IV. A COMUNIDADE SALESIANA LUGAR PRIVILEGIADO DE FORMAÇÃO E ANIMAÇÃO |
«Recebereis uma força,
a do Espírito Santo que descerá sobre vós,
e me sereis testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e
a Samaria, e até aos confins da terra» (At 1,8).
«Estai atentos a vós mesmos e a todo o rebanho:
nele
o Espírito Santo vos constituiu guardiães...” (At 20,28).
49. Estamos convencidos de que Deus nos chama a viver em comunidades fraternas, segundo o modelo do discipulado vivido pelos doze e animado por Jesus.
Dom Bosco é para nós pai, modelo e mestre. Por meio do estudo, da oração e da experiência concreta, aprendeu a encarar a realidade, avaliá-la e achar as respostas adequadas para os eventos e as novas conjunturas. Por suas qualidades humanas e espirituais, reuniu em seu derredor uma comunidade fraterna e apostólica, em contínuo crescimento vocacional.
As comunidades salesianas de hoje querem continuar o espírito da comunidade de Dom Bosco e dos primeiros salesianos. Para nós a comunidade é um verdadeiro lar, onde em clima de fraternidade nos apoiamos uns aos outros no caminho de crescimento pessoal e vocacional, segundo as várias etapas e fases da vida. A vida comunitária já é em si mesma formativa.
50. Interpelados pelos jovens e impelidos pelo dinamismo de um mundo em mudança, atualizamos e aprofundamos nosso empenho vocacional. Em tal contexto, o diálogo com os leigos e o empenho pelo crescimento da CEP se tornam para nós um caminho de formação e de promoção do nosso carisma.
51. Incentivadas pelo vasto movimento de re-fundação da vida consagrada e na escuta dos sinais dos tempos, as nossas comunidades advertem a necessidade de uma constante transformação de mentalidade dos estilos de vida, dos critérios e das metodologias educativo-pastorais, como também das estruturas, em constante fidelidade ao carisma original. Sentem-se, por isso, chamadas a um esforço solidário de reflexão e de diálogo, de experimentação e de confronto, de decisões e de avaliação, que assegure uma formação contínua.
52. O Diretor – pai, mestre, irmão e amigo – é reconhecido e apoiado pelos irmãos como ponto de referência na vida cotidiana, e como animador de sua fidelidade e crescimento vocacional. Ele une, guia e estimula toda a comunidade a viver com profundidade a própria vocação à santidade no espírito de Dom Bosco.1
B. SITUAÇÃO
53. A situação se apresenta com os seguintes aspectos positivos.
Em muitas comunidades os irmãos se mostram abertos à formação e à mudança. O desejo de crescimento vocacional se realiza:
- no amor fraterno e recíproco, na compreensão e na mútua aceitação, na oração comunitária, na colaboração para idear e realizar o projeto comum, no diálogo;
- na participação de especiais momentos comunitários, como a assembléia inspetorial e comunitária, o dia da comunidade, os retiros mensais e trimestrais, os exercícios espirituais.
Notam-se também algumas peculiares sensibilidades que contribuem para a formação:
- a responsabilidade pelo próprio crescimento humano e espiritual;
- a capacidade de partilhar a própria vida interior com os irmãos;
- a atenção à dimensão humana e afetiva da pessoa;
- o desejo não só de educar os jovens mas também de deixar-se educar por eles;
- a mentalidade de planejamento, que leva a um envolvimento cada vez mais amplo;
- o empenho pela inculturação e pela inserção no contexto social e eclesial.
Em várias partes da Congregação está sendo avaliado positivamente o ministério do diretor e sublinham-se algumas condições que favorecem seu exercício:
- o seu papel como pessoa da unidade e da fraternidade;
- a capacidade de levar a comunidade por linhas de renovação e de resposta aos problemas do mundo de hoje, em sintonia com o magistério da Igreja e as indicações da Congregação;
- a atenção dos inspetores e de seus conselhos e a participação dos irmãos na escolha dos diretores;
- a preparação do diretor para o seu ministério;
- o apoio pessoal oferecido ao diretor por parte do inspetor.
