CG28|pt|Inspetoria São Lucas, Venezuela

03/03/2020

BOA-NOITE CG28

INSPETORIA SÃO LUCAS, VENEZUELA




Mensagem para o Boa-noite

1. Compartilho convosco as nossas alegrias. Somos uma inspetoria com 150 SDB; 64% deles são venezuelanos de nascimento e 30% são irmãos que vieram ainda jovens como missionários da Espanha e da Itália, que agora têm uma média de 50 anos de presença na Venezuela. Os outros irmãos são da Colômbia, do Vietnã, da Síria, da Polônia, do Congo, de Madagascar, de El Salvador e do México. A idade média dos irmãos da inspetoria é de 57 anos. Temos 42 jovens irmãos em formação inicial. É consolador notar que aumentou nos últimos anos a perseverança vocacional.

Nossa inspetoria tem uma grande variedade de serviços. Formamos 22 comunidades com diferentes trabalhos, que administramos com os leigos, e outros trabalhos confiados a alguns grupos da Família Salesiana. Nossas presenças apostólicas estão localizadas em setores muito populares, onde prestam serviços educativo-pastorais em paróquias, escolas, centros de formação profissional para jovens não-escolarizados, centros juvenis e oratórios.

Uma expressão significativa da nossa inspetoria é constituída pela presença missionária entre os povos indígenas do Estado da Amazônia: existem quatro comunidades que realizam o trabalho pastoral naquela região. Também estamos presentes no estado de Zulia, onde trabalhamos com povos indígenas, uma população mais crioula.

Além dessas presenças missionárias, há dois 'programas' que os salesianos da Venezuela realizam com grande satisfação, em resposta aos desafios da opção preferencial: a Rede de Centros de formação denominada ‘Juventude e Trabalho’ para jovens não-escolarizados; e a Rede de Casas Dom Bosco para crianças e adolescentes em risco elevado. Essas obras tornaram-se o ponto mais avançado da missão salesiana entre os mais pobres.

Quanto ao Programa ‘Juventude e Trabalho’, embora o número de jovens que o frequentam tenha diminuído recentemente, devido à situação complicada em nosso país, ainda é considerada uma resposta concreta para jovens que abandonaram seus estudos ou para quem trabalha sem qualificação. São acolhidos mais de 3000 jovens; se eles não estivessem nesses nossos centros, seriam presa domínio fácil da delinquência ou do desemprego. Por outro lado, a Rede Dom Bosco de Casas mantém um número estável de crianças e adolescentes; neste momento, recebe um impulso renovado, graças à solidariedade possibilitada por projetos financiados pelo exterior.

2. Também quero compartilhar convosco as nossas preocupações com a situação em que vivemos no país, situação muito complexa. Para entender algo do momento presente, tão nefasto, que estamos enfrentando, precisamos retornar a meados do século passado. Desde a sua criação em 1953, a nossa prática democrática não foi educada adequadamente à participação dos cidadãos. O exercício das eleições em vista da alternância de governo foi prejudicado pela corrupção e a oferta de promessas prometedoras e de realização imediata. Desde o início, carecemos de uma sólida formação para a participação política com o controle e a corresponsabilidade do bom cidadão.

As riquezas naturais que Deus deu à nossa terra com o potencial do petróleo e os muitos minerais de alta qualidade em nosso subsolo, paradoxalmente foram convertidas em um fator de empobrecimento progressivo. Enquanto priorizamos os trabalhos no âmbito geológico, negligenciamos progressivamente a agricultura, a produção têxtil e nosso grande potencial turístico. As microempresas de origem privada que poderiam surgir nesses setores alternativos foram canceladas pelos grandes interesses econômicos – nós os chamamos de ‘roscas’ – estragadas ainda mais por esse mal social, que também afeta a Venezuela: a corrupção.

A situação econômica tornou-se muito complexa. O barril de petróleo da década de 1970 não foi explorado em benefício da população e suas demandas de desenvolvimento sustentável. Temos indicadores financeiros que não seriam permitidos em nenhum cálculo feito com inteligência. É suficiente citar, como exemplo de referência, o caso de nosso salário mínimo mensal: dois dólares (US$ 2,00); acrescentando-se a ele o cupom de alimentação concedido pelo regime, equivalente a um dólar, chega-se a três dólares por mês (US$ 3,00).

