401-450|pt|403 A família salesiana ontem e hoje Estreia 2009

1. CARTA DO REITOR-MOR

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A FAMÍLIA SALESIANA ONTEM E HOJE


ESTREIA 2009


150º aniversário de Fundação da Congregação Salesiana



Introdução – Dois acontecimentos convergentes - 1. A Família Salesiana ontem. 1.1. A "semente" carismática. 1.2. A semente sob a neve. 1.3. A árvore e o bosque: desenvolvimento vigoroso. - 2. No terceiro milênio: o hoje e o amanhã. 2.1. No caminho da comunhão. 2.2. Comunhão na e pela missão. 2.3. Algumas exigências para continuar a caminhada. - 3. Diretrizes para o futuro. 3.1. As sinergias na missão. 3.2. Os recursos. 3.3. Alguns campos de colaboração: Os jovens - A proposta vocacional - As Missões - O Boletim Salesiano. 3.4. Visibilidade eclesial da presença salesiana como "Movimento". 3.5. A cultura da Família Salesiana. - 4. Sugestões para a concretização da Estréia. 4.1. Colaborar juntos na formação e no aprofundamento da mentalidade carismática. 4.2. Promover o trabalho compartilhado. 4.3. Um instrumento de comunhão: o Conselho local e o Conselho inspetorial da Família Salesiana. 4.4. Algumas plataformas de colaboração e trabalho em rede a promover e desenvolver. Conclusão. Oração da Família Salesiana. - Narração metafórica: Os abetos.



Roma, 25 de dezembro de 2008

Solenidade do Natal do Senhor


Queridos Irmãos,


nesta data muito bela e densa de significado como é o Natal do Senhor, coloco-me em comunicação com todos, e apresento-lhes os melhores votos de que o Pai os enriqueça dos dons que nos quis conceder na encarnação do seu Filho, antes de tudo Ele mesmo, porque Jesus veio para dar-nos justamente Deus, e, com Ele, o seu amor, a sua alegria, a sua paz, a sua luz, a sua verdade e a sua vida.

Desde a última vez em que lhes escrevi para apresentar o Programa de animação e governo do sexênio 2008-2014, o panorama mundial mudou profundamente, com uma crise financeira e econômica sem precedentes, que está a colocar em questão o modelo social ocidental. De fato, é evidente a esta altura que a causa da crise financeira não está apenas na falta de transparência e responsabilidades legais, mas num falso conjunto de valores no qual se está a pretender construir a sociedade. A crise atual é comparada, sob o perfil econômico, à grande depressão dos anos 30 do século passado; parece ser verdade, porém, que a situação é muito mais grave, porque desta vez se faz acompanhar de profunda crise espiritual.

Com razão, Bento XVI exortava os jovens na Jornada Mundial da Juventude, a ser a "nova geração de cristãos, revigorada pelo Espírito, que se inspirando numa rica visão de fé, é chamada a contribuir para a edificação de um mundo onde a vida seja acolhida, respeitada e cuidada amorosamente... a construir um futuro de esperança para toda a humanidade"; e acrescentava: "O mundo tem necessidade desta renovação. Em muitas das nossas sociedades, ao lado da prosperidade material vai crescendo o deserto espiritual: vazio interior, medo indefinível, oculta sensação de desespero. Quantos dos nossos contemporâneos escavaram cisternas rotas e vazias para si mesmos (cf. Jr 2, 13) à procura desesperada de sentido, daquele sentido último que só o amor pode dar? Este é o dom grande e libertador que o Evangelho traz consigo: revela a nossa dignidade de mulheres e homens criados à imagem e semelhança de Deus; revela a sublime vocação da humanidade, que é a de encontrar a própria plenitude no amor; desvenda a verdade sobre o homem, a verdade sobre a vida".1 Preocupa-nos, sobretudo, a condição de extrema precariedade em que vive a imensa maioria da população, como também a aumento da falta de futuro para os jovens.

À dramática situação econômica, que leva tantos homens e mulheres a viverem na insegurança da falta de trabalho com tudo aquilo que isso comporta, às vezes simplesmente para a sobrevivência, acrescenta-se a nova onda de violências, entre as quais a carnificina em curso na região de Goma com milhões de desalojados. Devo dizer que me senti orgulhoso dos irmãos e dos voluntários que permaneceram em seus postos, para continuarem a defender e acolher os possíveis refugiados. Esse drama deu origem à iniciativa, denominada "Emergência Congo"; ela aliou novamente as duas Uniões dos Superiores e das Superioras Gerais para estarem presentes de maneiras variadas. Espero que os organismos internacionais se decidam enfim a intervir para garantir os direitos de todas as pessoas daquela área tão sofrida.

Ao longo destes meses, além de acontecimentos de nível mais familiar, houve outros diversos eventos, dos quais pude participar: o Capítulo Geral das nossas irmãs, as Filhas de Maria Auxiliadora, realizado nos dias 8 de setembro a 15 de novembro, com o tema "Chamadas a ser sinal do amor preveniente de Deus"; o harambée e a expedição missionária, no domingo 28 de setembro, ocasião em que lancei o desafio de preparar uma expedição missionária extraordinária para celebrar o 150º aniversário de fundação da Congregação Salesiana; o Sínodo dos Bispos sobre "A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja", de 5 a 26 de outubro; a visita à Inspetoria de Bilbao por ocasião do centenário da presença salesiana em Santander; a Congregação plenária, antes, e o Congresso, depois, da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica; a Assembléia semestral e geral da União dos Superiores Gerais; o Encontro dos Inspetores da Europa, de 28 a 30 de novembro, para a concretização do "Projeto Europa". Enfim, retomamos a atividade ordinária do Conselho com a sessão plenária de inverno, a começar do curso para os novos Inspetores.

Minha participação no Capítulo Geral das FMA como Reitor-Mor foi intensa e, espero, também significativa. Começou com a pregação dos Exercícios Espirituais em Mornese; continuou com a celebração da Eucaristia e a participação na cerimônia de abertura na Casa Generalícia das FMA em Roma; em seguida, com a visita à Madre Yvonne Reungoat, para apresentar-lhe os cumprimentos após a sua eleição como nova Superiora Geral, com todo o seu Conselho; e concluiu-se com a Eucaristia de encerramento. Foi para mim, não só um ato institucional enquanto Sucessor de Dom Bosco, nosso comum Fundador, mas, sobretudo, de afeto, estima e proximidade a este Instituto, ao qual estamos estreitamente unidos, também através das Salesianas que encontramos ao longo da nossa vida salesiana, e que foram para nós verdadeiras irmãs. E isso está perfeitamente alinhado com o tema da Estreia deste ano, que nos convida a redescobrir aquilo que Dom Bosco queria: fundar uma família. Esta é a nossa riqueza, que vivemos na comunhão real, intensa, convicta. Tudo isso a serviço dos jovens, para a sua salvação. Esta é também a nossa significatividade, vivida na missão compartilhada, qualificada, empenhada. Faço votos que, além da beleza espiritual e carismática da experiência vivida pelas capitulares, o CGXXII signifique para o Instituto inteiro um momento de profunda renovação, tanto mais que as nossas irmãs quiseram ir ao essencial ao assumirem como tema o primeiro artigo das suas Constituições; e isso, a fim de poderem responder às atuais expectativas em relação à vida consagrada feminina e às novas necessidades da missão.

