Bakaru Rowatsu's (noticias misionarias)| 13



Missão Salesiana de Mato Grosso

ANIMAÇÃO MISSIONÁRIA INSPETORIAL

CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO INDÍGENA (CDI)

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"BAKARU-ROWATSU'U-Notícias Missionárias"

é de Circulação Interna




Coordenação: Delegado Inspetorial de Animação Missionária:

Pe. Georg Lachnitt SDB





Digitação e Diagramação: Georg Lachnitt





Impressão: Mariza Etelvina Rosa Irala

Centro de Documentação Indígena

UCDB - Campo Grande MS




Capa:

BAKARU, palavra Bororo, significa: o que se conta, notícia

ROWATSU'U, palavra Xavante, significa: o que se conta amplamente, notícia

Apresentação


Dando continuidade ao eco do mês missionário, este nº de NM apresenta informações da nova fronteira missionária, a Mongólia. Assim, este povo tão distante geograficamente chega mais perto de nós.

Cada reunião de missionários/as apresenta uma contribuição para manter a unidade da ação missionária junto aos povos Bororo e Xavante. O encontro, além de favorecer a fraternidade, leva também a um estudo de fatos da realidade missionária concreta com seus desafios, que exige compromisso por parte dos missionários.

O Magistério de João Paulo II mostra um crescente aprofundamento da reflexão missionária. Neste fascículo segue um comentário da Carta Encíclica Slavorum Apostoli, que ficou um tanto esquecida com sua rica contribuição em procura de definições mais claras do termo de inculturação, que se refere ao grande mistério da Encarnação de Jesus Cristo.

O Animador Missionário pôde participar da Assembléia da Igreja Missionária de São Gabriel da Cachoeira no Rio Negro, bem diferente em seu aspecto geográfico e tão rica em povos indígenas diferentes. Isto nos anima a enfrentarmos com mais animação a nossa própria missão.

O tema da Teologia Índia ganha cada vez mais importância nos ambientes missionários entre os indígenas, pelo que parece oportuno partilhar alguns elementos da reflexão sobre este tema, que mereceu atenção também em diversos encontros diocesanos e regionais.

Um encontro de mulheres Xavante para refletir sobre seu papel em suas famílias mostra que tantos outros campos da atividade missionária ainda não foram contemplados. Isto também aponta para a missão específica das missionárias junto ao mundo feminino indígena.

Os Cursos de Agentes de Pastoral já fazem parte da rotina pastoral anual. Cada encontro mostra novas faces da pastoral e suscita contribuições sobretudo por parte dos anciãos indígenas.

As "Notícias Breves" apenas são breves na redação, mas muitas são significativas quanto ao seu conteúdo.

Muita Animação Missionária!


Pe. Georg Lachnitt SDB

1. Mongólia, Nova Fronteira Missionária

Dicastério para as Missões dos SDB

Ambiente e território

A Mongólia é um território principalmente montanhoso, um gigantesco planalto cuja altitude média é de 1580 m acima do nível do mar (a própria capital Ulan Bator surge a 1350 metros de altitude).

É possível identificar quatro zonas geográficas distintas, de altitude gradualmente mais baixa: a oeste, os montes Altai, que constituem a fronteira ocidental do país; a norte, o território da taiga, dos grandes lagos e das florestas de coníferas, do centro a leste, as estepes e a região dos planaltos; no extremo sul, o deserto de Gobi, uma gigantesca depressão, como o nome em mongol indica.

As montanhas mais altas do país, que delimitam a Mongólia de Oeste a Sudoeste por mais de 1500 km, se encontram na cadeia dos Altai (Altai Nuruu), sugestiva e de difícil acesso, com picos constantemente cobertos de gelo, alguns dos quais ultrapassam facilmente os 4000 metros. O cume mais alto, o Tavanbogd Uul (4374 m), tem uma magnífica geleira. As vastas pradarias que se estendem aos pés dos montes, cobrem-se no verão de estrelas alpinas.

Parece que eram de origem altaica as primeiras populações mongóis, como testemunham as pinturas rupestres encontradas em algumas grutas e que remontam a 15.000 anos atrás.

Outras cadeias importantes são o maciço do Kangai (situado no centro do país), a cadeia do Kentii (na zona Norte-nordeste, onde, segundo a tradição, teria nascido Gêngis Khan). Existem outros relevos ao Norte, mas que não constituem cadeias de montanhas bem definidas.

Nestes numerosos relevos montanhosos, nascem muitos rios, entre os quais o longo Keroulen (1254 km) que, do maciço do Kentii, corre até a China setentrional, o Selenga (992 km) que nasce nos montes do Kangai e alimenta o lago Baikal na Sibéria, o Orkon e as suas cascatas, o Onon e o Tula que atravessa a capital.

A maior parte dos lagos está reunida na extremidade ocidental, encravada entre os Altai e os Kangai, na área chamada justamente zona dos lagos.

Aqui encontramos o Ubsu Nur que, com os seus 3350 kmq, possui a superfície mais extensa e é caracterizado pelas águas salobras e uma miríade de bacias de dimensões menores. Este lago espetacular, circundado por dezenas de montanhas de 2000 m de altitude ou mais, pinheirais densos e prados verdejantes conta 96 afluentes e um só emissário. Com os seus 2760 kmq (136 km de comprimento e 30 km de largura) de água pura e cristalina excepcionalmente rica de peixes, entre os quais lennoks e esturjões, è, em absoluto, o mais profundo da Ásia Central (262 m) e contém 2% das reservas de água doce mundial.

Em 1992, foi aqui instituído o Parque Nacional de Hovsgol Nur, sendo que a maior parte de seu território é constituída por florestas. A região é habitada por três povos diversos: Darkhad, Buriatas e Tsaatan, os homens-rena, uma população nômade em vias de extinção que vive na taiga da Mongólia do norte. Na zona vivem carneiros argalí, cabras-monteses, ursos, martas zibelinas, alces e mais de 200 espécies de pássaros.

Descendo para o sudeste, o território torna-se mais baixo e gradualmente mais árido: trata-se da região dos planaltos, caracterizada pela vegetação da estepe.

No sul, estende-se o deserto de Gobi, que ocupa um terço do território nacional e prossegue nos territórios da China do Norte. Este é formado principalmente por terrenos áridos e pedregosos recobertos por arbustos, enquanto as dunas de areia representam somente 3% de sua superfície. Apesar de seu aspecto árido, o deserto, com sua vegetação pobre, consegue sustentar numerosas cabeças de ovelhas, cabras e camelos.

As temperaturas nessa área ultrapassam 40° no verão e atingem - 40° no inverno, enquanto que na primavera desencadeiam as tempestades de areia. A chuva, muito rara nestas regiões, cai a cada dois ou três anos. No seu interior, encontram-se lagos salgados, como o Orog Nur e o Bon Tsagan Nur, que apesar de estarem lentamente secando, continuam a ser suficientemente alimentados por nascentes subterrâneas.

A lenda reza que o deserto de Gobi tenha sido criado pela passagem dos exércitos de Gêngis Khan, mas, na verdade, os numerosos fósseis que o constituem testemunham na pré-história a presença de um vasto mar. O Parque Nacional Gurvansaikhan aqui instituído abriga montanhas, fósseis de dinossauros, extraordinárias dunas de areia, formações rochosas e um vale coberto de gelo na maior parte do ano.

Clima

Apesar de gozar de mais de 260 dias de sol por ano, tanto que merece o epíteto de "Terra dos céus azuis", a Mongólia é um território de extremos.

Os longos invernos subárticos caracterizam a estação fria: a neve permanece no deserto de Gobi mesmo até abril, para recomeçar a cair já em setembro, enquanto alguns lagos permanecem gelados às vezes até junho. As temperaturas na taiga podem descer até a 60 graus abaixo de zero.

Em Ulan Bator, a capital, o inverno dura de outubro a abril e, em janeiro e fevereiro, o termômetro pode tocar até -40°C.

A curta primavera (de maio a junho), é caracterizada por violentas tempestades de areia e pouquissima chuva. Isto provocou, na primavera de 1996, uma série de perigosos incêndios que destruíram uma área do tamanho de Portugal.

Os verões, que vão de junho a agosto, são amenos com temperaturas médias de 25 - 30 graus acima de zero. Por causa da elevada altitude do país, as noites são, em todo o caso, frescas também nos meses do verão. Nas areias do deserto de Gobi, é possível atingir +40° C durante o dia, mas de noite a temperatura cai para 0° C.

A breve estação úmida vai da metade de junho a setembro, mas as chuvas são em geral modestas e de curta duração.

