25-anexo 6 |
1 ANEXO 6 |
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“Boa-noite” do P. Pascual Chávez
no dia da eleição para Reitor-Mor
Espero que na minha nomeação não tenha influído o fato de estarmos no tempo pascal; dado que o meu nome é uma palavra que se repete muitíssimo neste tempo litúrgico (fala-se de fato de círio pascal, tempo pascal...), poderia ter sido visto como uma mensagem subliminar.
1. Agradecimento
172.
Começo por exprimir o meu muito obrigado, antes de tudo a Deus Nosso Senhor que quis dar à Congregação e à Família salesiana um novo pastor segundo o estilo de Dom Bosco.
Obrigado ao P. Luc Van Looy, que, por quase dois anos, desde o início da doença do P. Vecchi, guiou a Congregação com verdadeira dedicação e amorevolezza. Obrigado ao P. Anthony McSweeny, que acompanhou o processo de discernimento com sabedoria e amor pelos Salesianos. Devo dizer que o fato de não ter tornado público à Assembléia Capitular o número das preferências no resultado da primeira sondagem, permitiu-me dormir muito bem, a ponto de sentir-me agora mais sereno do que ontem.
Obrigado a todos vós que fostes os instrumentos de Deus para fazer-me conhecer a Sua vontade. Pusera-me inteiramente em suas mãos, como diz o salmo 130, ‘como criança no regaço acolhedor de sua mãe’, para estar pronto a responder a qualquer coisa que me pedisse. Não sei se vos destes conta de quanto haveis feito. Seja como for, eis-me aqui.
2. Uma surpresa
173.
Esta nomeação é, antes de tudo, uma surpresa para mim e a recebo como expressão da vontade de Deus, tal como o disse quando me foi perguntado se aceitava. Exprime o desejo amorável de Deus, que me deseja cada vez mais a serviço dos irmãos e dos jovens, tendo-o como único Senhor da minha vida. Sinto-me porém muito pouco adequado para desempenhar a grande tarefa e assumir a grande honra de ser o sucessor de Dom Bosco.
3. O perfil
174.
Lendo e relendo o elenco das qualidades requeridas para o cargo de Reitor-Mor e apresentadas à assembléia para o discernimento, posso confidenciar-lhes que aí não me encontrava, não me sentia enquadrado. Estava certo por isso de que seria eleito um outro. E o digo com muita sinceridade. Agora compreendo que nesse perfil vós quisestes traçar não somente as vossas expectativas relativas ao Reitor-Mor, mas também o seu programa pessoal de vida. Muito obrigado. Esse também é um dom do Senhor.
4. O programa sexenal
175.
A descrição dos problemas por vós apresentados nas perguntas feitas ao Vigário do Reitor-Mor, após a apresentação da Relação sobre o estado da Congregação no sexênio 1996-2002, completa o panorama da situação, já descrita pelo P. Luc Van Looy, no seu Relatório. Junto com as prioridades indicadas e com as conclusões do CG25, essa entrará a fazer parte da Programação do Reitor-Mor e do seu Conselho para o próximo sexênio.
5. Um percurso veloz
176.
Talvez vos pergunteis como tenha chegado a este encargo. Foi, a meu ver, um percurso decididamente curto e veloz. Em 1995, no fim do meu mandato como Inspetor de Guadalajara, México, fui chamado pelo P. Viganó que me convidava a concluir o percurso formativo com o doutorado em Teologia Bíblica. Lembro-me muito bem de suas palavras: “A Congregação precisa desse doutorado”. Quando lhe perguntei qual seria o meu futuro, respondeu-me: “Não sei ainda. Poderias talvez ser professor na UPS, ou colaborar no dicastério da formação, ou talvez poderias... poderias ser Inspetor!». Dispunha de apenas um ano e meio para terminar.
Lembrar-vos-eis provavelmente de como fui chamado ao Conselho geral neste último sexênio. Estava seis anos atrás a pregar um curso de Exercícios Espirituais a um grupo de irmãos da Inspetoria de Madri, quando me chegou um telefonema do P. Vecchi, o qual me informava que a assembléia capitular me havia eleito Conselheiro para a Região Interamérica e que me pedia uma resposta. Era o dia 2 de abril de 1996. Isto quer dizer que somente 6 anos e um dia depois, me chega esta nova nomeação.
Nomeando-me Inspetor, o P. Viganó convidava-me a deixar-me guiar pelo Espírito, pondo de lado os projetos pessoais e assumindo os que Deus me apresentava como programa de vida.
Por seu lado, o P. Vecchi, na sua introdução aos trabalhos do novo Conselho Geral, convidava-nos a viver o cargo como uma graça, uma oportunidade para progredir no caminho da santidade, iluminando a própria e alheia realidade com a luz de Dom Bosco, do seu carisma, da sua missão, tal como está codificado nas Constituições. Embora sinta que nestes últimos anos cresci salesianamente, confesso-vos que há ainda muito caminho por fazer. Conto entretanto com o Senhor e a sua Graça, assim como com cada um de vós e com todos os irmãos das vossas Inspetorias.
6. Em continuidade com os últimos Reitores-Mores
177.
Sinto-me chamado a continuar o esplêndido trabalho de animação e de governo desempenhado pelo P. Viganó e pelo P. Vecchi. O esforço do primeiro para renovar a identidade salesiana segundo as indicações do Concílio Vaticano II e para colocar a Congregação em sintonia com as necessidades dos jovens de hoje, foram uma contribuição à qual se não pode não responder adequadamente, fazendo nossa aquela identidade. E a contribuição do P. Vecchi de criar um modelo pastoral cônsono com a situação da sociedade atual, com as novas concepções de educação, de evangelização e de pastoral juvenil, serviu sobretudo para tornar significativa a nossa obra em favor dos jovens.
A sólida formação teológica do P. Viganó e a sua proximidade com o carisma de Dom Bosco desembocaram numa original interpretação atualizada de nosso Pai fundador. A competência pedagógica e a visão antropológicas do P. Vecchi enriqueceu a Congregação, dando-lhe segurança sobre o que fazer hoje para ser verdadeiramente significativos, tanto como indivíduos quanto como comunidades.
7. O meu desejo
178.
Quereria ter a preparação teológica do P. Viganó, a sensibilidade pedagógica e cultural do P. Vecchi, mas sobretudo a amorável paternidade do P. Rinaldi e a fidelidade do P. Rua, de quem Paulo VI afirmou dever-se a sua beatificação ao fato de que Rua havia feito de Dom Bosco uma escola, da sua santidade um modelo, da sua regra um espírito. Consciente dos meus limites e das minhas fraquezas, convido-vos, e por meio de vós a todos os irmãos da Congregação, idosos e jovens, padres e coadjutores, doentes e em plena saúde, a reproduzirmos juntos a imagem de Dom Bosco .