O Sínodo com o tema sobre "A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja", durante o Ano Paulino, foi para mim uma experiência bela e estimulante. Toda Assembleia sinodal é uma forte experiência de comunhão eclesial, presidida pelo Santo Padre, o Vigário de Cristo e Sucessor do Apóstolo Pedro, com a participação de Cardeais, Arcebispos, Bispos representantes da Cúria e das Conferências Episcopais, aos quais se acrescentam dez Superiores Gerais, mais os convidados e os especialistas. Esta Assembleia foi ainda mais significativa porque colocou no centro da atenção aquilo que ilumina e guia a Igreja: a Palavra de Deus, que é Cristo em pessoa. Antes, arrisco-me a afirmar que a maior insistência ao longo do Sínodo foi justamente a afirmação de que a leitura da Sagrada Escritura é autêntica, plena, quando leva ao encontro pessoal com Cristo hoje, e que, portanto, o grande desafio é saber passar "das palavras à Palavra", das Escrituras ao Verbo de Deus! Isso só é possível quando fazemos uma leitura orante da Palavra de Deus, abertos ao que o Espírito diz à sua Igreja.

A Assembleia teve início em 5 de outubro com a Eucaristia de abertura na Basílica de São Paulo fora dos muros e foi concluída no dia 26 de outubro com a Eucaristia de encerramento na Basílica de São Pedro; ela foi organizada, não como um congresso intelectual sobre um tema acadêmico ou pastoral a discutir, mas como experiência de escuta religiosa da Palavra, o que era evidenciado na liturgia (celebrações eucarísticas, oração da Hora Média com a respectiva Lectio, oração das Vésperas na Capela Sistina, à qual interveio Sua Santidade o Patriarca Bartolomeu I) e no próprio desenvolvimento do Sínodo.

Acredito que o fruto mais precioso foi a consciência renovada de que tarefa prioritária da Igreja e, portanto, também da Congregação, no início deste novo milênio, é, primeiramente nutrir-se da Palavra de Deus para tornar eficaz o trabalho da nova evangelização, do anúncio do Evangelho em nosso tempo. Assinalo algumas consequências práticas para a nossa vida e missão consagrada, que poderão encontrar em algumas das Propositiones aprovadas e apresentadas ao Santo Padre: primeiramente, o que diz a Propositio n. 24: Palavra de Deus e vida consagrada; a Propositio n. 31 sobre a Palavra de Deus e a formação; a Propositio n. 14 sobre a Palavra de Deus e a Liturgia; a Propositio n. 22 sobre a leitura orante da Bíblia; a Propositio n. 23 sobre a Catequese e a Sagrada Escritura; a Propositio n. 25 sobre o estudo da Escritura.

A partir dessa perspectiva, a Mensagem di Sínodo, desenvolvida em quatro ícones – a Voz da Palavra: a Revelação; o Rosto da Palavra: Jesus Cristo; a Casa da Palavra: a Igreja; a Estrada da Palavra: a Missão – é muito sugestiva, tanto para a vida pessoal quanto para a ação pastoral, e não posso, portanto, deixar de recomendar-lhes a sua leitura atenta e a sua meditação.

A Propositio n.2, em particular, apresenta um augúrio que está em sintonia com a mensagem do ano paulino e com o núcleo 2 do CG26, ou seja, "A urgência de evangelizar". Faço-o meu para todos nós, caros irmãos: "Esta Assembleia Sinodal formula os votos para que todos os fiéis cresçam na consciência do mistério de Cristo, único salvador e mediador entre Deus e os homens (cf. 1Tim 2,5; Hb 9,15), e a Igreja renovada pela escuta religiosa da Palavra de Deus possa iniciar uma nova estação missionária, anunciando a Boa Nova a todos os homens".

O Encontro dos Inspetores da Europa, que se realizou na Casa Generalícia nos dias 28-30 de novembro, serviu para definir conteúdos e modalidades do "Projeto Europa", em obediência às linhas de ação do CG26. Como foi dito desde o início, não se trata de uma obra de socorro nesse continente com um processo irrefreável de envelhecimento do pessoal, um escasso fluxo vocacional e um crescente número de leigos que administram nossas obras; não se trata, muito menos, de manter as estruturas ou repetir o modelo utilizado para o "Projeto África". Aquilo que se quer, como o Capítulo Geral decidiu, é "relançar o carisma salesiano na Europa" (n. 108), projetar uma presença salesiana renovada num contexto caracterizado por grande bem-estar, admirável desenvolvimento científico e tecnológico, forte sensibilidade social; mas, também, pelo secularismo invasor, o relativismo e niquilismo tal que se tornou "hóspede inquieto", pela onda incontrolável de imigrantes.

Essa situação particular desafia antes de tudo a capacidade dos irmãos de revitalizar o carisma na Europa e torná-lo vivo num continente mais do que nunca carente de Deus, de Cristo e do seu Evangelho; mas exige, também, uma intervenção da Congregação inteira, convencidos de que a Europa hoje e amanhã ainda é terra para o carisma salesiano, pela presença dos jovens, especialmente os mais pobres e abandonados, pela necessidade de uma educação capaz de gerar uma nova cultura que dê alma a este continente, rico de humanismo e pobre de futuro porque fechado à transcendência. Se no passado, milhares de irmãos salesianos das diversas nações da Europa foram para as missões, hoje a Europa – como por outro lado o mundo inteiro – tornou-se ela mesma terra de missão e precisa de apóstolos portadores de uma mensagem nova, de uma alegre notícia que encha a vida de sentido.

Enfim, em 18 de dezembro iniciamos a celebração do 150º aniversário de fundação da Congregação. Eu já escrevera uma carta de proclamação desse ano tão significativo, com algumas orientações precisas, e sugerindo a atitude de com vivê-lo; acrescenta-se a ela uma série de subsídios de celebrações ao longo do ano todo, para concluir esse ano de graça com a renovação da Profissão Religiosa, fazendo nosso o compromisso do primeiro grupo que, reunido no quarto de Dom Bosco em 18 de dezembro de 1859, deu início à nossa Sociedade de São Francisco de Sales. A este evento, contemplado à luz da Palavra de Deus, no ano paulino, gostaria de dedicar a próxima carta circular; por isso, limito-me agora a recordar o que escrevi na carta de proclamação deste jubileu. Ele inspirou também o tema da Estreia 2009, que deve significar para todos, mas, sobretudo para nós Filhos de Dom Bosco, uma virada profunda, uma mudança de mentalidade na forma de entender e viver a Família Salesiana, da qual somos parte fundamental e, ao mesmo tempo, responsáveis principais da sua animação.