Desde 1999, a Mongólia é particularmente atingida pelo fenômeno do dzud, ou seja, verões secos e invernos muito nevosos que impregnam de gelo o terreno reduzindo drasticamente a produção de forragem.

O dzud, que atingiu todo o país, mas em particular as províncias de Bulgan e Hovsgol, impediu que os rebanhos fossem pastar, causando nos últimos anos a morte de 10 milhões de cabeças.

Conseqüentemente, está piorando ainda mais o problema da desertificação, da degradação das pastagens e da exploração excessiva dos poucos terrenos produtivos, que constituem apenas 1% da superfície total da Mongólia.

Flora e fauna

Apesar das temperaturas extremas e das chuvas escassas, a Mongólia é rica de vegetação. A região a Norte, a mais fria e montanhosa do país, apresenta uma flora principalmente caracterizada pela taiga, composta de bosques de coníferas e bétulas, enquanto a parte central é caracterizada pela estepe, com vegetação herbácea baixa e muito cerrada, que degrada lentamente para o Sul, transformando-se depois, em zona desértica. Exuberantes e variadas são as flores que, nas estações mais quentes cobrem todo o país: nas montanhas, é possível encontrar imensas pradarias de estrelas alpinas.

Ainda mais extraordinária é a riqueza da fauna: os imensos espaços da Mongólia são repletos de uma grande quantidade de animais (600 espécies de vertebrados, 20.000 de invertebrados e um número impressionante de pássaros e peixes), alguns dos quais extremamente raros ou únicos, como, por exemplo, o leopardo das neves, que sobrevive em poucos exemplares entre as montanhas do Altai, o Euchoreutes naso (chamado "rato canguru) no deserto de Gobi ou o seu minúsculo primo Salpingotus kozlovi (de 4 centímetros de comprimento), o raríssimo Maazalai (Urso de Gobi), o Onagro (burro selvagem), o cavalo de Przewalski, o Argali (carneiro), o iaque e o camelo bactriano, além de renas, gazelas da cauda preta, cabras-monteses, pequenos roedores como os esquilos e os pikas, as marmotas de bochechas gorduchas, a raposa prateada e outros animais de pele.

Somente no deserto de Gobi vivem mais de 200 espécies de pássaros: grous, pegas, falcões, águias, além do tentilhão mongol do deserto, do abutre monge, da toutinegra anã e da abetarda húbara.

Em novembro de 2002, o Parlamento mongol aprovou uma lei para a proteção do patrimônio da fauna e da flora, em harmonia com as disposições internacionais. Serão, portanto, intensificados os controles sobre as exportações de animais, plantas, peles, troféus e outros objetos, assim como o exercício da caça.

Numerosas expedições realizadas a partir dos anos 20 encontraram no deserto de Gobi restos fósseis de esqueletos e ovos de centenas de dinossauros, dentre os quais o Protoceratops andrewsi, o Tiranossauro Rex e muitos exemplares de Velociraptor, hoje expostos no museu de história natural de Ulan Bator. Julga-se que estes mastodônticos animais, dominadores incontestados do período Cretáceo (70 milhões de anos atrás), tenham sido surpreendidos por tempestades ou por desabamentos de dunas ou, que uma vez mortos, fossem rapidamente cobertos por uma camada de areia e rocha que se fossilizou, permitindo que fossem encontrados em bom estado de conservação nos nossos dias.

Os cinco animais sagrados

A relação entre os Mongóis e o mundo animal é muito estreita e ligada a vínculos ancestrais. Por uma tradição muito antiga, os nômades das estepes veneram cinco animais sagrados dos quais depende totalmente para a sua sobrevivência: o cavalo, o camelo, a vaca (associada ao iaque), a cabra e a ovelha.

O respeito pelo ambiente e principalmente pelos seres vivos que o povoam é um dos pontos pacíficos da tradição desta terra. É só pensar nas botas típicas mongóis, os gutul, com as pontas viradas para cima para não ferir os pequenos animais do terreno, ou nas orações que são recitadas após a morte de uma presa ou a morte por velhice ou doença de um componente do rebanho, e nos métodos indolores que são empregados quando um animal tem de ser sacrificado.

A cabra fornece leite e companhia para a ovelha, mas a sua carne é raramente consumida. As macias cabras de raça cashmere, que vivem nas zonas frias, oferecem uma fibra mais macia e valiosa, quanto mais forem flageladas pelos ventos gélidos as pastagens. Os tosadores entram em atividade na primavera, tosando o pêlo inferior das cabras que serve exatamente para se protegerem do frio. Dado que cada animal fornece em média 150-200 g. de cashmere, para fazer um suéter, é necessário pelo menos sete cabras e cinco quilômetros de fio.

Muitas vezes, o iaque é utilizado no lugar da vaca, mas o seu leite é mais gordo. Resistente às baixas temperaturas graças ao pêlo longo e espesso, este fornece também carne e couro. Para puxar carroças, são utilizados indiferentemente camelos, iaques ou bois.

O animal tradicional de transporte é o camelo bactriano, aquele com duas corcovas, difuso especialmente nas áridas pradarias do deserto de Gobi. São animais imponentes e formidáveis, que são empregados como cavalgaduras e como animais de tração. Parecem mover-se livres, enquanto pastam em pequenos bandos, mas na Mongólia todas as cinco espécies de animais domésticos são sempre propriedade de alguma família, distante às vezes dezenas de quilômetros. Ambas as corcovas eretas significam que o animal goza de boa saúde. Se, ao contrário, caem flácidas, é sintoma de uma condição ruim, como acontece com freqüência no final do inverno. Não é raro encontrar uma caravana de seis camelos ou mais que procedem em fila, transportando as provisões, a mobília e a própria casa de uma família que está se deslocando em busca de novas pastagens.

Com certeza, o mais precioso dos cinco animais é o cavalo que, nesta terra, é bem mais que um simples eqüino útil ao pastor.  Recorda um provérbio: “quando um mongol está separado de seu cavalo, o que mais pode fazer senão morrer?”. As crianças na estepe aprender a montar logo após terem aprendido a andar e mesmo o mais "citadino" dos mongóis é capaz de cavalgar.

Os cavalos mongóis, baixos de estatura e distinguidos por uma longa cauda e uma densa crina, são deixados livres para correr pelas pradarias. Para pegá-los, usam um tipo de laço rígido, chamado urga, para empregar o qual é preciso grande habilidade.

Muito importante na imaginação dos Mongóis, que erroneamente acreditam fosse a montaria das hordas de Gêngis Khan, é o cavalo originário, o Equus ferus przewalskii (do nome do cientista de origem polonesa a serviço do czar que o descobriu e descreveu no século XIX), conhecido na Mongólia com o nome de Takhi (espírito).

O takhi, que geneticamente possui 66 cromossomos contra os 64 do cavalo comum, parece mais com uma zebra: pescoço maciço e não muito longo, pernas curtas, crina breve e eriçada, pelagem cor de areia que escurece nos meses do inverno, estatura de não mais que 140 cm no lombo.

Em época antiga, os takhi deviam ser muito numerosos: dizem que até Gêngis Khan perdeu os estribos de seu cavalo assustado pela passagem de um deles. Mas já poucos séculos mais tarde, tornaram-se raros, a ponto de um exemplar, em 1630, ser o objeto de um precioso presente feito ao imperador da Manchúria.

A extinção quase total dos takhi na Mongólia foi causada pela caça indiscriminada organizada pelos zoológicos ocidentais: para obter os exemplares, provavelmente capturavam os potros, menos velozes na corrida, que na maior parte morriam durante a perigosa viagem para a Europa ou a América.

Os últimos exemplares livres desta espécie foram vistos em 1960 no deserto de Gobi. O programa de reintrodução não foi simples de se iniciar, porque não se sabia mais qual fosse o seu habitat real (alguns estudiosos diziam que seu lugar de origem era o deserto de Gobi e que os exemplares vistos na estepe tinham se deslocado por motivos acidentais; outros estavam convencidos do exato contrário).

Usos e costumes

O estilo de vida mongol é nômade e está profundamente ligado ao dos animais. A urbanização não conseguiu afetar as antigas tradições que continuam a sobreviver nas estepes.

Festas: O Tsagaan Sar (Mês Branco), em janeiro ou fevereiro, marca o início do novo ano lunar. Depois de meses de frio polar, os mongóis se concedem por ocasião do ano novo, mais de três dias de festas, com abundância de comida, bebidas e cantos.

Mais uma grande ocasião de festa que envolve profundamente o povo mongol são os jogos desportivos dos Naadam, cujas eliminatórias são realizadas nas diversas províncias, enquanto as finais nacionais são disputadas na capital nos dias 11 e 12 de julho.

