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1.3 Page 3

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CongregaçÃo
para os Institutos De Vida Consagrada
E as Sociedades de Vida Apostólica
Ano da Vida ConsaGrada
Alegrai-vos
Carta circular
aos consagrados e consagradas
Do Magistério do Papa Francisco
LIBRERIA EDITRICE VATICANA

1.4 Page 4

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© Copyright 2014 – Libreria Editrice Vaticana
00120 Città del Vaticano
Tel. 06 69 88 10 32 - Fax 06 69 88 47 16
www.libreriaeditricevaticana.com
www.vatican.va
ISBN 978-88-209-9346-7

1.5 Page 5

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« Queria dizer-vos uma palavra,
e a palavra é alegria.
Onde quer que haja consagrados,
aí está a alegria! ».
PAPA FRANCISCO

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Caríssimos Irmãos e Irmãs,
1. « A alegria do Evangelho enche o coração
e a vida inteira daqueles que se encontram com
Jesus. Com Jesus Cristo, nasce e renasce sem
cessar a alegria » 1.
O início da Evangelii gaudium soa, na linha
do magistério do papa Francisco, com surpreen-
dente vitalidade, apelando ao mistério admirável
da Boa-Nova que, ao ser acolhida no coração de
uma pessoa, transforma a sua vida. É-nos con-
tada a parábola da alegria: o encontro com
Jesus acende em nós a beleza originária, a beleza
do rosto no qual resplandece a glória do Pai
(cf. 2 Cor 4, 6), no frutto da alegria.
Esta Congregação para os Institutos de Vida
Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica
1 FRANCISCO, Exortação Apostólica Evangelii gaudium
(24 de novembro de 2013), Cidade do Vaticano, Libreria
Editrice Vaticana [LEV], 2013, n. 1.
7

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convida-vos a refletir sobre o tempo de graça que
nos é dado viver, sobre o especial convite que o
Papa dirige à vida consagrada.
Acolher tal magistério significa renovar a vida
segundo o Evangelho, não no sentido de radica-
lidade entendida como modelo de perfeição e,
muitas vezes, de separação, mas no sentido de
adesão toto corde 2 ao encontro de salvação que
transforma a vida: « Trata-se de deixar tudo para
seguir o Senhor. Não, não quero dizer radical.
A radicalidade evangélica não é só para os reli-
giosos: a todos se exige. Mas os religiosos seguem
o Senhor de modo especial, de modo profético.
Espero de vós esse testemunho. Os religiosos
devem ser homens e mulheres capazes de des-
pertar o mundo » 3.
Dentro das limitações humanas, nas preocu-
pações do dia a dia, os consagrados e as
consagradas vivem a fidelidade, dão razão da
alegria che poranem, convertem-se em testemun-
ho luminoso, anúncio eficaz, companhia e
proximidade para com as mulheres e homens do
nosso tempo que procuram a Igreja como casa
2 Com todo o coração (NdE).
3 ANTONIO SPADARO, « Sede profetas verdadeiros e não
brinqueis a sê-lo: Diálogo do Papa com os Superiores-Gerais
dos Institutos de vida religiosa, 29 de novembro de 2013 »,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 2, domingo,
9 de janeiro de 2014, p. 8.
8

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paterna 4. Francisco de Assis, tomando o Evan-
gelho como forma de vida, « fez crescer a fé,
renovou a Igreja; e, ao mesmo tempo, renovou a
sociedade, tornando-a mais fraterna, mas sempre
com o Evangelho, com o testemunho. Pregai
sempre o Evangelho e, se for necessário, pregai-o
também com as palavras! » 5.
Muitas são as sugestões que nascem da escuta
das palavras do Santo Padre, mas interpela-nos
particularmente a simplicidade absoluta com a
qual o papa Francisco propõe o seu magistério,
conformando-se com a genuinidade desarmante
do Evangelho. Palavra sine glossa 6, espalhada
com o gesto amplo do bom semeador que, cheio
de confiança, não faz discriminação de terreno.
Um convite autorizado que nos é dirigido
com plena confiança; um convite a renunciarmos
às argumentações institucionais e às justificações
pessoais; uma palavra provocadora que questio-
na o nosso viver, por vezes entorpecido e
sonolento, e com frequência indiferente ao desa-
fio: « Se tivésseis fé como um grão de mostarda »
4 Cf. FRANCISCO, Exortaçao Apostólica Evangelii gaudium,
n. 47.
5 ID., « Anunciai o Evangelho, se necessário também com
palavras » – usando a expressão de São Francisco, o Papa
confiou a sua mensagem aos jovens reunidos em Santa Maria
dos Anjos (Assis, 4 de outubro de 2013) –, in L’Osservatore
Romano, ed. portuguesa, n. 41, domingo, 13 de outubro de
2013, p. 9.
6 Sem glosa, sem comentário (NdE).
9

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(Lc 17, 5). Um convite que nos incentiva a elevar
o espírito para darmos razão ao Verbo que
habita no meio de nós, ao Espírito que cria e
renova constantemente a sua Igreja.
Esta Carta surge a partir deste convite e
pretende dar início a uma reflexão partilhada, ao
mesmo tempo que se apresenta como simples
meio para um confronto leal entre o Evangelho e
Vida. Este Dicastério desencadeia assim um per-
curso comum, lugar de reflexão fraterna, pessoal,
institucional, rumo a 2015, ano que a Igreja
dedica à vida consagrada. Alimentamos o desejo
de que ousadas decisões evangélicas venham a
ser postuladas e se produzam frutos de reno-
vação e de fecunda alegria: « O primado de Deus
é, para a existência humana, plenitude de signi-
ficado e de alegria, porque o ser humano é feito
para Deus e não descansa enquanto não encon-
trar nele a paz » 7.
7 JOÃO PAULO II, Exortação Apostólica pós-sinodal Vida
consagrada (25 de março de 1996), n. 27; AAS 88 (1996),
pp. 377-486.
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ALEGRAI-VOS, EXULTAI,
REJUBILAI

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Alegrai-vos com Jerusalém, rejubilai com
ela, vós todos que a amais; regozijai-vos com
ela, vós todos que estáveis de luto por ela.
Porque assim diz o Senhor: « Vou fazer com
que a paz corra para Jerusalém como um rio,
e a riqueza das nações, como uma torrente
transbordante. Os seus filhinhos serão leva-
dos ao colo e acariciaclos sobre os seus
regaços.
Como a mãe consola o seu filho, assim Eu
vos consolarei: em Jerusalém sereis con-
solados.
Ao verdes isto, os vossos corações pulsarão
de alegria, e os vossos ossos retomarão
vigor, como erva fresca. A mão do Senhor
manifestar-se-á aos seus servos ».
Isaías 66, 10.12-14

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À escuta
2. Com a palavra alegria (em hebraico:
s´imh. â/s´amah. , gyl) a Sagrada Escritura pretende
exprimir uma série de experiências coletivas e
pessoais, particularmente ligadas ao culto religio-
so e às festas, e destinadas a reconhecer o sen-
tido da presença de Deus na história de Israel.
Na Bíblia, há treze verbos e substantivos diferen-
tes para descrever a alegria de Deus, das pessoas
e da própria criação, no diálogo da salvação.
No Antigo Testamento, é nos Salmos e no
profeta Isaías que estes termos aparecem mais
vezes. Com uma variação linguística criativa e
original, surge com frequência o convite à ale-
gria e proclama-se a alegria da proximidade de
Deus, alegria por tudo o que Ele criou e fez.
Nos Salmos encontramos, centenas de vezes, as
expressões mais eficazes para indicar, juntamen-
te com a alegria, quer o fruto da presença
benevolente de Deus e os ecos jubilosos que esta
provoca, quer a afirmação da grande promessa
que ilumina o horizonte futuro do povo. No que
diz respeito ao profeta Isaías, a segunda e a
terceira partes do seu livro estão, precisamente,
ritmadas por esse frequente apelo à alegria,
15

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orientado para o futuro: será superabundante
(cf. Is 9, 2); o céu, o deserto e a terra exultarão de
alegria (Is 35, 1; 44, 23; 49, 13); os prisioneiros
libertados chegarão a Jerusalém, gritando de
alegria (Is 35, 9 s.; 51, 11).
No Novo Testamento, o termo mais fre-
quente está ligado à raiz char (chàirein, charà),
mas também se encontram outros termos como
agalliáomai, euphrosy´ne¯, que geralmente com-
portam um júbilo total, abarcando simul-
taneamente o passado e o futuro. A alegria é o
dom messiânico por excelência, como o próprio
Jesus promete: « A minha alegria esteja em vós e
a vossa alegria seja completa » (Jo 15, 11; 16, 24;
17, 13). Lucas, a partir dos acontecimentos que
antecedem o nascimento do Salvador, assinala o
jubiloso difundir-se da alegria (cf. Lc 1, 14.44.47;
2, 10; cf. Mt 2, 10). Esta acompanha a difu-
são da Boa-Nova como um efeito que se ex-
pande (cf. Lc 10, 17; 24, 41.52) e que é si-
nal típico da presença e implantação do Reino
(cf. Lc 15, 7.10.32; At 8, 39; 11, 23; 15, 3; 16, 34;
cf. Rm 15, 10-13; etc.).
Para Paulo, a alegria é um fruto do Espírito
(cf. Gl 5, 22) e uma nota típica e estável do Rei-
no (cf. Rm 14, 17), que se consolida também
através da tribulação e das provas (cf. 1 Ts 1, 6).
Na oração, na caridade, na constante ação de
graças deve encontrar-se a fonte da alegria
(cf. 1 Ts 5, 16; Fl 3, 1; Cl 1, 11 s.): nas tribulações,
16