8. Uma nova fase
179.
Sou o primeiro Reitor-Mor não italiano. (O P. Vecchi era argentino, mas de pais italianos.) Este é um sinal da multiculturalidade da Congregação já espalhada por todo o mundo.
Aproveito da ocasião para agradecer a toda a Itália salesiana, que soube até agora cumprir a sua responsabilidade histórica de transmitir fielmente o carisma de Dom Bosco. Obrigado caríssimos irmãos italianos aqui presentes, ou inseridos nas várias comunidades da península, ou como missionários no mundo.
Agora esta responsabilidade histórica passa a todos, porque todos somos chamados a encarnar Dom Bosco. Precisamos aprofundar o conhecimento de Dom Bosco, justamente porque necessitamos de identidade carismática, para não perder-nos neste vasto oceano a que fomos chamados a adentrar, tal como nos indica a Estréia do meu predecessor. Precisamos conhecer Dom Bosco, até torná-lo nossa mens, o nosso ponto de vista, o nosso agir perante as necessidades dos jovens. Convido-vos a amá-lo. É o presente mais belo que Deus nos deu: Dom Bosco, caminho seguro para a realização humana e sobretudo para a seqüela de Cristo. Eis a minha exortação: conhecê-lo, amá-lo, imitá-lo porque somos todos herdeiros e transmissores do seu espírito, e por isso divulgá-lo.
8. A minha atitude hoje
180.
Com que atitude assumo hoje esta responsabilidade? Com a atitude de Moisés e de Dom Bosco. Com efeito quando fui ordenado sacerdote, dia 8 de dezembro de 1973, escolhi como mote uma expressão que me havia impressionado enquanto estudava a Carta aos Hebreus: «Como se visse o invisível, perseverou firme na fé». É o texto com que o autor da Carta resume a experiência espiritual de Moisés, o homem pascal. Para fazer o longo e perigoso caminho junto com o Povo de Deus, povo que conduziu como líder fora do Egito, ele precisava de muita audácia, de “parrésia”; mas esta mostrara-se insuficiente, sobretudo quando soube que estava sendo procurado por haver matado um egípcio e se refugiar no deserto; aí amadureceu a opção de abdicar dos seus projetos. Por isso, quando foi novamente convocado pelo Senhor, teve Moisés de renunciar a si mesmo e aos seus projetos e entregar-se totalmente a Deus, crer nEle, caminhar como se contemplasse o invisível.
Asseguro-vos que experimentei uma grande emoção quando, anos depois, li no artigo 21 do texto renovado das Constituições esta mesma expressão aplicada a Dom Bosco, no qual o Santo é apresentado como Pai e Mestre. Dom Bosco foi um homem que viveu para realizar um único sonho: salvar os jovens, especialmente os mais necessitados e periclitantes; foi um padre educador, totalmente “consagrado” à missão que Deus lhe havia confiado, e a esse serviço orientou todas as suas qualidades de natureza e de graça.
Este ser um homem unificado, a perfeita encarnação da interioridade apostólica, está na raiz da sua maravilhosa intrepidez, da sua fantástica criatividade, da sua incansável capacidade de trabalho, da sua rica sensibilidade, do seu amor generoso.
9. Entrega a Nossa Senhora
181.
Termino convidando-vos a entregar a Maria a minha pessoa e toda a Congregação. Ela é o precioso testamento deixado por Jesus, para que fosse Mãe nossa e nos ensinasse a ser fiéis e discípulos do seu Filho. Ela foi, desde o sonho dos nove anos, a Mãe e a Mestra de Dom Bosco. Ela é hoje a “Stella Maris”, que nos guiará e nos acompanhará na aventura de “fazer-nos ao largo” a que nos convidou o P. Vecchi, para pôr a Congregação e a Família Salesiana em sintonia com o programa da Igreja no início do terceiro milênio.
Obrigado. Boa noite!
ANEXO 7
2 Discurso do Reitor-Mor |
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3 P. Pascual Chávez Villanueva |
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4 no encerramento do CG25 |
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182. Caros Irmãos Capitulares,
eis que chegamos ao fim da experiência do CG25, que nós vivemos como dom do Espírito, dom para nós e para a nossa Congregação. O Espírito de Cristo derramou sobre nós a riqueza e a variedade dos seus dons, dons que nos encheram de alegria e nos indicaram os caminhos para o futuro. O nosso primeiro pensamento, humilde e grato, é pois dirigido a Deus, que por meio do seu Espírito animou a nossa assembléia a viver a unidade na comunhão e a buscar a resposta aos seus apelos.
São muitas as pessoas a quem desejo agradecer neste momento de conclusão. Agradeço primeiramente ao Vigário do Reitor-Mor, P. Luc Van Looy, ao Regulador do Capítulo, P. Antonio Domenech, ao P. Antonio Martinelli, à Comissão pré-capitular, aos Moderadores e aos Secretários da Assembléia, a Dom Alois Kothgasser, ao P. Anthony Mc Sweeny, que com variada intensidade de empenho e de responsabilidades orientaram a vida e o trabalho da mesma Assembléia.
Agradeço além disso à Assembléia capitular, que esteve sempre pronta, operante e disponível, nas várias etapas e prazos que se foram sucedendo, ajudada pelas suas Comissões e articulações internas. Agradeço aos secretários do Capítulo, aos tradutores, à ANS e à sua equipe, aos irmãos da Casa Geral, ao pessoal de apoio, que com um trabalho discreto e ativo tornaram possível todo o desdobramento desta importante assembléia.
Agradeço finalmente aos membros do Conselho geral em final de mandato, que realizaram o seu trabalho com verdadeira dedicação e competência; saúdo especialmente os Conselheiros que findaram o seu mandato; dou a seguir os parabéns ao Vigário e aos Conselheiros gerais que acolheram a indicação da assembléia capitular para serem meus colaboradores neste sexênio.
Acompanhou-nos nestes dias a preocupação pela Terra de Jesus. O drama da guerra esteve-nos sempre presente; acompanhamos as notícias, que se foram sucedendo rapidamente; unimo-nos na oração ao grito angustiado de João Paulo II. As matanças, as represálias, as ocupações, as destruições infelizmente criaram uma fratura entre os dois povos. Nós também ficamos preocupados com a sorte de nossos irmãos e irmãs de Belém e de Cremisã e continuamos acompanhando o desenrolar-se da situação com a oração, a proximidade e a solidariedade.