Eis, portanto, a Estreia 2009:



A Família Salesiana ontem e hoje:

a semente tornou-se uma árvore e a árvore, um bosque



"O Reino dos céus é como um grão de mostarda que alguém pegou e semeou no seu campo. Embora seja a menor de todas as sementes, quando cresce, fica maior que as outras hortaliças e torna-se uma árvore, a tal ponto que os pássaros do céu, vêm fazer ninhos em seus ramos" (Mt 13,31-32).



Queridos irmãos e irmãs da Família Salesiana,


cumprimento-os com o coração de Dom Bosco, de cujo zelo e caridade pastoral nasceu a nossa Família espiritual e apostólica. Somos o fruto mais belo e fecundo da sua entrega total a Deus e da sua paixão de ver chegar à plenitude da vida em Cristo os jovens, especialmente os mais pobres, carentes e periclitantes.

Após as Estreias bem propositivas e de comprometimento dos últimos três anos, eis-me aqui a lhes propor outra ainda mais urgente, exigente e promissora. Ela tem a ver com a nossa identidade e a nossa missão. Dela depende, com efeito, uma presença mais visível na Igreja e na sociedade e uma ação mais eficaz no enfrentar os grandes desafios do mundo atual.

O ano 2009 haverá de nos ajudar a tornar sempre mais real a convicção de Dom Bosco de que a educação dos jovens exige uma grande rede de pessoas que se dediquem a eles e uma decidida sinergia de intervenções para alcançar os horizontes almejados pelos jovens e serem significativos para a sociedade. Por isso, em nome de Dom Bosco, eu lhes peço:



"Empenhemo-nos por fazer da Família Salesiana

um vasto movimento de pessoas para a salvação dos jovens"



Dois acontecimentos convergentes



São dois os acontecimentos que justificam a escolha do tema da Estréia para 2009: o 150º aniversário de fundação da Sociedade Salesiana e a preparação do bicentenário do nascimento de Dom Bosco (1815-2015). Com a celebração do primeiro, iniciamos os preparativos do segundo. Fazemo-lo a recordar o apelo de João Paulo II no Jubileu de 2000: "Toda família religiosa viverá bem o Jubileu ao retornar com pureza de coração ao espírito do Fundador".

A celebração jubilar significa, então, para nós, fidelidade renovada e criativa a Dom Bosco, à sua espiritualidade, à sua missão. Haverá um "Ano Santo salesiano", no qual somos chamados a reviver com brilho e comunicar com entusiasmo as experiências de vida, as modalidades de ação, os traços de espírito que levaram Dom Bosco e, primeira entre muitos, Madre Mazzarello à santidade.

Não posso deixar de recordar nesse sentido a experiência de Dom Bosco. Num primeiro momento, ele consagrou-se pessoalmente, de corpo e alma, à salvação dos jovens que encontrava vagando pelas ruas; em seguida, ele convidou alguns deles para partilhar do seu trabalho apostólico, dando lugar a uma espécie de primeira forma da 'Família Salesiana'. Entretanto, depois de constatar que muitos o abandonavam e de ficar sozinho ou quase, reuniu ao seu redor um grupo de jovens e educou-os para formarem com ele uma família religiosa; surgiram, então, os Salesianos; depois vieram outros grupos, estruturados em diversos níveis, mas com os mesmos objetivos apostólicos. Esse rápido aceno ao percurso 'histórico' esclarece em que consiste a Família Salesiana e a sua relação com o núcleo fundamental, os consagrados – SDB e FMA –, cujo coração e motor, como, aliás, o de toda a Família Salesiana, é a paixão do Da mihi animas, cetera tolle. Ela encerra o espírito que deve caracterizar todos os membros e grupos da Família Salesiana.

Parece-me natural que quanto mais completa for a consagração, tanto maior será a responsabilidade na animação. Esta convicção foi-nos confirmada pelo Santo Padre Bento XVI, no Discurso da Audiência aos Capitulares de 31 de março de 2008: "Dom Bosco quis que a continuidade do seu carisma na Igreja fosse garantida pela opção da vida consagrada. Ainda hoje o movimento salesiano só poderá crescer em fidelidade carismática se, no seu interior, continuar a ser um núcleo forte e vital de pessoas consagradas".



1. A Família Salesiana ontem



O 150º aniversário de fundação da Sociedade Salesiana é ocasião de refletir sobre a ideia original de Dom Bosco e a fundação concreta dos grupos originários, suscitados e cultivados por ele: Salesianos de Dom Bosco, Filhas de Maria Auxiliadora, Associação dos Cooperadores Salesianos, Associação dos Devotos de Maria Auxiliadora.

Pois bem, a partir da parábola usada por Jesus para explicar o Reino dos céus e o seu dinamismo, arrisco-me a dizer que a semente lançada por Dom Bosco cresceu até se tornar uma árvore frondosa e robusta, verdadeiro dom de Deus à Igreja e ao mundo. De fato, a Família Salesiana viveu uma autêntica primavera. Aos grupos originários, uniram-se, sob o impulso do Espírito Santo, outros grupos que, com vocações específicas, enriqueceram a comunhão e alargaram a missão salesiana.

Hoje, é evidente aos olhos de todos nós o quanto cresceu a Família, multiplicou-se o trabalho realizado e o que sonhamos, estendeu-se sem limites o campo de ação pelo bem de muitos jovens e adultos. Disso somos gratos ao Senhor e tomamos consciência da nossa grande responsabilidade, justamente porque como qualquer outra vocação, também a da Família Salesiana está a serviço da missão, em nosso caso a salvação da juventude, sobretudo a mais pobre, abandonada e periclitante.



1.1. A "semente" carismática



O espírito, a mentalidade, a experiência pastoral, a visão de mundo e de Congregação levaram Dom Bosco a algumas convicções e iniciativas análogas:

  • a missão universal da Igreja de salvar o homem todo e todos os homens a ser assumida de maneira solidária. No interior dessa missão, seus filhos e seguidores devem caracterizar-se pelas prioridades em relação aos jovens, aos pobres, aos povos não evangelizados;

  • a utilidade, ou melhor, a urgência e a necessidade impreterível de unir-se espiritualmente e associar-se operativamente em empreendimentos que correspondessem a essa finalidade;

  • as possibilidades de o espírito concedido a ele ser vivido em diversos estados de vida e, portanto, contribuir por meio da união dos "bons" à grande missão da Igreja, inserindo-se nela com "as prioridades" salesianas;

  • a fundação dos primeiros grupos, reunidos espiritualmente ao redor da experiência oratoriana como missão, estilo, método e espírito:

- com ligação distinta em relação à Congregação salesiana (núcleo original),

- com consistência associativa diversa,

- com nível diverso de empenho público "cristão" como requisito de pertença;

  • a função histórica dos SDB, das FMA, dos CC.SS.



1.2 A semente sob a neve: crescimento silencioso



Estas intuições desenvolveram-se segundo a compreensão que os seguidores de Dom Bosco podiam ter no contexto de uma determinada visão e vida de Igreja. Nota-se esse desenvolvimento:

- na permanência e extensão dos grupos fundados por Dom Bosco;

- nas atualizações e revisões periódicas dos elementos organizativos e espirituais;

- no sentido das relações vitais que esses grupos mantêm entre si.