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o Apóstolo dos Gentios sente-se cheio de alegria
e participante da glória que todos esperamos
(cf. 2 Cor 6, 10; 7, 4; Cl 1, 24). O triunfo final de
Deus e as núpcias do Cordeiro completarão toda
a alegria e júbilo (cf. Ap 19, 7), fazendo estalar
um Aleluia cósmico (Ap 19, 6).
Vejamos o sentido do texto: « Alegrai-vos
com Jerusalém; rejubilai com ela, vós todos que a
amais. Regozijai-vos com ela » (Is 66, 10). Trata-
se do final da terceira parte do profeta Isaías;
os capítulos 65 e 66 de Isaías estão intimamente
unidos, completando-se mutuamente, como era
evidente já na conclusão da segunda parte de
Isaías (capítulos 54 e 55).
Em ambos os capítulos é evocado o passado,
por vezes até com imagens cruas: são um convite
a esquecê-lo, porque Deus quer fazer brilhar
uma nova luz, uma confiança que curará infide-
lidades e crueldades sofridas. A maldição, fruto
da não observância da Aliança, desaparecerá,
porque Deus quer fazer de « Jerusalém um mo-
tivo de júbilo, e do seu povo uma fonte de
alegria » (cf. Is 65, 18). Saberão por experiência
que a resposta de Deus virá ainda antes de a
súplica ser formulada (cf. Is 65, 24). Este é o
contexto que continuará também nos primeiros
versículos de Isaías 66, aflorando aqui e além, e
evidenciando obtusidade de coração e de ouvi-
dos perante a bondade do Senhor e a sua Palavra
de esperança.
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É muito sugestiva a imagem de Jerusalém
mãe, inspirada nas promessas de Isaías 49, 18-29
e 54, 1-3: a terra de Judá enche-se com os que
regressam da dispersão, depois da humilhação.
Dir-se-ia que os rumores da « libertação »
« engravidaram » Sião de nova vida e esperança.
Deus, o Senhor da vida, levará até ao fim a
gestação, fazendo nascer sem sofrimento os no-
vos filhos. Assim, Sião-mãe fica rodeada de novos
filhos, amamentando-os a todos com abundância
e ternura. Uma imagem dulcíssima, fascinante
para Santa Teresa de Lisieux, que nela encontrou
uma decisiva chave de interpretação da sua espi-
ritualidade 1.
Um conjunto de vocábulos intensos: alegrai-
vos, exultai, transbordai; e também consolações,
delícia, abundância, prosperidade, carícias, etc.
A relação de fidelidade e de amor tinha falhado,
caíra-se na tristeza e na esterilidade; agora, o
poder e a santidade de Deus tornavam a dar
sentido e plenitude de vida e de felicidade.
Estas exprimem-se em termos que têm a sua raiz
nos afetos de todo o ser humano, e que provo-
cam sensações únicas de ternura e segurança.
Delicado e verdadeiro perfil de um Deus
que vibra com entranhas maternas e com inten-
1 Entre outras citações, cf. SANTA TERESA DO MENINO
JESUS, Obras completas, Cidade do Vaticano, LEV/Ed. OCD,
1997: Manuscrito A, 76vº; B, 1rº; C, 3rº; Carta 196.
18

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sas emoções contagiantes; uma alegria vinda do
coração (cf. Is 66, 14) que, a partir de Deus
– rosto materno e braço que ergue –, e se
difunde num povo desfigurado por mil humil-
hações, e, por isso, com ossos frágeis; uma
transformação gratuita que festivamente se es-
tende a « novos céus e nova terra » (cf. Is 66, 22),
para que todos os povos conheçam a glória do
Senhor, fiel e redentor.
Esta é a beleza
3. « Esta é a beleza da consagração: é a ale-
gria, a alegria... » 2. A alegria de levar a todos a
consolação de Deus. São palavras do papa Fran-
cisco no encontro com os seminaristas, os
noviços e noviças. « Não há santidade na triste-
za » 3, continua o Santo Padre, « não andeis
tristes como os que não têm esperança », escrevia
São Paulo (1 Ts 4, 13).
A alegria não é um adorno inútil, mas exigên-
cia e fundamento da vida humana. Nas preocu-
pações de cada dia, todo o homem e mulher
2 FRANCISCO, « Autênticos e coerentes » – com os semina-
ristas e as noviças, o papa Francisco fala sobre a beleza da
consagração (Roma, 6 de julho de 2013) –, in L’Osserva-
tore Romano, ed. portuguesa, n. 28, domingo, 14 de julho de
2013, p. 5.
3 Ibidem, p. 4.
19

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procura alcançar a alegria e permanecer nela
com todo o seu ser.
No mundo há, muitas vezes, um déficit de
alegria. Não somos chamados a realizar gestos
épicos nem a proclamar palavras altissonantes,
mas a testemunhar a alegria que brota da certeza
de sentir-se amado, da confiança de ser salvo.
A nossa memória curta e a nossa experiên-
cia fraca impedem-nos muitas vezes de procu-
rar as « terras da alegria », onde saborear o
reflexo de Deus. Temos mil e um motivos para
viver na alegria. A sua raiz alimenta-se da escu-
ta crente e perseverante da Palavra de Deus.
Na escola do Mestre, escuta-se o « esteja em vós
a minha alegria e a vossa alegria seja completa »
(Jo 15, 11), e treinamo-nos com exercícios de
alegria perfeita.
« A tristeza e o medo devem dar lugar à
alegria: “Alegrai-vos... exultai... transbordai de
alegria” – diz o profeta (66, 10). É um grande
convite à alegria. […] Cada cristão, mas so-
bretudo nós, somos chamados a levar esta men-
sagem de esperança, que dá serenidade e alegria:
a consolação de Deus, a sua ternura para com
todos. Mas só o poderemos fazer, se experimen-
tarmos, nós primeiro, a alegria de ser consolados
por Ele, de ser amados por Ele. […] Enistem
pessoas consagradas que têm medo da con-
solação de Deus e se amofinam, porque têm
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3 Pages 21-30

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3.1 Page 21

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medo dessa ternura de Deus. Mas não tenhais
medo. Não tenhais medo. O nosso Deus é o
Senhor da consolação, o Senhor da ternura.
O Senhor é pai e Ele disse que procederá conos-
co como faz uma mãe com o seu filho – com
ternura. Não tenhais medo da consolação do
Senhor » 4.
Ao chamar-vos
4. « Ao chamar-vos, Deus diz-vos: “És im-
portante para mim, Eu amo-te; conto contigo”.
Jesus diz isto a cada um de nós! Daqui nasce a
alegria! A alegria do momento no qual Jesus
olhou para mim. Compreender e sentir isto é o
segredo da nossa alegria. Sentir-se amado por
Deus, sentir que, para Ele, nós não somos núme-
ros, mas pessoas; e sentir que é Ele que nos
chama » 5.
O papa Francisco leva-nos a olhar para o
fundamento espiritual da nossa humanidade,
para vermos o que nos é dado gratuitamente por
livre soberania divina e livre resposta humana:
4 ID., « A evangelização faz-se de joelhos » – na missa
conclusiva das jornadas dedicadas aos seminaristas e às
noviças no Ano da Fé (Roma, 7 de julho de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 28, domingo,
14 de julho de 2013, p. 7.
5 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 5.
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« Então Jesus olhou para ele com simpatia e
respondeu: “Falta-te apenas uma coisa: vai, ven-
de tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e
terás um tesouro no Céu; depois, vem e segue-
me” » (Mc 10, 21).
O Papa faz memória: « Na Última Ceia, Jesus
dirige-se aos Apóstolos com estas palavras:
“Não fostes vós que me escolhestes; fui Eu que
vos escolhi” (Jo 15, 16); estas palavras recordam a
todos, não só a nós sacerdotes, que a vocação é
sempre uma iniciativa de Deus. Foi Cristo que
vos chamou a segui-lo na vida consagrada, e isto
significa realizar constantemente um “êxodo”
de vós mesmos para centrardes a vossa existência
em Cristo e no seu Evangelho, na vontade de
Deus, despojando-vos dos vossos projetos, a fim
de poderdes afirmar com São Paulo: “Já não
sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim”
(Gl 2, 20) » 6.
O Papa convida-nos a uma peregrinação ao
passado, um caminho sapiencial para nos encon-
trarmos nas estradas da Palestina ou junto da
barca do humilde pescador da Galileia; convida-
nos a contemplar os inícios de um caminho, ou
melhor, de um acontecimento que, tendo sido
6 ID., « Um caminho de adoração e serviço » – às Supe-
rioras-Gerais, o Pontífice recordou que a consagrada deve
ser mãe e não « solteirona » (Roma, 8 de maio de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 19, domingo,
12 de maio de 2013, p. 2.
22