Ficamos também impressionados com o escândalo divulgado pela mídia relativo a padres e religiosos da Igreja dos Estados Unidos, acusados de abusos contra menores. Tudo isso nos está a exigir, de nós educadores, uma particular atenção. Como também continuamos a acompanhar as situações de conflitos sociais ou de guerras, que afligem os países onde estamos presentes.
Seguindo o exemplo da comunidade apostólica, enviada por Jesus a levar o anúncio do Reino e a ensinar a todas as nações “na alegria do Espírito”, agora a nossa assembléia está pronta para ir a todo o mundo, a fim de que cada um possa voltar a percorrer os caminhos da história, a viver com os jovens, a animar as comunidades, a caminhar com a Igreja.
1. A Comunidade Salesiana Hoje
183.
O CG25 desenvolveu o tema principal da “Comunidade salesiana hoje” e o secundário da “Avaliação do funcionamento das estruturas do governo central”. A maior parte do tempo foi dedicada à reflexão sobre o tema da comunidade, que já se havia iniciado nos dois Capítulos precedentes; eles haviam feito emergir a comunidade local como o lugar estratégico da educação na fé dos jovens e do envolvimento dos leigos.
O Capítulo Geral 23 enfrentara o desafio da educação dos jovens na fé. Ela estava se tornando uma ação cada vez mais complexa, conseqüência de uma cultura emergente, que exigia um repensamento da metodologia e dos conteúdos. Partindo dos desafios da realidade juvenil nos seus vários contextos, os capitulares traçaram um caminho de educação na fé para os jovens, oferecendo-lhes uma proposta de vida cristã significativa e de espiritualidade juvenil salesiana.
Era preciso renovar a qualidade da nossa proposta educativo-pastoral. Não se tratava de criar novas presenças, mas de fazer nascer uma presença nova, um modo novo de estarmos presentes no lugar onde já nos encontramos. Mais uma vez a Congregação se sentia chamada a relançar a atitude do «da mihi animas», convertendo a comunidade em «sinal de fé, escola de fé e centro de comunhão».
O Capítulo Geral 24 concentrou a sua reflexão sobre o desafio de criar uma nova sinergia entre SDB e leigos, ou seja, sobre o desafio de multiplicar as pessoas que queiram viver o seu batismo na área da educação, de fazer convergir Salesianos e leigos para um novo modelo de relações, de colocar os salesianos perante a sua tarefa prioritária de animação pastoral e pedagógica.
Crescia cada vez mais a convicção de que a nova evangelização e a nova educação não podiam se realizar sem a colaboração orgânica e qualificada dos leigos. Quanto às comunidades salesianas, deviam agora atualizar-se mais e mais, para se tornarem as animadoras das comunidades educativo-pastorais e da Família Salesiana.
Nestes dois últimos Capítulos Gerais projetou-se um novo modelo pastoral. Nele, a comunidade salesiana tem uma tarefa de animação, o de ser o ponto de referência carismático para todos aqueles que partilham o espírito e a missão de Dom Bosco. A qualidade de sua vida consagrada, a profundidade de sua experiência espiritual, a significatividade do seu testemunho e a incisividade da sua proposta, são fatores indispensáveis para dar vida e força evangélica à animação da CEP e da Família Salesiana.
184.
Com o Capítulo Geral 25 a comunidade salesiana é colocada no centro e é vista em todas as suas dinâmicas e características. Não é tanto a dimensão comunitária a ser tomada em consideração, mas a comunidade local como sujeito, ou seja, a sua capacidade de planejar, de envolver as numerosas forças, de profecia evangélica, de comunhão e, em última análise, de evangelização. O CG25 aprofunda assim a caminhada feita pela Congregação e dá um novo relevo à realização da “subjetividade plena” da comunidade. O modelo de comunidade que emerge do CG25 é aquele que faz referência à nossa consagração apostólica, como se expressa no artigo 3 das Constituições. A comunidade vive a graça de unidade, que realiza a síntese vital entre a vida fraterna, o seguimento radical de Cristo, a experiência espiritual, a dedicação à missão juvenil.
O texto capitular sobre a comunidade se apresenta como um conjunto de cinco módulos operativos ou fichas de trabalho. A comunidade salesiana é o sujeito principal, a que se dirige o texto. Assumindo-o, ela é convidada a acolher o chamado que Deus lhe dirige por meio dos acontecimentos históricos e eclesiais, das indicações da Palavra de Deus e da nossa Regra de vida, dos apelos dos jovens, das necessidades dos leigos e da Família Salesiana. A comunidade aprofunda, a seguir, a leitura da própria situação, descobrindo as disponibilidades e as resistências, os recursos e as carências, as possibilidades e os limites. Aprende ainda a reconhecer os desafios fundamentais e a enfrentá-los com coragem e esperança; sabe também questionar-se apropriadamente e buscar as respostas. Finalmente, a comunidade se confronta com as orientações operativas propostas e determina as condições para traduzi-las em prática.
185.
Os conteúdos fundamentais referem-se à vida fraterna, ao testemunho evangélico, à presença animadora entre os jovens. A vida fraterna da comunidade propõe-se favorecer os processos de crescimento humano e vocacional dos irmãos, superar a inércia de relações formais ou funcionais, reforçar o sentido de pertença e o clima fraterno, facilitar a comunicação, ajudar a construção de uma visão partilhada. Podem para tanto ser úteis: o projeto pessoal de vida, a prática do discernimento comunitário, a valorização dos momentos de encontro comunitários, o projeto da comunidade salesiana.
O testemunho evangélico nos pede manifestar visivelmente o primado de Deus na vida da comunidade, de viver a “graça de unidade” na experiência espiritual e nas expressões comunitárias, de tornar radical, profético e atraente o testemunho comunitário do seguimento de Cristo, de partilhar as nossas motivações e empenhos vocacionais. A centralidade da Palavra de Deus, favorecida pela prática da “lectio divina”, a qualidade da oração comunitária, a Eucaristia cotidiana, a comunicação e a partilha da vida ajudam o aprofundamento da experiência espiritual e a manifestação do primado de Deus. A maneira, além disso, de viver o seguimento de Cristo, mediante a centralidade de uma obediência alegre na missão, a concretitude de uma pobreza austera, o esplendor da castidade vigilante e serena, torna mais transparente o testemunho da comunidade.