Entretanto outros grupos foram surgindo em diversos continentes com características análogas, por serem fundados por Salesianos.

Entre eles sobressai, certamente, o grupo das Voluntárias de Dom Bosco, tradução do espírito salesiano na secularidade consagrada, que era novidade também na Igreja.

As novas condições criadas pelo Concílio Vaticano II (Igreja comunhão, renovação dos Institutos de vida consagrada, retorno ao carisma original, emergência do laicato) levaram a descobrir e evidenciar o caráter de "família" carismática que a constelação de grupos surgidos podia ter e a também formular orientações operativas nesse sentido: comunicação entre os grupos, expressões de comunhão, papel animador dos Salesianos, o Reitor-Mor como referência significativa, elementos comuns da espiritualidade.

Esta nova mentalidade, contudo, ainda deve passar do papel à vida de cada grupo e de cada membro dos grupos, para que a Família Salesiana seja vivida como dimensão da própria vocação. "Sem vós, já não somos nós!".



1.3. A árvore e o bosque: desenvolvimento vigoroso



Alguns fatos acompanharam e sustentaram o desenvolvimento da Família.

  • Pediu-se formalmente e foi reconhecida publicamente a pertença dos grupos surgidos após a morte de Dom Bosco. Hoje, em seu conjunto, são vinte e três os grupos oficialmente reconhecidos:

    1. Sociedade de São Francisco de Sales (Salesianos de Dom Bosco)

    2. Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora

    3. Associação dos Salesianos Cooperadores

    4. Associação de Maria Auxiliadora

    5. Associação dos Ex-Alunos e das Ex-Alunas de Dom Bosco

    6. Associação das Ex-Alunas e dos Ex-Alunos das Filhas de Maria Auxiliadora

    7. Instituto das Voluntárias de Dom Bosco

    8. Filhas dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria

    9. Salesianas Oblatas do Sagrado Coração de Jesus

    10. Apóstolas da Sagrada Família

    11. Irmãs da Caridade de Miyazaki

    12. Irmãs Missionárias de Maria Auxiliadora

    13. Filhas do Divino Salvador

    14. Servas do Coração Imaculado de Maria

    15. Irmãs de Jesus Adolescente

    16. Associação Damas Salesianas

    17. Voluntários Com Dom Bosco

    18. Irmãs Catequistas de Maria Imaculada Auxiliadora

    19. Filhas da Realeza de Maria Imaculada

    20. Testemunhas do Ressuscitado 2000

    21. Congregação de São Miguel Arcanjo

    22. Congregação das Irmãs da Ressurreição

    23. Congregação das Irmãs Anunciadoras do Senhor

  • Surgiram ainda outros grupos, que esperam o amadurecimento das condições para serem formalmente reconhecidos como membros da Família Salesiana; entretanto, cultiva-se o terreno em que mais grupos ainda poderiam exprimir-se.

  • A Família Salesiana refletiu abundantemente sobre a própria identidade (cf. ACG 358), os elementos que se referem à sua consistência e unidade, à sua organização na comunicação (cf. Carta de Comunhão e Carta da Missão).

  • Cada grupo procurou robustecer-se ao se dar Estatutos ou Regulamentos de Vida, linhas-mestras para a formação dos membros, síntese da própria específica espiritualidade salesiana, e empenhar-se para melhorar a organização e encontrar caminhos e oportunidades de crescimento e desenvolvimento.

  • Fez-se um esforço comum de aprofundamento das possibilidades e definição das modalidades de comunhão entre todos; válida referência disso, primeiramente foi a Carta de Comunhão e, depois, a Carta da Missão, que é preciso continuar a difundir, estudar, traduzir em fatos.



2. No terceiro milênio: o hoje e o amanhã



2.1. No caminho da comunhão



A Igreja entrou numa nova fase de comunhão, marcada pelos Sínodos continentais e da Igreja universal, pelo diálogo ecumênico, pelo movimento inter-religioso, pela solidariedade globalizada, pelo empenho na reconciliação.

São características dessa comunhão:

  • a revisitação dos fundamentos,

  • a maior expansão,

  • a compreensão mais adequada das suas condições,

  • a maior visibilidade,

  • a maior eficácia apostólica e missionária,

  • a sua referência à missão: "A comunhão gera comunhão e configura-se essencialmente como comunhão missionária" (ChL 32).

Embora a nossa Família seja prevalentemente apostólica, por ser família, aprofunda suas raízes necessariamente no mistério da Trindade, origem, modelo e meta de qualquer família. Ao contemplar o Deus-Amor, o Deus-Comunhão, o Deus-Família, compreendemos o significado para nós da missão ("ser sinais e portadores do amor de Deus"), da espiritualidade de comunhão, de ser família.

O Pai evoca a amplitude do coração pelo qual, membros e grupos da Família Salesiana, nos acolhemos e reconhecemos como irmãos e irmãs, homens e mulheres amados por Ele, chamados pessoalmente por Ele para trabalhar no seu campo em vista de uma única finalidade. A avareza do coração humano pode levantar barreiras, criar distâncias e separações, buscar – como entre os Apóstolos – o primeiro lugar, em detrimento do Reino. Às vezes, a produzirem efeitos semelhantes, são os nossos temores ou as nossas reservas a essa unidade com os outros. Coração, como o do Pai, significa afeto verdadeiro e profundo pelos jovens e por aqueles que gastam a vida por eles. Traduz-se em cordialidade, valorização de todos e de cada um, reconhecimento por aquilo que cada um pode e consegue dar.

O Espírito Santo indica-nos uma segunda atitude para construir família: a acolhida agradecida e alegre da diversidade. Manifestação do Espírito são as muitas línguas, os diversos carismas, os vários membros de um corpo, os bilhões de homens, cada qual plasmado singularmente como filho de Deus. O Espírito não se repete, não produz em série.

Dom Bosco foi mestre em fazer aflorar a unidade a partir da diversidade de tipos e temperamentos, de condições e capacidades. Em seu tempo, essa sensibilidade era menos presente. Hoje, porém, a diversidade constitui um desafio educativo e pastoral para a convivência humana, o testemunho eclesial e a Família Salesiana.

Diversidade significa abundância de relações, variedade de forças, fertilidade de campos e, portanto, fecundidade sem cálculo. Que incomparável oportunidade de diálogo, intercâmbio de experiências espirituais e educativas podem oferecer na Família Salesiana homens e mulheres, consagrados e seculares, sacerdotes e leigos, em sua singular condição de maridos, mulheres e filhos, jovens, adultos e idosos, operários, profissionais ou estudantes, gente de povos e culturas variadas, em força total ou na prova da doença, santos e pecadores!

A unidade entre diversos não é, certamente, um fato natural; entretanto Jesus rezou: "Que sejam um!" (cf. Jo 17,21) justamente para que tivéssemos a força de superar o instinto da auto-afirmação.