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inaugurado por Cristo, nos leva a deixar as redes
na margem, o banco dos impostos na berma da
estrada, as veleidades do zelote entre as inten-
ções do passado. Todos meios desapropriados
para estar com Ele.
Convida-nos a parar algum tempo, como pe-
regrinação interior, diante do horizonte da
primeira hora, onde os espaços têm o calor da
relação amiga, a inteligência é levada a abrir-se
ao mistério, a decisão estabelece que é bom
pôr-se no seguimento daquele Mestre que só tem
« palavras de vida eterna » (cf. Jo 6, 68). Convida-
nos a fazer de toda a « existência uma peregri-
nação de transformação no amor » 7.
O papa Francisco chama-nos a deter o nosso
espírito no fotograma da partida: « A alegria
do momento no qual Jesus olhou para mim » 8;
a evocar significados e exigências subentendidos
na nossa vocação: « É a resposta a um chama-
mento, a um chamamento de amor » 9. Estar com
Cristo requer que partilhemos com Ele a vida,
opções, obediência de fé, bem-aventurança dos
pobres, radicalidade do amor.
7 ID., « Para subir ao monte da perfeição » – mensagem do
Pontífice aos Carmelitas, por ocasião do Capítulo Geral
(Roma, 22 de agosto de 2013) –, in L’Osservatore Romano,
ed. portuguesa, n. 37, domingo, 15 de setembro de 2013, p. 5.
8 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 4.
9 Ibidem.
23

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Trata-se de renascer vocacionalmente. « Con-
vido todo o cristão […] a renovar hoje mesmo o
seu encontro pessoal com Jesus Cristo ou, pelo
menos, a tomar a decisão de se deixar encontrar
por Ele, de o procurar dia a dia sem cessar » .10
Paulo leva-nos a essa visão fundamental:
« Ninguém pode pôr outro alicerce diferente do
que já foi posto » (1 Cor 3, 11). O termo vocação
indica este dado gratuito, como um depósito de
vida que não cessa de renovar a humanidade e a
Igreja no mais profundo do seu ser.
Na experiência da vocação, o próprio Deus é
o sujeito misterioso do chamamento. Ouvimos
uma voz que nos chama à vida e ao discipula-
do pelo Reino. O papa Francisco, ao recordá-lo
– « tu és importante para mim » –, usa o discurso
direto, na primeira pessoa, de modo a que a
consciência desperta. Chama-me a ser consciente
da minha ideia, do meu juízo, para pedir com-
portamentos coerentes com a consciência de
mim próprio, com o chamamento que sinto, o
meu chamamento pessoal: « Gostaria de dizer
a quantos se sentem indiferentes a Deus, à fé;
a quantos estão distantes de Deus, ou a quem o
abandonou; também a nós, com as nossas “dis-
tâncias” e os nossos “abandonos” de Deus, talvez
pequenos, mas demasiado frequentes na vida
10 ID., Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 3.
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quotidiana: Olha no fundo do teu coração, olha
no íntimo de ti mesmo e interroga-te: tens um
coração que aspira a algo de grande, ou um
coração entorpecido pelas coisas? O teu coração
conservou a inquietação da procura, ou per
mitiste que ele fosse sufocado pelos bens que, no
fim, o atrofiam? » .11
A relação com Jesus Cristo precisa de ser
alimentada com a inquietação da procura; torna-
nos conscientes da gratuidade do dom da
vocação e ajuda-nos a justificar as razões que
levaram à opção inicial, e que permanecem na
perseverança: « Deixar-se conquistar por Cristo
significa estar sempre orientado para aquilo que
está à minha frente, rumo à meta que é Cristo
(cf. Fl 3, 14) » .12 Permanecer constantemente à
escuta de Deus requer que estas perguntas se
tornem as coordenadas que marcam o nosso
tempo quotidiano.
Este mistério indizível que trazemos den-
tro de nós e que participa do inefável mistério
11 ID., « Com a inquietação no coração » – aos capitula-
res agostinianos, o Sumo Pontífice pediu que se ponham
sempre em busca de Deus e do próximo (Roma, 28 de agosto
de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 35,
domingo, 31 de agosto de 2013, p. 6.
12 ID., « Caminhos criativos radicados na Igreja » – o papa
Francisco com os seus irmãos jesuítas, no dia da memória
de Santo Inácio de Loiola (Roma, 31 de julho de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 31, domingo,
4 de agosto de 2013, p. 28.
25

3.6 Page 26

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de Deus só pode ser interpretado à luz da fé:
« A fé é a resposta a uma Palavra que interpela
pessoalmente, a um Tu que nos chama pelo
nome » 13 e, « enquanto resposta a uma Palavra
que precede, será sempre um ato de memória;
contudo, esta memória não o fixa no passado,
porque, sendo memória de uma promessa, torna-
se capaz de se abrir ao futuro, de iluminar os
passos ao longo do caminho » .14 « A fé contém
precisamente a memória da história de Deus
conosco; a memória do encontro com Deus, que
toma a iniciativa, que cria e salva, que nos
transforma; a fé é memória da sua Palavra que
inflama o coração, das suas ações salvíficas, pelas
quais nos dá vida, purifica, cuida de nós e
alimenta. […] Quem traz em si a memória de
Deus, deixa-se guiar pela memória de Deus em
toda a sua vida, e sabe despertá-la no coração
dos outros » .15 Memória de ser chamado aqui
e agora.
13 ID., Carta Encíclica Lumen fidei (29 de junho de 2013),
n. 8; AAS 105 (2013), pp. 555-596.
14 Ibidem, n. 9.
15 ID., « Memória de Deus » – na missa, na Praça de São
Pedro, no dia que lhes é dedicado, o Papa falou da missão do
catequista (Roma, 29 de setembro de 2013) –, in L’Osservatore
Romano, ed. portuguesa, n. 40, domingo, 6 de outubro de
2013, p. 5.
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3.7 Page 27

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Encontrados, alcançados, transformados
5. O Papa pede-nos para relermos a nossa
história pessoal e a verificarmos no olhar de amor
de Deus, porque, se a vocação é sempre iniciativa
sua, cabe-nos a livre adesão à economia divino-
humana, como relação de vida no ágape, camin-
ho de discipulado, « luz no caminho da Igreja » .16
Na vida no Espírito não há tempos acabados;
ela abre-se constantemente ao mistério quando
faz discernimento para conhecer o Senhor e
captar a realidade a partir dele. Ao chamar-nos,
Deus faz-nos entrar no seu repouso e pede-nos
que repousemos nele, como contínuo processo
de conhecimento de amor. Ecoa em nós a Pala-
vra « andas inquieta e preocupada com muitas
coisas » (Lc 10, 41). Na via amoris 17 progride-se
renascendo: a velha criatura renasce para uma
nova forma. « Por isso, se alguém está em Cristo,
é uma nova criatura » (2 Cor 5, 17).
O papa Francisco dá um nome a este renas-
cer: « Esta estrada tem um nome, um semblante:
o rosto de Jesus Cristo. É Ele que nos ensina a
tornarmo-nos santos. É Ele que, no Evangelho,
nos indica o caminho: a via das bem-aventuran
ças (cf. Mt 5, 1-12). Esta é a vida dos Santos:
16 ID., « Um caminho de adoração e serviço », loc. cit., p. 2.
17 O caminho do amor (NdE).
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3.8 Page 28

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pessoas que, por amor a Deus, na sua vida não
lhe puseram condições » .18
A vida consagrada é chamada a encarnar a
Boa-Nova, no seguimento de Cristo, o Crucifica-
do ressuscitado; a fazer próprio o « modo de
existir e de agir de Jesus como Verbo encarnado
em relação ao Pai e aos irmãos » .19 Concretamen-
te, é assumir o seu estilo de vida, adotar as suas
atitudes interiores, deixar-se invadir pelo seu
espírito, assimilar a sua lógica surpreendente e a
sua escala de valores, partilhar os seus risos e as
suas esperanças: « Guiados pela certeza humilde
e feliz de quem foi encontrado, alcançado e trans-
formado pela Verdade que é Cristo, e não pode
deixar de anunciá-la » .20
O permanecer em Cristo permite-nos colher a
presença do Mistério que habita em nós e nos
dilatar o coração segundo a medida do seu co-
18 FRANCISCO, « Não super-homens, mas amigos de Deus »
– no Angelus, no dia de Todos os Santos (Roma, 1 de no-
vembro de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa,
n. 45, domingo, 7 de novembro de 2013, p. 8.
19 JOÃO PAULO II, Exortação Apostólica pós-sinodal Vida
consagrada (25 de março de 1996), n. 22; AAS 88 (1996),
pp. 377-486.
20 FRANCISCO, « Nas encruzilhadas das estradas » – aos bis-
pos, sacerdotes, religiosos, religiosas e seminaristas, durante
as JMJ, o Papa confiou a missão de formar os jovens na fé
(Rio de Janeiro, 27 de julho de 2013) –, in L’Osservatore
Romano, ed. portuguesa, n. 31, domingo, 4 de agosto de
2013, p. 12.
28

