351-400|pt|358 A FS completa 25 anos

Juan Edmundo Vecchi



A Família salesiana completa vinte e cinco anos



Atos do Conselho Geral

Ano LXXVIII – janeiro-março, 1997

N. 358




1. Introdução. – 1.1. Uma história aberta ao futuro. – 1.2. A nova sensibilidade eclesial. – 1.3. Partir novamente das Constituições. – 2. A Família Salesiana: princípios constitutivos. 1. É um conjunto; 2. 2.1. Um conjunto; 2.2. Um conjunto de grupos; 2.3. Um esclarecimento necessário: a eclesialidade; 2.4. A exigência definitiva: ser grupos “instituídos”. – 3. A vida da Família Salesiana. 3.1. Participação vocacional do carisma de Dom Bosco; 3.2. Participação diversificada do espírito e da espiritualidade salesiana; 3.3. Cultivar o amor de predileção pelos jovens; 3.4. Títulos de pertença à Família Salesiana. – 4. O serviço à Família Salesiana. 4.1. A animação é um compromisso comunitário; 4.2. É trabalho de irmãos qualificados e disponíveis; 4.3. Um serviço salesianamente qualificado. – 5. Algumas perspectivas novas surgidas no CG24. 5.1. Os Amigos de Dom Bosco; 5.2. O Movimento Salesiano. – 6. Retornemos aos jovens. - Conclusão.




Roma, 1º de janeiro de 1997

Solenidade de Maria SS.ma Mãe de Deus




Queridos irmãos,


Escrevo-lhes no início de 1997, que lhes desejo feliz e fecundo pela presença do Senhor, sentida na vida comunitária e nos trabalhos pastorais.

Gosto de pensá-los empenhados na aplicação do CG24, que, para todos nós, representa o programa de trabalho dos próximos seis anos. Assim deixam-no entender as notícias que chegam das Inspetorias.

Nós, também, no Conselho Geral, procuramos concentrar a atenção em alguns pontos considerados como parte essencial das orientações capitulares.1



1. Introdução



O primeiro ponto é a nova relação a ser instaurada, de maneira orgânica, entre salesianos e leigos, a partir de algumas convicções interiorizadas e traduzidas na prática.

Veio-me, dessa reflexão, a ideia, apresentada em Conselho, de retomar com vocês o tema da Família Salesiana. Ela é o ambiente onde as relações entre salesianos e leigos adquirem maior significado. A Família é, em toda a sua riqueza e multiplicidade, o resultado da profundidade dessas relações.

Uma ocorrência significativa oferece-me também esta ocasião: o projeto de Família Salesiana, como o estamos levando adiante, completa vinte e cinco anos. Foi proposto pelo CGE 20, cujos documentos foram entregues à Congregação em janeiro de 1972. Podemos contemplar, pois, com uma visão de síntese, os inícios, a caminhada percorrida, seu estado atual, e descobrir juntos potencialidades ainda latentes, espaços novos a serem explorados, expressões a serem criadas.

Fui ainda estimulado pela iniciativa das FMA de instituir em seu Conselho Geral uma figura para a Família Salesiana. Essa sua “nova” presença de responsabilidade comunitária no cenário da Família não só lhes dará um desenvolvimento quantitativo, mas aumentará também a qualidade de que são portadoras como mulheres, consagradas, salesianas.

É justamente este o momento para uma pausa de reflexão e para um reinicio, com visão mais ampla e envolvimento mais geral.

A isso, de sua parte, leva-nos o CG24 quando projeta um sujeito responsável mais alargado da missão salesiana, que nos cabe convocar, tornar consciente e acompanhar.

Voltando, pois, a propor-lhes o tema da Família Salesiana, não enfrento um ponto “particular” do CG24, mas uma perspectiva de síntese e uma chave de compreensão adequada. A Família Salesiana será o nosso principal campo operativo como o foram, em outros períodos, a comunidade salesiana ou os ambientes de educação.



1.1. Uma história aberta ao futuro



O fato e a ideia de Família remontam a Dom Bosco e fazem parte do seu carisma. Contribuem, por isso, para dar uma fisionomia à sua espiritualidade, que tem na missão sua fonte e o ponto mais expressivo de manifestação.

Impressiona reler a descrição da vida do Oratório em seus primeiríssimos anos. Dom Bosco se vê sozinho com uma massa de jovens. Os colaboradores, assustados pelo trabalho e ainda mais pelo tipo de jovem escolhido pela sua caridade pastoral, abandonam-no. Mas jamais desaparecem dele a vontade de reunir jovens e adultos ao seu redor. Ele percebe a importância de agregar forças para a missão que lhe foi confiada. Em vez de desistir diante das dificuldades, tenta outra vez. Envolve na Obra dos Oratórios pessoas de diversas orientações, movidas por um desejo comum de ir ao encontro do problema dos jovens em perigo. São homens e mulheres, profissionais e gente modesta, políticos e eclesiásticos, catequistas e também colaboradores com trabalhos domésticos.

Com a fundação dos três grupos - Salesianos, Filhas de Maria Auxiliadora e Cooperadores - ele dá corpo à intuição inicial, conforme lhe sugeriam e consentiam os tempos da Igreja e da sociedade civil.

A Congregação conservou a intuição de Dom Bosco e expandiu as suas realizações. Basta recordar as “renovações” periódicas e a difusão dos cooperadores, a consolidação e a extensão da associação dos ex-alunos e o surgimento do Instituto das Voluntárias de Dom Bosco.

Novas expressões do espírito salesiano cresciam ao redor do núcleo inicial, e variava também a relação entre os grupos originários, salva sempre a referência a uma única pertença espiritual.

Chegamos assim à época do Concílio Vaticano II. A Congregação Salesiana, chamada a reler as próprias origens em vista da renovação desejada pela Igreja, chega à tomada de consciência de que «as atuais urgências colocam em termos novos o problema da unidade e da comunhão» entre os grupos que se referem a Dom Bosco como Fundador2.

Julgo indispensáveis as afirmações do CGE para entender a história e continuar o empreendimento. Apresento, por inteiro, o texto a que me refiro a fim de oferecer algumas orientações a partir das perspectivas enunciadas então, que hoje devem ser aprofundadas. Trata-se de um “Ato de refundação”, como um decreto constitutivo no qual são catalogados e correlacionados os fatos que fundam a Família Salesiana.

«O contexto em que se move hoje a realidade da Família Salesiana e do qual devem ter consciência os membros que a compõem é o seguinte:

- a Família Salesiana é uma realidade eclesial que se torna sinal e testemunho da vocação de seus membros para uma missão particular, segundo e espírito de Dom Bosco;

- a Família Salesiana exprime - na linha de quanto a Igreja disse de si mesma - a comunhão entre os diversos ministérios a serviço do povo de Deus; e completa as vocações particulares para que seja manifestada a riqueza do carisma do Fundador;

- a Família Salesiana desenvolve uma espiritualidade original de natureza carismática que enriquece todo o Corpo da Igreja e se torna modelo pedagógico cristão todo particular.

A ‘Família Salesiana’ vista no mistério da Igreja, deverá definir sua identidade, sua missão e suas formas à luz das dimensões essenciais da Igreja; isto pede que se fale de vocação, missão, serviço, testemunho, comunhão, historicidade e renovação permanente como componentes essenciais desta família.

A amplitude extraordinária e a complexidade dos problemas juvenis hodiernos levam o nosso zelo a acentuar as formas de distribuição das forças operantes neste setor e a sua colaboração recíproca. Não se trata somente de uma simples “estratégia da ação” em nível humano, mas de construir juntos um “futuro” à luz do Evangelho, com o dinamismo da esperança cristã e sob o impulso da ação de Deus que realiza o seu Reino na história humana».3

Dessa tomada de posição originou-se um projeto. O esforço de realizá-lo marcou a história dos últimos decênios. Desde então fez-se o levantamento dos grupos; aqueles que já estavam ligados a nós foram renovados, consolidados e expandidos; outros grupos pediram formalmente a pertença e outros ainda nasceram justamente na fecunda fase do pós-Concílio. Teve início o funcionamento do conjunto com uma nova forma de comunicação: mais frequente, mais orgânica, mais substancial e unitária, mais desejada e procurada. Assim, a realidade da Família Salesiana entrou na consciência da Congregação e dos grupos com ela relacionados e adquiriu maior visibilidade. Disso são testemunhas a vasta literatura e as muitas iniciativas em nível mundial e inspetorial.

Aos poucos, à medida que se renovavam outros aspectos da nossa vida, a Família aparecia com maior clareza, com maiores responsabilidades e com novas possibilidades. O projeto educativo-pastoral (CG21) assim a supunha e convocava para uma ação mais extensa e eficaz em favor da evangelização dos jovens. E, para o caminho de fé desses mesmos jovens, o CG23 considerava indispensável que os salesianos se dedicassem à animação da Família Salesiana juntamente com a comunidade educativa.