Alimentação: Um antigo ditado mongol recita mais ou menos assim: "Tome o café da manhã sozinho, compartilhe o almoço com os amigos e ofereça o jantar aos inimigos". Para os mongóis, as refeições mais importantes e abundantes são o café da manhã e o almoço, que em geral constam de carne de carneiro cozida com muita gordura e farinha acompanhada, às vezes, de queijos ou arroz. As comidas são tradicionalmente divididas e duas categorias: os alimentos cinzentos que são consumidos principalmente nos meses de inverno (essencialmente carne ovina cozida, mas também o zaidas, salame cozido feito com o intestino de capado, moído, misturado com sangue, farinha, cebola, alho e os bolinhos de carne chamados khuurshuur), e os alimentos brancos derivados do leite (queijo, iogurte, creme ácido, etc.), consumidos, ao contrário, nas estações mais quentes. Às vezes, há também algumas comidas compostas de farinha, como o Guriltai, macarrão grande, enquanto as hortaliças são quase ausentes, com excessão do repolho, cebola, pepinos e frutas silvestres. Os cazaques da Mongólia ocidental variam sua dieta com carne de cavalo.

Os mongóis bebem muito chá: a bebida mais difusa é o süütei tsai (Chá preto temperado com leite e sal). Bebidas tradicionais são o Arak e o kumiss, produzido com leite de égua fermentado em odres de pele de cabra, com um leve conteúdo alcoólico igual a cerca de 3%. Muitos mongóis realizam mais uma fermentação, obtendo assim o shimiin arkhi, que chega a um conteúdo alcoólico de cerca de 12%. Também difusa é a besbodka, espécie de vodka mongol e o kvas, bebida fermentada a partir de pão preto e açúcar. Para a cultura mongol, os homens que se recusam a beber bebidas alcoólicas são considerados maricas e, infelizmente, o alcoolismo constitui um fenômeno tragicamente em aumento.

As roupas: muitas pessoas, principalmente entre os idosos ou nas zonas distantes da cidade, usam ainda a tradicional túnica de seda acolchoada, amarrada na cintura por uma faixa amarela ou alaranjada. Como calçado, usam as gutul, as típicas botas da estepe cujas pontas são viradas para cima, pois, conforme a tradição, o solo não deve ser ofendido pelos passos do homem. Particularmente interessantes são as roupas das crianças: às vezes, os meninos são vestidos com roupas femininas e vice-versa. Este antigo costume teria o objetivo de confundir os espíritos da morte infantil que, com frequência, atingem sem piedade. Por isso, pode acontecer de se ver na estepe uma figurinha vestida com um esvoaçante vestido rosa cavalgar a pelo num desenfreado cavalo!

Característica é a roupa das mulheres, que se vestem de túnicas de seda de cores chamativas e enrolam os cabelos em tranças. O vestuário tradicional mais elegante é o das mulheres Cazaque, constituído por vestidos com decorações vivas e jóias. As mulheres casadas se distinguem porque usam uma faixa branca ao redor da cabeça; os homens Cazaque também têm um vestuário particular: usam uma longa capa preta, com barrete de pele de raposa.

A hospitalidade: como todos os povos nômades, os Mongóis são extremamente hospitaleiros e acolhedores, apesar de sua pobreza. Seus costumes, porém, são às vezes muito diferentes dos dos povos ocidentais. Eis algumas de suas normas de etiqueta:

- Não se deve tirar o chapéu entrando numa habitação

- É preciso cumprimentar os presentes e sentido horário, do mais velho ao mais jovem (segundo o nariin, a direção do sol, a mesma adotada nos templos budistas)

- Quando estiver sentado numa ger, não mostrar a sola dos sapatos, não assobiar, não estalar os dedos, não jogar no fogo restos de carne, não mover as brasas com a ponta de uma faca (o fogo é sagrado, representa a família, tocá-lo com uma lâmina significaria o fim da própria família)

- À mesa, não deixar a lâmina de uma faca virada na direção de alguém (seria como desejar sua morte)

- É considerado educado comer de maneira ruidosa, porque isso concorda com o princípio budista da exaltação dos sentidos

- Quando é trazida uma tijela ou qualquer outro objeto, receber sempre com a mão direita e cobrir o pulso com a manga

- É completamente inconveniente arregaçar as mangas. De fato, este é o gesto de quem mata um animal e poderia ser mal interpretado

- Não pular por cima das cordas para amarrar os animais fixadas no terreno fora da ger: seria ultrajante para com os bichos e para com a própria família

- Se se recebe um presente, este nunca deve ser aberto na frente de quem deu (se é muito importante, poderia constranger quem o recebe; se é uma coisa simples, poderia desiludi-lo, mas, em todo caso, o que é apreciado é o gesto simbólico de dar).


2. Reunião de Missionários em São Marcos

Informações de Georg Lachnitt

Nos dias 14-16 de setembro foi realizada a Reunião dos Missionários/as em São Marcos. Os primeiros dois dias foram dedicados à Região III da Diocese de Barra do Garças e o último dia à Família Salesiana. A reflexão versou sobre os símbolos nos ritos de passagem em confronto com os símbolos dos ritos da Iniciação Cristã. Este é um tema muito delicado, pois tenta-se expressar em conceitos racionais o que é de ordem intuitiva e vivencial.

Houve nova eleição da Coordenação de Pastoral Indigenista Diocesana: Pe. Eloir Inácio de Oliveira foi confirmado por mais uma temporada, Pe. Giulio Boffi foi eleito para vice-coordenador e secretário, e Ir. Maria Estela Marques para tesoureira.

Foi apresentado um comentário sobre a Assembléia Regional do CIMI-MT e sobre a Assembléia Nacional do CIMI.

Foi recomendada a participação no IVº Seminário Nacional de Inculturação da Liturgia, em Luziânia, de 17 a 19 de março de 2006. Igualmente haverá um Encontro sobre Teologia Índia, em Luziânia de 01 a 05 de dezembro deste ano e para o ano vindouro está planejado, a nível de América Latina, o "V Encontro-oficina de Teologia Índia" em Manaus, de 21 a 26 de abril de 2006.

Os SDB e as FMA, depois de uma manhã de retiro com reflexão da Ir. Francisca, refletiram ainda sobre a problemática da divisa entre os Bororo e Xavante de São Marcos. A situação precária da energia elétrica, por longo tempo atendida pela MSMT nas Missões, exige agora nova solução, pois as instalações existentes não conseguem mais atender às exigências atuais.

Em vista da atualização do Diretório Missionário de SDB e FMA, a ser concretizada na Reunião de Setembro de 2006, foi solicitado um estudo dos 100 ANOS de atividade missionária diante dos atuais desafios. Nos anos 60 e 70, todo o atendimento era realizado nos poucos centros missionários de então. Hoje os Xavante se multiplicaram em mais de 150 aldeias, enquanto o número de missionários foi diminuindo. Isto, p.ex., exige novos modos e métodos de exercer a atividade pastoral junto às comunidades indígenas, a nós confiadas. Em vista desta reflexão solicitamos contribuições também dos demais membros SDB e FMA e de todos os que nos queiram prestar uma ajuda importante.


3. A INCULTURAÇÃO no Magistério de João Paulo II (II)

Georg Lachnitt

O que é a Inculturação.

Seis anos depois da Exortação Apostólica Catechesi Tradendae (1979), João Paulo II retoma seus pronunciamentos sobre o tema da inculturação, por ocasião da Carta Encíclica Slavorum Apostoli (1985). Ao comentar a importância da atividade evangelizadora dos Santos Cirilo e Metódio entre os povos eslavos, o Papa declara vários elementos básicos sobre o significado desta palavra, retomando também pronunciamentos a respeito em outras ocasiões. Ao apresentar os dois santos como "modelos" de inculturação, o Papa a define como:

a encarnação do Evangelho nas culturas autóctones e, ao mesmo tempo, a introdução dessas culturas na vida da Igreja (SA 21).

Com isso ele mostra que a evangelização na forma da inculturação se dá em duas direções. O anúncio se dirige a um povo com sua cultura, não apenas a indivíduos isolados. E simultaneamente os mesmos povos com suas culturas têm seu lugar próprio na vida da Igreja.

Mais adiante, contra qualquer visão reducionista da tarefa missionária como que sendo acréscimo ou adicional, ele declara ela ser uma tarefa essencial à vida da Igreja e proclama sua urgência na forma da inculturação. Por meio dos exemplos exímios dos Santos irmãos ele a entende como respeito à cultura do povo e promoção da mesma.

