16 A. CAVIGLIA, Vita di Domenico Savio, Opere e scritti editi e inediti di Don Bosco, vo. IV, Turim, SEI, p. 314.
17 G. BOSCO, Meraviglie della Madre di Dio invocata sotto il titolo di Maria Ausiliatrice, Turim 1868, p. 45. – Opere edite, vol. XX, p. 237.
18 Cf. por exemplo, como expressão das suas meditações, a oração composta por ele para ser musicada por Cagliero: “O Maria, Virgo potens...” (MB XVII, 309-310).
19 G. MARTINA, Pio IX, Chiesa e Mondo moderno, ed. Studium, Roma 1976, p. 7-8.
20 Dom Bosco de fato escreve: “Enquanto se estava a deliberar quanto ao título sob o qual colocar o novo edifício, um incidente desfez qualquer dúvida. O Sumo Pontífice, o reinante Pio IX, a quem nada escapa do que possa redundar em vantagem para a religião, informado da necessidade de uma igreja no lugar acima indicado, mandou a sua primeira graciosa oferta de 500 francos, manifestando que Maria Auxiliadora seria um título certamente agradável à Augusta Rainha do Céu” (Giovanni BOSCO, Meraviglie della Madre di Dio invocata sotto il titolo di Maria Ausiliatrice. Turim 1868, pp. 108-109 — Opere edite, vol. XX, pp. 300-301; id. Giovanni BOSCO, Maria Ausiliatrice col racconto di alcune grazie, Turim 1875, p. 30 — Opere edite, vol. XXVI, p. 334; id. Giovanni BOSCO, Associazione de' divoti di Maria Ausiliatrice, Turim 1869, p. 27 — Opere edite, vol. XXI, p. 365).
21 Lettere circolari, Turim 1965, p. 286.
22 G. BOSCO. Meraviglie della Madre di Dio invocata sotto il titolo di Maria Ausiliatrice, Turim 1868, p. 6-7. Opere edite, vol. XX, p. 198-199.
23 NOTA BIBLIOGRÁFICA. Recordem-se particularmente as seguintes publicações:
- P. RICALDONE, A nossa devoção a Maria Auxiliadora, in ACS, setembro-outubro 1948.
- Os 11 volumes dos Atti dell’Accademia Mariana Salesiana.
- F. GIRAUDI, Il Santuario de Maria SS. Ausiliatrice, SEI, Turim 1948.
- P. STELLA, Don Bosco nella storia della religiosità cattolica, vol. 2º, cap. 7º, PAS-Verlag 1969.
24 A 21 de novembro de 1964 Paulo VI proclamou oficialmente o título mariano de “Mãe da Igreja”. Encerrava-se então a III sessão do Concílio Ecumênico Vaticano II, na qual se promulgou a constituição dogmática Lumen Gentium, que apresentava a doutrina conciliar da Igreja e de Maria. No seu discurso histórico o Papa afirmou: “A reflexão sobre as estreitas relações de Maria com a Igreja, tão claramente estabelecidas pela hodierna Constituição conciliar, fez-Nos julgar ser este o momento mais solene e apropriado para satisfazer um voto que, já por Nós lembrado ao final da sessão precedente, muitíssimos Padres conciliares fizeram próprio, pedindo instantemente uma declaração explícita, durante este Concílio, da função materna que a Santa Virgem exerce sobre o povo cristão. Para isso julgamos consagrar, nesta sessão pública, um título em honra da Virgem sugerido de diversas partes do mundo católico, e a nós especialmente caro, porque com admirável síntese exprime o lugar privilegiado, reconhecido por este Concílio à Virgem na Santa Igreja. Para glória, pois, da Virgem e para nosso conforto, Nós proclamamos Maria Santíssima Mãe da Igreja, isto é, de todo o povo de Deus, tanto dos fiéis como dos Pastores que a chamam de Mãe amorosíssima; e queremos que com esse título suavíssimo seja a Virgem doravante ainda mais honrada e invocada por todo o povo cristão” (AAS, 56 [1964] 1015).
25 M. MAGRASSI, Maria e la Chiesa una sola Madre, ed. La Scala, Noci 1976, p. 40.
26 Max THURIAN, Tradition et renouveau dans l’Esprit, Taizé 1977, p. 193.
27 LG 8.
28 Cf. Traité de l’amour de Dieu, lib. 7, c. 7, in Opera Omnia V, 29-32.
29 Cf. CG21, 590.
30 MB XVII, 511.
31 MB XVIII, 273.
32 Homilia de 29 de outubro de 1972 na basílica de S. Pedro, durante a cerimônia da beatificação do P. Rua.
33 Cf. Lettere circolari, Torino 1965; p. ex., p. 178, 293-294, 348, 367-368 etc.
34 o.c., p. 353.
35 Lettere circolari di Don Paolo Albera, Turim 1965, p. 285; cf. p. 169, 223, 224, 284, 466, 477 etc.
36 o.c., p. 286.
37 Cf. Encíclica Mediator Dei de Pio XII, n. 38-40.
38 Max THURIAN, o. c. p. 197.
39 P. RICALDONE, Maria Ausiliatrice, I sei libretti di Don Bosco, LDC 1951, p. 39-44.
40 A fórmula da bênção foi aprovada pela Sagrada Congregação dos Ritos a 18 de maio de 1878. Julgo oportuno e esclarecedor (e serve também para comemorar o seu centenário) transcrever aqui a carta de Dom Bosco ao papa Leão XIII (MB 13, 489):
Beatíssimo Padre,
Na tristeza dos tempos em que vivemos parece que Deus quer de diversas maravilhosas maneiras glorificar sua augusta Mãe invocada sob o título de Maria Auxilium Christianorum. Entre os diversos argumentos há o da eficácia das bênçãos com a invocação desse título glorioso que se costuma dar em diversos lugares, notadamente no santuário a Ela dedicado em Turim.
Mas para que tais fórmulas sejam estabelecidas e reguladas de acordo com o espírito da S. Igreja, o P. João Bosco, reitor do Santuário e da Arquiconfraria nele ereta, pede humildemente que a fórmula transcrita à parte seja tomada em benévola consideração, examinada, modificada, e onde necessário, corrigida, para que se possa usar ao dar a assim chamada Bênção de Maria Auxiliadora, especialmente no Santuário a Ela dedicado em Turim. Aí acorrem a cada momento os fiéis pedindo a bênção com grande incremento da piedade e muitíssimas vezes com sensível vantagem quanto às suas misérias espirituais e corporais.
A fórmula de que se trata, é uma coleção de jaculatórias já usadas e aprovadas pela liturgia da Igreja, e aqui reunidas para maior glória de Deus e da B. V. Maria.
Turim, 10 de março de 1878.
Sac. Gio. Bosco
41 J. AUBRY, Cooperatori di Dio. Roma 1977, p. 444.
42 MC 57.
43 Do “Testamento espiritual” in Scritti spiritual, J. AUBRY, vo. 2º, p. 278-279.