Quem sabe, inicialmente, tenhamos sentido algum desconforto ao falar de Família Salesiana. Com o passar dos anos, o aprofundamento da idéia e a experiência positiva, no-la tornaram familiar. Hoje não podemos dispensá-la.

Entretanto precisamos passar das declarações de intenções e das ricas afirmações doutrinais ao empenho operativo mais aberto e criativo. Surgiram, com efeito, interrogações fecundas e abriram-se perspectivas inesperadas sobre o desenvolvimento da Família Salesiana. Provêm de quanto vivemos nos últimos anos, da reflexão acumulada e particularmente do confronto feito no último Capítulo Geral.



1.2. A nova sensibilidade eclesial



A caminhada feita pela Família Salesiana insere-se no caminho da Igreja, e reflete-o. Para entender o que hoje nos é pedido e o que nos espera no futuro próximo, precisamos olhar para as grandes orientações que se vão esboçando na Igreja. Apresento apenas as mais atinentes ao nosso tema e faço-o velozmente porque as considero bem presentes à sua atenção.

João Paulo II está encaminhando toda a comunidade eclesial às fronteiras da nova evangelização. A leitura atenta do seu magistério dá ideia do alcance e dos aspectos mais urgentes. A nova evangelização comporta a presença dos crentes, capaz de testemunhar alguns valores indispensáveis e particularmente em perigo no mundo de hoje: a dimensão espiritual, a ética, a vida, o amor, o sentido de Deus;4 trata-se de um empenho integral da comunidade cristã no anúncio de Cristo, na promoção humana e na inculturação do Evangelho.

Os Sínodos dos Bispos e as Conferências dos diversos episcopados sublinharam a urgência de um envolvimento mais responsável dos leigos no projeto de evangelização e na animação das comunidades cristãs; urgência que, de outro lado, já irrompia espontaneamente da consciência da Igreja. A apresentação mais completa nos é dada pela Exortação apostólica Christifideles laici. Ela apresenta-nos de novo algumas preocupações já presentes em nosso projeto educativo pastoral e que hoje se tornaram mais urgentes, justamente pelo maior envolvimento dos leigos na missão salesiana.

Refiro-me, por exemplo, ao intercâmbio que se deve favorecer entre as diversas vocações; às urgências formativas diante dos desafios da cultura; ao diálogo a ser desenvolvido entre pessoas de diversas confissões cristãs ou de diversas religiões; ao papel da mulher e à sua contribuição ao trabalho educativo; à espiritualidade e à convivência social. O CG24 ocupou-se disso pormenorizadamente bastando indicar novamente às comunidades a sua leitura atenta.

Outra realidade que desejo trazer à sua atenção é o surgimento e a difusão de movimentos de espiritualidade. Trata-se de um florescimento que se impõe e nos interroga sobre a força e os caminhos do Espírito. Tais movimentos respondem às questões de sentido, de interioridade e de vida espiritual que afloram vigorosos em nosso contexto tecnológico e secular. Correspondem aos caminhos da nova evangelização e à emergência do laicato.

Não poucos deles estão ligados a Institutos de vida consagrada em cuja espiritualidade alimentam-se ou dos quais tiveram origem como expressão de radicalidade e de serviço. Reconhece-o a Exortação apostólica Vita consecrata: «Estes (leigos) são convidados a participar mais intensamente na espiritualidade e missão do próprio instituto. Pode-se dizer que, no rastro de experiências históricas como a das diversas ordens seculares ou ordens terceiras, se iniciou um novo capítulo, rico de esperanças, na história das relações entre as pessoas consagradas e o laicato».5

Estas e outras tendências devem ser vistas e integradas em nossa experiência pessoal e de comunidade não como fatos casuais, separados uns dos outros, mas de maneira unitária como sinais de uma caminhada que a Igreja nos convida a fazer.



1.3. Partir novamente das Constituições



No interior da vida eclesial, tão rica de estímulos e modelos, encontramo-nos como Família de Dom Bosco para reconfirmar algumas certezas e fazer frutificar alguns dons que são parte integrante da nossa vocação.

Sentimo-nos felizes por ter escrito em nossas Constituições alguns artigos cujo cumprimento nos colocou na onda da Igreja. Eles conservam o frescor dessa sintonia e transmitem a urgência de realizar alguns projetos para responder às novas necessidades da juventude em todas as latitudes.

As Constituições relacionam internamente missão e Família. Sobre a nossa missão dizem que entendemos «ser na Igreja sinais e portadores do amor de Deus aos jovens, especialmente aos mais pobres»;6 «a vocação salesiana situa-nos no coração da Igreja e nos põe inteiramente a serviço de sua missão»;7 «abertos às culturas dos países em que trabalhamos, procuramos compreendê-las e acolhemos seus valores para encarnar nelas a mensagem evangélica».8 Causa admiração a amplitude com que a missão é projetada e a profundidade do seu sentido. Corresponde-lhe uma outra idéia original de Dom Bosco: um conjunto de forças a serem agregadas para realizar essa missão em toda a sua extensão, segundo um espírito característico. É expressa no artigo 5 das Constituições, um daqueles textos que, meditado, deveria ficar literalmente registrado em nossa memória.

«De Dom Bosco origina-se vasto movimento de pessoas que, de várias maneiras, trabalham para a salvação da juventude. Ele próprio, além da Sociedade de S. Francisco de Sales, fundou o Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora e a Associação dos Cooperadores Salesianos que, vivendo no mesmo espírito e em comunhão recíproca, continuam a missão iniciada por ele, com vocações específicas diversas. Juntamente com esses grupos e outros nascidos posteriormente formamos a Família Salesiana. Por vontade do Fundador, temos nela particulares responsabilidades: manter a unidade do espírito e estimular o diálogo e a colaboração fraterna para mútuo enriquecimento e maior fecundidade apostólica. Os ex-alunos fazem parte dela em razão da educação recebida. Sua pertença torna-se mais estrita quando se comprometem a participar da missão salesiana no mundo».9

Tendo participado da pesquisa sobre a Família Salesiana, anterior à redação dos textos que estão hoje em nossas mãos, recordo essa inspiração surgida no CGE como dom do Senhor para a renovação da Congregação. É quanto exprimia o Reitor-Mor P. Luigi Ricceri apresentando os Atos do referido Capítulo Geral:

«Eis-nos aqui frente a outra grande diretriz no caminho de nossa renovação para estes próximos anos...

É urgente restituir às nossas comunidades a dimensão de núcleo animador de outras forças espirituais e apostólicas: disso tirarão elas mesmas grandes vantagens espirituais e apostólicas.

Foi essa uma das características da caridade pastoral de Dom Bosco».10

Nessas bases desenvolveu-se a reflexão e progrediu a práxis nos anos seguidos ao Capítulo Especial. As cartas circulares do P. Egídio Viganò, dedicadas à Família Salesiana em seu conjunto e em seus diferentes Grupos, sustentaram-na e impeliram-na. Constituem um patrimônio de onde beber e um ponto de referência para ulteriores desenvolvimentos.



2. A Família Salesiana: princípios constitutivos



Acontece-me com frequência, nos encontros com irmãos e comunidades, ouvir perguntas sobre a natureza da Família Salesiana: o que é, o que compreende, em base a quais critérios ela se alarga ou não. Estes 25 anos produziram esclarecimentos e certezas a respeito.

Nascem, porém, sempre novos questionamentos das situações que a Congregação vai encontrando na difusão do carisma de Dom Bosco em novos ambientes de atividade e em novos territórios. Torna-se necessário dar-lhes respostas segundo o princípio da fidelidade criativa.

É adquirida a convicção que Dom Bosco, guiado pelo Espírito do Senhor, entendeu dar início não só a algumas Congregações, mas a uma Família espiritual, em que se deve sempre esperar novos nascimentos e novas parentelas. Sua figura eclesial é a de Fundador de um vasto movimento espiritual e apostólico.

A Família que a ele se refere tem uma identidade e, por isso, critérios ou princípios que regem a sua constituição. Recordo-os brevemente.





2.1. É um conjunto.



Entendemos por Família Salesiana o conjunto de grupos eclesiais fundados por Dom Bosco e daqueles que, com eles, o Reitor-Mor reconhece como portadores do carisma de Dom Bosco.

O “conjunto” não comporta uma “organização”, com poderes e tarefas, superior aos próprios componentes. Diz, porém, que entre eles vigora uma ligação, uma relação, uma convergência, um desejo de livre colaboração, numa palavra, um espaço amplo de comunhão que compreende os grupos interessados.