Jesus, o Senhor, o Filho que se fez nosso companheiro de viagem, que reconcilia todas as coisas, as do céu e as da terra (cf. Cl 1,20), recapitulando-as em Deus, indica-nos uma terceira atitude: a vontade de caminhar juntos na direção de um horizonte compartilhado; de nos colocarmos juntos num espaço por nada etéreo, o Reino; de formar uma comunidade reconhecível de discípulos que assumem juntos o seu mandato: "Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa-Nova a toda criatura" (Mc 16,15).

Eis as três atitudes indispensáveis para crescer em comunhão: amplitude do coração, acolhida na diversidade, vontade de caminhar juntos na direção de um horizonte compartilhado.



2.2. Comunhão na e pela missão



"A comunhão gera comunhão e configura-se essencialmente como comunhão missionária" (ChL 32). Agora, no terceiro milênio, nosso principal horizonte é exprimir, de maneira mais evidente, a comunhão na missão, levando em conta os seguintes critérios:

De acordo com as constantes das origens e do desenvolvimento da Família Salesiana:

Um fato permaneceu constante como herança preciosa: a paixão educativa, particularmente pelos jovens mais pobres, que ajudamos a viver conscientes da própria dignidade de pessoas, do valor e das possibilidades que a vida deles tem para Deus e para o mundo.

"Da mihi animas!" É o lema de Dom Bosco que fazemos nosso! Olhamos para os jovens, para sua dimensão espiritual, e deles queremos nos ocupar a fim de despertar neles a vocação de serem filhos de Deus e ajudá-los a realizá-la, segundo o Sistema Preventivo, isto é, por meio da razão, da religião e da bondade. Isso implica desapegar-se de tudo aquilo que nos possa distrair da nossa entrega a Deus e aos jovens. Eis o significado do "cetera tolle", que é a segunda parte do nosso lema.

Conforme as condições do mundo de hoje:

O mundo unificado pela comunicação, caracterizado pela complexidade, pelo caráter transversal de muitas "causas", pela possibilidade de redes, oferece um cenário novo para a missão cristã, promocional, educativa, juvenil.

A Família Salesiana terá a preocupação de, em conjunto, dar grandeza à própria presença na sociedade e incidência à sua ação educativa: há a questão juvenil, a vida a conservar, a pobreza em suas diversas expressões a debelar, a paz a promover, os já declarados direitos humanos a tornar reais, Jesus Cristo a ser conhecido.

Como fruto das últimas Estréias:

As Estréias dos três últimos anos evidenciaram a emergência educativa, o trabalho em relação à família, a promoção da vida, a preferência pelos pobres, a solidariedade globalizada, a nova evangelização.

A nova fase da Família Salesiana será marcada pela caridade ardente e operosa, cheia de fantasia e generosidade, aquela caridade que fez de Dom Bosco uma imagem de Jesus Bom Pastor, reconhecível pelos jovens e pela gente humilde do seu tempo. Nós, Família Salesiana, somos chamados hoje, no século XXI, a modelar o nosso coração, pobre e às vezes também pecador, ao de Jesus em quem Deus se manifestou ao mundo como Aquele que dá a vida para que o homem seja feliz e tenha vida em abundância (cf. Jo 10,10).



2.3. Algumas exigências para continuar a caminhada



Emergem de imediato algumas exigências para continuar a caminhada de crescimento e alcançar o horizonte da comunhão na missão que nos propusemos:

  • Aprofundar, para melhor entendê-lo, o possível campo comum e as características operativas da missão.

Tudo isso comporta olhar, refletir, dialogar, estudar, rezar juntos para encontrar o caminho a percorrer em espírito de comunhão. É o sinal do amor que os jovens aguardam e do qual certamente sentirão o impacto e o benefício.

  • Reportar-se ao centro da espiritualidade como encorajamento à comunhão em vista da missão, conforme o tempo da Igreja e as condições da experiência religiosa atual; disso resulta a urgência da formação dos membros e o envolvimento de outros.

A santidade: esta é a fonte e a energia da qual "origina-se vasto movimento de pessoas que, de várias maneiras, trabalham para a salvação da juventude" (Const. SDB 5): a Família Salesiana. Não se pode pensar que ela possa resultar de uma organização embora perfeita ou de técnicas refinadas de agregação. Ela foi suscitada pelo Espírito e vive do Espírito.

Faço a esta Família o urgente convite de adquirir uma nova mentalidade, pensar, crer-se e agir sempre como Movimento, com intenso espírito de comunhão (concórdia), com vontade convicta de sinergia (unidade de intentos), com capacidade madura de trabalhar em rede (unidade de projetos). Dom Bosco escreveu no Regulamento dos Salesianos Cooperadores: "Julgou-se sempre necessária a união dos bons para serem de proveito recíproco no fazer o bem e manter distante o mal... As forças frágeis, quando unidas, tornam-se fortes, e se um cordão tomado sozinho rompe-se facilmente, é muito difícil romper três deles unidos. Forças frágeis, unidas, tornam-se fortes: "Vis unita fortior, funiculus triplex diffcile rumpitur". Jamais nos poderemos esquecer que fomos fundados por Dom Bosco, Santo da caridade social (cf. Deus Caristas Est, n. 40), que estava consciente, porém, de que o trabalho educativo-pastoral precisa de uma caridade cooperativa, pela qual o Espírito Santo suscita carismas.

  • Garantir a capacidade autônoma dos grupos quanto ao próprio desenvolvimento, à formação dos seus sócios, às iniciativas apostólicas.

  • Entender e experimentar formas ágeis de colaboração: "pensar globalmente, agir localmente".

  • Aprofundar a experiência salesiana que se realiza na condição laical.



3. Diretrizes para o futuro



O fruto desta Estréia deve ser, então, o esforço conjunto mais visível e também mais concreto na linha da missão.

São muitas as propostas a avaliar, levando-se em conta o desenvolvimento da vida e de certas prioridades. A isso miram a Carta de Comunhão e a Carta da Missão da Família Salesiana. Enquanto a primeira esclarece o nosso DNA comum, os elementos que caracterizam a nossa identidade carismática salesiana, a segunda representa uma declaração de intenções e de orientações. O objetivo de ambas é, em primeiro lugar, criar consciência, formar mentalidade, fazer com que surja a "cultura da Família Salesiana". Ambas devem levar todo componente dos diversos grupos a perceber que, sem os outros, não é o que precisa ser e, conseqüentemente, deve produzir sinergias variadas, múltiplas, nem todas institucionalizadas. Espero que o fruto desta Estréia possa ser a Carta da Espiritualidade, da qual já falei muitas vezes. A espiritualidade é a motivação de fundo e o dinamismo mais poderoso do empenho de cada componente da Família Salesiana, aquela que pode garantir maior eficácia e incidência na ação educativa e evangelizadora.