Esta atividade (missionária) constitui, de fato, uma tarefa essencial da Igreja; e nos dias de hoje ela apresenta-se como urgente, sob a forma da chamada "inculturação". Os dois irmãos não só desempenharam a sua missão com todo o respeito pela cultura que já existia entre os povos eslavos, mas promoveram-na e incrementaram-na, de modo eminente e incessante, ao cultivarem a religião (SA 26).

Os Missionários

Os Santos Cirilo e Metódio são verdadeiros modelos para a postura de um missionário que se dirige a um povo para anunciar Jesus Cristo. Antes de tudo, é preciso inserir-se no meio do povo e fazer-se um deles, a ponto de identificar-se com eles. Esta presença muitas vezes silenciosa já é uma contribuição e é básica para outras iniciativas. O Papa fala da purificação e iluminação da cultura pela luz do Evangelho. Toda esta postura reproduz a atitude de São Paulo que se fez tudo para todos afim de salvar a todos.

Foi exemplar também a determinação demonstrada em assimilar e fazer próprias todas as exigências e as expectativas dos povos eslavos. A generosa decisão de identificar-se com a sua própria vida e com a sua tradição, depois de as terem purificado e iluminado com a revelação, torna Cirilo e Metódio verdadeiros modelos para todos os missionários que, nas diversas épocas, acolheram o apelo de São Paulo de fazer-se tudo para todos a fim de resgatar todos os homens (SA 11).

A ida dos dois missionários foi resposta ao pedido do Príncipe da Grande Morávia, contanto que pudessem anunciar o Evangelho na língua do povo. Sem esse recurso é impossível a evangelização.

A petição dirigida pelo Príncipe Ratislau, da Grande Morávia, ao Imperador Miguel III, no sentido de enviar aos seus povos "um bispo e mestre ... que estivesse em condições de explicar-lhes a verdadeira fé cristã na sua língua" (SA 5).

De resto, a cristianização do povo não era possível sem recorrer à língua autóctone (SA 23).

Em preparação à sua futura atividade, eles tinham estudado a fundo a lingua eslava. Sendo naquele tempo uma língua ágrafa, fizeram o esforço de definir um alfabeto que fosse adequado para reproduzir com precisão a língua falada. A finalidade era declaradamente a celebração da liturgia na língua do povo e, para isso, os textos da Bíblia necessários também foram previamente traduzidos.

Com efeito, tinham-se preparado bem para a tarefa que lhes havia sido confiada; assim, levavam já consigo os textos da Sagrada Escritura, indispensáveis para a celebração da sagrada liturgia, ordenados e traduzidos por eles em língua paleoeslava e escritos com um novo alfabeto, elaborado por Constantino Filósofo (o mesmo Cirilo) e perfeitamente adequado à fonética daquela língua (SA 5; cf. 11).

O estudo da língua e cultura eslavas era, pois, um meio indispensável para a sua atividade missionária, e para isso a sua inserção no meio do povo, acima comentada, era o grande instrumento para se aproximar do mesmo. É pois necessário, o missionário se tornar discípulo do povo a quem se dirige.

Eles propuseram-se como objetivo chegar a compreender e a penetrar a língua, os costumes e as tradições próprias dos povos eslavos, interpretando fielmente as suas aspirações e os valores humanos que neles havia e neles se exprimiam (SA 10).

O anúncio do Evangelho a um outro povo significa também enfrentar o desafio de interpretar novos termos, próprios da Bíblia, da liturgia e do cristianismo em geral. Esta tradução tem que ser compreendida corretamente, embora devamos admitir sempre as tentativas aproximativas de interpretação. Toda tradução é uma traição, diz o provérbio popular, e é verdade. Mas toda a tradução inclui também uma nova criação, em base ao mundo imaginário e ao pensamento do povo. Tudo isso, naturalmente, leva à renovação dos métodos de catequese e de expressões litúrgicas.

Para traduzir as verdades evangélicas numa língua nova, eles tiveram de fazer o possível para conhecer bem a fundo o mundo interior daqueles a quem pretendiam anunciar a palavra de Deus com imagens e conceitos que lhes fossem familiares. Introduzir corretamente as noções da Bíblia e os conceitos da teologia grega num contexto de experiências históricas e de pensamentos muitos diversos apresentava-se para eles como condição indispensável para o feliz êxito da sua atividade missionária. Tratava-se de um novo método de catequese (SA 11; cf. 20).

Em defesa do povo

A inserção na vida de um povo leva ainda a assumir não apenas seu estilo de vida, mas também as suas preocupações e todos os problemas que o afligem. Os povos eslavos, naqueles tempos, tiveram que enfrentar a ameaça de uma colonização militar e cultural, que agredia sua identidade étnica, para não dizer, sua própria existência como povo. Os dois missionários também fizeram sua esta problemática e defenderam o direito à identidade própria dos povos eslavos.

Precisamente por esse motivo julgaram natural tomar claramente uma posição em todos os conflitos, que então perturbavam as sociedades eslavas, em vias de organização, assumindo como próprias as dificuldades e os problemas inevitáveis para povos que defendiam a própria identidade, em face da pressão militar e cultural do novo Império romano-germânico, e que tentavam repelir aquelas formas de vida que eles consideravam como estranhas (SA 10).

Esta defesa da identidade própria dos eslavos não se restringia somente à sua cultura, digamos ancestral. Ela também visava suas novas criações "cristãs" de cultura. A Igreja num outro povo que recebe o Evangelho não se torna nem colônia da Igreja dos missionários, nem sua cópia. Por isso, os missionários precisam avaliar com seu novo povo tanto a fidelidade à tradição quanto a originalidade nova do povo que recebe e expressa o Evangelho. Ambas as dimensões têm que ficar garantidas, a exemplo dos dois Santos irmãos.

Estavam bem atentos tanto ao depósito da tradição como às novas maneiras de viver próprias dos povos evangelizados (SA 10).

Tudo isso exigia dos dois missionários virtudes não comuns para serem fiéis à sua missão. Esta exigência de uma espiritualidade sólida e virtudes humanas ainda hoje continua sendo necessária para a atividade missionária no meio de um povo de cultura diferente.

Conjuntamente a um grande respeito pelas pessoas e à solicitude desinteressada pelo seu verdadeiro bem, os dois santos irmãos demonstraram ter também os adequados recursos de energia, de prudência, de zelo e de caridade, indispensáveis para levar a luz aos futuros fiéis cristãos e, ao mesmo tempo, para lhes indicar o bem e para os ajudar concretamente a alcançá-lo. Foi com este objetivo que eles quiseram tornar-se semelhantes, sob todos os aspectos, àqueles a quem levavam o Evangelho; procuraram integrar-se naqueles povos e compartilhar em tudo a sua sorte (SA 9).

A Tradução da Sagrada Escritura

Voltando ainda a analisar mais concretamente a tarefa de traduzir a Bíblia, eles conheciam bem, pela sua cultura própria e estudos feitos, a língua grega, original do Novo Testamento. Quem tentou dar alguns passos nesta atividade, sabe bem que não se trata de simples tradução, quem sabe, palavra por palavra. É preciso ser fiel ao significado mais amplo, que a tradução literal facilmente olvida. Há ainda conceitos bíblicos típicos, também reflexo da filosofia do povo eleito e da grega, que têm que ser levados em conta.

Os dois santos irmãos dedicaram-se à difícil tarefa de traduzir os textos da Sagrada Escritura, que eles conheciam em grego, para a língua daquela estirpe eslava, que se estabelecera até aos confins da sua região e da sua terra natal( SA 10).

Tenho diante de mim o Novo Testamento em língua Wapichana, resultado de quinze anos de trabalho cansativo de mais de 30 pessoas envolvidas. É preciso comunicar com precisão e fidelidade os textos sagrados. Para isso todo o esforço é requerido.

Os missionários que desde a antiguidade até aos tempos modernos ... se esforçaram por traduzir para as línguas vivas dos diversos povos a Bíblia e os textos litúrgicos, com o objetivo de fazer ouvir nelas a única palavra de Deus, e deste modo tornada acessível pela adoção dos meios de se exprimir próprios de cada civilização (SA 11).

A tradução da Sagrada Escritura para a língua de um povo em vias de evangelização leva consigo também um enriquecimento e crescimento da própria cultura de um povo, como aliás aconteceu igualmente entre outros povos. A língua bíblica leva a uma consolidação e melhor definição desse instrumento vital da comunicação humana. Um exemplo exímio deste resultado colateral nos deram os Santos Cirilo e Metódio.