Não é indiferente, porém defini-la como um conjunto e insistir em seu significado.

De um lado, a afirmação reconhece em Dom Bosco uma fecundidade que vai além da Congregação Salesiana. Não somos os únicos a dirigir-nos a Dom Bosco com o título de Pai. Chamamo-lo assim juntamente com outros, com os quais é necessário sentir-se reciprocamente irmãos e irmãs, filhos e filhas, todos juntos.

De outro lado, no que diz respeito aos indivíduos, a afirmação diz que, realizando num grupo o carisma de Dom Bosco, entra-se a fazer parte viva da Família inteira. Quando, como salesiano, emito a profissão religiosa, sou incorporado à Congregação e ao mesmo tempo, em força desta pertença, à Família Salesiana de Dom Bosco. O que vale para nós salesianos vale para os demais grupos.



2.2. Um conjunto de grupos.



Deve-se compreender em suas consequências a afirmação de que a Família Salesiana é um conjunto de grupos. A afirmação exprime uma condição de tipo institucional; antes, porém, e mais substancialmente, apresenta uma característica carismática que tem manifestações originais na experiência de vida e de trabalho dos salesianos.

É, com efeito, uma opção salesiana típica atuar através de “grupos”, ambientes, comunidades, e não só atingindo indivíduos ou desenvolvendo relações interpessoais. Essa modalidade refere-se ao espírito de família, ao nosso modo de viver a Igreja e à dimensão social da missão.

As Constituições, descrevendo o conteúdo do “nosso serviço educativo pastoral”, insistem com determinação nessa opção carismática, que se aplica não só ao trabalho com os jovens, mas a toda intervenção nossa: «Encaminhamos os jovens a fazer experiência de vida eclesial mediante o ingresso e a participação numa comunidade de fé. Por isso, animamos e promovemos grupos e movimentos de formação e de ação apostólica e social. Neles, os jovens crescem na consciência das próprias responsabilidades e aprendem a dar a sua contribuição insubstituível à transformação do mundo e à vida da Igreja, tornando-se eles mesmos os primeiros e imediatos apóstolos dos jovens».11

Aplicado à Família Salesiana, isso quer dizer que devemos trabalhar para formar grupos de trabalho e não só para ter disponíveis algumas pessoas que se envolvem individualmente. É preciso verificar o quanto viva seja em nós a vontade de “agregar”, que levava Dom Bosco a propor e realizar múltiplas associações, entre jovens e adultos: a Sociedade da alegria, as Companhias, a Sociedade de mútuo socorro, os devotos de Maria Auxiliadora, sodalícios variados, além dos que nos são mais conhecidos.

O grupo atua com autonomia. Torna-se lugar natural do crescimento de cada membro: tranquiliza mais facilmente sobre a continuidade do estilo e dos projetos a serem realizados. Passam através do grupo os conteúdos formativos e apostólicos que nos qualificam.

Do ponto de vista institucional, a afirmação “a Família Salesiana de Dom Bosco é constituída por grupos” indica que a entrada nela se liga necessariamente à pertença a um dos grupos. A inserção imediata de indivíduos é impensável. A Família Salesiana, com efeito, não é puro fato de amizade, admiração, simpatia e colaboração ocasional entre pessoas. A opção pessoal, a vontade de participar de alguma coisa e o desejo de pertença devem amadurecer em experiência vividas de corresponsabilidade espiritual e operativa.

Aqui encontram resposta uma série de interrogações que podem nascer entre irmãos e leigos: «Por que os colaboradores não fazem parte da Família Salesiana?». Ou ainda: «Por que os professores não podem ser da Família Salesiana?». Enfim: «Por que os pais de nossos garotos não são considerados da Família Salesiana?».

A resposta é sempre a mesma: «Comecem por constituir-se em grupo. Formem associações com garantias de continuidade. Verifiquem que à base de sua identidade e agregação exista a “vocação” salesiana (de professor, colaborador, pai-educador), como diremos mais adiante».

Isso tudo, é fácil entendê-lo, mais do que um limite comporta a condição de desenvolvimento e o estímulo para “uma nova estação associativa” a fazer florescer entre nós.



2.3. Um esclarecimento necessário: a eclesialidade.



É preciso explicar um outro elemento para o esclarecimento que procuramos dar.

Dizia antes: Entendemos por Família Salesiana o conjunto de grupos eclesiais fundados por Dom Bosco e daqueles que o Reitor-Mor reconhece portadores do carisma de Dom Bosco.

Comentei sobre a exigência do conjunto, do grupo.

Não basta, porém, ser um grupo qualquer. Para pertencer à Família de Dom Bosco exige-se o reconhecimento eclesial, ou seja, o grupo deve ter cidadania na Igreja em que vive e trabalha, oferecer-lhe algo de congenial ao espírito de Dom Bosco em termos de comunhão e de trabalho apostólico.

Poderia soar como afirmação discriminatória, redutiva das potencialidades da Família Salesiana. Mas, ao contrário, é uma necessária declaração de identidade, para superar confusões e evitar mal-entendidos costumeiros. Daí resulta realmente uma delimitação de campo, que consente a definição do trabalho a ser realizado, dos valores a serem cultivados, das exigências a serem mantidas. Ela deve ser também levada em consideração a propósito de quem tendesse a alargar os espaços de maneira indiscriminada, ou de grupos de não católicos, quando exigissem uma plena pertença à Família de Dom Bosco.

O que foi dito, porém, deve ser composto com outras considerações, igualmente importantes, para um justo equilíbrio.

Primeira: a pertença é real mesmo quando ainda é apenas inicial. Grupos há que estão percorrendo um caminho de consolidação numérica, de identidade e de organização à espera do reconhecimento eclesial. Encontram-se na mesma condição em relação à Família Salesiana, que os acompanha e apoia com interesse.

Segunda: a pertença é, sim, um reconhecimento sancionado pelo Reitor-Mor, mas é também uma realidade vivida pelos grupos, antes ainda de ser formalmente declarada. Os dois elementos - realidade vivida e reconhecimento público - são necessários para não fazer da pertença um fato formal e nem sequer apenas um desejo privado.

E ainda uma terceira consideração: pode acontecer, e de fato acontece no interior de grupos e associações reconhecidos pela Igreja, a presença de pessoas de diversas confissões e religiões, e, por consequência, intercâmbio ecumênico, colaboração e encontro inter-religioso: é o caso da associação dos ex-alunos, que poderia ter correspondência em outras agregações semelhantes



2.4. A exigência definitiva: ser grupos “instituídos”.



A experiência dos salesianos localizados em diversos contextos, a reflexão dos Capítulos Gerais, as orientações dos Reitores-Mores, que sempre exerceram na Família Salesiana um papel de orientação e definição, sustentaram a exigência de os grupos serem “instituídos”, isto é, reconhecidos pelo Reitor-Mor com fórmulas apropriadas.

A Carta de Comunhão na Família Salesiana de Dom Bosco diz no artigo 9: «O Reitor-Mor é sucessor de Dom Bosco e um vínculo ininterrupto liga-o à sua pessoa e torna-o idôneo a representá-lo hoje de maneira viva.

É o centro de unidade de toda a Família. Oferece, de fato, o exemplo e o ensinamento que garantem a fidelidade ao espírito e o estímulo à participação do carisma salesiano. A sua é uma função animadora e promotora, que tece a unidade e garante, na variedade das vocações específicas, a fidelidade ao espírito e a coordenação das iniciativas. A sua não é uma tarefa de governo; é sobretudo um serviço vital de animação.

O Reitor-Mor é o pai de todos os que colaboram na missão de Dom Bosco. Ele dilata o espaço de sua paternidade, que permanece para ele, como o foi para Dom Bosco, uma característica essencial. A paternidade exige bondade, sentido de responsabilidade diante do crescimento de cada um, guia na fidelidade carismática, empenho para a fecundidade da vocação salesiana em todas as suas expressões. “O vosso Reitor cuidará de vós e da vossa salvação eterna”, deixou escrito Dom Bosco».12

Não pretendo delongar-me aqui na apresentação do nível operativo que resulta dessas afirmações. Será objeto de ulteriores indicações práticas em sucessivos números dos Atos do Conselho Geral, porque retomaremos e tornaremos a propor os critérios para o reconhecimento de pertença à Família Salesiana dos grupos que farão seu pedido.

Sinto como compromisso a mim confiado por Dom Bosco ajudar a Família Salesiana a crescer em número e qualidade. Estou plenamente convencido (é a minha fé... salesiana!) da atualidade e fecundidade da experiência educativa e espiritual do nosso Pai e Fundador e da função insubstituível que nela tem a sinergia dos dons e das forças representadas pela Família.