3.9 Page 29

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ração de Filho. Quem permanece no seu amor,
como o ramo ligado à videira (cf. Jo 15, 1-8),
entra na familiaridade com Cristo e produz fruto:
« Permanecer em Jesus! Permanecer ligado a
Ele, dentro dele, com Ele, falando com Ele » .21
« Cristo é o selo na fronte, é o selo no cora-
ção: na fronte, porque o professamos sempre;
no coração, porque o amamos sempre; é o selo
no braço, porque atuamos sempre » .22 A vida
consagrada, com efeito, é um constante chama-
mento a seguir Cristo e a imitá-lo. « Toda a vi-
da de Jesus, a sua forma de tratar os pobres, os
seus gestos, a sua coerência, a sua generosidade
simples e quotidiana e, finalmente, a sua total
entrega, tudo é precioso e fala à nossa vida
pessoal » .23
O encontro com o Senhor põe-nos em movi-
mento, impele-nos a sair da autorreferencialida-
de .24 A relação com o Senhor não é estática nem
intimista: « Quem coloca Cristo no centro da sua
vida, descentraliza-se! Quanto mais te unes a
21 ID., « A vocação do ser catequista » – aos catequistas, o
Pontífice encoraiou a não ter medo de sair de si mesmo para
ir ao encontro do próximo (Roma, 27 de setembro de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 40, domingo,
6 de outubro de 2013, p. 4.
22 AMBRÓSIO, De Isaac et anima, 75; PL 14, cols. 556-557.
23 FRANCISCO, Exortação Apostólica Evangelii gaudium,
n. 265.
24 Ibidem.
29

3.10 Page 30

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Jesus e mais Ele se torna o centro da tua vida,
tanto mais Ele te faz sair de ti mesmo, te descen-
traliza e abre aos outros » .25 « Não estamos no
centro; estamos, por assim dizer, “deslocados”,
estamos ao serviço de Cristo e da Igreja » .26
A vida cristã é determinada por verbos de
movimento, mesmo quando vivida na dimensão
monástica e contemplativo-claustral; é uma con-
tínua procura.
« Não se pode perseverar numa evangelização
cheia de ardor, se não se estiver convencido, por
experiência própria, de que não é a mesma coisa
ter conhecido Jesus ou não o conhecer; não é a
mesma coisa caminhar com Ele ou caminhar
tateando; não é a mesma coisa poder escutá-lo ou
ignorar a sua Palavra; não é a mesma coisa poder
contemplá-lo, adorá-lo, descansar nele, ou não o
poder fazer. Não é a mesma coisa procurar
construir o mundo com o seu Evangelho, em vez
de o fazer unicamente com a própria razão.
Sabemos bem que a vida com Jesus se torna
muito mais plena, e, com Ele, é mais fácil encon-
trar sentido para cada coisa » .27
O papa Francisco exorta-nos à inquietação da
procura, como aconteceu com Agostinho de Hi-
25 ID., « A vocação do ser catequista », loc. cit., p. 4.
26 ID., « Caminhos criativos radicados na Igreja », loc. cit.,
p. 28.
27 ID., Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 266.
30

4 Pages 31-40

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4.1 Page 31

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pona: uma « inquietação do coração que o leva
ao encontro pessoal com Cristo; que o leva a
compreender que aquele Deus que ele procurava
longe de si é o Deus próximo de cada ser
humano, o Deus próximo do nosso coração,
mais íntimo a nós do que nós mesmos ». É uma
procura que continua: « Agostinho não se detém,
não se acomoda, não se fecha em si mesmo,
como aquele que já chegou à meta, mas continua
o caminho. A inquietação da busca da verdade, da
busca de Deus, torna-se inquietação de o conhe-
cer cada vez mais e de sair de si mesmo para o
dar a conhecer aos outros. É precisamente a
inquietação do amor » .28
Na alegria do sim fiel
6. Quem encontrou o Senhor e o segue
com fidelidade é um mensageiro da alegria do
Espírito.
« Só graças a esse encontro – ou reencontro –
com o amor de Deus, que se converte em amiza-
de feliz, é que somos resgatados da nossa
consciência isolada e da autorreferencialida-
de » .29 Quem é chamado é convocado para si
mesmo, isto é, para o seu poder ser. Talvez
28 ID., « Com a inquietação no coração », loc. cit., p. 6.
29 ID., Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 8.
31

4.2 Page 32

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possamos dizer que a crise da vida consagrada
passa também pela incapacidade de reconhecer
esse profundo chamamento, mesmo naqueles
que já vivem essa vocação.
Vivemos uma crise de fidelidade, entendida
como adesão consciente a um chamamento que é
um percurso, um caminho, desde o seu início
misterioso até ao seu misterioso fim.
Talvez se esteja também numa crise de huma-
nização. Estamos a viver os limites de uma
coerência total, feridos pela incapacidade de
realizar, no tempo, a nossa vida como vocação
unitária e caminho fiel.
Um caminho quotidiano, pessoal e fraterno,
marcado pelo descontentamento, pela amargura
que nos fecha na tristeza, como que numa per-
manente saudade, por estradas inexploradas e
sonhos por realizar, torna-se um caminho soli-
tário. A nossa vida, chamada à relação na con-
strução do amor, pode transformar-se numa
charneca desabitada. Somos convidados, em
qualquer idade, a revisitar o centro profundo da
vida pessoal, onde encontram significado e ver-
dade as motivações do nosso viver com o Mestre,
discípulos e discípulas do Mestre.
A fidelidade é consciência do amor que nos
orienta para o Tu de Deus e para qualquer outra
pessoa, de maneira constante e dinâmica, en-
quanto sentimos em nós a vida do Ressuscitado:
32

4.3 Page 33

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« Os que se deixam salvar por Ele são libertados
do pecado, da tristeza, do vazio interior, do
isolamento » .30
O discipulado fiel é graça e exercício de amor,
exercício de caridade oblativa: « Quando cami-
nhamos sem a Cruz, quando edificamos sem a
Cruz ou confessamos um Cristo sem Cruz, não
somos discípulos do Senhor: somos mundanos,
somos bispos, padres, cardeais, papas, mas não
discípulos do Senhor » .31
Perseverar até ao Gólgota, sentir as dilace-
rações das dúvidas e do renegar, alegrar-se com
a maravilha e com a estupefação da Páscoa até
à manifestação do Pentecostes e à evangeliza-
ção aos povos, são etapas da fidelidade alegre
porque quenótica, vivida durante a vida intei-
ra, mesmo na prova do martírio e, ao mesmo
tempo, participante da vida ressuscitada de
Cristo: « É da Cruz, supremo ato de misericórdia
e de amor, que se renasce como nova criatura
(Gl 6, 15) » .32
No lugar teologal em que Deus, revelando-se,
nos revela a nós mesmos, o Senhor pede-nos,
portanto, para voltarmos a procurar, fides quae-
30 Ibidem, n. 1.
31 ID., « A nossa vida é um caminho » – homilias aos
cardeais eleitores (Roma, 14 de março de 2013) –, in
L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 11, domingo, 17 de
março de 2013, p. 9.
32 ID., « A evangelização faz-se de joelhos », loc. cit., p. 7.
33

4.4 Page 34

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rens: « Procura a justiça, a fé, o amor e a paz
com todos os que, de coração puro, invocam o
Senhor » (2 Tm 2, 22).
A peregrinação interior começa na oração:
« A primeira coisa necessária para um discípulo
é estar com o Mestre, ouvi-lo, aprender dele.
E isto é sempre válido, é um caminho que dura a
vida inteira. […] Se, no nosso coração, não há o
calor de Deus, do seu amor, da sua ternura,
como podemos nós, pobres pecadores, inflamar
o coração dos outros? » .33 Este itinerário dura a
vida inteira, enquanto o Espírito Santo, na hu-
mildade da oração, nos convence do senhorio de
Cristo em nós: « Todos os dias, o Senhor chama-
nos a segui-lo, corajosa e fielmente; fez-nos o
grande dom de nos escolher como seus discípu-
los; convida-nos a anunciá-lo jubilosamente
como o Ressuscitado, mas pede-nos para o fazer-
mos, no dia a dia, com a palavra e o testemunho
da nossa vida, no quotidiano. O Senhor é o
único, o único Deus da nossa vida e convida-nos
a despojar-nos dos numerosos ídolos e adorá-lo
só a Ele » .34
33 ID., « A vocação de ser catequista », loc. cit., p. 4.
34 ID., « Coerência entre palavra e vida » – em São Paulo
Extramuros, o Papa exortou a abandonar os ídolos e a ado-
rar o Senhor (Roma, 14 de abril de 2013) –, in L’Osserva-
tore Romano, ed. portuguesa, n. 16, domingo, 21 de abril de
2013, p. 9.
34