54. Em algumas comunidades, porém, lamentam-se dificuldades e incertezas devidas a:
- a influência da cultura atual com os seus fenômenos de secularismo, relativismo, hedonismo e individualismo;
- o enfraquecimento da fé, que se manifesta no enfraquecimento da vida de oração, da fidelidade à celebração eucarística cotidiana e do sacramento da reconciliação, na leitura dos acontecimentos da vida e da história fundada em critérios não evangélicos, na diminuição do entusiasmo pela evangelização;
- a imaturidade humana, a fragilidade psicológica, a superficialidade nas relações, a insuficiente comunicação e diálogo;
- a insuficiência numérica e qualitativa, a pouca colaboração entre os irmãos, a diminuta ligação entre os vários papéis na comunidade e na missão, uma inadequada distribuição de tarefas, a falta de equilíbrio entre trabalho, estudo, oração;
- a incapacidade de se acompanharem os irmãos no crescimento, de ajudar-se nas dificuldades, de se apoiar também com a correção fraterna;
- a crisi do “colóquio fraterno” com o diretor;
- a insuficiente atenção aos irmãos jovens e em formação inicial;
- a descontinuidade entre a formação inicial e a permanente;
- a multiplicidade de compromissos do diretor ou a falta de hierarquização entre eles, que limitam a disponibilidade de energias e de tempo para servir os irmãos; às vezes, a ausência, até freqüente, do diretor, da comunidade;
- a tendência, por parte do diretor, de “fazer” em vez de “mandar fazer”;
- em alguns casos, a sua inadequada preparação.
C. DESAFIOS E ORIENTAÇÕES OPERATIVAS
1. A COMUNIDADE:LUGAR DE FORMAÇÃO E ANIMAÇÃO
DESAFIOS
55. A análise da situação evidencia a presença de multíplices desafios, entre os quais se afiguram prioritários os seguintes:
►Que atitudes favorecer para uma efetiva mudança de mentalidade e a abertura à renovação?
►Em que condições é possível assegurar e melhorar o empenho de todos os irmãos na formação contínua?
► Que experiências salesianas privilegiar e promover para enriquecer a formação da comunidade?
► Como valorizar a vida cotidiana em sua dimensão formativa?
Indicam-se especialmente as seguintes, como resposta aos desafios evidenciados, tendo em vista o futuro:
56.
Melhorar o empenho de toda a comunidade na formação:
■ habilitando os irmãos em formação inicial a adquirir as convicções e as atitudes necessárias para a formação permanente;
■ envolvendo todos os irmãos naqueles processos que promovem o confronto, o diálogo, a busca: programação comunitária, avaliação sistemática da vida e da ação da comunidade;
■ animando e acompanhando cada irmão no empenho pela própria formação por meio do projeto pessoal de vida.
57. Privilegiar algumas áreas de formação:
■ o amadurecimento humano, especialmente o afetivo;
■ a identidade vocacional cristã e salesiana (cf. Ratio, 26-37);
■ a compreensão e o apreço pelo Sistema Preventivo como caminho para a santidade salesiana;
■ a habilitação para trabalhar em equipe, também com os leigos, e para formular projetos e individuar processos;
■ o conhecimento do contexto cultural e da realidade juvenil, para a inculturação dos valores evangélicos e do carisma salesiano.
58. Valorizar a vida cotidiana:
■ animando a comunidade a uma espiritualidade de comunhão,2 pré-requisito de qualquer colaboração e partilha;
■ envolvendo todos os recursos da comunidade tendo em vista a missão comum;
■ favorecendo o crescimento da identidade religiosa por meio dos momentos comunitários, especialmente os encontros de programação e de avaliação, as assembléias comunitárias, o dia-da-comunidade;
■ ajudando os irmãos a encontrar tempos e ritmos certos para superar o ativismo e a superficialidade, e programando com cuidado momentos para o estudo, a leitura pessoal, a reflexão comunitária, a partilha, a oração, o recreação e o descanso.