O reconhecimento explícito dos grupos dos quais falamos ajuda a realizar uma Família consciente de ser una e unida, com as mesmas características, no mundo todo. Não podem existir várias Famílias de Dom Bosco construídas de acordo com critérios individuais: existirão, e diria afortunadamente, muitos grupos que a ela pertencerão. Haverão de declarar e assumirão todos a ligação, com as relativas consequências, que garante a unidade, a convergência, a corresponsabilidade, o empenho missionário próprio do estilo de Dom Bosco.



3. A vida da Família Salesiana



A Família Salesiana não deve ser considerada, antes de tudo, como um fato jurídico. Ela possui uma dimensão organizacional própria, que não pode ser descurada, mas é e deve ser vivida como uma realidade espiritual. A reflexão sobre este aspecto é complementar à anterior. Dá à Família a sua fisionomia característica. Como também serve para responder de forma exaustiva às interrogações que as comunidades ouvem em seu trabalho de animação.

É possível compreender como se configura esta dimensão espiritual considerando alguns traços particulares.



3.1. Participação vocacional do carisma de Dom Bosco.



Os membros da Família Salesiana sentem e realizam uma vocação, precisamente a salesiana.

A expressão, em alguns casos, pode provocar perplexidades e dúvidas. Talvez se pense que exista apenas um fato associativo, que envolve vocações simplesmente cristãs.

Esclareça-se então que a vocação salesiana não se sobrepõe e não substitui a vocação cristã: ao contrário. Dá-lhe o tom original e a intensidade. Somos salesianos enquanto cristãos. Dizem as Constituições: «Nós, Salesianos de Dom Bosco (SDB), formamos uma comunidade de batizados que, dóceis à voz do Espírito, intentam realizar numa forma específica de vida religiosa o projeto apostólico do Fundador...».13

Poderíamos parafrasear um tanto audaciosamente: «Nós, Família Salesiana de Dom Bosco, formamos um conjunto de batizados, reunidos em grupos distintos e interligados pela comum resposta ao Espírito do Senhor, para viver na Igreja uma espiritualidade original e realizar um projeto apostólico para a salvação da juventude em perigo».

O Capítulo Geral Especial havia-nos introduzido nas mesmas reflexões. Apresento o seu texto porque, embora de difícil leitura hoje, relaciona-se com as concepções do CG24 e lança sobre os 25 anos transcorridos uma ponte que destaca o desenvolvimento homogêneo pelo qual passou a Família Salesiana: «Segundo o pensamento e o coração de Dom Bosco, a Família Salesiana é UNA! A unidade original dessa Família tem sua raiz última na comunhão de espírito e missão ao serviço integral da juventude e do povo. Realiza deste modo, em nível superior, uma verdadeira comunidade, em que todos os membros estão integrados segundo os dons recebidos, e também conforme as funções específicas e as diversas formas de vida possíveis no seio da Igreja. Isto quer dizer, e importa reconhecê-lo com lealdade, que a vocação salesiana é “salesiana” antes de ser “religiosa”. Quer dizer que o carisma salesiano ultrapassa os limites da nossa Congregação (...). Esta é a verdadeira realidade renovadora de que devemos tomar seriamente consciência, se quisermos pensar num relançamento verdadeiro e desafiador...».14

Como interpretar aquele “antes” tão evidenciado no texto de fundação da Família Salesiana?

Antes de tudo, parece dar a entender que, historicamente, a vocação salesiana manifestou-se num conjunto de pessoas antes que a “Congregação Salesiana” fosse constituída.

Recorda-nos também que hoje as experiências salesianas são variadas: vida consagrada, estado laical, consagração secular, condição masculina e feminina; mas que à base de todas há um elemento comum. A vocação salesiana é, pois, mais extensa que qualquer uma das especificações individuais.

Pode indicar enfim, uma orientação de serviço para nós salesianos: dar atenção, empenhar-nos para que a Família cresça e não nos limitarmos a só olhar as possibilidades da Congregação.

Quanto trabalho ainda nos resta a realizar para tornar as comunidades salesianas conscientes desta perspectiva tão interessante e desafiadora! Que trabalho de formação há também a empreender para fazer com que os membros dos diversos grupos, que já participam da Família Salesiana ou o serão amanhã, vivam uma vocação autenticamente salesiana!

A solicitude exigida hoje da comunidade salesiana, como núcleo animador, consiste em ajudar aqueles que se aproximam de nós a descobrirem a própria vocação, compreendida a vocação salesiana. Isso comporta a superação de certa relutância em propor aos nossos colaboradores o compromisso de gastar a própria vida com Dom Bosco.

Encontra aqui o seu lugar o apelo tantas vezes expresso, em diversos documentos e encontros, repetido também no CG24,15 de uma ação comum pela promoção das vocações salesianas. Cada pessoa, depois do necessário discernimento, escolherá onde se colocar na Igreja de Deus e como viver o próprio batismo. Mas não podemos excluir a priori que, movida pelo Espírito, decida por alguma das expressões da vocação salesiana: ser SDB, ser FMA, fazer a promessa de Cooperador, escolher a vida secular consagrada, ou outro gênero de vida nos grupos da Família.

Nenhum grupo, por outro lado, poderá considerar subtraído a si um membro, quando, feito o discernimento, ele pedir a agregação numa associação diversa daquela em que vinha amadurecendo pelo costume da frequência ou pela educação.



3.2. Participação diversificada do espírito e da espiritualidade salesiana.



A vocação como fato pessoal refere-se sempre a um espírito e a uma espiritualidade que orientam a existência. A vocação salesiana deverá reconduzir-nos ao espírito e à espiritualidade salesiana.

Não entro nas discussões acadêmicas, ao falar de espírito e de espiritualidade. Estamos todos ao par das dificuldades encontradas quando se deseja definir os dois âmbitos de maneira precisa e delimitada.

O Capítulo Geral Especial optou por usar os dois termos de forma indistinta. O comentário ao capítulo das Constituições sobre o “espírito salesiano” é introduzido declarando que para sua utilização prática feita por nós, os dois termos são permutáveis.16

Explica os esforços que ainda estamos fazendo. «Notamos, para sermos exatos, que este documento não visa a dar apresentação perfeita nem definitiva do espírito salesiano. Constitui tão somente um esforço de resposta a um pedido que hoje no seu conjunto a Congregação está fazendo. A experiência e o estudo nos ajudarão a completar o nosso esforço».17

O espírito, pela sua natureza, é participado diversamente pelos grupos e pessoas, enquanto cada qual o percebe e assume conforme a própria vocação específica. Não só. Deve-se considerar ainda a história pessoal: a maneira como cada um faz frutificar aquilo que recebe como dom e o quanto vai conquistando com o próprio esforço. Isso já se aplica à vocação cristã, que é única, mas vivida de forma diversa por quem assume o estado celibatário e por quem se casa, por quem se torna ministro ordenado e por quem se consagra na vida religiosa. E assim por diante.

Referindo-nos à vocação salesiana participada por todos os que pertencem à Família Salesiana, pode-se falar de salesianos SDB, de salesianas FMA, de Cooperadores salesianos, de Voluntárias de Dom Bosco e de outras realizações possíveis. Configura-se assim a diversidade entre os grupos da mesma Família Salesiana: diversidade que não estabelece privilégios, mas exclui também o nivelamento que considera a dimensão prática da denominação salesiana única e igual para todos.

Entretanto, através das diversidades, participamos do mesmo espírito salesiano. Uma expressão do Capítulo Geral Especial recorda-nos que «A peculiaridade do “espírito salesiano”, enquanto dá fundamento à nossa unidade, constitui a alma da renovação pós-conciliar, não só dos salesianos, mas também de todos os membros da “família salesiana”».18

As Constituições ou os Estatutos dos Grupos da Família Salesiana apresentam uma convergência sobre o espírito salesiano que impressiona pela clareza e pela profundidade.

Prova disso é o apelo sobre o Sistema Preventivo. A razão, a religião e o carinho recebem modulações originais, quanto o são os dons do grupo que se exprime.

É essencial reconhecer esse dado, porque transforma a simples afinidade em acolhida mútua, em busca recíproca, em vontade de intercâmbio, em dom e oferta. O espírito de Dom Bosco e a espiritualidade salesiana tornam-se assim o fundamento da comunhão na Família. Encontram-se no princípio, ao longo da caminhada e à conclusão de sua organização.

A tarefa mais importante de animação que podemos realizar como salesianos de Dom Bosco é justamente a de comunicar o seu espírito salesiano e aprofundar a espiritualidade que faz referência a São Francisco de Sales.

O CG24 insistiu muito na dimensão laical da espiritualidade salesiana, considerando-a um aspecto fundamental na relação de corresponsabilidade entre nós e os leigos, particularmente os da nossa Família. Convém dar atenção especial ao desenvolvimento apresentado pelo documento capitular;19 e procurar traduzi-lo na prática quotidiana, através dos itinerários indicados.