3.1 As sinergias na missão



A referência à Carta de Comunhão e à Carta da Missão oferece-nos a oportunidade de refletir sobre as possíveis condições de sinergias na missão. Devemos ter presente, primeiramente, que já temos uma missão comum e a estamos realizando. É a missão suscitada e articulada pelo Espírito em diferentes serviços e iniciativas, em diferentes modalidades de intervenção, mas em convergência de objetivos, conteúdos e métodos, como se lê em todas as constituições, regulamentos ou estatutos dos diversos grupos. Isso foi obra do Espírito Santo, quando fez brotar e crescer do tronco salesiano um novo ramo com algumas das suas características específicas. O que nos deve levar a entender que a primeira condição para a comunhão e a missão comum é que cada grupo realize, com o maior esforço possível, a própria vocação e missão, que lhes infunda vitalidade contínua com fidelidade e criatividade. O Espírito articulou-nos em homens e mulheres, consagrados e leigos, presentes entre a juventude, os doentes, os povos a evangelizar etc. Se cada grupo realizar essa finalidade, com o espírito e os objetivos declarados no próprio estatuto e coerentes com a espiritualidade salesiana, já teremos realizada a missão salesiana.

A primeira grande ajuda e a melhor realização da Carta de Comunhão e da Carta da Missão é, pois, a consciência da complementaridade a serviço de uma grande missão, à qual devem seguir a abertura e a disponibilidade de apoiar e sustentar a missão comum da parte de cada grupo.

Nossos tempos permitem e exigem, todavia, novas expressões da missão comum. Há, atualmente, como sublinhamos nas Estréias dos últimos anos, causas transversais (como a família, a vida, a educação, os direitos dos menores, o problema da paz, a questão da mulher, a salvaguarda da criação) que nos podem ver empenhados em conjunto. Há, sobretudo, a solidariedade global, que se vai exprimindo em diversas formas e está em busca de adesões, declarações públicas, pressões sobre os organismos que orientam a vida das nações e do mundo. E há, ainda, novas possibilidades de coligação em rede e de comunicação; isso leva a várias formas de intervenção e a ativar sinergias que, antes, não eram possíveis. Queremos fazer frutificar as possibilidades ainda inexploradas na missão salesiana e colher as oportunidades que nos são oferecidas pelo nosso tempo, fazendo convergir capacidades adquiridas e criatividade inovadora.

Estou convencido de que a Família Salesiana apresentar-se-á com credibilidade na Igreja e será pastoral, espiritual e vocacionalmente fecunda para os jovens se conseguir trabalhar por eles em comunhão, qual verdadeiro Movimento. Não nos devemos esquecer de que o Movimento caracteriza-se por algumas idéias-força e um espírito comum. Mais do que num estatuto, é num espírito e numa práxis que se encontram e para os quais convergem os membros dos diversos grupos de um movimento. Trata-se de uma adesão mais vital do que formal! A partir desta perspectiva, o Movimento Salesiano é muito maior do que a Família Salesiana por incluir os próprios jovens, os pais de nossos destinatários, os colaboradores, os voluntários, os simpatizantes da obra salesiana, os benfeitores, também os não cristãos, como acontece em muitas partes do mundo, especialmente na Ásia, mas não só. São pessoas que participam parcialmente da missão ou do carisma salesiano. São eles os "Amigos de Dom Bosco". É no interior desse grande Movimento que a Família Salesiana está como núcleo animador.



3.2 Os recursos



Quais os recursos com que podemos contar?

  • Primeiramente, visamos à formação das pessoas e ao reforço das comunidades ou grupos.

  • Mas precisamos, também, da elaboração e aquisição de uma cultura ou mentalidade carismática comum, e para isso devem servir a Carta de Comunhão e a Carta da Missão.

  • O apoio organizativo é certamente útil, ma tem um valor apenas subsidiário, e deve ser adequado às exigências e situações concretas.

Continuamos a crer, então, que a Família Salesiana é, ainda hoje, antes de tudo, uma realidade carismática, cujos grandes recursos são o Espírito e a criatividade; tudo isso apoiado numa suficiente estrutura organizativa.

Quanto à missão, ainda há outro aspecto a sublinhar. Dizemo-nos corresponsáveis na missão. Devemos ter presente, contudo, que a missão, que se refere a vários campos (áreas, dimensões), com objetivos e espírito comuns, não implica necessariamente corresponsabilidade em todas as iniciativas ou em todos os territórios. À medida que se desce da visão do grande âmbito da missão à sua realização concreta, ver-se-á se convergem colaborações bilaterais, trilaterais, sem nos ancorarmos aprioristicamente em qualquer estrutura global que oriente preventivamente a totalidade. Convém ter um objetivo claro e seguir o curso da vida e da realidade, como repetimos no sexênio passado sobre o pensar globalmente e agir localmente, dando forte vitalidade às células, aos organismos essenciais, aos organismos intermédios e, finalmente, à estrutura última.



3.3 Alguns campos de colaboração



Os jovens

Todos nós procuramos trabalhar com o maior número de jovens com diversas iniciativas. Observamos que se vão consolidando entre os jovens, especialmente nos últimos tempos, os grupos juvenis que pretendem fazer uma caminhada de crescimento humano e de fé conforme o Sistema Preventivo que, nós o sabemos, não é só metodologia, mas também um modo de conceber os conteúdos. Neles formam-se os líderes, chamados de animadores, acompanhadores etc. Vai-se consolidando, de modo particular o Movimento Juvenil Salesiano (Articulação da Juventude Salesiana), para o qual convergem grupos juvenis nascidos e formados na Família Salesiana e que desejam fazer parte dela. É uma possibilidade oferecida a todos. Até agora, na animação do MJS/AJS há uma consistente colaboração entre Salesianos e Filhas de Maria Auxiliadora. Espero que no futuro se faça mais intensa a participação também dos Salesianos Cooperadores e dos Ex-Alunos, promovendo o MJS/AJS entre seus grupos juvenis.

Esta é, também, uma iniciativa concordada entre os ramos da Família Salesiana mais próximos entre si e mais presentes no campo juvenil. FMA e SDB têm, de fato, uma longa experiência, muitas obras e organismos de animação ativados há muito tempo. A participação, porém, está aberta a todos os outros. A participação acontece a partir de uma plataforma elaborada por ocasião de cada encontro ou acontecimento.

É útil, para os grupos juvenis, ter uma plataforma comum de formação humana, de caminhada de fé e proposta vocacional, porque tudo isso realiza a concepção educativa de Dom Bosco.

Há, então, sinergias já existentes e possibilidades de abertura a outros no Movimento Juvenil Salesiano (AJS), que sente já possuir uma consciência mundial. Ao caminhar pela Congregação, vi como a mensagem do Reitor-Mor enviada todos os anos de Turim, por ocasião da Festa de Dom Bosco, associe mundialmente os grupos presentes nos diversos continentes. Há, depois, um espaço juvenil no qual podemos educar os jovens também para as futuras sinergias e a futura solidariedade.

Demonstra-o o sucesso das Jornadas Mundiais da Juventude, que conseguem reunir, apesar das distâncias e despesas, jovens de todas as partes do mundo, pertencentes a grupos diocesanos, a grupos animados por institutos religiosos, pelos movimentos, ou simplesmente que se identificam com esse tipo de iniciativas.