A tradução dos livros sagrados, feita por Cirilo e Metódio, valendo-se da colaboração dos discípulos, conferiu eficiência e dignidade culturais à língua litúrgica paleoeslava, que se tornou durante longos séculos não somente a língua eclesiástica, mas também a língua oficial e literária e, por fim, mesmo a língua corrente entre as classes mais cultas na maior parte das nações eslavas em particular, de todos os eslavos de rito oriental (SA 21; cf. 13).

Contribuição e enriquecimento para a Igreja

Quando missionários são enviados de uma Igreja, esta não apenas dá do que em tempos mais remotos ela mesma recebeu: a novidade do Evangelho. Qual semente, o Evangelho em terras novas faz brotar novos frutos originais, diferentes e até mesmo questionadores. A Igreja que enviou, de repente tem necessidade de rever suas posições de fidelidade ao Evangelho diante das novas maneiras de expressar e viver o Evangelho que ela partilhou com outro povo. Esta e muitas outras novidades não são um prejuízo ou uma ameaça à unidade da fé, antes, são um enriquecimento e uma nova contribuição para viver mais plenamente o Evangelho, são uma das muitas faces com que o Evangelho se apresenta no meio de muitos outros povos.

Todas as Igrejas locais são chamadas a enriquecer com os próprios dons o "pleroma" católico, ... em perfeita harmonia com a sua intuição evangélica de que as diversas condições de vida das Igrejas cristã particulares não podem nunca justificar dissonâncias, discórdias e dilacerações na profissão da única fé e na prática da caridade (SA 13).

Cada uma das partes traz às demais e a toda a Igreja o benefício dos seus próprios dons, de modo que o todo e cada uma das partes crescem por comunicação mútua e pelo esforço comum em ordem a alcançar a plenitude da unidade" ... (SA 16; cf. 17).

A Igreja, então, acolhe com simpatia os dons das novas Igrejas, reconhecendo-os como válidos e até os propõe, dentro de seus próprios limites, aos seus próprios fiéis, no que for compatível com os próprios limites culturais. Nem tudo o que é diferente de nós, deve ser assimilado por nós.

A Igreja torna realidade por toda a parte a própria universalidade quando ela acolhe, unifica e enobrece, da maneira que lhe é própria, com solicitude materna, todos os valores humanos autênticos (SA 19).

Há aqueles que consideram o anúncio do Evangelho como uma agressão, uma ameaça de destruição da cultura e da identidade de um povo. Como cada cultura é dinâmica, se renova a partir das novas exigências internas e também pela influência externa, a evangelização só pode ser uma nova valorização e consolidação da cultura. Naturalmente - e a história da América Latina nos oferece um triste exemplo - sempre se tenha presente que a evangelização é uma proposta, não imposição, um anúncio que deixa liberdade de aderir ou rejeitar, tudo isso em clima de diálogo recíproco e respeitoso.

O Evangelho não leva ao empobrecimento ou à extinção daquilo que cada homem, povo e nação e daquilo que todas as culturas, ao longo da História, reconhecem e põem em prática como bem, como verdade e como beleza. Antes, pelo contrário, ele impele a assimilar e a desenvolver todos esses valores: a vivê-los com magnanimidade e alegria e a completá-los com a luz misteriosa e nobilitante da Revelação (SA 18).

Papel próprio de cada Igreja nova

Os dois irmãos tinham plena consciência de que não deviam implantar o modelo de Igreja de sua origem, mas que a Igreja devia nascer pela força do anúncio do Evangelho com feições próprias. É verdade que qualquer missionário é portador de uma cultura e anuncia o Evangelho a partir de sua cultura. Mas imbuído pelo Espírito no critério de fazer nascer a Igreja particular nova, com feições próprias, o missionário sabe relativizar a imagem cultural de sua Igreja de origem e promover o surgimento da nova com rosto próprio. Por isso, num sentido, sabiam acolher todos os dons dos povos eslavos.

Todos os homens, todas as nações, todas as culturas e todas as civilizações têm um papel próprio a desempenhar e um lugar próprio no plano misterioso de Deus e na história universal da salvação (SA 19).

Num outro sentido, eram conscientes de que deviam relativizar sua Igreja vigorosa das origens.

Os dois irmãos não procuravam impor aos povos aos quais deviam pregar nem sequer a indiscutível superioridade da língua grega e da cultura bizantina, ou os costumes e modos de comportar-se da sociedade mais desenvolvida, em que eles próprios haviam sido educados e que, evidentemente, continuavam a ser para eles familiares e caros (SA 13).

Numa visão limitada, o autor da encíclica admite ainda que os povos eslavos não tivessem a sua cultura e devem ao trabalho dos dois missionários os "inícios" da mesma. Indiscutivelmente, porém, deram sua contribuição valiosa para o desabrochar de uma outra face da cultura, até então inexistente: a cultura da escrita com todos os seus desdobramentos. Nisso se torna verdade que a obra da evangelização também cria novidade na cultura de cada povo.

Ao encarnarem o Evangelho na cultura peculiar dos povos que evangelizaram, os Santos Cirilo e Metódio tiveram méritos particulares na formação e no desenvolvimento dessa mesma cultura ou, melhor dito, de numerosas culturas. Com efeito, todas as culturas das nações eslavas devem os seus "inícios" ou o seu desenvolvimento à obra dos dois irmãos de Salônica. Eles, de fato, com a criação original e genial de um alfabeto para a língua eslava, deram uma contribuição fundamental para a cultura e para a literatura de todas as nações eslavas (SA 21).

Unidade e diversidade

Ao promover o surgimento de uma Igreja com rosto próprio, diferente daquela de origem dos missionários, temos, de fato, uma novidade diferente do modelo de origem e, quem sabe, do modelo universal de Igreja. Esta multiplicação de Igrejas originais diferentes certamente questiona aquela visão de unidade no sentido de uniformidade. Como o Evangelho é um só, mas diferente em suas respostas de como vivê-lo, a diversidade é um fato normal e previsível da grande orquestra de muitos instrumentos de uma sinfonia. A diversidade, em razão do único Evangelho de Jesus Cristo anunciado, exige a comunhão das muitas diversidades na Igreja. Diz-se que a unidade só é possível pela composição de diversidades. Por isso, cada povo contribui com suas riquezas próprias para as demais Igrejas com que está em comunhão.

Ambas as tradições cristãs - a oriental ... e a ocidental... - nasceram no seio da única Igreja, ainda que sobre tecidos de culturas diferentes e de modos diversos de enfrentar os mesmos problemas. Esta diversidade, se bem compreendida a sua origem e se bem considerados o seu valor e a sua significação, não pode senão enriquecer quer a cultura da Europa, quer a sua tradição religiosa (SA 25).

Comentando a importância dos dois irmãos para o sentido de construir a unidade da Igreja, o Papa nos oferece definições muito claras para os desafios da inculturação, que não deve significar um fechamento nem um isolamento de cada Igreja sobre si mesma, antes de manter-se sempre aberta às demais Igrejas, sem renunciar à sua originalidade. Bem define o Papa o significado da unidade, que não é nem absorção nem sequer fusão de diversidades.

Eles são para nós modelos e, ao mesmo tempo, os patronos do esforço ecumênico das Igrejas irmãs do Oriente e do Ocidente, para reencontrar, mediante o diálogo e a oração, a unidade visível na comunhão perfeita e total, "a união que ... não é nem absorção nem sequer fusão. A unidade é o encontro na verdade e no amor, que nos são dados pelo Espírito. ... Para a perfeita catolicidade, todas as nações e todas as culturas têm um papel próprio a desempenhar no plano universal da salvação. Cada tradição particular e cada Igreja local deve permanecer aberta e atenta às outras Igrejas e às outras tradições e, ao mesmo tempo, à comunhão universal e católica; se ficasse fechada em si mesma, correria o risco de também ela se empobrecer (SA 27).

Esta última afirmação não somente deve ser aplicada às novas Igrejas que surgem pelo anúncio do Evangelho, mas igualmente às antigas Igrejas de existência secular.

Diálogo indispensável em todos os níveis

Cirilo soube utilizar com maestria a arte do diálogo, tanto na ciência quanto na ação missionária. Na verdade, o missionário não tem somente o dever de promover a inculturação do Evangelho, mas ainda aquele outro de defender e justificar o surgimento de faces novas de como receber, viver e celebrar o mesmo Evangelho comum a todos os cristãos. Na pauta do documento conciliar Unitatis Redintegratio, a prática do diálogo, motivado pela procura comum da verdade, se impõe também como instrumento irrenunciável para o anúncio do Evangelho. No relacionamento do missionário com as autoridades eclesiásticas este é o instrumento necessário para justificar as inovações dentro do processo da inculturação.