59. Para realizar tudo isso se propõe:
Em nível mundial
O Conselheiro geral para a formação e a sua equipe:
▪ continua a apresentar oportunamente e a valorizar a nova Ratio;
▪ coordena e fortalece os centros de formação permanente nacionais e internacionais;
▪ promove a valorização dos lugares salesianos para momentos de formação, também para os diferentes contextos culturais e lingüísticos.
60. Em nível inspetorial
▪ A Comissão inspetorial para a formação elabora o programa anual para a formação permanente, dando atenção especial à área afetiva e à capacidade de relacionamentos interpessoais.
▪ O delegado para a formação coordena programas específicos para responder às necessidades dos vários grupos de irmãos, sem esquecer os doentes e os idosos, para ajudá-los a viver com serenidade e espírito de fé sua situação.
▪ O Inspetor com o seu Conselho zela pela elaboração do projeto inspetorial para a qualificação do pessoal, de entendimento com a comissão da formação e em diálogo com os irmãos. Preocupa-se com dar a devida importância aos estudos filosóficos, pedagógicos, teológicos, salesianos, profissionais e acadêmicos.
▪ Prepara-se e se favorece por parte de toda inspetoria a efetiva possibilidade de se ter acesso às fontes da nossa espiritualidade.
▪ Onde se julgar conveniente, as casas de formação inicial sejam abertas também ao serviço e apoio da formação permanente de outros irmãos, dos membros da Família Salesiana e dos colaboradores leigos.
▪ Os irmãos tirocinantes, os coadjutores que apenas terminaram a formação inicial e os sacerdotes nos primeiros anos de seu ministério pastoral sejam enviados àquelas comunidades que têm suficiente consistência, tanto qualitativa como quantitativa, e que estejam em condição de acompanhá-los em seu progresso.
▪ Ofereçam-se aos irmãos períodos consistentes de renovação e experiências espirituais capazes de sustentá-los nas várias etapas da vida.
▪ Desde o início da formação os irmãos sejam iniciados a variadas formas de aprendizagem cooperativa («cooperative learning»).
61. Em nível comunitário
▪ Fundamental fonte de formação espiritual continuam sendo: a celebração cotidiana da Eucaristia, o sacramento da Reconciliação, a liturgia das horas, a meditação, a devoção a Nossa Senhora Auxiliadora e aos santos da Família Salesiana, e outras formas de oração.
▪ A “lectio divina”, pessoal e comunitária, seja favorecida como instrumento de crescimento da vida da comunidade e “escola de oração” para os irmãos, os leigos e os jovens, especialmente nos tempos fortes do ano litúrgico.
▪ Sejam valorizados o dia da comunidade e os vários encontros comunitários. Tais ocasiões sejam adequadamente preparadas e programadas a fim de que se tornem uma oportunidade eficaz de crescimento espiritual e de partilha das próprias experiências pessoais.
▪ O projeto comunitário nasce da colaboração de todos os irmãos, podendo assim ser verdadeiramente partilhado e diligentemente avaliado.
▪ Também para efeito de formação, cada comunidade ponha em andamento todas aquelas medidas consideradas úteis para salvaguardar, reorganizar e enriquecer as suas bibliotecas e os arquivos documentais.
62. Em nível pessoal
. Dê o irmão a prioridade aos tempos de oração, de reflexão pessoal e de retiro, ao dia semanal da comunidade e às reuniões de planejamento e de avaliação.
. Valorize a direção espiritual, tanto pessoal quanto comunitária.
. Desenvolva, também com a ajuda das ciências humanas, as capacidades e as atitudes de auto-conhecimento e auto-estima.
. O projeto pessoal de vida3 pode tornar-se assunto do colóquio com o diretor.
1 DESAFIOS |
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63. Na situação atual, vários são os desafios para o adequado exercício do ministério do diretor, entre os quais estes parecem ser os mais relevantes:
► Como ajudar o diretor para que na comunidade possa ser não só homem de governo e último responsável pelas atividades mas sobretudo pai, guia, irmão e amigo?