4.5 Page 35

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O Papa apresenta a oração como a fonte da
fecundidade missionária: « Cultivemos a dimen-
são contemplativa, mesmo no turbilhão dos
compromissos mais urgentes e pesados. E quan-
to mais a missão vos chamar para irdes às
periferias existenciais, tanto mais o vosso coração
se mantenha unido ao de Cristo, cheio de mise-
ricórdia e de amor » .35
O estar com Jesus leva a ter um olhar contem-
plativo da história, para vermos e escutarmos em
toda a parte a presença do Espírito e, de forma
privilegiada, discernirmos a sua presença, a fim
de vivermos o tempo como tempo de Deus.
Quando falta um olhar de fé, « a vida perde
gradualmente sentido, o rosto dos irmãos tor-
na-se opaco, impossibilitando descobrir nele o
rosto de Cristo; os acontecimentos da história
tornamse ambíguos, senão mesmo vazios de es-
perança » .36
A contemplação abre-nos à atitude profética.
O profeta é um homem « que tem os olhos
penetrantes e que escuta e diz as palavras de
Deus; […] um homem de três tempos: promessa
35 ID., « A evangelização faz-se de joelhos », loc. cit., p. 7.
36 CONGREGAÇÃO PARA OS INSTITUTOS DE VIDA CONSAGRA-
DA E AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA, Instrução Repartir
de Cristo. Um renovado empenho da vida consagrada no
Terceiro Milénio (19 de maio de 2002), n. 25; EnchVat 21,
pp. 372-510.
35

4.6 Page 36

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do passado, contemplação do presente, coragem
para indicar o caminho do futuro » .37
Por fim, a fidelidade no discipulado passa
e é comprovada pela experiência da fraterni-
dade, lugar teológico, no qual somos chama-
dos a apoiar-nos no sim jubiloso do Evangelho:
« É a Palavra de Deus que suscita a fé, que a
alimenta e regenera. É a Palavra de Deus que
sensibiliza os corações, que os converte a Deus e
à sua lógica, que é tão diferente da nossa; é a
Palavra de Deus que renova continuamente as
nossas comunidades » .38
O Papa convida-nos, portanto, a renovar e
qualificar com alegria e paixão a nossa vocação,
porque o ato totalizante do amor é um processo
constante: « Amadurece, amadurece, amadure-
ce » ,39 num progresso permanente em que o sim
da nossa vontade à Sua une vontade, intelecto
e sentimento. « O amor nunca está “concluído”
37 FRANCISCO, « O homem de olho penetrante » – medi-
tação matinal na capela da Casa de Santa Marta (16 de
dezembro de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. típica,
segunda e terça-feira, 16-17 de dezembro de 2013, CLIII
(289), p. 7. A edição portuguesa não reproduz o texto.
38 ID., « A atração que faz crescer a Igreja » – encontro com
os sacerdotes, os religiosos, as religiosas e os leigos, na catedral
de São Rufino (Assis, 4 de outubro de 2013) –, in L’Osser-
vatore Romano, ed. portuguesa, n. 41, domingo, 13 de outu-
bro de 2013, p. 6.
39 ID., « Autênticos e coeremes », loc. cit., p. 5.
36

4.7 Page 37

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e completado; transforma-se ao longo da vida,
amadurece e, por isso mesmo, permanece fiel a
si próprio » .40
40 BENTO XVI, Carta Encíclica Deus caritas est (25 de de-
zembro de 2005), n. 17; AAS 98 (2006), pp. 217-252.
37

4.8 Page 38

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4.9 Page 39

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CONSOLAI,
CONSOLAI O MEU POVO

4.10 Page 40

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5 Pages 41-50

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5.1 Page 41

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Consolai, consolai o meu povo,
diz o vosso Deus.
Falai co coração de Jernsalém.
Isaías 40, 1-2

5.2 Page 42

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5.3 Page 43

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À escuta
7. Com uma peculiaridade estilística, que vol-
tará a encontrar-se mais adiante (cf. Is 51, 17;
52, 1: « Desperta, desperta! »), os oráculos da
segunda parte de Isaías (40-55) lançam o apelo a
ir em ajuda de Israel exilado, que tende a fechar-
se no vazio de uma memória falhada. O contexto
histórico pertence claramente à fase do prolon-
gado exílio do povo em Babilónia (587-538 a.C.),
com toda a consequente humilhação e o sentido
de impotência daí resultante. Todavia, a desagre-
gação do Império Assírio sob a pressão da nova
potência emergente, a persa, guiada pelo astro
nascente que era Ciro, leva o profeta a intuir
que poderia vir daí uma libertação inesperada;
o que, de facto, sucederá. O profeta, sob a in-
spiração de Deus, dá voz pública a essa possibi-
lidade, interpretando os movimentos políticos e
militares como ação guiada misteriosamente por
Deus através de Ciro, e proclama que a liber-
tação está próxima e o regresso à terra dos pais
está iminente.
As palavras que Isaías emprega – consolai...
falai ao coração – encontram-se com uma certa
frequência no Antigo Testamento; têm especial
43

5.4 Page 44

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relevância as passagens onde se encontram diá-
logos de ternura e afeto. Como quando Rute
reconhece que Booz « a consolou e lhe falou ao
coração » (cf. Rt 2, 12); ou então, na famosa
página ele Oséias, que diz à sua esposa (Gomer)
querer atraí-la ao deserto para lhe « falar ao
coração » (cf. Os 2, 16-17), em ordem a uma nova
estação de fidelidade. Mas também há outros
paralelismos semelhantes, como o diálogo de
Siquém, filho de Hamor, enamorado de Dina
(cf. Gn 34, 1-5) ou o do levita de Efraim, que fala
à concubina que o abandonou (cf. Jz 19, 3).
Trata-se, portanto, de uma linguagem que
deve ser interpretada no contexto do amor, e não
do encorajamento; portanto, ação e palavra ao
mesmo tempo delicadas e encorajadoras, mas
que aludem aos laços afetivos e intensos de Deus,
« esposo » de Israel. E a consolação deve ser
epifania de uma pertença recíproca, jogo de
intensa empatia, de comoção e ligação vital.
Não são, portanto, palavras superficiais e adoça-
das, mas Misericórdia e visceralidade, preocupa-
ção, abraço que fortalece e paciente proximidade
para reencontrar as estradas da confiança.
Levar o abraço de Deus
8. « Hoje, as pessoas precisam certamente de
palavras, mas sobretudo têm necessidade de
quem testemunhe a misericórdia, a ternura do
44

5.5 Page 45

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Senhor que aquece o coração, desperta a espe-
rança, atrai para o bem. A alegria de levar a
consolação de Deus! » 1.
O papa Francisco confia aos consagrados e
consagradas essa missão: encontrar o Senhor que
nos consola como uma mãe, e consola o povo
de Deus.
Da alegria do encontro com o Senhor e do seu
chamamento brota o serviço na Igreja, a missão:
levar aos homens e mulheres do nosso tempo a
consolação de Deus; testemunhar a sua miseri-
córdia 2.
Na visão de Jesus, a consolação é dom do
Espírito, o Paráclito, o Consolador que nos con-
sola nas provas e acende uma esperança que não
desilude. Assim, a consolação cristã torna-se
conforto, encorajamento, esperança: é presença
operante do Espírito (cf. Jo 14, 16-17), fruto do
Espírito, e o « fruto do Espírito é caridade,
alegria, paz, paciência, benignidade, bondade,
fidelidade, mansidão, temperança » (Gl 5, 22).
Num mundo que vive de desconfiança, de
desânimo e depressão, numa cultura em que os
homens e mulheres se deixam levar por fragili-
dades e fraquezas, por individualismos e interes-
ses pessoais, é-nos pedido que introduzamos a
1 FRANCISCO, « A evangelização faz-se de joelhos », loc. cit.,
p. 7.
2 Cf. ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 4.
45

5.6 Page 46

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confiança na possibilidade de uma felicidade
verdadeira, de uma esperança possível, que não
se apoie unicamente nos talentos, nas qualidades,
no saber, mas em Deus. Todos podem encontrá-
lo; basta procurá-lo de coração sincero.
Os homens e mulheres do nosso tempo espe-
ram palavras de consolação, proximidade,
perdão, alegria verdadeira. Somos chamados a
levar a todos o abraço de Deus, que se inclina
sobre nós com ternura de mãe: consagrados,
sinal de humanidade plena, facilitadores e não
controladores da graça 3, marcados pelo sinal da
consolação.
A ternura faz-nos bem
9. Testemunhas de comunhão para além das
nossas maneiras de ver e dos nossos limites,
somos, portanto, chamados a levar o sorriso de
Deus; e a fraternidade é o primeiro e mais
credível Evangelho que podemos contar. Pede-
se-nos para humanizar as nossas comunidades:
« Cuidai da amizade entre vós, da vida de família,
do amor entre vós. E que o mosteiro não seja um
purgatório, mas uma família. Os problemas exis-
tem e existirão, mas como se faz numa família,
com amor, procurai uma solução com caridade;
não destruais esta em nome daquela; que não
3 Cf. ID., Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 47.
46