A proposta vocacional

Relacionado ao tema do MJS/AJS há o da proposta vocacional, da orientação vocacional e do nosso testemunho. Sabemos que Dom Bosco, além de ter grande estima pelos leigos, exultava quando podia dar sacerdotes e consagrados à Igreja. Sendo verdade, de fato, que todos nós temos igual dignidade e igual chamado à santidade, é também verdade que existem na dinâmica temporal do reino de Deus vocações que movem particularmente a comunidade eclesial. É importante, então, que estejamos unidos também neste objetivo. Ao fazer que os nossos grupos ou os nossos jovens trilhem um caminho de formação humana e cristã, propomos-lhes o leque das vocações, evidenciando também o maior empenho da "sequela Christi" próprio de algumas vocações específicas.

A finalidade dos grupos juvenis, formados pelos ramos específicos da nossa Família, não é ter um bando de "filhotes" para a própria Associação. Nossa finalidade é a educação cristã e a orientação do jovem na vida. Precisamos saber fazer com que o apelo de Cristo chegue ao jovem, recordando que na dinâmica temporal do Reino existem vocações também de maior empenho. Precisamos ser capazes de suscitar nos jovens desejos de formação e disponibilidade, e de orientá-los para vocações de serviço e de grande significado (entre estas coloco também o voluntariado), tudo no realismo do Reino.



As Missões

A missionariedade é o terceiro campo no qual já estamos colaborando, campo que a solidariedade e cooperação atual podem alargar oferecendo novas possibilidades. Foi-se consolidando nas últimas expedições missionárias, com os religiosos, a presença de leigos solteiros, casais e até mesmo famílias inteiras. É belo sublinhar que, no interior da Família Salesiana existem grupos que incluem a missionariedade em sua mesma denominação.

A missionariedade tem, contudo, diversidade de expressões e iniciativas, especialmente em nosso tempo no qual se fala de solidariedade globalizada. Há novas possibilidades de empenho missionário. Há possibilidade de diversas formas de presença pessoal, de "gemellaggio" e de apoio à distância. Ao ver a diferença entre as diversas partes do mundo, penso no quanto seria belo se houvesse uma rede de "gemellaggios" capaz de veicular os recursos correspondentes às várias necessidades; e, onde houver forças disponíveis, estar abertos a colaborações temporárias ou definitivas. Isto fase de projeto e sucessivamente para a sua realização sinérgica.



O Boletim Salesiano

Há, ainda, um setor muito importante, no qual já estamos a colaborar: é o campo da comunicação na Igreja e na sociedade. Cada grupo tem o próprio órgão de comunicação interna, que depois difunde além do grupo. Sabem, porém, que há uma revista ou um órgão que nos representa a todos: o Boletim Salesiano. Dizemos que é um órgão para a Família Salesiana, para o Movimento Salesiano e para toda a opinião salesiana do mundo, que apresenta o ponto de vista da Família sobre as realidades que estamos a viver, e abre para o mundo uma janela sobre a realidade salesiana.

É verdade que o Boletim é gerido e levado adiante pela Congregação Salesiana. Seria supérfluo e pesado criar um grande organismo de representatividade. Vai-se dando sempre maior espaço à Família Salesiana no conselho de redação e vão-se apresentando as nossas realidades, mais do que "lotear" as páginas, o que não é oportuno. Da imagem que o Boletim consegue criar, todos nós recebemos algum benefício.



3.4 Visibilidade eclesial da presença salesiana como "Movimento"



Seria interessante agir sempre mais por meio de todas as sinergias e atuar sempre mais como Movimento tendo assim uma presença visível na realidade social e eclesial. Devemos superar dois perigos, não imaginários: de um lado, o protagonismo demasiadamente aclamado e, de outro, o absenteísmo injustificável. Mais do que uma obra de propaganda grandiosa ou afirmação declamada, deveria ser bem clara na Igreja local a nossa presença solidária com o Bispo e com os sacerdotes; deveríamos demonstrar a nossa capacidade de trabalhar por algumas causas, fazendo ver que não existimos em função de nós mesmos, mas da comunidade eclesial que, por sua vez, vive em função da salvação do mundo.



3.5 A cultura da Família Salesiana



Para que a cultura da Família, isto é, a visão e a mentalidade de trabalhar juntos passem a todos os ramos e à árvore inteira, é indispensável que os sócios de cada grupo estejam conscientes de pertencer a um vasto Movimento de pessoas, nascido do coração apostólico de Dom Bosco; e que estejam prontas para as sinergias, convergências, colaborações múltiplas, diversas, ágeis, atualizáveis. Não busquemos uma grande organização que defina ou ratifique a partir de cima o que se deve fazer, mas um vigoroso impulso de espiritualidade, capaz de vitalizar as células e os órgãos, para que eles criem depois as colaborações possíveis.

A partir desta perspectiva surge, como primeira tarefa, que todos leiam tanto a "Carta de Comunhão", quanto a "Carta da Missão". Ali se encontram as grandes ideias a transmitir e as grandes opções a fazer.

Entretanto, além do estudo desses documentos, será oportuno que os diversos grupos façam experiências de convivência, espiritualidade, fraternidade e colaboração. Essas experiências elevarão o nível de confiança recíproca e o apreço pelas possibilidades contidas no carisma e na Família Salesiana. O horizonte a alcançar é sempre passar da concórdia à comunhão de intenções, à colaboração e corresponsabilidade em projetos comuns no território social e eclesial.



4. Sugestões para a concretização da Estréia



Eis alguns passos a dar para que a Família Salesiana se torne de fato um vasto Movimento a serviço da salvação dos jovens.



4.1 Colaborar juntos na formação e no aprofundamento da mentalidade carismática.



Por isso nos esforçaremos para:

  • que todos os grupos da Família Salesiana façam da "Carta de Comunhão" e da "Carta da Missão" objeto de estudo e aprofundamento, a fim de aumentar em todos os seus membros a cultura de Família e a consciência de Movimento;

  • compartilhar as conclusões desse estudo no "Conselho" local e inspetorial da Família Salesiana, e, como conclusão, escolher algumas linhas operativas de partilha e sinergia a serviço da missão salesiana no próprio território.



4.2 Promover o trabalho compartilhado



Fazer um estudo em comum, entre os diversos grupos da Família Salesiana presentes no território, sobre a situação dos jovens de hoje, sobretudo ao redor dos grandes desafios da vida, da pobreza em suas diversas expressões, da evangelização, da paz, dos direitos humanos... e buscar:

  • caminhos que melhorem as iniciativas já em ato, mediante uma maior colaboração e um maior trabalho em rede;

  • novas iniciativas a promover com a contribuição específica dos diversos grupos presentes.



4.3 Um instrumento de comunhão: o Conselho local e o Conselho inspetorial da Família Salesiana



Dar mais consistência ao Conselho local e ao Conselho inspetorial da Família Salesiana, buscando a forma mais adequada de realizá-los, para que sejam não só ocasião de intercâmbio de ideias e experiências, mas, sobretudo um instrumento

  • para refletir em conjunto sobre os desafios da missão no próprio território e compartilhar algumas linhas fundamentais de resposta que cada grupo se esforçará por assumir segundo as suas possibilidades;

  • para buscar caminhos de colaboração ágil e bem articulada em projetos educativos e de evangelização, sobretudo a serviço dos jovens.