Ele recorria sempre, assim como Constantino Filósofo, ao diálogo com aqueles que eram contrários às suas idéias e às suas iniciativas pastorais e que punham em dúvida e legitimidade das mesmas (SA 15).

No estreito relacionamento com o Sumo Pontífice, por duas vezes Cirilo obteve a aprovação da liturgia em língua eslava.

O Papa João VIII, no ano de 880, aprovou o uso da lingua eslava na liturgia, traduzida pelos dois santos irmãos (SA 2).

O Papa Adriano II aprovou os livros litúrgicos eslavos e ordenou que eles fossem depostos solenemente sobre o altar na Igreja de Santa Maria ad Praesepe, hoje chamada Santa Maria Maior (SA 5; cf. 13).

A Carta Encíclica Slavorum Apostoli trouxe à Igreja, por ocasião da memória dos dois Santos Cirilo e Metódio, apóstolos dos povos eslavos, uma oportunidade singular de mostrar que a novidade da inculturação é um fato tão antigo como a própria Igreja e, por isso, as suas razões podem ser conferidas no exemplo dos antigos missionários, de que os Santos irmãos Cirilo e Metódio são modelos e patronos.

No próximo número de NM continua a reflexão.



4. Assembléia Pastoral Diocesana de São Gabriel da Cachoeira AM

A diocese de São Gabriel da Cachoeira AM, no Rio Negro, é quase do tamanho da Itália. 90 % da população é indígena, distribuída ao longo dos rios imensos e pertencendo a 22 povos indígenas diferentes. Em 1910 foi fundada a Prefeitura Apostólica, em 1941 foi elevada a Prelazia e em 1980 elevada a Diocese.

A diocese realiza sua Assembléia Diocesana a cada quatro anos, também devido às distâncias e o custo das viagens em barcos durante horas e dias. Em 2003 foi decidido realizar uma assembléia intermediária de Avaliação neste ano de 2005, também para comemorar os 25 anos de diocese. Assim os temas fundamentais eram os de então: 1º Inculturação; 2º Dignidade Humana; 3º Cidadania. Sobre estes três temas versou a primeira reflexão e, em seguida, foram apresentados os respectivos relatórios.

No segundo momento refletiu-se sobre um tema típico da diocese com suas características missionárias: "Igreja de São Gabriel, tua Vida é Missão". Os grupos de trabalho procuraram traçar linhas concretas de como levar a efeito esta missionariedade numa diocese missionária.

Uma nova reflexão, básica para a catequese sobretudo, traçou elementos sobre a "Teologia Índia", um tema atual na reflexão teológica entre os indígenas e tema promovido através de encontros do CIMI.

Os grupos de trabalho elaboraram as prioridades a serem concretiza-das nas ações pastorais das Paróquias e comunidades, para os próxi-mos dois anos, que num consenso geral se expressam: 1º Planejamen-to Pastoral participativo envolvendo padres, religiosos(as), leigos (pastorais) e organizações; 2º Revitalizar o sentido das festas dos Santos; 3º Formação de lideranças; 4º Conscientizar a vivência dos Sacramentos; 5º Criar projetos para a auto-sustentação das pastorais.

A assembléia foi concluída com um solene pontifical na catedral. Dom José Song Sui Wan, bispo diocesano, saudou a assembléia em três línguas indígenas, saudação esta que foi respondida com entusiasmo. Depois da celebração, grupos indígenas expressaram sua alegria com danças e símbolos típicos, o que foi vivamente participado.


5. Teologia Índia (I)

Georg Lachnitt

1. Teologia

A teologia, como "ciência de Deus", estuda todas as questões relativas à existência, à natureza e à ação de Deus no mundo. A diversidade de teologias provém tanto das escolas e tradições religiosas, como das matérias tratadas e das metodologias seguidas. Na teologia natural, teodicéia, o conhecimento de Deus é fundado na razão humana. Na teologia revelada o conhecimento de Deus é através da revelação1. Podemos então falar não somente de uma TEOLOGIA, única, mas de teologias, tais como: teologia dogmática, teologia moral, teologia bíblica, teologia litúrgica, teologia do batismo, teologia do matrimônio, teologia espiritual, teologia da eucaristia, teologia filosófica, teologia fundamental, teologia do trabalho, teologia ortodoxa, teologia Hindu, teologia negra, teologia paulina e joanina, teologia da libertação, e, teologia índia e nessa, teologia Bororo, teologia Xavante, teologia Terena, teologia Kaingang, teologia Guarani etc. A todos esses termos seja sempre aplicado o significado geral emitido acima, teologia, dentro de determinado campo de reflexão.

2. Teologia Índia

No D.S.D. 248 encontramos descrito o que chamamos de Teologia Índia: As formula­ções culturais (dos povos indígenas), que os auxiliem a dar razão de sua fé e de sua esperança. A Teologia Índia não é outra coisa que tentar compreender e explicar com a razão o que se vive pela fé2 (M.&C3. p. 226).

Essas descrições falam-nos em primeiro lugar de uma teologia que nasce da necessidade de entender a vida; da necessidade de unir o que acontece no dia-a-dia com o que Deus quer que aconteça (M.&C. p. 227).

Falam-nos da proximidade de Deus nos acontecimentos da vida do povo, que mostra onde Ele se dá a conhecer, porque o lugar privilegiado da presença de Deus é a comunidade. Porém, a sua presença abarca tudo o que é vida, pelo que a experiência de Deus se dá em todos os lugares da natureza, e o povo o encontra nas lagoas, nos morros, nas nascentes, no sol, nas estrelas, na lua, na mãe terra, no vento, nos raios. ... (M.&C. p. 227).

Na carta dirigida à Congregação para a Doutrina da Fé, em 1992, a Teologia Índia é definida: A Teologia Índia é o conjunto de experiências e de conhecimentos religiosos que os povos índios possuem e com os quais explicam, desde há milhares de anos até hoje, sua experiência de fé, dentro do contexto de sua visão global do mundo e da visão que os demais têm desses povos. A Teologia Índia é, portanto, um acervo de práticas religiosas e de sabedoria teológica popular, da qual se servem os membros dos povos índios para explicar os mistérios novos e antigos da vida. Por isso não se trata de algo novo nem de um produto propriamente eclesial, senão de uma realidade muito antiga que tem sobrevivido aos embates da história.4

Sendo a vida o ponto de partida para a Teologia Índia, as formulações culturais, de que fala o D.S.D. deverão ser encontradas nas características que brotam deste ponto de partida.

1. A Teologia Índia é sumamente concreta. Não se perde em abstrações ou em discussões especulativas. Contempla e saboreia a vida, e banha-se em seus mistérios, extraindo daí a sabedoria milenária. Acompanha sempre o projeto de vida do povo, enraizando-o no passado, aplicando-o e explicando-o no presente e transcendendo-o até o futuro. Sem ela, o projeto se atrofia, se desvirtua ou desaparece.

A teologia índia é simbólica, pois se expressa singularmente nos rituais. Por isso é expressa num código vital, profundo, que antes de mais nada é sentido e vivido, mas dificilmente é verbalizado ou interpretado racionalmente.

2. A Teologia Índia integra a globalidade da existência do povo e cada parte implica e explica o todo. Nenhum aspecto da realidade é rejeitado, por insignificante que pareça. Em sentido estrito, não é uma teologia exclusiva sobre Deus, mas uma teologia do povo e de seu projeto de vida, com o qual Deus está absolutamente comprometido. Não há nada da vida do povo que não tenha a ver com Deus e daí com a Teologia Índia.... (M.&C. p. 227-228).

João Paulo II falando aos bispos do CELAM em Santo Domingo n. 22 mostra também a abrangência da TEOLOGIA ÍNDIA: A sua (dos índios e negros) visão da vida, que reconhece a sacralidade do ser humano e do mundo, o seu respeito profundo pela natureza, a humildade, a simplicidade, a solidariedade são valores que hão de estimular o esforço, por levar a cabo uma autêntica evangelização inculturada, que seja também promotora de progresso e conduza sempre à adoração de Deus "em espírito e verdade" (Jo 4,23).

3. Como conseqüência do precedente, a Teologia Índia emprega uma linguagem marcadamente religiosa que, não poucas vezes, é motivo de questionamento, quando não de rejeição, de que utiliza um discurso "revolucionário" ou "libertador". Quando, nesses casos, o índio se sente agredido, reage com o silêncio ou com o rito; não é que não possa responder, mas é porque as palavras não seriam capazes de expressar o que ele experimenta, e o rito exprime muito mais (M.&C. p. 228). A linguagem religiosa, como a própria religião, é radicalmente simbólica. O símbolo expressa tudo e de maneira profunda e ampla; a linguagem verbal e racional é redutiva e delimitativa.