Relevo particular foi dado, em relação à espiritualidade, ao lema Da mihi animas. É indispensável entender o seu significado e a sua dimensão para evitar equívocos sobre o insistente apelo à espiritualidade. Consideraram-no “centro” iluminador e energia movente do espírito salesiano todos os Reitores-Mores, que lhe dedicaram comentários sintéticos, mas estimulantes. Mantém a nossa busca espiritual no justo equilíbrio e coloca-a no espaço onde se pode exprimir: o educativo-pastoral.

O P. Egídio Viganò deixou este comentário: «Trata-se de uma profundidade espiritual que contempla Deus como enamorado do homem: Pai das misericórdias, Filho que se encarna para salvar a humanidade, Espírito Santificador vivo entre nós para transformar a história.

Tão logo a oração e a contemplação de um coração salesiano concentram-se no Mistério, movem imediatamente o coração, do mesmo interior da sua união com Deus, a ponto de tornar-se totalmente disponível para a atividade apostólica.

Este olhar fixo sobre a face de Deus suscita no orante uma fonte irreprimível de caridade pastoral (...).

Isso vale para os consagrados, e também para os demais membros da Família, particularmente para os Leigos, que deveriam entender e assimilar sempre mais a originalidade e a riqueza desta interioridade (...).

Dedicação, portanto, à profundidade espiritual, maior sensibilidade ao Mistério e mais intenso cuidado da caridade apostólica».20

Em síntese, o Da mihi animas e o Sistema Preventivo exprimem os traços do espírito de Dom Bosco e da espiritualidade salesiana: paixão pastoral e sentido educativo.





3.3. Cultivar o amor de predileção pelos jovens.



Outro traço que distingue e qualifica a vida da Família Salesiana de Dom Bosco é a participação na missão juvenil e popular.

A fórmula com que é indicada a exigência de trabalhar pela salvação dos jovens, particularmente daqueles que vivem expostos aos perigos, contém duas referências: predileção pelos jovens, participação na missão juvenil e popular.

Todos os grupos cultivam a predileção pelos jovens, embora cada um possua, por força da própria identidade, destinatários particulares e modalidades específicas de evangelização.

Podemos esclarecer o que é e o que comporta essa predileção com algumas indicações essenciais sem pretensão de esgotar o tema.

A primeira é trabalhar com “coração oratoriano”, aonde quer que se seja chamado a realizar o próprio trabalho educativo e pastoral. Coração oratoriano é interesse pelo que diz respeito aos jovens; é atenção àqueles garotos que encontramos no próprio campo de trabalho ou na vida; é busca de contato e acolhida para ajudá-los e comunicar-lhes a fé; é preocupação de promover e salvaguardar os seus “direitos”; é trabalhar ao lado de quantos querem o seu crescimento, para um mundo diferente e melhor; é inserir-se aonde se decide a sorte dos garotos e jovens, nas estruturas deliberativas pequenas ou grandes.

Os espaços nos quais o “coração oratoriano” pode exprimir-se são vastos e múltiplos. A questão juvenil comporta hoje intervenções em campo educativo, social e político, em nível secular e eclesial, para a prevenção, a orientação e a recuperação.

Cada grupo e cada pessoa são chamados depois a trabalhar explicitamente num dos ambientes típicos da missão salesiana: a promoção humana, a educação, a evangelização. Nós, salesianos de Dom Bosco, exprimimo-lo com os artigos constitucionais 32 (promoção pessoal), 33 (promoção social e coletiva), 34 (evangelização e catequese). Os outros grupos fazem-no com as formulações que lhe são próprias. Como animadores, somos chamados a fazer emergir a colocação e a orientação juvenil e popular da Família Salesiana.

Abrem-se, assim, muitas possibilidades de intervenção, se estivermos atentos às perspectivas de compromisso apostólico. Hoje percebemos sempre mais a impossibilidade de poder agir eficazmente mesmo nos pequenos ambientes, se não pensarmos num trabalho conjunto e corresponsável. A Família Salesiana deverá, então, assumir maior relevância para responder às urgências e desafios que o mundo juvenil coloca de forma crescente aos adultos e educadores.

Todos os grupos retomam uma afirmação de Dom Bosco que se encontra no Jovem Instruído desde as primeiras edições:21 «Basta que sejais jovens, para que eu vos ame muito».

A passagem das palavras à realidade exige união de forças.







3.4. Títulos de pertença à Família Salesiana.



As várias indicações apresentadas (participação vocacional no carisma de Dom Bosco - participação diversificada do espírito e da espiritualidade salesiana - amor de predileção pelos jovens) criam o sentido de pertença e determinam as condições para torná-la pública e formal.

Ela não pode consistir em elementos unicamente interiores, como a simpatia, a amizade e o desejo de ser reconhecido dentro dessa Família. É indispensável recorrer a outras categorias, assim como fizeram-no os Capítulos Gerais.

O P. Egídio Viganò interveio muitas vezes sobre o assunto, como se pode deduzir das cartas circulares que tratam da Família Salesiana, das Filhas de Maria Auxiliadora, dos Cooperadores, das Voluntárias de Dom Bosco e dos Ex-alunos.

A Carta de Comunhão traz, de forma sintética, o sentir comum dos grupos sobre a necessidade e diversidade dos títulos e razões de pertença.

«O termo Família - lemos ali - é usado continuamente na tradição salesiana para indicar, de forma genérica, as ligações existentes entre os vários grupos e se aplica de modo diversificado de acordo com a natureza de sua relação.

Esta ligação ou relação não pode ser reduzida ao fato de pura simpatia. É sobretudo a expressão externa da comunhão interior e carismática. Ajuda por isso a compreender os diversos títulos de pertença à Família salesiana.

A pertença nutre-se de um espírito comum, que orienta para uma missão juvenil e popular vasta e complementar; e de determinadas características próprias e originais que justificam o reconhecimento oficial, dado por um título específico.

Um primeiro título é aquele próprio dos Salesianos, das Filhas de Maria Auxiliadora e dos Cooperadores: são os três primeiros grupos centrais, dos quais Dom Bosco é fundador de maneira toda especial. Foram constituídos herdeiros diretos da sua obra; são fundamento e ponto de cotejo para todos os outros no que diz respeito ao espírito, à missão e à metodologia pedagógico-pastoral de ação.

Outro título de pertença é o dos vários grupos de vida consagrada, nascidos mais adiante da força criativa do carisma. Eles enriquecem com expressões carismáticas particulares o patrimônio comum da Família.

Um terceiro nível, enfim, é definido com as expressões: títulos particulares de pertença. O horizonte em que se coloca é muito amplo em relação ao dos grupos anteriormente indicados, mas vinculado igualmente, de modo objetivo, à vitalidade e à riqueza do patrimônio espiritual de Dom Bosco. A energia unificadora do seu carisma é indispensável também para esse nível mais vasto.

O título jurídico de pertença deve ser, então, deduzido do documento de reconhecimento oficial que o Reitor-Mor envia como resposta ao pedido feito pelos vários grupos».22

A nossa reflexão chegou até aqui. O panorama apresenta-se claro, mas também muito aberto.

As expressões utilizadas para os títulos são variadas: pertença à Família Salesiana em sentido estrito ou em sentido lato; pertença a título de fundação por parte de Dom Bosco ou por parte de outros fundadores que nele se inspiram; pertença por resposta à vocação salesiana, como grupo, mas também como indivíduo, através de uma consagração específica; pertença por títulos diversos.

Considerando os vários títulos de pertença, sublinho algumas urgências que a comunidade salesiana deve examinar com cuidado para tornar operativa esta minha carta.

- Os Salesianos de Dom Bosco com as Filhas de Maria Auxiliadora e os Cooperadores constituem o núcleo central da Família. Assim também são frequentemente denominados. Não é um privilégio. É uma missão, primariamente, de comunhão. Devem-se buscar reciprocamente a fim de unirem seus diferentes dons na complementaridade e colocar-se à disposição da difusão do espírito salesiano.

Era coisa certa para SDB e FMA. Hoje os Cooperadores estão reconhecendo de modo sempre mais evidente o seu papel na formação dos leigos que participam da missão salesiana.

- A comunhão e a missão precisam de estruturas de apoio e de estímulo. Devem ser, hoje, ágeis e leves.

Em vista da comunhão entre todos os grupos da Família, convido a continuar o esforço já feito em muitas Inspetorias para instituir momentos de encontro, de fraternidade, de entendimento e de planejamento. Os Inspetores sejam os primeiros a manifestar essa vontade de comunhão convocando os representantes e responsáveis dos diversos grupos, com prazos oportunos e ordem do dia anteriormente concordada. A comunhão nasce e desenvolve-se quando encontra um ambiente e iniciativas que a favoreçam. Nós também, em nível de Conselho Geral, haveremos de considerar o modo de tornar institucional o encontro anual dos representantes da Família realizado nos anos passados.