Onde existe uma comunidade salesiana, está presente uma experiência de fé, se constrói uma rede de relações, oferecem-se multíplices formas de serviço aos jovens. A comunidade torna visível a presença salesiana entre os jovens, anima-a e promove seu crescimento. É necessário, pois, antes de tudo, voltar para o meio dos jovens e ser não somente uma comunidade para os jovens, mas também com os jovens. Por isso, a comunidade salesiana constrói uma presença de comunhão e de participação, envolve os leigos e a Família Salesiana, insere-se no território. Ela se torna presença que educa e evangeliza, criando ambientes de intensa carga espiritual, tomando consciência e agindo perante as situações de pobreza, realizando projetos e processos de crescimento para os jovens. Ela, enfim, promove a escolha vocacional de cada jovem, anima a comunidade educativo-pastoral para que seja lugar de crescimento vocacional, atua uma metodologia do acompanhamento e da proposta vocacional.
Para ser uma comunidade que vive a fraternidade, que dê um intenso testemunho evangélico, que anime a presença entre os jovens, ela mesma precisa ser animada, atualizada, motivada, encorajada, orientada, guiada. A animação da comunidade passa principalmente através da formação contínua. A comunidade pode oferecer momentos de renovação espiritual, ocasiões de confronto, oportunidade de atualização educativa e pastoral; mas a valorização e a qualificação da vida cotidiana são o primeiro recurso de formação na comunidade. O diretor possui um papel fundamental na animação da comunidade, mas envolvendo e responsabilizando todos os irmãos; a sua atenção se concentra no carisma, na missão, na fraternidade. Ele anima a comunidade conjuntamente com os irmãos.
O CG25 propõe, enfim, algumas condições que tornam possível o ser comunidade salesiana hoje; trata-se de ajudar a comunidade a trabalhar de acordo com um projeto comunitário, de garantir a consistência qualitativa e quantitativa da comunidade, de aprofundar o relacionamento entre comunidade e obra, de atualizar o projeto orgânico inspetorial. Algumas destas condições dizem respeito ao nível local, mas na maioria das vezes exigem também a responsabilidade e as escolhas da comunidade inspetorial.
A cada comunidade o Capítulo confia estes cinco itinerários, para que os estude, aprofunde, conscientize, a fim de que se torne uma comunidade carismática significativa.
2. A avaliação do funcionamento das estruturas centrais de governo
186.
O segundo elemento temático da reflexão capitular consistiu na avaliação do funcionamento das estruturas do governo central. Tal avaliação, pedida explicitamente pelo CG24, foi iniciada pelo Conselho geral e foi aprofundada por este CG25. O Conselho geral iniciou o trabalho de revisão mediante o auxílio a reflexão de um grupo de Inspetores, orientada pelo Vigário do Reitor-Mor. Foram a seguir interpelados os Capítulos Inspetoriais com algumas perguntas que se referiam aos Conselheiros de setor, aos Conselheiros regionais e às Visitas extraordinárias. O Capítulo Geral 25, por fim, levou em consideração este trabalho e desenvolveu sua reflexão, com a finalidade de tornar mais ágil e eficaz o funcionamento das estruturas do governo central.
A avaliação feita levou o CG25 a fazer algumas modificações constitucionais; elas se referem à temporalidade do encargo do Reitor-Mor e dos membros do Conselho geral, a atribuição da animação da Família Salesiana ao Vigário do Reitor-Mor e a conseqüente entrega a um Conselheiro geral do único encargo do setor da Comunicação social. Deste modo, se oferecem: uma modalidade de mudança dentro do Conselho Geral, que, sendo programada com tempo, poderá ser preparada; uma nova possibilidade de animação para a Família Salesiana; uma ulterior valorização da Comunicação social ao serviço da educação e da evangelização.
Constituíram-se dois diferentes grupos de Inspetorias, chamadas Ásia Sul e Ásia Leste-Oceânia, nascidos da divisão do único grupo chamado Austrália-Ásia. Tal decisão vai permitir uma animação maior das duas novas “Regiões”, por parte dos respectivos conselheiros, e impele a encontrar formas mais apropriadas de coordenação dentro das mesmas “Regiões”.
Sente-se a necessidade de estudar um modo diferente de realizar o Capítulo Geral, para que responda melhor às necessidades do planejamento e da concretitude. Tem-se consciência de que os Capítulos gerais de releitura do carisma já terminaram e que se passou aos Capítulos gerais ordinários. Reflexões análogas poderão ser feitas sobre o funcionamento dos Capítulos inspetoriais.
Sublinha-se a instância para que o Reitor-Mor com o Conselho geral trabalhe de maneira mais orgânica e coordenada, a partir da programação do sexênio, mas também nas realizações sucessivas. Deseja-se especialmente que se supere o setorialismo; sobretudo que os assim chamados setores da “missão salesiana”, ou seja, pastoral juvenil, comunicação social e missões, trabalhem mais conjugadamente. Percebe-se também a urgência de trabalhar com projetos e de zelar por uma animação capaz de ativar processos. Nota-se outrossim a importância de valorizar os recursos presentes nas Regiões, nas Conferências e nas Inspetorias, e de uni-las em rede. Nisto também a Casa Geral pode dar sua específica contribuição para melhorar as modalidades de trabalho com toda a Congregação.
Aprecia-se a contribuição, dada ao crescimento das Inspetorias, pela realização do descentralização e da subsidiariedade; mas se reconhece também a exigência de uma solidariedade que supere o âmbito inspetorial ou regional e a necessidade de uma maior coordenação interinspetorial. Em tempos de mundialização é necessária a moderação para amenizar as instâncias globais e os impulsos locais; é preciso refletir sobre aquilo que é conveniente que as Inspetorias façam com suas próprias forças e aquilo que é mais útil que realizem juntas. Há, de fato, necessidades, urgências e prioridades que ultrapassam o âmbito das “Regiões”. As fronteiras da missão requerem se conjuguem subsidiariedade e solidariedade.
A realização do processo de discernimento para a eleição do Reitor-Mor e dos Conselheiros gerais foi uma ocasião para viver e experimentar uma práxis, um método e uma experiência espiritual, que precisam ainda ser aprofundados, mas que já estão dando resultados apreciáveis. O discernimento, realizado em comum nas coisas de importância (C 66), é um caminho aberto a ser experimentado nos momentos de governo e da vida pastoral nos vários níveis. O exercício desta prática nos ajudará a chegar a visões partilhadas.
A exigência da avaliação das estruturas do governo central continua aberta à efetiva realização de um diferente funcionamento e requer um empenho análogo nos vários níveis da Congregação. De um modo melhor de trabalhar se chegará a um trabalhar conjunto, a um trabalhar bem, a um trabalhar eficaz.
3. A hora que vivemos
187.
