ao dos Pastores. Quando, de fato, a dissensão consegue estender a sua
influência até inspirar uma opinião comum, ela tende a se tornar regra de
ação, o que não pode deixar de perturbar gravemente o Povo de Deus e
levar a um menosprezo da verdadeira autoridade.[30]
35. Às vezes a dissensão recorre também a uma argumentação
sociológica, segundo a qual a opinião de um grande número de cristãos
seria uma expressão direta e adequada do « senso sobrenatural da fé ».
Na realidade as opiniões dos fiéis não podem ser pura e simplesmente
identificadas com o « sensus fidei ».[31] Este é uma propriedade da fé
teologal, a qual sendo um dom de Deus, que faz aderir pessoalmente à
Verdade, não pode enganar-se. Esta fé pessoal é também fé da Igreja,
porque Deus confiou à Igreja a guarda da Palavra, e, consequentemente, o
que deve crer o fiel é aquilo que a Igreja crê. O « sensus fidei » implica,
portanto, por sua natureza, a conformação profunda do espírito e do
coração com a Igreja, o « sentire cum Ecclesia ».
Se, portanto, a fé teologal enquanto tal não se pode enganar, o fiel pode,
ao contrário, ter opiniões erróneas, porque nem todos os seus pensamentos
procedem da fé.[32] Nem todas as ideias que circulam entre o Povo de
Deus são coerentes com a fé, tanto mais que podem facilmente sofrer a
influência de uma opinião pública veiculada pelos modernos meios de
comunicação. Não é sem motivo que o Concílio Vaticano II sublinha a
relação indissolúvel entre o « sensus fidei » e a orientação do Povo de
Deus por parte do magistério dos Pastores; as duas realidades não podem
ser separadas uma da outra.[33] As intervenções do Magistério servem
para garantir a unidade da Igreja na verdade do Senhor. Ajudam a «
permanecer na verdade », frente ao caráter arbitrário das opiniões
mutáveis, e são a expressão da obediência à Palavra de Deus.[34] Mesmo
quando pode parecer que limitem a liberdade dos teólogos, elas instauram,
por meio da fidelidade à fé que foi transmitida, uma liberdade mais
profunda, que não pode provir senão da unidade na verdade.
36. A liberdade do ato de fé não pode justificar o direito à dissensão. Na
realidade esta não significa, de forma alguma, a liberdade em relação à
verdade, mas o livre autodeterminar-se da pessoa em conformidade com o
seu dever moral de acolher a verdade. O ato de fé é um ato voluntário,
porque o homem, resgatado por Cristo Redentor e chamado por ele à
adoção filial (cf. Rm 8, 15; Gal 4, 5; Ef 1, 5; Jo 1, 12), não pode aderir a
Deus a não ser que, « atraído pelo Pai » (Jo 6, 44), lhe faça a oferta
racional da sua fé (cf. Rm 12, 1). Como recordou a Declaração Dignitatis
humanae, [35] autoridade humana alguma tem o direito de interferir, com
coações ou pressões nesta opção, que supera os limites da sua
competência. O respeito do direito à liberdade religiosa é o fundamento do
respeito à totalidade dos direitos humanos.
Não se pode, portanto, recorrer a estes direitos humanos, para opôr-se às
intervenções do Magistério. Um tal comportamento desconhece a natureza
e a missão da Igreja, que recebeu do seu Senhor o dever de anunciar a
todos os homens a verdade da salvação, e o realiza caminhando sobre as
pegadas do Cristo, sabendo que « a verdade não se impõe senão pela força