- A missão pode tirar muito proveito do entendimento entre todos os grupos e particularmente entre os grupos centrais da Família.

Hoje, a educação dos jovens tem necessidade de figuras diferenciadas e de intervenções variadas. Só o conjunto pode responder com eficácia às expectativas. O bem dos jovens pede-nos, portanto, um novo esforço para planejar juntos.

Os resultados atingidos nos anos passados estão a testemunhar que é possível trabalhar de modo convergente. A pastoral juvenil, a família salesiana, a comunicação social, o trabalho missionário, a preocupação formativa e a economia possuem ambientes que podem ser partilhados corresponsavelmente.



4. O serviço à Família Salesiana



Creio que já foi aceito por todos que temos particulares responsabilidades em relação à Família Salesiana. Afirma-o o artigo 5 das nossas Constituições.

Em vista da solidez que quer revestir a presente carta, dou uma rápida olhada nos Regulamentos gerais da Congregação.23 Eles especificam em linha prática a orientação constitucional. Chamo a atenção, como consequência, para alguns compromissos a serem retomados neste momento de atenção renovada. Inspetores e Diretores têm em sua realização um papel determinante. Eles deverão ter algumas coisas presentes.



4.1. A animação é um empenho comunitário.



O Capítulo Geral Especial falava de mudança de mentalidade necessária para enfrentar com perspectivas novas o trabalho com a Família Salesiana. A primeira mudança indispensável é que a comunidade se sinta envolvida na animação e colaboração com os diversos grupos da Família Salesiana que trabalham no mesmo território. Não pode ser este um empenho totalmente delegado a uma só pessoa. Estão em jogo significativos valores carismáticos.

A comunidade intervém de muitos modos, com:

- o interesse direto e explícito pela vida e atividades do Grupo;

- a estima e simpatia, expressas especialmente nos momentos de ocorrências particulares;

- a acolhida fraterna das pessoas que vêm à comunidade por variados motivos, como reuniões e encontros programados pelos diversos grupos;

- o apoio moral e material, enquanto possível, nos casos de dificuldades, demonstrando assim que queremos considerá-los verdadeiros irmãos e verdadeiras irmãs;

- a assistência e direção espiritual, como momento típico de formação à vida salesiana;

- a oferta de espaços e formas de colaboração corresponsáveis no projeto educativo e pastoral que a comunidade está realizando;

- o acompanhamento vocacional de todas as pessoas para que acolham o dom de Deus.

Sobretudo, porém, a comunidade integra em seu projeto comunitário a preocupação pela Família Salesiana. É indispensável levar as preocupações apostólicas de todos os salesianos ao centro da vida da comunidade e ao projeto único de ação. A nossa força está em viver e trabalhar juntos. A incidência da nossa presença está ligada ao caráter comunitário das intervenções. Deve-se, pois, evitar uma “delegação” que comporte marginalidade ou desinteresse da comunidade no acompanhamento dos grupos.

A participação ativa da comunidade é indispensável, sobretudo em vista da nova qualidade e das novas formas de colaboração. Ela enriquece o serviço, protege das mudanças imprevistas de orientação, organização e estilo de vida dos grupos.

Contribui, portanto, para a história do grupo e impede a dispersão da riqueza acumulada.



4.2. É trabalho de irmãos qualificados e disponíveis



Recolheremos os frutos que esperamos dos grupos da Família, particularmente dos Cooperadores, Ex-alunos e VDB, na proporção da qualidade e disponibilidade de tempo dos irmãos encarregados do seu acompanhamento.

A primeira preocupação do Inspetor com seu Conselho é, pois, a escolha de irmãos que realizarão esse serviço tipicamente salesiano. Qualidade e competência garantem a eficácia de sua presença e facilitam as relações no interior dos grupos. Existem, depois, alguns critérios que devem orientar o discernimento do Inspetor com seu Conselho nessa escolha. Sublinho os principais.

O serviço seja confiado a irmãos enamorados de Dom Bosco e da espiritualidade salesiana: desejosos, por isso, de comunicar essa espiritualidade e disponíveis na busca de caminhos novos para a realização do carisma. Eles saberão compartilhar com a própria comunidade o que estão realizando.

Sejam preparados para sua tarefa. A improvisação não gratifica. As associações eclesiais exigem hoje uma assistência espiritual de qualidade. As nossas não fazem exceção. Os delegados deverão colocar-se ao lado das diversas realidades salesianas e acompanhar respeitosamente a sua caminhada.

A disponibilidade que deles se exige comporta o estudo das características do grupo, a compreensão dos objetivos espirituais e pastorais próprios de sua identidade, a orientação salesiana diante das novidades que brotam da vida e da ação quotidiana. O resultado dessa presença não interessa apenas ao grupo, ao qual cada um se dedica, mas à Família Salesiana toda. Devem ser, portanto, favorecidos os encontros de formação dos delegados, nos quais sejam preparados, sobretudo para o papel de animadores espirituais.

As tarefas sejam, também, esclarecidas oportunamente. Elas são hierarquizadas no artigo 5 das Constituições: manter vivo o esforço de crescimento das pessoas e dos grupos no espírito salesiano; cuidar do diálogo; favorecer a colaboração fraterna; estimular o enriquecimento recíproco e a criatividade apostólica. Não convém deixar as coisas à mercê de interpretações individuais, perder-se em serviços secundários ou assumir funções que o próprio grupo deve prover.

Os grupos da Família Salesiana são grupos autônomos. Têm suas próprias estruturas, seus ordenamentos internos e relações ao externo a serem pessoalmente geridas. Nossa presença não deve dar lugar a ingerências. Não faltarão momentos de suplência, sobretudo nos inícios da vida de um grupo num determinado território. Mesmo nessas circunstâncias devemos agir como “assistentes” salesianos, isto é, como pessoas que se colocam ao lado e suscitam as riquezas escondidas no coração de cada um e do conjunto.



4.3. Um serviço salesianamente qualificado.



A formação deve ser colocada em primeiro lugar no trabalho de animação que nos é confiado. A diversidade dos grupos sugerirá os conteúdos, e os níveis dos membros indicará os itinerários para uma adequada formação cristã.

A formação salesiana, contudo, é o ponto chave do nosso trabalho. Ela não é um capítulo, mas uma forma e um estilo de crescimento. Possui conteúdo específico, mas depois torna-se forma da totalidade. Deve ser comunicada a tradição educativa e pastoral salesiana, principal aspecto do nosso patrimônio espiritual e estratégia vencedora na relação com os jovens. Dom Bosco repetia aos seus primeiros missionários que gostaria de lhes pregar um Retiro sobre o Sistema Preventivo.

Há que se aproximar, aprofundar e enfrentar, também, os aspectos do espírito salesiano segundo as diversas vivências, o que representa uma efetiva escola de vida salesiana no quotidiano, para irmãos e leigos. As perspectivas são, de fato, muitas e enriquecedoras. Cada grupo é chamado a exprimir, como se faz nas Semanas de Espiritualidade, o modo de sentir e de viver a espiritualidade salesiana.

É necessário preocupar-se igualmente com a formação apostólica. Trata-se de uma dimensão interna à espiritualidade salesiana que supõe ardor, mas também competências práticas. Temos, nesse campo, algumas originalidades que não se podem perder. Referem-se a algumas intuições de São Francisco de Sales, que Dom Bosco retomou, reformulou e viveu em sua situação de educador de jovens e jovens pobres.

Os grupos da Família Salesiana (nós compreendidos, naturalmente!) devem saber abrir-se às novas fronteiras apostólicas da Igreja. Existem areópagos a serem evangelizados, inúmeras questões juvenis a acolher e novos espaços missionários aos quais acudir. A concentração de recursos em alguns lugares não serve, quando isso impede a presença salesiana em outros ambientes que a desejariam e dela precisam. Deve-se repensar a colaboração integrativa no território e nos novos espaços.

É indispensável, para que haja sucesso nessa programação, que os grupos se tornem suficientemente capazes de assumir a responsabilidade primária da própria animação e das próprias iniciativas apostólicas. É um caminho de amadurecimento que nós salesianos devemos impulsionar com todas as nossas forças.

Desejo chamar a atenção para um serviço específico nessa caminhada: o presbiteral! Considero-o importante e a ser prestado de maneira mais intensa. Está sendo melhorado, e não poucos irmãos poderiam oferecer-nos a experiência dos resultados obtidos. Ameaça, porém, o risco de reduzi-lo a pura “capelania”, isto é, celebrações determinadas pelo horário ou calendário. Na concepção e na práxis de Dom Bosco esse serviço tem um peso determinante. Ele é Pai e Pastor da sua Família.