A hora que estamos vivendo é empolgante e dramática; oferece novas oportunidades e limita algumas possibilidades; abre espaços inéditos e aponta para desafios não fáceis. As orientações operativas do CG25 inserem-se em contextos de referência mais amplos, que é preciso ter presentes; e a caminhada das comunidades vai-se dando dentro das situações da sociedade e da cultura, da Igreja, da vida religiosa. A aplicação do CG25 nos pede conhecer nossos contextos particulares, mas também de situar-nos nas grandes mudanças em andamento.
3.1 O contexto social e cultural da secularização, globalização e fragmentação
Na sociedade e na cultura estão em andamento profundas e rápidas transformações, que interpelam o trabalho de educação e de evangelização, o testemunho da vida religiosa, o modelo de homem e de mulher que propomos.
Constata-se um acentuado pluralismo étnico, cultural e religioso, favorecido também por migrações em massa. Muitas vezes tornam-se difíceis a tolerância e a integração cultural; aparecem ainda várias formas de sincretismo religioso; às vezes nascem tensões, conflitos e guerras com matizes étnicos, nacionalistas e religiosos. No campo religioso é muito forte o processo de secularização, que diz respeito prevalentemente a fé cristã, mas que envolve também outras religiões. São também acentuados os movimentos que buscam experiências espirituais, satisfação interior, emoções profundas.
A globalização, por sua vez, é uma realidade que se afirma cada vez mais e que se manifesta especialmente no planejamento econômico em dimensões mundiais, na crescente consciência de solidariedade, na defesa do ambiente, na exigência de uma partilha mais justa e distribuição dos bens, na comunicação social e no desenvolvimento da informática. Mas ela produz também injustiças e exclusões sociais, em prejuízo das populações mais vulneráveis. O bem-estar econômico, que assume aspectos cada vez mais arrogantes nas faixas privilegiadas da humanidade, produz nelas o consumismo e o hedonismo. Ao mesmo tempo os desafios da fome, da pobreza, das doenças e da exclusão, que atingem bilhões de pessoas, tornam-se cada vez mais agudos.
A complexidade e a fragmentariedade, por fim, criam instabilidade e diversidade de pontos de referência, de valores e de interesses. Junto com um sadio pluralismo e a busca de novos critérios multiplicam-se os desafios e se difundem o relativismo e o pragmatismo. Enquanto, por um lado, se sublinha com força o valor da pessoa e dos seus direitos e a dignidade da mulher é progressivamente reconhecida na prática, tem-se uma visão mais objetiva do corpo, da afetividade e da sexualidade, por outro, nascem novas formas de exploração da pessoa e especialmente dos menores, e aumenta a fuga do compromisso com a solidariedade. A pós-modernidade acentua o cultivo das relações interpessoais, o interesse pelos afetos, mas também o individualismo e o subjetivismo.
O CG25 pede às comunidades que aceitem os desafios que a cultura apresenta à educação e à evangelização; que vivam a fraternidade dando atenção ao amadurecimento vocacional de cada irmão e ao cuidado das relações interpessoais; que dêem um testemunho evangélico propositivo e alternativo com relação ao contexto em que se encontram. Cada comunidade busca assim não só aprofundar cada vez mais o conhecimento do contexto em que vive e age, mas também apresentar respostas eficazes.
3.2 O contexto eclesial da “Novo Millennio Ineunte”
188.
No fim do Ano Jubilar e no início do novo milênio, João Paulo II convidou a Igreja a «fazer-se ao largo»1, a «fixar os olhos no Senhor Jesus»2, a «partir de Cristo»3, a ser «testemunhas do amor»4, construindo comunhão.
A primeira área na qual é preciso individuar as orientações pastorais adaptadas a cada comunidade é o “partir de Cristo”. «O horizonte para que deve tender todo o caminho pastoral é a santidade»5: chegou a hora de repropor a todos esta medida alta da vida cristã que é a santidade e de ter uma pedagogia da santidade. «Para esta pedagogia da santidade há necessidade dum cristianismo que se destaque pela arte da oração»6: as nossas comunidades são urgidas a serem autênticas escolas de oração; a educação à oração deve tornar-se um ponto qualificador de toda programação pastoral. «Não há dúvida de que este primado da santidade e da oração só é concebível a partir duma renovada escuta da Palavra de Deus».7 Santidade, oração e escuta da Palavra de Deus são os caminhos fundamentais da pastoral pós-jubilar.
A segunda área em que é preciso manifestar um decidido compromisso programático é o da comunhão. «Fazer da Igreja a casa e a escola da comunhão: eis o grande desafio que nos espera no milênio que começa, se quisermos ser fiéis ao desígnio de Deus e corresponder às expectativas profundas do mundo».8 A profecia da comunhão pressupõe que se cultive a espiritualidade da comunhão; ela se exprime no cultivo da variedade das vocações, na promoção do compromisso ecumênico, no apostar na caridade, no favorecer o diálogo inter-religioso e a missão “ad gentes”, no enfrentar os desafios da cultura atual.
Com o CG25, a Congregação entende responder ao apelo de João Paulo II para trabalhar nas fronteiras da nova evangelização e para colocar em ação os dons e tarefas do Jubileu: “Duc in altum”. Todas as comunidades são chamadas a partir de Cristo e a construir comunhão. Isto irá trazer novos frutos de vida espiritual e de evangelização.
3.3 O contexto religioso da re-fundação carismática
189.
Durante estes anos pós-conciliares a vida consagrada viveu um insistente convite a se renovar, tornando-se eloqüente e significativa; especialmente, a Exortação Apostólica Vita Consecrata acata as instâncias de re-fundação que nestes trinta anos se verificaram na vida consagrada e constitui o ponto de referência para “uma grande história a ser construída”.9
No delicado processo de renovação, desejado pela Igreja, a nossa Congregação dedicou três Capítulos Gerais “extraordinários”, que especificaram a identidade salesiana. Será útil relembrar o caminho feito. Enquanto o CG19, que se deu durante o Concílio, «tomou consciência e preparou», o CG20 «pôs em órbita», o CG21 «avaliou, retificou, confirmou e aprofundou»; o CG22 foi chamado a «re-examinar, precisar, completar, aperfeiçoar e concluir»10.
O Capítulo Geral Especial 20 realizou a avaliação e a adequada renovação da Congregação segundo o espírito do Fundador e de acordo com os objetivos indicados pela Constituição Dogmática Lumen Gentium e pelo Decreto Perfectae Caritatis. O Capítulo propôs-se não só cumprir as orientações e as diretrizes do Concílio Vaticano II como simples formalidade, mas aproveitou da oportunidade para responder melhor a Deus e aos jovens. Por isso, o CGE, precedido por uma preparação muito acurada, por meio de interpelação feita a todas as Inspetorias, quis reformular um projeto global. A pergunta fundamental era como tornar visível e atual o testemunho particular da vida religiosa salesiana na Igreja. Tratava-se também de exarar um texto renovado das Constituições e dos Regulamentos. Em síntese, era necessário re-fundar a identidade da Congregação.