4. Na Teologia Índia é o povo o sujeito que elabora seus pensamento de forma coletiva. Unidos em assembléia, presididos pela autoridade legítima, reflete e leva à prática tudo o que tem a ver com a existência. Isto faz com que se ressintam os grupinhos ou indivíduos que rompem a unidade que está sendo construída pelos membros do povo. No entanto, apreciam a participação dos indivíduos ou grupos que, como servidores, contribuem para esse funcionamento coletivo, sempre que não queiram ser os únicos e principais protagonistas, suplantando o povo ...(M.&C. p. 228).

5. Uma vez que a Teologia Índia é um produto do povo, seu veículo de expressão é a linguagem mítico-simbólica, e isso não porque se encontre numa etapa atrasada ou pré-moderna; mas porque com os símbolos e os mitos expressa com mais radicalidade e globalidade o sentido profundo que o índio dá à vida. ........... (M.&C. p. 228)

Ao falar de teologia Índia, podemos constatar duas vertentes, a nível de América Latina. Podemos falar de uma Teologia da religião original antes do contato com os anunciadores do Evangelho. Esta será típica nos termos acima descritos e original de cada povo, de cada etnia. Diferente já é a teologia que resultou depois do anúncio de Jesus Cristo num nova síntese entre o antigo e o novo, diferente do que em geral é chamado de sincretismo, indevidamente. Na verdade, não existe "mistura" de elementos cristãos com elementos primitivos. Nos critérios da antropologia, que igualmente são válidos para os critérios da inculturação, o elemento novo é recebido a partir e dentro dos critérios já existentes. Será uma teologia da mestiçagem, de quem é indígena em parte e igualmente não-indígena. Como os critérios de discriminação exteriores consideram o mestiço também como indígena, esta teologia será basicamente também "índia". Nesta teologia temos um elemento valioso, a assim chamada Religiosidade Popular, uma síntese maravilhosa de religião ancestral e a novidade de Jesus Cristo. Como a Igreja oficial não aceitou por muito tempo este fato, a inculturação da liturgia, p. ex. ficou pendendo. Mas nos demais campos não-litúrgicos, a inserção, a apropriação e a re-elaboração a partir da fé ancestral conferiu características tão originais a esse fenômeno, a tal ponto que, como dizem os bispos em Santo Domingo, a Religiosidade Popular é uma expressão privilegiada da incul­turação da fé. Neste caso podemos falar não somente de uma Teologia Índia, mas também de uma teologia da inculturação da fé cristã na América Latina.


3. Método de Teologia Índia

1. Ponto de partida: a realidade atual, promovedora ou negadora da vida para o povo.

2. Fontes de inspiração para discernir a realidade:

a) O pensamento religioso dos antepassados indígenas e a Bíblia cristã;

b) A espiritualidade indígena, conservada em forma escrita ou oral na Tradição de seus povos ou na prática atual;

3. Sujeito: A comunidade, com seus sábios internos, seus interlocutores teólogos externos e o Magistério da Igreja;

4. Linguagem: mítico-simbólico, contida na memória indígena, oral ou escrita, e na prática religiosa popular;

5. Finalidade: Fortalecer a totalidade da vida do povo em suas múltiplas expressões e contribuir para a transformação social em favor dos pobres.

Tratar de cada um desses pontos é um desafio que requer a capacidade dos povos indígenas para abrir-se e confiar na possibilidade de um diálogo respeitoso da parte dos outros setores da sociedade, especialmente da jerarquia eclesiástica; mas também é necessário que a jerarquia e outros setores da sociedade dêem amostras claras de que respeitarão a liberdade dos povos indígenas para manifestar sua prática e elaborar a sua reflexão teológica.

Para fins de pesquisa e diálogo com outra religião, de uma outra etnia, costumam ser úteis as seguintes questões:

a) Quem é Deus? Que nomes tem Deus? - Importante é distinguir entre a divindade e os símbolos da divindade; p. ex. O sol é um poderoso símbolo da divindade, mas são raros os casos em que se pode falar de um culto à divindade SOL.

b) Como é Deus? Quais as suas qualidades?

c) O que Deus faz? Quais as suas atividades? Isto pode ser singularmente verificado nos ritos de cada povo, onde se realiza a ação de Deus atualizada para o povo presente.

d) Como Deus age? Com que metodologia?


6. O Papel cristão da Mulher Xavante na Família

SITE da MSMT de 03/11/2005

No dia 22 de outubro reuniram-se, das várias aldeias da Missão São Marcos, 74 mulheres Xavante, para rezar e discutir sobre o papel cristão na família Xavante, neste momento de grandes mudanças. Ir. Estela, diretora das FMA da Missão São Marcos, auxiliada pela benemérita Josina, voluntária há 40 anos entre os Xavante, dirigiu o encontro, que teve seu desdobramento nos grupos naturais da cultura Xavante. Dois Grupos não puderam participar e cobraram a mesma experiência de encontro e debate. As mulheres participantes solicitaram que encontros semelhantes sejam realizados a cada ano.


7. Curso de Agentes de Pastoral Xavante em Sangradouro

Georg Lachnitt

Chegando em Sangradouro como novo diretor e pároco, o Pe. Giulio Boffi, com sua longa experiência de pároco, logo se interessou pela evangelização e catequese. Por circunstâncias, precisou começar um novo movimento nesse sentido, pois tudo estava parado.

Para essa finalidade convocou os catequistas das diversas aldeias para um primeiro encontro nos dias 11-12 de fevereiro. Convidou também o Pe. Giaccaria e Pe. Aquilino para esse primeiro encontro.

O ritmo da comunidade Xavante neste ano estava centrado na iniciação dos jovens à vida adulta, conjunto ritual que perdura vários meses. Durante esse tempo não é possivel promover nem catequese etc. pois toda a comunidade está ocupada nos rituais indígenas.

Foi um tempo de espera paciente até o momento oportuno.

Tendo retornado da Itália, logo organizou um novo encontro com os catequistas para os dias 24-25 de outubro, para encaminhar o processo de catecumenato. Só que foi tomado de surpresa.

Concluídos os rituais do danhono e estando assim sem movimento, os jovens escutaram da disposição do Pe. Giulio e, em massa, compareceram mais de 80 rapazes e moças à missa e depois da missa queriam catequese. Do nada a tanto ... foi um susto e perplexidade.

Assim sendo, o encontro planejado foi um grande encontro de catequese para os tantos candidatos. Foi-lhes apresentado o caminho do processo do catecumenato e seguiu-se uma reflexão sobre o significado da Iniciação Cristã.

Numa reunião à parte, os Catequistas com os missionários programaram o ritmo da caminhada catecumenal para levar o grupo possivelmente ao batismo e primeira eucaristia na Páscoa de ano vindouro, já que, como alegam, houve dois anos de catequese em tempos idos.

De acordo com os critérios Xavante, antes de definir os iniciandos, é preciso definir os responsáveis pelo processo, a saber, os padrinhos, as madrinhas e os catequistas do grupo. Eles entendem perfeitamente os esquemas inerentes ao processo de iniciação e a metodologia a ser utilizada.

Assim, para o Rito da Instituição dos Catecúmenos, marcado para o dia 06 de novembro, não compareceram somente os 80 candidatos, mas ainda outros 80, isto é, padrinhos e madrinhas. O missionário ficou perplexo diante da "confusão", que na verdade era exatamente a organização típica de como os Xavante realizam também a iniciação cristã. Compete agora ao missionário acompanhar catequistas e catecúmenos que com muito fervor se apresentaram para o catecumenato. PARABÉNS!


8. Curso de Agentes de Pastoral Xavante em São Marcos

Georg Lachnitt

De 12 a 15 de novembro foi realizado em São Marcos o Curso de Agentes de Pastoral Xavante, no qual participaram 40 representantes da maioria das aldeias circundantes. Havia vários anciãos que com suas intervenções deram contribuições importantes.

O tema central a ser aprofundado foi o da Iniciação Cristã entre os Xavante. Este tema, além de sua reflexão própria, mereceu aprofundamento antropológico, recorrendo ao rico sistema de iniciação da cultura Xavante. Num sentido de uma evangelização inculturada que constroe sobre a rica experiência de Deus na vida, na mitologia e na ritualidade indígena, uma reflexão sobre Teologia Índia torna-se um tema presente em todos os encontros. A originalidade do anúncio do Evangelho requer, por sua vez, uma exposição clara da proposta nova que enriquece a vida religiosa tradicional e ainda leva maior vigor à tradição secular, a qual é fundamento para a evangelização.