Tudo o que o Concílio indicou sobre o serviço sacerdotal, as muitas reflexões nascidas na Congregação sobre o tema, as exigências que nos chegam hoje da Igreja, devem encontrar a nós, presbíteros, atentos e conscientes da riqueza do carisma sacerdotal.

Devemos perguntar-nos, queridos irmãos, se realizamos o serviço da palavra generosamente, com alegria interior, com competência e adequação aos tempos e às pessoas. Dedicamo-nos ao ministério da santificação, propondo e acompanhando a caminhada espiritual, utilizando tudo o que a Igreja coloca à nossa disposição? Procuramos construir e fazer viver a comunhão que tem sua origem na vocação, a sua energia no Espírito, a sua raiz em Cristo ou ficamos, às vezes, apenas no nível da socialização e do convívio?

O serviço sacerdotal é um serviço no qual se deve empenhar toda a graça e a preparação recebida.













5. Algumas perspectivas novas surgidas no CG 24



5.1. Os amigos de Dom Bosco.



O tema enfrentado nas páginas precedentes cruza-se com uma realidade que julgo útil comentar brevemente: os “Amigos de Dom Bosco”.

Prevê-se que essa realidade crescerá e, por isso, será preciso uma ulterior reflexão para chegar a orientações compartilhadas. Detenho-me, no momento, em alguns elementos de necessária clareza.

A expressão é usada embora de maneira geral entre nós SDB, desde as origens da nossa Congregação. Dom Bosco criou muitos amigos e muitos tiveram prazer em serem chamados amigos de Dom Bosco.

Os Ex-alunos foram os que mais diretamente começaram a falar disso em seu Estatuto Confederativo. Assim escrevem: «(A Confederação) propõe-se como ponto de referência e de agregação para quantos 'com variados títulos' sentem-se próximos à obra salesiana, compartilham suas finalidades e compromissos, e constituem aquele vasto movimento de simpatizantes e de AMIGOS DE DOM BOSCO há tempo atuante na sociedade».24

O CG24 fez uma primeira reflexão mais orgânica tratando da relação SDB-leigos.

Evidenciou um dado de fato: «Dom Bosco teve sempre muitos amigos espalhados pelo mundo e em ambientes os mais variados. Com o passar dos anos não diminuíram de número, nem se desfizeram os laços que os prendem ao nosso Pai e Fundador».25 O Papa igualmente em sua mensagem para o início do Capítulo reconhece que «os Salesianos podem contar com tantos Amigos de Dom Bosco espalhados pelo mundo inteiro, com denominações diferentes, mas todos unidos ao Santo dos jovens».26

O mesmo CG24 indicou uma tipologia, sublinhando a sua variedade, com termos como «simpatizantes, admiradores, benfeitores, colaboradores, consultores, crentes e não crentes, não cristãos».27

Reportou, porém, todos os tipos a uma identidade. «Com nuanças diversas eles apresentam a seguinte identidade: revelam uma atitude de simpatia pela figura de Dom Bosco, seu espírito e sua missão; exprimem o próprio apego a Dom Bosco; entendem colaborar, de formas variadas, em iniciativas de bem, partilhando assim a missão salesiana».28

Concluiu definindo a sua referência à Família Salesiana. «Reconhece-se que os amigos de Dom Bosco se inserem num movimento mais amplo que a realidade atual da Família Salesiana. Sua inserção no espírito e na missão de Dom Bosco é diversificada, com gradações e atitudes diversas, segundo a imagem dos círculos concêntricos: para alguns trata-se de um envolvimento direto, para outros de participação indireta».29

O texto apresentado oferece o ponto de partida para algumas orientações práticas.

Fiquemos cientes, antes de tudo, do fato de os amigos de Dom Bosco existirem em todos os lugares e os valorizemos: nas CEP e em iniciativas salesianas de natureza variada, mas também espalhados na sociedade, distantes de qualquer ligação física com uma comunidade de Dom Bosco. Isso se encontra em todos os contextos geográficos, religiosos e culturais. Surgiram também grupos que possuem a denominação “Amigos de Dom Bosco”. Embora pouco numerosos representam uma diferença em relação aos não associados.

Consideremos importante, então, programar o cultivo das relações com eles. Confiemos essa ação particularmente à Confederação dos Ex-alunos de acordo com o que expressamos na mensagem a eles dirigida no CG24: «Em nível local e inspetorial a vossa Associação se torne promotora de convocação e de colaboração expandindo assim o carisma salesiano no vasto movimento e criando uma rede de amizade e simpatia com os inúmeros “amigos” da obra salesiana e de Dom Bosco».30

Mesmo nesse caso, porém, não há uma delegação exclusiva ou uma “reserva”. Cada salesiano, cada comunidade, cada grupo deve estender essa amizade. Trata-se de uma característica da espiritualidade, da pedagogia e da pastoral salesiana.

Mais, fazendo parte do movimento salesiano, eles têm o direito de serem alimentados pela espiritualidade salesiana. É dever nosso, portanto, encontrar os modos de oferecer essa espiritualidade, criando oportunidades de encontro e canais de comunicação.

Enfim, a peculiaridade dos amigos de Dom Bosco, isto é, o fato de estarem espalhados em todos os lugares é, para nós salesianos, uma ocasião de fazer ouvir Dom Bosco e as suas preocupações educativas em regiões e ambientes aonde nós não estamos presentes.

O conjunto constitui uma realidade que não nos pode deixar indiferentes. Fazemos todos os dias experiência de que muitas iniciativas são possíveis justamente pela presença desses amigos. Contribuem para o sustento material da obra salesiana, abrem-nos caminhos em ambientes políticos e institucionais, oferecem uma contribuição não indiferente na educação, difundem o nome e o espírito de Dom Bosco nos mais variados contextos. Muitos deles, homens e mulheres, sustentam-nos com a oração e com uma solidariedade à toda prova.

Existem, pois, potencialidades das quais tirar proveito. Por isso, estamos abertos a novos desenvolvimentos e realizações. Ficaremos atentos como Dom Bosco aos sinais e aprenderemos da experiência como ir além. Continuaremos a reflexão, no Conselho Geral, para iluminar ulteriormente a questão e oferecer critérios de ação.











5.2. O Movimento Salesiano



Ocupou-se dele o CG24,31 sublinhando uma situação conhecida em que se começou a trabalhar.

O artigo 5 das Constituições une, de fato, sem solução de continuidade, o movimento à Família, como um ambiente sem limites. Capítulos Gerais e Reitores-Mores indicaram a natureza e os critérios do seu desenvolvimento.

Nasceu e consolidou-se, depois, no âmbito da pastoral juvenil, através de um paciente caminho de propostas, esclarecimentos e realizações, o Movimento Juvenil Salesiano (MJS). O CG23 reconheceu-o, ratificou o seu valor educativo e fez dele uma proposta a toda a Congregação. Em alguns contextos ele apresenta-se com boa capacidade de comunicação interna, com força de envolvimento e com itinerários formativos consolidados. Multiplicam-se no seu interior os grupos e animadores. A Espiritualidade Juvenil Salesiana (EJS) já é uma referência unificadora, embora muito ainda se deva fazer para que seja assimilada.

Esse é o motivo para tratar do Movimento Salesiano, embora brevemente, no contexto presente. Não faltará outra circunstância em que refletiremos de maneira mais orgânica e mais completa sobre toda a problemática que relativa ao Movimento Salesiano e a à sua componente juvenil.

O CG23 afirma que o MJS «é um dom original do Espírito à comunidade dos crentes, uma riqueza que pertence à Igreja e aos jovens».32 Experiências e comentários, nem sempre prudentes, podem ter criado alguma desafeição pelos movimentos, e nesse distanciamento involuntário veio a encontrar-se, para alguns irmãos, também o Movimento Salesiano, sobretudo o juvenil, que se apresenta mais organizado e propositivo.

É preciso partir de novo da convicção de que os movimentos representam uma manifestação da presença e da ação do Espírito na Igreja e no mundo. Sublinha-o a Christifideles Laici quando insiste na existência de uma “nova estação associativa” justamente como resposta a necessidades espirituais sentidas hoje e como recurso para a nova evangelização.

Interessa-nos sublinhar aqui a variegada natureza do Movimento Salesiano. Participam dele os que trabalham pela juventude, dentro ou fora de estruturas salesianas, na Igreja e nas instituições civis, e expressem conscientemente algum aspecto do espírito e do estilo educativo salesiano. Não se desejam carteirinhas de identidade. Deve-se reconhecer, com todas as letras, que essa realidade multíplice e diferenciada encontra a sua unidade e energia de desenvolvimento na referência a Dom Bosco e na participação da sua espiritualidade e pedagogia segundo os contextos e possibilidades de cada um.