5.7 Page 47

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haja competição. Cuidai da vida de comunidade,
pois quando a vida de comunidade é vida de
família, o Espírito Santo encontra-se no seio da
comunidade. Sempre com um coração grande.
Deixai passar, não vos vanglorieis, suportai tudo,
sorri com o coração. E o sinal disto é a alegria » 4.
A alegria consolida-se na experiência da fra-
ternidade, qual lugar teológico, onde cada um é
responsável da fidelidade ao Evangelho e do
crescimento de cada um. Quando uma fraterni-
dade se alimenta do mesmo Corpo e Sangue de
Jesus, reúne-se à volta do Filho de Deus para
partilhar o caminho de fé guiado pela Palavra,
torna-se uma só coisa com Ele; é uma fraterni-
dade em comunhão, que sente o amor gratuito e
vive em festa, livre, alegre, cheia de coragem.
« Uma fraternidade sem alegria é uma frater-
nidade que se apaga. […] Uma fraternidade rica
de alegria é um verdadeiro dom do Alto para os
irmãos que sabem pedi-lo e que sabem aceitar-se
uns aos outros, empenhando-se na vida fraterna
com confiança na ação do Espírito » 5.
4 ID., « Para uma clausura de grande humanidade » – reco-
mendações às Clarissas, na Basílica de Santa Clara (Assis, 4 de
outubro de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa,
n. 41, domingo, 13 de outubro de 2013, p. 7.
5 CONGREGAÇÃO PARA OS INSTITUTOS DE VIDA CONSAGRA-
DA E AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA, Instrução sobre
a vida fraterna em comunidade. « Congregavit nos in unum
Christi amor » (2 de fevereiro de 1994), n. 28; Ench/Vat 14,
pp. 345-537.
47

5.8 Page 48

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No tempo em que a fragmentação leva a um
individualismo estéril e de massa, e a fraqueza
das relações desagrega e asfixia a atenção pelo
humano, somos convidados a humanizar as re-
lações de fraternidade para favorecer a comu-
nhão dos espíritos e dos corações ao estilo do
Evangelho, porque « existe uma comunhão de
vida entre todos aqueles que pertencem a Cris-
to. Uma comunhão que nasce da fé » e que faz
da « Igreja, na sua verdade mais profunda, co-
munhão com Deus, familiaridade com Deus,
comunhão de amor com Cristo e com o Pai no
Espírito Santo, que se prolonga numa comunhão
Fraterna » 6.
Para o papa Francisco, o selo da fraternidade
é a ternura, uma « ternura eucarística », porque
« a ternura faz-nos bem ». A fraternidade tem
« uma enorme força de convocação. […] A fra-
ternidade religiosa, mesmo com todas as di-
ferenças possíveis, é uma experiência de amor
que ultrapassa os conflitos » 7.
6 FRANCISCO, « Uma grande família entre o céu e a terra »
– na audiência geral, o Papa Francisco falou sobre a comu-
nhão dos Santos (Roma, 30 de outubro de 2013) –, in L’Os-
servatore Romano, ed. portuguesa, n. 44, domingo, 31 de
outubro de 2013, p. 16.
7 ANTONIO SPADARO, Sede profetas verdadeiros e não brin-
queis a sê-lo, op. cit., pp. 10 e 11.
48

5.9 Page 49

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A proximidade como companhia
10. Somos chamados a realizar um êxodo de
nós mesmos, num caminho de adoração e de
serviço 8. « Sair pela porta para procurar e encon-
trar! Ter a coragem de ir contra a corrente dessa
cultura eficientista, dessa cultura da rejeição.
O encontro e o acolhimento de todos, a solida-
riedade e a fraternidade, são os elementos que
tornam a nossa civilização verdadeiramente hu-
mana. Temos de ser servidores da comunhão e da
cultura do encontro! Quero-vos quase obsessivos
neste aspecto. E fazê-lo sem ser presunçosos » 9.
« O fantasma que se deve combater é a ima-
gem da vida religiosa entendida como refúgio e
conforto face a um mundo exterior difícil e
complexo » .10 O Papa exorta-nos a « sair do
ninho » ,11 para habitarmos na vida dos homens e
mulheres do nosso tempo, e a nos entregarmos a
Deus e ao próximo.
« A alegria nasce da gratuidade de um encon-
tro! […] E a alegria do encontro com Ele e do
seu chamamento faz com que não nos fechemos,
8 Cf. FRANCISCO, « Um caminho de adoração e serviço »,
loc. cit., p. 2.
9 ID., « Nas encruzilhadas das estradas », loc. cit., pp. 11
e 12.
10 ANTONIO SPADARO, Sede profetas verdadeiros e não brin-
queis a sê-lo, op. cit., p. 10.
11 Cf. Ibidem, p. 9.
49

5.10 Page 50

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mas que nos abramos; leva ao serviço na Igreja.
São Tomás dizia: “Bonum est diffusivum sui
(o bem difunde-se). E a alegria também se difun-
de. Não tenhais medo de mostrar a alegria de
haverdes respondido ao chamamento do Senhor,
à sua escolha de amor, e de testemunhar o seu
Evangelho no serviço à Igreja. E a alegria, a
verdadeira alegria, é contagiosa; contagia... faz-
nos ir em frente » .12
Perante o testemunho contagioso de alegria,
de serenidade, de fecundidade, o testemunho da
ternura e do amor, da caridade humilde, sem
prepotência, muitos sentem a necessidade de
vir ver .13
Várias vezes o papa Francisco indicou o ca-
minho da atração, do contágio, como caminho
para fazer crescer a Igreja, caminho da nova
evangelização. « A Igreja deve atrair. Despertai o
mundo! Sede testemunhas de um modo diferen-
te de fazer, de agir, de viver! É pos sível viver
diversamente neste mundo. […] Eu espero de
vós um tal testemunho » .14
12 FRANCISCO, « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 4.
13 Cf. ID., « A humildade é a força do Evangelho » – me-
ditação matinal na capela da Casa de Santa Marta (1 de outu-
bro de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. típica, quarta-
feira, 2 de outubro de 2013, CLIII (225), p. 8. A edição
portuguesa não reproduz o texto.
14 ANTONIO SPADARO, Sede profelas verdadeiros e não brin-
queis a sê-lo, op. cit., p. 8.
50

6 Pages 51-60

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6.1 Page 51

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Confiando-nos a missão de despertar o mun-
do, o Papa impele-nos a encontrar as histórias
dos homens e mulheres de hoje à luz de duas
categorias pastorais, que têm as suas raízes na
novidade do Evangelho: a proximidade e o encon-
tro, duas modalidades, através das quais o
próprio Deus se revelou na história a ponto de
encarnar.
Na estrada de Emaús, como Jesus com os
discípulos, acolhamos na companhia quotidiana
as alegrias e dores das pessoas, dando « calor ao
coração » ,15 esperando com ternura os cansados,
os fracos, para que o caminho feito em comum
tenha em Cristo luz e significado.
O nosso caminho « amadurece até à paterni-
dade pastoral, até à maternidade pastoral e,
quando um sacerdote não é pai da sua comuni-
dade, quando uma religiosa não é mãe de todos
aqueles com os quais trabalha, torna-se triste.
Eis o problema. Por isso vos digo: a raiz da
tristeza na vida pastoral consiste precisamente na
falta de paternidade e maternidade, que vem do
viver mal esta consagração; esta, pelo contrário,
deve-nos conduzir à fecundidade » .16
15 Cf. FRANCISCO, « Para uma lgreja que reconduz o homem
a casa » – encontro com os bispos do Brasil no palácio
arquiepiscopal do Rio de janeiro (Rio de janeiro, 27 de julho
de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 31,
4 de agosto de 2013, p. 16.
16 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 5.
51

6.2 Page 52

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A inquietação do amor
11. Ícones vivos da maternidade e da proxi-
midade da Igreja, vamos ao encontro dos que
esperam a Palavra da consolação, inclinando-nos
com amor materno e espírito paterno sobre os
pobres e os fracos.
O Papa convida-nos a não privatizar o amor,
mas, com a inquietação de quem procura, « pro-
curar sempre, sem tréguas, o bem do outro, da
pessoa amada » .17
A crise de sentido do homem moderno e a
crise económica e moral da sociedade ocidental e
das suas instituições não são um acontecimento
passageiro dos tempos em que vivemos, mas
desenham um momento histórico de excepcional
importância. Somos chamados então, como Igre-
ja, a sair para ir às periferias geográficas, urbanas
e existenciais – as do mistério do pecado, da dor,
das injustiças, da miséria –, aos lugares recôndi-
tos da alma, onde cada pessoa experimenta a
alegria e o sofrimento do viver .18
« Vivemos numa cultura do desencontro, uma
cultura da fragmentação, uma cultura na qual o
17 ID., « Com a inquietação no coração », loc. cit., p. 6.
18 Cf. ID., « Uma Igreja que vai ao encontro de todos »
– vigília de oração presidida pelo papa Francisco por ocasião
do dia dos movimentos, das novas comunidades, das asso-
ciações e das agregações laicais no Ano da Fé (Roma, 18 de
maio de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa,
n. 21, domingo, 26 de maio de 2013, p. 10.
52