4.4 Algumas plataformas de colaboração e trabalho em rede a promover e desenvolver



  • A animação do Movimento Juvenil Salesiano (Articulação da Juventude Salesiana),

  • desenvolvendo nos diversos grupos juvenis animados pelos grupos da Família Salesiana o empenho de partilha e participação no Movimento Juvenil Salesiano (Articulação da Juventude Salesiana);

  • envolvendo-se no acompanhamento dos grupos e dos jovens;

  • compartilhando na caminhada formativa dos grupos um itinerário de educação à fé que os ajude a descobrir e assumir a própria vocação apostólica na Igreja e na sociedade.



  • A animação e promoção do Voluntariado salesiano, social e missionário entre jovens e adultos, como resposta salesiana aos grandes desafios do mundo juvenil atual, em particular dos jovens mais pobres e periclitantes.

  • A promoção de vocações sacerdotais, religiosas e laicais de especial empenho, a serviço da Igreja e, em particular, na Família salesiana, mediante:

  • a participação nas iniciativas vocacionais promovidas na Igreja local;

  • o testemunho da própria vivência como vocação e a apresentação das diversas vocações na Igreja e na sociedade, de modo especial na Família Salesiana;

  • uma particular atenção e acompanhamento dos jovens, com iniciativas adequadas, em sua caminhada de casal;

  • o apoio às famílias e aos pais em seu trabalho educativo, promovendo escolas de pais, grupos de casais etc.



Conclusão

Concluo com uma oração a Dom Bosco, pai carismático de toda a Família Salesiana, composta pelo P. Egídio Viganò. Parece mais do que nunca oportuna por ter um foco determinado e ser programática. E, como de costume, com uma narração ilustrativa da Estréia. São Paulo, ao falar da realidade da Igreja, faz sua a metáfora do corpo que "é um, embora tenha muitos membros, e os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo" (1Cor 12,12). Para falar da Família Salesiana, eu preferi sublinhar a unidade, a que se refere a imagem do corpo, com a vitalidade, o dinamismo do movimento; por isso, usei a imagem do bosque, também para ser coerente com a parábola inicial da semente que se torna árvore e da árvore que se torna bosque.



Eis a Oração da Família Salesiana:



São João Bosco,

Pai e mestre da juventude,

que, dócil aos dons do Espírito Santo,

deixaste à Família Salesiana

o tesouro da tua predileção

pelos "pequenos e pobres",

ensina-nos a ser

para eles, todos os dias,

sinais e portadores do amor de Deus,

cultivando em nosso espírito

os mesmos sentimentos de Cristo

Bom Pastor.

Pede para todos os membros da tua Família

um coração cheio de bondade,

constância no trabalho,

sabedoria no discernimento,

coragem para testemunhar

o sentido de Igreja e generosidade missionária.

Obtém do Senhor para nós

a graça de sermos fiéis

à aliança especial

que o Senhor fez conosco,

e faze que, guiados por Maria,

percorramos com alegria,

ao lado dos jovens,

o caminho que conduz ao amor.

Amém.



E eis a narração metafórica:

OS ABETOS



O uivo do lobo percorreu como um arrepio longo os flancos da montanha. Um cervo, que roía a erva gordurosa e tenra devido à umidade assustou-se, e partiu correndo, atravessando o bosque de pinheiros.

Os chifres imponentes do cervo tocavam levemente os ramos e batiam neles. Uma pinha grande e madura caiu de um ramo de abeto e precipitou-se pela encosta, chocou-se com uma rocha proeminente e acabou com rumor numa depressão úmida e bem exposta.

Um punhado de sementes foi lançado para fora do seu cômodo alojamento e espalhou-se pelo terreno.

"Ufa!" gritaram as sementes a uma só voz. "Aconteceu!"

"Conseguimos! Aqui não há esquilos e ratos, estamos fora de perigo".

Com entusiasmo começaram a germinar para cumprir a missão que ardia em seu pequeno coração e que é a missão de cada árvore: manter o céu ligado à terra. Por isso, as árvores colocam raízes profundas na terra e lançam ramos nodosos para o céu. Se as árvores não existissem, o céu já teria desaparecido.

As sementes começaram a aninhar-se no terreno, mas logo em seguida descobriam que o fato de serem muitas criava alguma dificuldade.

"Um pouquinho mais longe, por favor!"

"Cuidado! Você enfiou um broto no meu olho!"

E assim por diante. Em todo caso, debatendo-se e abrindo caminho, todas as sementes encontraram um lugarzinho para germinar.

Todas, menos uma.

Uma bela e robusta semente afirmou claramente as suas intenções. "Vocês parecem-me um bando de incapazes! Não tenho nada a ver com vocês. Sozinha, poderei ser uma grande árvore, nobre e imponente. Sozinha!"

Com a ajuda do vento, a semente conseguiu afastar-se dos seus irmãos e, solitária, plantou suas raízes no topo da montanha.

Depois de algumas estações, graças à neve, à chuva e ao sol tornou-se um magnífico jovem abeto que dominava o vale, onde seus irmãos, porém, tornaram-se um bosque que oferecia sombra e agradável repouso aos viajantes e aos animais da montanha.

Mesmo não faltando problemas.

"Fique parado com esses ramos! Você faz cair minhas agulhas".

"Você rouba-me o sol. Vá mais prá lá...".

"Será possível não desarranjar os meus ramos?"

O abeto solitário olhava-os irônico e soberbo. Ele tinha todo o sol e o espaço que desejava.

Certa noite de fim de agosto, porém, as estrelas e a lua desapareceram sob uma cavalgada de nuvens imensas e ameaçadoras. Sibilando e agitando-se, o vento descarregou uma série de rajadas sempre mais violentas, até que se abateu sobre a montanha uma devastadora tempestade.

Os abetos do bosque juntaram-se uns aos outros, tremendo, mas protegendo-se e sustentando-se mutuamente.

Quando a tempestade se aplacou, os abetos estavam extenuados pela longa luta, mas a salvo.

Do soberbo abeto solitário não restava senão um tronco desfeito e melancólico no cimo da montanha.

Na primavera sucessiva, os raios do sol acariciavam dezenas de tenros brotos que a brisa da tarde embalava emocionada. Entre os ramos dos abetos muitos pássaro e esquilos encontraram refúgio e superaram o inverno e, ao pé dos robustos troncos, cresciam plantas e flores de mil cores.

Era o presente que, sem desejá-lo, o vento e a chuva da tempestade tinham dado à montanha.



Queridos irmãos e irmãs, amigos todos, desejo-lhes um 2009 de graças e confio-lhes a tarefa de fazer realmente da Família Salesiana um vasto e solidário movimento de pessoas para a salvação dos jovens.



Com afeto, em Dom Bosco

P. Pascual Chávez Villanueva

Reitor-Mor

1 Bento XVI, Homilia durante a eucaristia da JMJ (Sydney 20.07.2008).

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