Todos os temas foram permeados de intervenções sobre a preocupação central hoje nas comunidades Xavante: a juventude. O fácil contato com o mundo mais amplo, seja por estudos nas cidades, acompanhando pais e avós ao retirar sua aposentadoria e mesmo saídas à procura de aventuras joga os jovens nos braços do acoolismo e da droga. Hoje em dia, lamentavelmente, não há mais aldeia que não tenha algum jovem contaminado por esses vícios. Estes somam-se à situação comum de que os jovens rompem as barreiras da própria cultura e procuram experiências no mundo mais amplo. Os anciãos estão perplexos e não sabem o que fazer diante dessa situação tremenda, a qual, numa visão mais ampla, se apresenta temporária entre os Xavante. Realmente, depois de alguns poucos anos de aventuras, voltam à sua sociedade e assumem suas responsabilidades sociais, onde apresentam seu passado como exemplar, pois ao assumirem a responsabilidade de padrinhos, "apagam" seu passado censurável.

Este foi um encontro significativo, pois, além das ricas contribuições, trouxe representantes das diversas aldeias, que há pouco estiveram separadas completamente por questões políticas, que levaram à divisão de várias aldeias.


9. Notícias Breves

O CDI está fazendo o levantamento de material didático, litúrgico e catequético para as comunidades Xavante e Bororo para o ano de 2006. Os responsáveis e interessados queiram enviar seus pedidos!

No dia 31 de outubro passado, o Pe. Pascual Chávez Villanueva, Reitor-Mor dos Salesianos de Dom Bosco, recebeu o título "Doctor Honoris Causa" em Ciências da Educação, pela Universidade Católica Dom Bosco, Campo Grande MS. A solenidade foi presidida pela Chanceler da Universidade, Pe. Afonso de Castro, juntamente com o Reitor da UCDB, Pe. José Marinoni, o Pró-reitor Acadêmico, Pe. Jair Marques de Araújo, o Conselho Universitário e o Reitor do Centro Universitário Católico Auxilium de Lins, Pe. Paulo Fernando Vendrami. Entre os presentes ao ato estiveram ainda o Arcebispo de Campo Grande, Dom Vitório Pavanello, seu bispo-auxiliar Dom Eduardo Pinheiro da Silva, o Bispo Diocesano de Corumbá, Dom Segismundo Martinez Alvarez, os diretores de todas as comunidades da MSMT, autoridades civis e muitas amigos da MSMT. O discurso do Reitor-Mor, pronunciado depois de receber o título, será publicado num periódico da UCDB.

Convidamos missionários e missionárias, atuais e futuros, como formandos com disponibilidade, para o "Estudo da Língua e Cultura Xavante, a realizar-se em Sangradouro, de 26 a 30 de dezembro de 2005. As noções básicas serão apresentadas por meio de Data-Show, para maior facilidade de assimilação. Um "Curso de Língua Xavante" acompanhado de fitas cassete está à disposição, como ainda várias publicações sobre aspectos da cultura Xavante.

O acadêmico Tomé Tsi'eiwa'adi Wadzatsé, professor na Escola Don Filippo Rinaldi de São Marcos, recebeu, como primeiro de onze Xavante e três Bororo, o Diploma em Pedaogia, pela Universidade Católica Dom Bosco. A solene entrega do Diploma foi realizada no final da Missa Dominical em São Marcos. O cacique Raimundo Urébété Ai'réro fez um discurso solene, sublinhando a importância do estudo para servir melhor à comunidade indígena e não como pretexto para deixar a aldeia e ir à cidade para ganhar dinheiro, onde o alcoolismo e a droga ameaçam os jovens Xavante.

O Grupo de Pastoral da UNISALESIANO de Lins programou sua visita anual às Missões de Mato Grosso de 10 a 15 de novembro. Sob a direção e ativa participação do Pe. Paulo Fernando Vendrami, Reitor, o grupo de 17 pessoas programou minuciosamente e executou o plano. Eles visitaram Barra do Garças, Sangradouro, Merúri e São Marcos. Eles chegaram em São Marcos na hora da missa de domingo, presidida pelo Pe. Aquilino Tsere'ubu'õ Tsi'rui'a. Causou surpresa uma missa toda em língua indígena com vigorosos cantos indígenas.

Com o apoio de um projeto do DKMR, foram adquiridos os equipamentos necessários para arquivar fotos e documentos do CDI em CD. O primeiro trabalho contemplou 2.800 fotos dos arquivos do Pe. Giaccaria, além de outros 1.000 fotos missionárias de diversas origens. De 09 a 14 de novembro, o Pe. Giaccaria forneceu à secretária do CDI, Mariza, descrição de cada uma das fotos. Assim o arquivamento ganha qualidade.


10. Videos Missionários

Os seguintes Videos de temas missionários podem ser encontrados nas Locadoras.

A Missão, Robert de Niro e Jeremy Irons, 2 horas

Hábito Negro. 1:35 horas

Romero - uma história verdadeira. John Duigan. 1:05 horas

Brincando nos Campos do Senhor. Hector Babenco. 3 horas.

A Floresta de Esmeraldas. John Boorman. 1:53 horas

O Curandeiro da Selva. Cinergi. 1:40 horas

Avaeté - semente de vingança. Zelito Viana. 1:10 horas

Gerônimo. Joseph Runningfox. 1:20 horas


11. Agenda

14-16/09 - Reunião de Missionários/as entre Bororo e Xavante, São Marcos

24/10 - Encontro de Catequistas Xavante, Sangradouro

12-15/11 - Curso de Agentes de Pastoral Xavante, São Marcos

01-05/12 - Seminário Nacional de Teologia Índia, Luziânia GO

26-30/12 - Estudo de Língua e Cultura Xavante, Sangradouro


12. Publicações Diversas

Folders:

Índios, Xavante 1, Xavante 2, Xavante 3, Xavante 4, Bororo 1, Bororo 2, Nambiquara. - Aldeias Xavante 2004, Aldeias Kaiowá e Guarani, Aldeias Terena-Kinikinaua-Aticum-Guató-Kamba-Kadiwéu-Ofayè Xavante.

Livros recentes do CDI:

VV.AA. (Coord.) Romhurinhihötö Nhoré Waihu'uprãdzé - Cartilha de Leitura I. 2ª ed. Campo Grande, MSMT, 2004, 47 p.; MSMT-UCDB, 2004, 47 p.

VV.AA. (Coord.) Rowatsu'u Nhorédzé-Cartilha de Leitura II. 2ª ed. Campo Grande, MSMT, 12004, 106 p.; 2ª ed. MSMT-UCDB, 2004, 106 p.

LACHNITT, Georg. O Símbolo "Água" na Iniciação Cristã. Ed. prov. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2004, 126 p.

LACHNITT, Georg. Estudando o Símbolo. Ed. prov. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2004, 151 p.

LACHNITT, Georg. Ritos de Passagem do Povo Xavante - um estudo sistemático. Ed. prov. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2004, 155 p.

LACHNITT, Georg. Cultura - Religião - Mito. Ed. Prov. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2005, 122 p.

LACHNITT, Georg. Curso de Língua Xavante. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2005, 172 p.

LACHNITT, Georg (Coord.). Romhurinhihötö Waihu'u Na'ratadzé - Cartilha de Alfabetização (Comentários em Xavante). (livro do prof.), Campo Grande, MSMT - UCDB, 2005, 3ª ed. exp. modificada.

LACHNITT, Georg. Noções de Símbolo. Campo Grande, MSMT-UCDB, 2005, 46 p.

TRINDADE, Rosa Adélia Garcia Neto. Ai'uté ma Rowatsu'u (Literatura Infantil Xavante). Campo Grande, MSMT - UCDB, 2ª ed. 2005.

OBS: Eventuais pedidos sejam dirigidos ao CDI, com o endereço acima.

1SCHLESINGER, Hugo e PORTO, Humberto. Dicionário enciclopédico das religiões. p. 2491.

2Encontro de Teologia Mayense

3M.&C., abrev. de MONTES, Manuel Arias e CARRASCO, Bartolomé. Y la palabra de Dios se hizo Indio - Teologia y práctica de una catequesis inculturada e liberadora - Una Propuesta desde Oaxaca-México. (Tesis de doctorado en Tübingen). Quito, Ed. Abya-Yala, 1996. 308 p.

4RUFFALDI, Pe. Nello e SPIRES, Ir. Rebeca (org.). A terra sem males em construção - IV Encontro Continental de Teologia Índia. p. 25.