6.3 Page 53

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que não me serve é jogado fora […]. Hoje, en-
contrar um sem-abrigo morto de frio não é
notícia ». « A pobreza é uma categoria teologal
porque o Filho de Deus humilhou-se, para ca-
minhar pelas estradas. […] Uma Igreja pobre
para os pobres começa por dirigir-se à carne de
Cristo. Se nos fixarmos na carne de Cristo,
começamos a compreender qualquer coisa, a
compreender o que é esta pobreza, a pobreza
do Senhor » .19 Viver a bem-aventurança dos po-
bres significa ser sinal de que a angústia da
solidão e do limite é vencida pela alegria de
quem é verdadeiramente livre em Cristo e apren-
deu a amar.
Durante a sua visita pastoral a Assis, o papa
Francisco perguntava de que devia despojar-se a
Igreja. E respondia: « De qualquer ação que não
é para Deus, que não é de Deus; do medo de
abrir as portas para ir ao encontro de todos,
sobretudo dos mais pobres, dos necessitados,
dos distantes, sem esperar; certamente, não para
se perder no naufrágio do mundo, mas para levar
com coragem a luz de Cristo, a luz do Evangelho,
também à escuridão, aonde não se vê, aonde
pode acontecer que se tropece; despojar-se da
tranquilidade aparente que as estruturas ofere-
cem, estruturas certamente necessárias e impor-
tantes, mas que nunca devem obscurecer a única
19 Ibidem, p. 11.
53

6.4 Page 54

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verdadeira força que a Igreja tem em si: Deus.
Ele é a nossa força! » .20
Eis um convite a « não ter medo da novidade
que o Espírito Santo faz em nós, não ter medo da
renovação das estruturas. A Igreja é livre.
Condu-la o Espírito Santo. É o que Jesus nos
ensina no Evangelho: a liberdade necessária para
encontrar sempre a novidade do Evangelho na
nossa vida e também nas estruturas. A liberdade
de escolher odres novos para esta novidade » .21
Somos convidados a ser homens e mulheres
audazes, de fronteira: « A nossa fé não é uma
fé-laboratório, mas uma fé-caminho, uma fé his-
tórica. Deus revelou-se como história, não como
um compêndio de verdades abstratas. […] Não é
preciso levar a fronteira para casa, mas viver na
fronteira e ser audazes » .22
Juntamente com o desafio da bem-aventu-
rança dos pobres, o Papa convida a visitar as
20 ID., « Uma lgreja despojada da mundanidade » – encon-
tro com os pobres, os desempregados e os imigrantes
assistidos pela Cáritas (Assis, 4 de outubro de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 41, domingo,
13 de outubro de 2013, p. 4.
21 ID., « Renovação sem temores » – meditação matinal
na capela da Casa de Santa Marta (6 de julho de 2013) –,
in L’Osservatore Romano, ed. típica, domingo, 7 de julho de
2013, CLIII (154), p. 7. A edição portuguesa não reproduz
o texto.
22 ANTONIO SPADARO, « Entrevista ao papa Francisco »,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 39, domingo,
29 de setembro de 2013, p. 21.
54

6.5 Page 55

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fronteiras do pensamento e da cultura, a favore-
cer o diálogo, inclusive a nível intelectual, para
darmos razão da esperança, na base de critérios
éticos e espirituais, interrogando-nos sobre o que
é bom. A fé nunca limita o espaço da razão, mas
abre-o a uma visão integral do homem e da
realidade, e defende do perigo de reduzir o
homem a « material humano » .23
A cultura, chamada a servir constantemente a
humanidade em todas as condições, se for autên-
tica, rasga caminhos inexplorados, passagens que
fazem respirar esperança, consolidam o sentido
da vida, conservam o bem comum. Um autêntico
processo cultural « faz crescer a humanização
integral e a cultura do encontro e do relaciona-
mento; este é o modo cristão de promover o bem
comum, a alegria de viver. E aqui convergem fé e
razão, a dimensão religiosa com os diferentes
aspectos da cultura humana: arte, ciência, traba-
lho, literatura » .24 Uma autêntica busca cultural
encontra a história e abre caminhos para procu-
rar o rosto de Deus.
23 Cf. FRANCISCO, « O apocalipse que não virá » – discurso
ao mundo académico e cultural (Cagliari, 22 de setembro de
2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 39,
domingo, 29 de setembro de 2013, p. 8.
24 ID., « Favorecer diálogo e encontro » – discurso do Papa
à classe dirigente do Brasil (Rio de Janeiro, 27 de julho de
2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 31,
domingo, 4 de agosto de 2013, p. 13.
55

6.6 Page 56

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Os lugares onde se elabora e comunica o
saber são também os lugares onde se cria uma
cultura da proximidade, do encontro e do diálo-
go, abaixando as defesas, abrindo as portas,
construindo pontes .25
25 Cf. ID., « Homens de fronteira » – discurso do Papa aos
membros equipe da revista La Civiltà Cattolica (Roma, 14 de
junho de 2013) –, in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa,
n. 25, domingo, 23 de iunho de 2013, p. 13.
56

6.7 Page 57

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PARA REFLEXÃO

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12. O mundo, como rede global em que
todos estamos integrados, onde nenhuma tra-
dição local pode ambicionar ter o monopólio da
verdade, onde as tecnologias têm efeitos que
atingem a todos, lança um desafio constante ao
Evangelho e a quem vive a vida à maneira do
Evangelho.
O papa Francisco está a realizar, neste mo-
mento histórico, através de opções e modalida-
des de vida, uma hermenêutica viva do diálogo
Deus-mundo. Introduz-nos num estilo de sabe-
doria, que, radicada no Evangelho e na escatolo-
gia do humano, lê o pluralismo, procura o
equilíbrio, convida a habilitar a capacidade de
ser responsáveis da mudança, para que a ver-
dade do Evangelho seja comunicada cada vez
melhor, enquanto nos movemos « por entre as
limitações da linguagem e das circunstãncias » 1
e, conscientes destes limites, cada um de nós se
torna « fraco com os fracos... tudo para todos »
(1 Cor 9, 22).
Somos convidados a cultivar uma dinâmica
generativa, não simplesmente administrativa,
para acolher os acontecimentos espirituais, pre-
1 FRANCISCO, Exortação Apostólica Evangelii gaudium,
n. 45.
59

6.10 Page 60

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sentes nas nossas comunidades e no mundo;
movimentos e graça, que o Espírito realiza em
cada pessoa, vista como pessoa. Somos convida-
dos a empenhar-nos na desestruturação de
modêlos sem vida para narrar o humano marca-
do por Cristo e nunca revelado de forma
absoluta nas linguagens e nos modos.
O papa Francisco convida-nos a uma sabedo-
ria que seja sinal de uma consistência dúctil,
capacidade dos consagrados de se moverem se-
gundo o Evangelho, de atuarem e fazerem
escolhas segundo o Evangelho, sem se perderem
nas diversas esferas de vida, linguagens, relações
e mantendo o sentido da responsabilidade, dos
laços que nos ligam, da restrição dos nossos
limites, da infinidade das formas como a vida se
exprime. Um coração missionário é um coração
que conheceu a alegria da salvação de Cristo e
partilha-a como consolação no sinal do limite
humano: « Sabe que ele mesmo deve crescer na
compreensão do Evangelho e no discernimento
das sendas do Espírito, e assim não renuncia ao
bem possível, ainda que corra o risco de se sujar
com a lama da estrada » 2.
Acolhamos as solicitações que o Papa nos
propõe para olhar para nós próprios e para o
mundo com os olhos de Cristo, e assim ficar
inquietos.
2 Ibidem.
60

7 Pages 61-70

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7.1 Page 61

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As perguntas do papa Francisco
• Queria dizer-vos uma palavra, e a palavra é
alegria. Onde estão os consagrados, os se-
minaristas, as religiosas e os religiosos, os
jovens, há sempre alegria, há sempre júbilo!
É a alegria do vigor, é a alegria de seguir Jesus;
a alegria que nos dá o Espírito Santo, não a
alegria do mundo. Há alegria! Mas, onde
nasce a alegria? 3.
• Olha no fundo do teu coração, olha no íntimo
de ti mesmo, e interroga-te: tens um coração
que aspira a algo de grande ou um cora-
ção entorpecido pelas coisas? O teu coração
conservou a inquietação da procura ou per-
mitiste que ele fosse sufocado pelos bens, que
terminam por atrofiá-lo? Deus espera por ti,
procura-te: o que lhe respondes? Apercebes-
te desta situação da tua alma? Ou dormes?
Acreditas que Deus te espera ou, para ti, esta
verdade não passa de « palavras »? 4.
• Somos vítimas desta cultura do provisório.
Gostaria que pensásseis nisto: como posso ser
livre, como posso libertar-me desta cultura do
provisório? 5.
3 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 4.
4 ID., « Com a inquietação no coração », loc. cit., p. 6.
5 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 4.
61