O Movimento vive, pois, com algumas ideias-força que orientam de maneira convergente aqueles que dele participam, tanto de forma direta como indireta. «A circulação de valores e mensagens sobre a espiritualidade - diz o CG23 a respeito da componente juvenil - não exige uma organização rígida e centralizada. Fundamenta-se na comunicação. Considera necessária uma estrutura mínima para organizar a coordenação de iniciativas comuns».33

Insista-se também que a urgência do Movimento deriva da missão juvenil e popular. A comunidade salesiana está ciente de que o empenho de ser “missionários dos jovens” não é realizável sem um vasto movimento de pessoas, envolvidas e corresponsabilizadas. Nasce dessa exigência a necessidade de existir a comunidade educativo-pastoral em todas as presenças salesianas. Provém da mesma exigência o esforço de interligar no território uma “rede” de colaboradores, amigos e simpatizantes dispostos a “obras de bem”. Sozinhos, arrisca-se a permanecer além de no isolamento também na ineficácia.

Concluamos, pois, com a necessidade de estender e qualificar o Movimento Salesiano. Para isso é indispensável uma animação adequada à sua natureza. A componente juvenil já se organizou nesse aspecto. Quanto aos adultos, a animação cabe a toda a Família Salesiana e particularmente aos seus grupos centrais.

«O empenho de ampliar o envolvimento é de todos os que de fato, por motivo e nível diversos, já partilham o espírito e a missão de Dom Bosco. Uma responsabilidade toda especial cabe aos SDB, em razão de sua identidade e da tarefa que o Fundador lhes confiou de serem animadores do Movimento que dele se origina».34

As FMA dão uma contribuição substancial e qualificada ao Movimento Salesiano. Em todos os ambientes onde a sua comunidade atua, agregam-se numerosas pessoas dispostas a colaborar nas iniciativas e abertas ao espírito de Dom Bosco e de Madre Mazzarello.

O CG24, em relação aos Cooperadores salesianos, pela sua particular colocação no interior da Família, dá uma orientação com que devemos saber empenhar os Centros locais e toda a Associação: «Devem ser reconhecidos como plenamente corresponsáveis da missão salesiana, e apontados como figuras de referência para os leigos do amplo Movimento Salesiano. Neste sentido foi aprovado o novo RVA em 1986».35

É preciso considerar também que o Movimento Salesiano vai-se estendendo como uma galáxia. Para tanto contribuem as atuais possibilidades da comunicação social, capaz de provocar adesões e colaborações sem limites de espaço. Além do mais, cada uma das nossas presenças alargou a rede de suas ligações, corresponsabilidades e participações. Mas, sobretudo, continuam a nascer ao redor dos diversos grupos da Família agregações e solidariedades organizadas por eles.

Quem sabe não se possa no futuro proceder a uma comunicação entre todas essas “constelações”.

O Movimento Salesiano representa, pois, um campo de trabalho com um futuro interessante para o carisma de Dom Bosco, mas quase inexplorado. A sua animação ainda não foi programada de forma adequada. É preciso inventar e experimentar!

Sabemos que a eficácia depende de algumas condições: animadores dispostos a comunicar o espírito salesiano, equipados de visões e competências adequadas; canais, formas, iniciativas de comunicação e, na medida do possível, momentos de agregação espiritual e operativa; referências essenciais compartilhadas, criadoras de unidade.

O Movimento Salesiano é o húmus das vocações às diversas expressões do carisma. Imaginamo-lo ao redor de cada presença e transversalmente no território amplo, como o espaço onde podem multiplicar-se cooperadores, ex-alunos e aderentes a outros ramos da Família Salesiana.



6. Retornemos aos jovens



Fizemos um voo de reconhecimento dos nossos recursos reais e potenciais. O Espírito pode despertá-los através da nossa mediação. Aterremos agora no campo do nosso trabalho.

A missão juvenil e popular de Dom Bosco é a motivação agregativa e a razão de ser da Família e do Movimento Salesiano. Ela coloca os jovens no centro das nossas preocupações educativas e populares. A fim de realizá-la nasceu e desenvolveu-se a pastoral juvenil salesiana, levada avante especialmente pelos SDB, FMA e Institutos de vida consagrada entregues à educação.

Alguns grupos laicais da Família Salesiana organizaram, nos últimos anos, as suas seções juvenis com finalidades vocacionais e operativas.

Igualmente as Igrejas locais vão equipando-se com secretariados de pastoral juvenil. Nelas impõem-se, de fato, como uma necessidade, a convergência e a articulação das propostas, a coordenação de setores e agentes, sob pena de fragmentação e dispersão.

É importante, então, que também nós pensemos numa pastoral juvenil coordenada ao menos nos critérios. Equipes de pastoral juvenil e da Família Salesiana deverão continuar o trabalho de convergência a ponto de traduzi-lo em resultados reais.

Tenhamos, entretanto, algumas referências seguras.

- A Família Salesiana inteira é corresponsável pelo serviço aos jovens. Isso comporta a necessidade de envolver sempre mais, num projeto, pessoas e grupos que trabalham no mesmo território com a sua relativa autonomia.

- O MJS é uma manifestação eminentemente “oratoriana” da missão juvenil realizada pela Família Salesiana. Somos todos chamados a animá-lo segundo as características do mesmo Movimento, que são as de um Movimento “educativo”, que coloca a educação à fé no centro. A presença de Cooperadores e Ex-alunos, como animadores, é desejável ao lado de SDB e FMA. O mesmo se deve dizer quanto à CEP.

- Fazem-se reconhecer, no Movimento Juvenil Salesiano e na CEP, todas as vocações salesianas; ajudam-se os jovens a trilharem um caminho de amadurecimento e discernimento, encorajando-os a formas vocacionais de maior compromisso. Quando o jovem é capaz de exprimir uma opção, ele é acolhido no respectivo grupo para a preparação específica imediata ao trabalho contemplado por essa opção.

- Deve-se recomendar o espírito missionário no momento atual da nova evangelização. Ele deve impelir para onde necessidades, questões ou sujeitos juvenis ainda não são objetos de preocupação, mais que concentrar-se em jovens que já possuem uma suficiente referência educativa e religiosa. Foi exatamente esse o espírito que provocou o surgimento e o crescimento da Família Salesiana.



7. Conclusão



1997: iniciamos o nosso itinerário para o Jubileu do ano 2000; ele nos recorda que estamos a viver um “tempo favorável” pela presença de “Jesus, único Salvador do mundo, ontem, hoje e sempre”. Ele é sentido na palpitação do mundo e no impulso da Congregação.

Hoje, primeiro dia do ano, celebramos a maternidade divina de Maria. Ela acolheu o Filho de Deus, contribuiu substancialmente para dar-lhe os traços humanos com que nos resulta próximo e reconhecível.

Sua maternidade expande-se de Jesus à Igreja e a cada pessoa, em que Cristo dá origem ao homem novo, que é e se comporta como filho de Deus. A nossa educação dos jovens tende justamente a isso e não podemos pensá-la a não ser como participação na obra materna de Maria.

Ela abençoe-nos na caminhada deste Ano de graça e acompanhe-nos na realização da missão que nos foi confiada, junto com todos os irmãos e irmãs da Família Salesiana.



P. Juan E. Vecchi

Reitor-Mor



1 Cf. Programação do Reitor-Mor e do seu Conselho, em “2. Orientações e Diretrizes”.

2 Cf. CGE, 158

3 CGE, 159-160

4 Cf. CG24, 199

5 VC 54

6 Const. 2

7 Const. 6

8 Const. 7

9 Const. 5

10 CGE, apresentação, pág. XIX

11 Const. 35

12 Carta de Comunhão na Família Salesiana de Dom Bosco, 1995, 9

13 Const. 2

14 CGE, 739

15 Cf. CG24, 143

16 Cf. CGE, 85-87

17 ib. n. 87

18 ib. n. 87

19 Cf. CG24, n. 89 ss.

20 Comentário à Estreia de 1987: Juntos para 1988 como vasto movimento de “missionários dos jovens”

21 Cf. edição de 1847, pág. 7

22 Carta de Comunhão na Família Salesiana de Dom Bosco, 5

23 Cf. Reg. 37-40

24 Estatuto Confederativo, art. 9 c

25 CG24, 85

26 CG24, 197

27 CG24, 50

28 ib.

29 ib.

30 CG24, 286

31 Cf. Índice analítico, voz: Movimento Salesiano

32 CG23,275

33 CG23, 277

34 CG24, 109

35 CG24, 77

25