O resultado de sete meses de trabalho capitular encontra-se nos 22 documentos de orientações doutrinais e operativas. O que se fez, pois, foi uma reformulação, mais carismática, do “Texto Constitucional”. Codificou-se nos “Regulamentos” o modo prático universal de viver as Constituições, remetendo às Inspetorias a tarefa de regulamentar o que é próprio dos lugares, por meio dos Diretórios Inspetoriais.
O Capítulo Geral 21 teve como objetivo avaliar se e como se havia feito a renovação. A profundidade e a rapidez da mudança, fruto do Concílio Vaticano II, trouxeram à Igreja e à Congregação uma situação de mal-estar, que pedia clareza de orientação e sabedoria nas soluções. A ação profundamente renovadora, realizada na Congregação pelo CGE, impunha revisão, retificação, aprofundamento e re-confirmação.
No CG21 estudaram-se também alguns temas substanciais para a Congregação: o Sistema Preventivo, a Formação à Vida Salesiana, o Salesiano Coadjutor e a Universidade Pontifícia Salesiana. Esse trabalho de esclarecimento da identidade, reforçado pela Encíclica Evangelii Nuntiandi, de Paulo VI, aprofundou a missão específica salesiana. Em seu discurso de encerramento, o Reitor-Mor, P. Egídio Viganó, sintetizou os três objetivos que se foram evidenciando durante o trabalho capitular: a tarefa prioritária de levar o Evangelho aos jovens, que implicava um projeto educativo pastoral; o espírito religioso; o novo estatuto da comunidade salesiana como animadora da comunidade educativo-pastoral.
O CG21 significou, certamente, uma radical renovação pastoral.
O CG22, realizado após um tempo intenso de experimentação e aprofundamento da identidade salesiana, propunha-se concluir o projeto de renovação, com a definitiva revisão da Regra de Vida. O resultado final do trabalho capitular foi, segundo as palavras do Reitor-Mor, «um texto orgânico, profundo, melhorado, permeado de Evangelho, rico da genuinidade das origens, aberto à universalidade e voltado para o futuro, sóbrio e digno, denso de equilibrado realismo e de assimilação dos princípios conciliares».11 A redação definitiva da Regra de Vida trouxe consigo, entre outras coisas, a renovação da Ratio; a idéia central era que toda a formação dos salesianos sintonizasse com a natureza da vocação e de sua missão específica de educadores e pastores dos jovens.
Assim a nossa Congregação empenhou-se na releitura ‘fundacional’ do seu carisma e na sua “re-fundação”. Depois dos Capítulos Gerais “extraordinários” seguiram-se mais três Capítulos Gerais “ordinários”, voltados para assuntos de caráter operativo: a educação na fé dos jovens, o envolvimento dos leigos no espírito e na missão salesiana, e a comunidade salesiana hoje. A releitura carismática da identidade estava concluída, mas sua tradução concreta ainda está em andamento.
4. A meta do CG25
190.
Concluídas as etapas da preparação e da celebração do CG25, chegou a hora de passar à fase da prática. Agora é tempo de assimilar o Capítulo com todos os irmãos, de torná-lo programa de governo inspetorial, de traduzi-lo operativamente nas comunidades. Para individuar os passos a serem dados, agora nos detemos a considerar as perspectivas de futuro e a meta a ser alcançada.
Revendo o caminho feito pela Congregação nestes trinta anos, pode-se notar que a mudança nem sempre foi linear. Penso que a resistência maior não se deu na renovação das Constituições, ou das estruturas de governo, ou da prática pastoral, mas na renovação espiritual, que acarreta uma profunda conversão interior.
Nestes anos de transformação, foi-se configurando uma nova forma de vida religiosa salesiana. Já temos os “odres novos”: uma nova evangelização, uma nova educação, um novo modelo pastoral, uma nova formação. Foi-se aos poucos também produzindo o “vinho novo”: o novo evangelizador, o novo educador, o novo sujeito pastoral, o novo salesiano.
Sentimo-nos, por vezes, incomodados perante o uso do adjetivo “novo” para qualificar realidades que consideramos conhecidas, sobretudo pelas conseqüências práticas que isso comporta: a necessidade de nos renovarmos espiritualmente, de nos atualizarmos profissionalmente, de nos qualificarmos pedagogicamente. A novidade provém das situações, dos contextos, das mudanças da realidade, da visão antropológica.
Hoje a preocupação da vida religiosa em geral, e da Congregação em particular, não pode ser a da sobrevivência, mas a de criar uma presença significativa e eficaz. É questão de profecia. «Isto comporta – escrevia o P. Vecchi – dar vida a uma presença que suscite questionamentos, dê razões de esperança, convoque pessoas, desperte colaboração, ative uma comunhão cada vez mais fecunda, para realizarmos juntos um projeto de vida e de ação segundo o Evangelho».12 O que se quer é um tipo de vida fascinante e atraente, que dê o primado ao profético mais que ao organizativo, que privilegie as pessoas mais que as estruturas.
Parafraseando Karl Rahner em seu testamento espiritual, podemos dizer que o futuro da vida religiosa passa através da sua força mística, a sua sólida experiência e o transparente testemunho de Deus, a superação de todo tipo de aburguesamento, atonia e mediocridade. A vida religiosa nasceu e tem sentido só como sinal da busca e da primazia de Deus. A sua missão é a de ser sacramento: ser “sinais e portadores do amor de Deus” (C 2), especialmente em favor dos mais necessitados, para que eles possam fazer a experiência de que Deus existe e os ama.
Quando os Superiores Gerais decidiram aprofundar o tema da re-fundação da vida religiosa13, movia-os a consciência de que há necessidade de “vinho novo em odres novos” (cf. Mc 2,22); uma fonte de novidade é o chamado a voltar às origens do carisma. Trata-se para nós de expressar a originalidade da Congregação, de ir ao essencial, de re-escrever a carta de Roma de 1884. Voltemos a Dom Bosco e voltemos aos jovens!
As imagens da “luz”, do “sal” e do “fermento”, empregadas por Jesus no Evangelho para definir a identidade e a missão dos discípulos, são reveladoras e empenhativas. Simplesmente é preciso “ser” para ter significado e relevância. Mas se o sal perder o seu sabor, ou se a luz se colocar por sob a mesa, ou se o fermento não puder já levedar, para nada mais servem: perderam a razão do seu “ser”.