As consequências socioeconômicas dessa situação são facilmente compreendidas: o empobrecimento progressivo de um povo rico em valores, com uma preciosa identidade cultural ao redor da família, com dedicação ao trabalho e às diversas artes, com um senso de humor próprio do Caribe, agora está em uma situação de alienação. Sentimo-nos alienados de nós mesmos: é algo como um exílio porque, sem sair do nosso espaço geográfico, estamos vivendo fora da nossa cultura. Dessa forma, podemos entender a implosão social que estamos enfrentando, com o fenômeno da emigração que atinge a nós e aos países para os quais emigramos, em particular os países vizinhos e irmãos da América Latina.

Em um contexto socioeconômico e cultural tão complexo, o exercício político dos partidos foi enfraquecendo progressivamente, a ponto de ser privado de sua real importância na vida da nação. A situação de enfraquecimento político foi aproveitada pela ideologia do chamado ‘Socialismo do século XXI’, que desde 1998 entrou e se apoderou das nossas instâncias de governo, com uma suposta revolução social que, de fato, representa uma forma diferente de opressão, agravada ainda mais pelas práticas criminosas daqueles que atualmente usurpam o poder e o governo do país.

- A Vida Consagrada na Venezuela dá um claro testemunho de profecia com sua presença de caridade, especialmente nos campos da educação e da saúde, e com acompanhamento pastoral entre as comunidades pobres. Creio poder afirmar que a Vida Consagrada na Venezuela, respeitando os carismas e as diferentes formas de resposta aos desafios da nova evangelização, se transformou em um testemunho corporativo de fidelidade a Cristo diante dos tão desafiadores problemas sociais e pastorais. Os religiosos que precisaram deixar o país o fizeram por razões de saúde e não porque não estavam mais felizes com a própria vocação ou porque pretendiam abandonar a missão que lhes fora confiada. Guiados pela nossa Conferência Episcopal, os Consagrados da Venezuela, damos passos sinodais – caminhando juntos – na construção de uma Venezuela segundo o Reino de Deus.

3. Compartilho nossos maiores desafios. Neste difícil momento histórico, a força da nossa fidelidade constitui o cerne do desafio, que nos desperta da letargia e do desânimo que gostariam de ter vantagem. Somos chamados a ser testemunhas de esperança, pacientes semeadores de uma democracia de solidariedade a partir do evangelho de Cristo, o Bom Pastor, com a pedagogia e a espiritualidade de Dom Bosco, que em seu tempo enfrentou desafios semelhantes e ofereceu uma resposta preventiva aos seus jovens e à sociedade em transição para a nova República que estava surgindo.

Enfrentamos os desafios mais urgentes, como dar uma primeira resposta à fome, à falta de alimentos e de medicamentos. No campo da educação formal, é um desafio garantir a qualidade dos diferentes atores – alunos e professores – em todos os níveis de estudo; a manutenção das instalações é outro problema sério. O problema é tão complexo que, às vezes, parece obscurecer qual é realmente o desafio mais importante, ou seja, a transformação de um povo segundo Deus. Da desordem social, do desânimo, da anarquia, da prática de corrupção, à prática permanente da solidariedade, com um desenvolvimento socioeconômico sustentável, no exercício da justiça e da democracia.

4. Evidenciamos agora algumas de nossas boas práticas. A situação tão séria e premente despertou a solidariedade e a paciência do bem; estamos aprendendo formas de colaboração interinstitucional com ações desenvolvidas por meio de alianças corporativas realizadas entre famílias, entre vizinhos, entre grupos civis organizados, entre Congregações. É uma verdadeira escola aprender a compartilhar ações de solidariedade, que ativam a responsabilidade, porque, do contrário, corremos o risco de favorecer a atitude de um povo que se acostuma a mendigar. Estamos aprendendo a dar qualidade às intervenções exigidas pela opção pelos mais necessitados: por exemplo, os serviços oferecidos com ‘panelas solidárias’, economia cooperativa, farmácias de setor, assistência jurídica.

A vossa oração, as vossas contribuições e sugestões são bem-vindas; elas nos ajudarão a continuar em nosso esforço para oferecer os melhores serviços, aqueles que Deus espera de nós para essa parte do seu povo: o povo da Venezuela.

Boa-noite.

Tradução: José Antenor Velho