7.2 Page 62

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• Esta é uma responsabilidade, em primeiro
lugar dos adultos, dos formadores: dar um
exemplo de coerência aos mais jovens. Que-
remos jovens coerentes? Sejamos nós coeren-
tes! Caso contrário, o Senhor nos dirá o que
dizia dos fariseus ao povo de Deus: « Fazei o
que dizem, mas não o que fazem! » Coerência
e autenticidade! 6.
• Podemos perguntar-nos: eu vivo inquieto por
Deus, por anunciá-lo, por dá-lo a conhe-
cer? Ou então deixo-me fascinar por aquela
mundanidade espiritual que leva a fazer tudo
por amor-próprio? Nós, consagrados, pen-
samos nos interesses pessoais, no funciona-
lismo das obras, no carreirismo. Mas pode-
mos pensar em tantas coisas... Por assim di-
zer, « acomodei-me » na minha vida cristã, na
minha vida sacerdotal, na minha vida religio-
sa, e até na minha vida de comunidade, ou
conservo a força da inquietação por Deus,
pela sua Palavra, que me leva a « sair » e ir
rumo aos outros? 7.
• Como vivemos a inquietação do amor? Cre-
mos no amor a Deus e ao próximo, ou somos
nominalistas a este propósito? Não de modo
abstrato, não somente pelas palavras, mas o
6 Ibidem, p. 5.
7 ID., « Com a inquietaçao no coraçao », loc. cit., p. 6.
62

7.3 Page 63

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irmão concreto que en-contramos, o irmão
que está ao nosso lado! Deixamo-nos inquie-
tar pelas suas necessidades, ou permanecemos
fechados em nós mesmos, nas nossas comu-
nidades, que com frequência são para nós
« comunidades-comodidades »? 8.
• Este é um bom caminho para a santidade!
Não falar mal dos outros. « Mas, padre, há
problemas... »: di-lo ao superior, di-lo à supe-
riora, ao bispo, que pode remediar. Não o
digas a quem nada pode fazer. Isto é impor-
tante: fraternidade! Mas diz-me, tu falarás
mal da tua mãe, do teu pai, dos teus irmãos?
Nunca. E porque o fazes na vida consagrada,
no seminário, na vida presbiteral? Só isto:
pensai, pensai... Fraternidade! Este amor fra-
terno! 9.
• Aos pés da cruz, Maria é a mulher da dor e, ao
mesmo tempo, da vigilante espera de um
mistério, maior que a dor, que está para se
cumprir. Tudo parece realmente acabado;
toda a esperança poderíamos dizer que se
apagou. Também ela, naquele momento, po-
deria ter exclamado, recordando as promes-
sas da anunciação: não se cumpriram, fui en-
8 Ibidem, p. 7.
9 ID., « Autênticos e coerentes », loc. cit., p. 5.
63

7.4 Page 64

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ganada. Mas não o disse. Contudo ela, bem-
aventurada porque acreditou, desta sua fé vê
brotar um futuro novo e aguarda com espe-
rança o amanhã de Deus. Às vezes, penso:
nós sabemos esperar o amanhã de Deus?
Ou queremos o hoje? O amanhã de Deus é
para ela o amanhecer da Páscoa, daquele
primeiro dia da semana. Far-nos-á bem pen-
sar, em contemplação, no abraço do Filho
com a Mãe. A única lâmpada acesa no sepul-
cro de Jesus é a esperança da Mãe, que
naquele momento é a esperança de toda a
Humanidade. Pergunto a mim e a vós: nos
mosteiros, esta lâmpada ainda está acesa? Nos
mosteiros, espera-se o amanhã de Deus? .10
• A inquietação do amor impele-nos sempre
a ir ao encontro do outro, sem esperar que
seja o outro a manifestar a sua necessidade.
A inquietação do amor oferece-nos a dádi-
va da fecundidade pastoral, e nós devemos
perguntar-nos, cada um de nós: como está a
minha fecundidade espiritual, a minha fecun-
didade pastoral? .11
10 ID., « Aqueles que sabem esperar » – às monjas camaldu-
lenses, o Papa indicou Maria como modêlo de esperança
(Roma, 21 de novembro de 2013) –, in L’Osservatore Ro-
mano, ed. portuguesa, n. 48, domingo, 28 de novembro de
2013, p. 5.
11 ID., « Com a inquietação no coração », loc. cit., p. 7.
64

7.5 Page 65

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• Uma fé autêntica exige sempre um desejo
profundo de mudar o mundo. Eis a pergunta
que nos devemos fazer: temos também nós
grandes visões e estímulos? Somos também
nós audazes? O nosso sonho voa alto? O zelo
devora-nos (cf. Sl 69, 10), ou somos medíocres
e satisfazemo-nos com as nossas programa-
ções apostólicas de laboratório? .12
12 ID., « O Evangelho anuncia-se com a doçura » – na Igre-
sia de Jesus o Papa celeba a missa de agradecimento pela
canonização de Pedro Fabro (Roma, 3 de janeiro de 2014) –,
in L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 2, domingo, 9 de
janeiro de 2014, p. 7.
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7.7 Page 67

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Ave, Mãe da alegria
13. « Alegra-te, cheia de graça » (Lc 1, 28).
« A saudação do Anjo a Maria constitui um
convite à alegria, a um júbilo profundo; anun-
cia o fim da tristeza […]. Trata-se de uma
saudação que marca o início do Evangelho, da
Boa-Nova » 1.
Junto a Maria, a alegria expande-se: o Filho
que traz no seio é o Deus da alegria, do júbilo
que contagia, que envolve. Maria abre de par em
par as portas do coração e corre para Isabel.
« Feliz de realizar o seu desejo, delicada no
seu dever, solícita na sua alegria, apressou-se a
dirigir-se para a montanha. Onde, se não para os
1 BENTO XVI, « A força silenciosa que venceu o ruído das
potências do mundo ». Reflexão proposta pelo Pontífice du-
rante a audiência geral de quarta-feira na sala Paulo VI
[Audiência Geral, Roma, 19 de dezembro de 2012], in:
L’Osservatore Romano, ed. portuguesa, n. 51, sábado, 22 de
dezembro de 2012, p. 3.
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7.8 Page 68

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cimos, devia solícitamente tender aquela que já
estava cheia de Deus? » 2.
Dirige-se « apressadamente » (Lc 1, 39) para
levar ao mundo o feliz anúncio, a todos a alegria
irreprimível que acolhe no seio: Jesus, o Senhor.
Apressadamente: não é apenas a velocidade com
que Maria se move. Exprime-nos a sua diligên-
cia, a atenção solícita com que enfrenta a viagem,
o seu entusiasmo.
« Eis a serva do Senhor » (Lc 1, 38). A serva do
Senhor corre apressadamente, para se tornar cria-
da dos seres humanos.
Em Maria, é a Igreja toda que caminha junta:
na caridade de quem se move ao encontro da-
quele que é mais frágil; na esperança de quem
sabe que será acompanhado neste seu andar,
e na fé de quem tem um dom especial a partilhar.
Em Maria, cada um de nós, levado pelo vento do
Espírito, vive a própria vocação a ir!
Estrela da nova evangelização,
ajudai-nos a refulgir
com o testemunho da comunhão,
do serviço, da fé ardente e generosa,
da justiça e do amor aos pobres,
para que a alegria do Evangelho
2 AMBRÓSIO, Expositio Evangelii secundum Lucam, II, 19;
CCL 14, p. 39.
68

7.9 Page 69

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chegue até aos confins da Terra
e nenhuma periferia fique privada da sua luz.
Mãe do Evangelho vivo,
manancial de alegria para os pequeninos,
rogai por nós.
Ámen. Aleluia! 3
Roma, 2 de fevereiro de 2014
Festa da Apresentação do Senhor
João Braz Card. de Aviz
Prefeito
José Rodríguez Carballo, O.F.M.
Arcebispo Secretário
3 FRANCISCO, Exortação Apostólica Evangelii gaudium,
n. 288.
69

7.10 Page 70

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8 Pages 71-80

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8.1 Page 71

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ÍNDICE
Caríssimos Irmãos e Irmãs . . . . . . . . 7
Alegrai-vos, exultai, rejubilai . . . . . . . 11
À escuta . . . . . . . . . . . . . 15
Esta é a beleza . . . . . . . . . . . 19
Ao chamar-vos . . . . . . . . . . . 21
Encontrados, alcançados, transformados . . . 27
Na alegria do sim fiel . . . . . . . . . 31
Consolai, consolai o meu povo . . . . . . . 39
À escuta . . . . . . . . . . . . . 43
Levar o abraço de Deus . . . . . . . . 44
A ternura faz-nos bem . . . . . . . . . 46
A proximidade como companhia . . . . . 49
A inquietação do amor . . . . . . . . 52
Para reflexão . . . . . . . . . . . . 57
As perguntas do papa Francisco . . . . . . 61
Ave, Mãe da alegria . . . . . . . . . . 67
71

8.2 Page 72

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TIP. DETTI − ROMA