A força da vida religiosa está no seu caráter profético perante a cultura, subversivo perante o aburguesamento, alternativo perante um progresso ilimitado, mas que não tem transcendência. O problema é o da identidade e da identificação: o que nos caracteriza e nos manifesta é uma intensa experiência de Deus, que mude profundamente a nossa vida, e uma comunidade em que se comece a viver a viver com novidade de vida. «Não vos conformeis com a mentalidade deste século – escreveu s. Paulo aos Romanos –, mas transformai-vos renovando a vossa mente, para poder discernir a vontade de Deus, o que é bom, agradável a Ele. E perfeito» (Rm 12,2).
Nesta linha, desejo traçar cinco perspectivas de futuro, que estiveram como objeto de reflexão e de estudo por parte do P. Egídio Viganó e do P. Juan Vecchi em suas cartas, mas que são ainda campo necessitado de renovação, para introduzir-nos decididamente no novo milênio com energia e clareza de projeto.
4.1 A renovação espiritual de cada salesiano
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A renovação espiritual exige a volta ao fundamento da nossa vocação: Deus e o seu Reino. Deus deve ser a nossa primeira “ocupação”. É ele que nos envia e nos confia os jovens, para ajudá-los a crescer até alcançarem a estatura de Cristo, o homem perfeito. Para nós, a recuperação da espiritualidade não pode estar separada da missão, se não quisermos cair no perigo da evasão. Deus nos espera nos jovens para oferecer-nos a graça de um encontro com Ele (cf. C 95; CG23, 95). É por isso inconcebível e injustificável pensar que a “missão” seja um obstáculo para o encontro com Deus e para cultivar a Sua intimidade.
4.2 A consistência da comunidade
192.
A qualidade da vida de comunhão e a ação educativa e pastoral requerem uma consistência qualitativa e quantitativa da comunidade salesiana. Todas as propostas para tornar formativo o cotidiano e melhorar a qualidade da metodologia, dos conteúdos e das atividades, se deparam com as possibilidades reais da comunidade. Para nós, a vida fraterna em comunidade é um elemento da nossa consagração apostólica e, portanto, da profissão religiosa (cf. C 3 e 24), junto com o seguimento de Cristo obediente, pobre e casto, e com a missão. Ela é também o âmbito em que somos chamados a viver a experiência espiritual, a missão e os conselhos evangélicos. Não podemos, portanto, continuar com a pretensão de querer resolver todos os problemas, a expensas do carisma e da vida da comunidade.
4.3 A re-significação da presença
193.
A significatividade da presença é uma exigência tanto da comunidade quanto da missão; trata-se da qualidade de ambas. No passado, quando se falava de “redimensionamento”, o acento era dirigido para o fechamento de obras ou da sua entrega aos leigos. Hoje, entretanto, enquanto se continua a afirmar que o redimensionamento é uma tarefa inevitável, se não quisermos enfraquecer as comunidades e sobrecarregar os irmãos, a insistência deve ser posta sobre a “significatividade” da presença salesiana no território. Esta não se reduz à obra ou às atividades; é antes uma forma de ser, de trabalhar e de organizar que busca não só a eficácia mas também dar sentido, abrir perspectivas, convocar pessoas, promover novas respostas. Trata-se de recolocar a Inspetoria onde são mais prementes as necessidades dos jovens e onde é mais fecunda a nossa presença. A nossa vida consagrada não será onipresente, nem mesmo sempre socialmente relevante, mas continuará a ser referência necessária na medida em que for sinal do Reino.
4.4 A qualidade da proposta educativo-pastoral
194.
A caminhada feita até agora, pelo menos em muitos lugares, foi a de multiplicar as obras, comprometendo em não poucos casos a qualidade da nossa atividade. Privilegiou-se por vezes o aspecto organizativo de preferência ao pastoral, ou a manutenção e a construção de edifícios antes que a clareza e a seriedade do projeto educativo-pastoral. Hoje a realidade nos pede que desenvolvamos formas mais intensas de evangelização, que nos concentremos no amadurecimento humano e na educação na fé dos jovens, que formemos os leigos, que animemos a comunidade educativo-pastoral e, junto com ela, elaboremos um projeto. Tal tarefa é já realização da significatividade.
4.5 A formação do salesiano
195.
A complexidade das situações atuais, os desafios dos jovens, a exigência da nova evangelização, a tarefa da inculturação requerem uma formação capaz de habilitar o salesiano a viver com dinamismo e solidez a sua vocação, a cumprir com profissionalismo e competência a missão, a assimilar pessoalmente a identidade carismática. Para nós Dom Bosco não é só ponto de referência constante; é norma de vida; e a formação nada mais é que apropriar-nos do dom que Deus nos deu quando nos chamou. O documento sobre a formação na Vida Consagrada afirma com clareza: «A renovação dos institutos religiosos depende principalmente da formação de seus membros».14 Este é o maior desafio que tem diante de si a Congregação, desafio que aceitou com a edição da nova Ratio15.
A Igreja e o Mundo precisam de pessoas que façam profissão de encarnar o interesse por Deus, que sejam uma reserva de humanismo, que se tornem um sinal poderoso, eloqüente, radical da “sequela Christi”. Era isto que o Concílio Vaticano II desejava e esperava da vida religiosa. Foi este o objetivo da Congregação durante estes 30 anos. Agora o CG25 quis dar a sua contribuição específica para alcançar esta meta, uma contribuição realista que, como já vimos, visa a reforçar a comunidade salesiana em todas as suas dinâmicas.
5. O dom das beatificações
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«Queridos salesianos, .... sede santos! É a santidade – vós bem o sabeis – a vossa tarefa essencial». Foi com esta exortação que João Paulo II se dirigiu a nós, participantes do Capítulo Geral, recebidos em audiência na manhã de 12 de abril. A santidade é também a imposição deste Capítulo, que finda com o presente de três novos Bem-aventurados da Família Salesiana: o P. Luís Variara, o Sr. Artêmides Zatti e a Ir. Maria Romero Meneses.
É a doação alegre de si e a dedicação generosa aos mais pobres que associam estes Bem-aventurados que se acrescentam ao grupo numeroso de santos da nossa Família carismática. Não há nada que tanto atraia como o testemunho da entrega total de si sem reservas, sem medida, sem condições; não há nada que fascine tanto como o serviço aos mais pobres, aos mais humildes, aos mais necessitados. Os leprosos do P. Variara, os doentes do Sr. Zatti, as meninas abandonadas da Ir. Romero lembram imediatamente a oferecimento gratuito da vida destas três figuras, que nos são propostas como modelos. O cuidado dos mais pobres e a doação total de si se harmonizam, testemunhando assim a caridade heróica dos três novos bem-aventurados.