►Como verificar que existem as condições para que um diretor possa desenvolver convenientemente o seu ministério?
► Como preparar adequadamente um irmão para a assunção do ministério de diretor?
►Como ajudar os irmãos a reconhecerem com fé o papel do diretor e apoiá-lo em seu serviço?
64. ▪ Seja o diretor, segundo o modelo, Dom Bosco, “uma figura paterna e, ao mesmo tempo, afetuosa e autorizada... Profundamente marcado pelo caráter sacerdotal, ele o traduz cotidianamente no ministério da palavra, da santificação e da animação”.4
▪ A primeira tarefa do diretor é a de animar a comunidade na caridade (“procure fazer-se amar”), cuidando dos seus irmãos, especialmente dos mais frágeis e dos que estão em formação inicial. O exercício do seu ministério requer, na situação atual, que leve em consideração a escala hierárquica das suas tarefas: servidor da unidade e da identidade salesiana, mestre e guia pastoral, orientador do trabalho educativo, gestor da obra.5
▪ O diretor “vive numa visão de fé, que se traduz na certeza de ter recebido de Deus quanto possa ser útil à comunidade. Por conseguinte, vive na oferta alegre das próprias possibilidades e na tranqüilidade diante dos seus limites de temperamento ou de capacidade”6. Ele goza da confiança dos irmãos da casa e da inspetoria e é aceito não só por aquilo que faz mas sobretudo por aquilo que é e representa.
▪ Diante da multiplicidade e da delicadeza das tarefas do diretor, é de fundamental importância garantir-lhe uma boa preparação, prévia e contínua, com conteúdos e metodologias úteis ao seu serviço.
65. Propõe-se:
Em nível inspetorial
▪ O inspetor garante reuniões regulares dos diretores para a formação, a troca de informações e o entendimento sobre as atividades e a animação da inspetoria.7
▪ Em nível interinspetorial ou regional são organizados cursos de preparação e de atualização para os diretores.
Em nível local
- A comunidade, sob a coordenação do diretor, elabora no início do ano o plano comunitário anual, onde diretor e irmãos manifestam as próprias expectativas, partilham objetivos e critérios de ação, e programam os momentos comuns.8
▪ O diretor, além de ter o apoio do Inspetor, seja ajudado e sustentado por uma válida figura de vigário e pela cooperação constante do seu Conselho.
▪ O diretor, sensível às necessidades dos irmãos e em diálogo com eles, empenha-se por favorecer e promover a maneira mais apropriada de realizar o colóquio, pronto a dar o primeiro passo.
▪ O diretor, auxiliado pelo inspetor, procura garantir para si, também com a utilização das ciências humanas, uma adequada preparação,.
1 Cf. C 55
2 Esta espiritualidade de comunhão “significa em primeiro lugar ter o olhar do coração voltado para o mistério da Trindade, que habita em nós. .... Significa também a capacidade de sentir o irmão de fé na unidade profunda do Corpo místico, isto é, como “um que faz parte de mim”», para saber partilhar as suas alegrias e os seus sofrimentos, para intuir os seus anseios e dar remédio às suas necessidades, para oferecer-lhe uma verdadeira e profunda amizade. Espiritualidade da comunhão é ainda a capacidade de ver, antes de mais nada, o que há de positivo no outro, para acolhê-lo e valorizá-lo como dom de Deus. .... Espiritualidade da comunhão é, enfim, saber «criar espaço» para o irmão, levando «os fardos uns dos outros» (Gl 6,2) e rejeitando as tentações egoístas que sempre nos insidiam e geram competição, arrivismo, suspeitas, ciúmes” (NMI 43; cf. ib.1).
3 Ratio, 277
4 Cf. J. Vecchi, Spiritualità salesiana, ed. SDB, IVE-IVO, pp. 129-131
5 CG21, 52
6 Cf. J. Vecchi, Spiritualià salesiana, ed. SDB IVE-IVO, p.25.
7 Cf. R 145
8 Cf. C 181