A santidade é o caminho mais exigente que juntos queremos realizar nas nossas comunidades; é «o dom mais precioso que podemos oferecer aos jovens» (C 25); é a meta mais alta que devemos propor com coragem a todos. Somente em um clima de santidade vivida e experimentada, terão os jovens a possibilidade de realizar escolhas corajosas de vida, de descobrir o plano de Deus sobre seu futuro, de apreciar e acolher o dom das vocações de especial consagração.
A beatificação do sr Artêmides Zatti, especialmente, evidencia a atualidade e a validade da vocação do salesiano irmão leigo. O carisma salesiano não seria o que deve ser sem sua figura. Sua presença na vida da comunidade salesiana não é um acréscimo extrínseco de uma categoria de pessoas, mas é parte imprescindível de sua fisionomia. Isto nos pede uma proposta vocacional mais convicta e uma presença mais visível desta figura na comunidade educativo-pastoral.
O fio condutor da existência do Sr. Zatti é constituído pelo seguimento de Jesus, com Dom Bosco e como Dom Bosco, em todos os lugares e sempre.16 Isto significa que Dom Bosco o fascinou e atraiu; a exemplo de Dom Bosco, viveu a doação total de si; como Dom Bosco, escolheu ser educador: Zatti foi um enfermeiro educador. Ele viveu com unidade profunda a experiência espiritual, o trabalho profissional, a fraternidade alegre, até se tornar um reflexo de Deus com radicalidade evangélica. A luminosa figura deste salesiano coadjutor bem-aventurado nos ensine os caminhos com que levar os jovens a descobrirem a beleza de tal vocação.
6. Confiados em sua Palavra, fazer-se ao mar alto
197.
O episódio evangélico da pesca milagrosa, apresentado pela Novo Millennio Ineunte e retomado pela última Estréia do P. Vecchi, é um símbolo da retomada do nosso caminho ao findar o nosso Capítulo Geral 25.
Podemos ter experimentado também nós, às vezes, a canseira inútil do nosso trabalho. O Senhor Jesus também hoje nos convida a “fazer-nos ao largo”, a renovar o nosso esforço de lançar a rede. A tentar novamente. Mesmo depois de o ter feito muitas vezes inutilmente. É esta a hora da coragem! É preciso fazer-se ao mar aberto, enfrentando os desafios de hoje, e é preciso rumar para as águas profundas, cultivando uma intensa experiência espiritual e fomentando a qualidade da nossa ação.
O que nos estimula a tentar novamente é a fé no Senhor Jesus: confiando em sua palavra continuaremos a lançar a nossa rede. É esta a hora da esperança! O tempo que estamos vivendo está orientado para as grandes responsabilidades que nos esperam, para a feliz aventura de ainda jogar as redes para a pesca e e sentir o poder da Palavra de Deus. Estamos certos de que o Senhor Jesus saberá ainda maravilhar-nos com sua fidelidade e as suas surpresas.
Onde existem grandes desafios, é necessária a coragem e a esperança da comunidade. Os caminhos novos e as tarefas difíceis da evangelização poderão ser enfrentados por comunidades que empreendem uma radical conversão pastoral e vivem uma profunda experiência espiritual. Coragem e esperança são as expressões mais eloqüentes da profecia das nossas comunidades.
Não nos passe despercebido o fato de que no episódio evangélico o gesto gratuito da pesca surpreendente não tem outra finalidade que a de suscitar a fé e de provocar o seguimento. Diante do gesto super-abundante de Jesus e depois do convite: «Não tenhas medo! De agora em diante serás pescador de homens», os primeiros discípulos, puxados os barcos a terra, deixaram tudo e seguiram Jesus (cf. Lc 5,1-11). Estarão desta forma envolvidos na mesma missão e no mesmo destino de Jesus: o chamado definitivo a todos para acolherem o Reino. Os gestos surpreendentes e superabundantes de coragem e de esperança das nossas comunidade provocam a resposta vocacional dos jovens; o testemunho profético da comunidade ainda hoje será capaz de suscitar jovens disponíveis a partilhar o projeto de vida de Dom Bosco: “Da mihi animas; caetera tolle”.
7. Com Maria nosso auxílio
198.
Também em nossas comunidades, como na comunidade apostólica das origens, Maria está presente. Está em oração com os discípulos do seu Filho; vive conosco, feitos seus filhos aos pés da Cruz. Desde então, Maria está presente na Igreja com uma presença orante; reza para que os discípulos superem os fechamentos do medo, estejam atentos e prontos para o sopro do Espírito, se aventurem pelas estradas da evangelização.
Dom Bosco deixou-nos como preciosa herança a consagração confiante a Maria: Ela é o nosso Auxílio, é a Mãe da Igreja, é o auxílio dos jovens e dos pobres, é a Mãe de todos. Como o discípulo predileto, também nós acolhamos Maria em nossa casa, nas nossas comunidades. Ela nos tornará atentos às necessidades do tempo presente: «Não têm mais vinho»; e nos tornará sensíveis às exigências evangélicas: «Fazei tudo o que Ele vos disser» (Jo 2,3-5).
Maria, ajudai-nos, com a vossa intervenção materna,
a voltarmos para Dom Bosco e para os jovens!
Maria, nosso auxílio,
rogai por nós e pelas nossas comunidades!
1 NMI, 1
2 Cf. NMI, 16-28
3 Cf. NMI, 29-41
4 Cf. NMI, 42-57
5 NMI, 30
6 NMI, 32
7 NMI, 39
8 NMI, 43
9 VC, 110
10 Cf. ACS 305, p. 9
11 Capítulo Geral 22 da Sociedade de São Francisco de Sales, Documentos, Roma 1984, p. 19
12 VECCHI J.E., Especialistas, testemunhas e artífices de comunhão, ACG 363, 21. Não é indiferente que o próprio P. Vecchi cite este texto em sua carta de convocação do CG25, ACG 372, 30
13 Cf. AA.VV., Per una fedeltà creativa. Rifondare: ricollocare i carismi, ridisegnare la presenza, Il Calamo, Roma 1999, que reúne o 54o Convenius Semestralis da USG, em Ariccia, no mês de novembro de 1998.
14 Potissimum Institutioni, 1
15 A Formação dos Salesianos de Dom Bosco. Princípios e Normas. Ratio Institutionis et Studiorum. Terceira edição, Roma, 2000, (n.15), 33
16 Cf. ACG 376, p. 27