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  1. CARTA DO REITOR-MOR

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"Isto é o meu corpo entregue por vós.

Fazei isto em minha memória" (1Cor 11,24)

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1.1 FAZER A EUCARISTIA PARA FAZER-SE EUCARISTIA

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1. 'FAZER A EUCARISTIA HOJE'. 1.1 A Eucaristia na caminhada recente da Igreja. 1.2 A Eucaristia na caminhada atual da Congregação. 1.3 A Eucaristia na vida dos irmãos. 2. RECORDANDO A EXPERIÊNCIA DOS DISCÍPULOS. 2.1 A primeira defecção dos discípulos (Jo 6,66-78). 2.2 O abandono consumado pelos Doze (Mc 14,17-31). 2.2.1 Seguir Jesus não nos garante que não iremos traí-lo. 2.2.2 Prometer muito a Jesus não nos livra de renegá-lo. 2.2.3 A aliança, traída tão logo instituída, deve, contudo, ser recordada. 2.3 O gesto na hora de Jesus: amar ao extremo (Jo 13,1-20). 3. 'FAZER-SE EUCARISTIA' HOJE. 3.1 A vida consagrada, "vida eucarística". 3.1.1 A vida consagrada, "memorial" mediante a obediência. 3.1.2 A vida consagrada, "sacrifício" mediante a castidade. 3.1.3 A vida consagrada, "ágape" mediante a pobreza. 3.2 O salesiano, homem da Eucaristia. 3.2.1 Da celebração à conformação. 3.2.2 Da conformação à adoração. 3.2.3 Da adoração à missão. Conclusão.



Roma, 7 de junho de 2007

Solenidade do Corpo e do Sangue do Senhor





Caríssimos irmãos,



cumprimento-vos com grande afeto, ao retornar de Aparecida, Brasil, sede da V Conferência do Episcopado Latino-americano e do Caribe, que contou com a participação de 13 bispos salesianos e duas FMA, além da do Reitor-Mor. Foi uma extraordinária experiência eclesial da qual falarei em outro momento. Basta-me, agora, exprimir os votos de que esta grande assembléia possa dar esperança e vida aos povos daquele continente, através de uma Igreja - e nós SDB nela - que se torne discípula enamorada e fiel do Cristo e missionária convicta e corajosa. Hoje, prefiro falar-vos de um tema que tenho muito a peito e sobre o qual venho refletindo desde o ano passado, a Eucaristia.

Estou plenamente consciente de que alguém dentre vós poderia pensar redundante, senão supérflua, uma nova carta sobre a Eucaristia. Não tereis esquecido, seguramente, a que o P. Vecchi escreveu sobre o tema no Ano Jubilar de 2000 "para redescobrir o mistério eucarístico e o seu significado em nossa vida e em nossa pastoral".1 Confidencio-lhes, porém, que já há algum tempo sentia a urgência de retomar o argumento e de vos tornar presentes as minhas preocupações. Os motivos são realmente prementes.



1. 'FAZER A EUCARISTIA' HOJE



Empenhados como estamos no "retorno a Dom Bosco", na recuperação criativa de suas opções carismáticas geniais, de suas intuições pedagógicas acertadas, como eu gostaria que se vivesse na Congregação - sempre melhor, sempre mais - da Eucaristia, celebrada com regularidade e reconhecimento, contemplada na adoração pessoal e comunitária! Como anunciar melhor a morte do Senhor até que Ele venha, senão comendo desse pão e bebendo desse cálice, e sendo nós mesmos "pão partido" para os irmãos e para os jovens e "libação", para que eles tenham vida em abundância? (cf. 1Cor 11,26). Como levar os nossos jovens a conhecerem com mais eficácia o Deus que nos amou por primeiro (cf. 1Jo 4,8-9.19) e sem limites (cf. Jo 13,1)?



1.1 A Eucaristia na caminhada recente da Igreja



Fonte e cume da vida e da missão da Igreja,2 o dom da Eucaristia, "sempre religiosamente conservado como preciosíssimo tesouro",3 acompanhou e estimulou a caminhada de renovação percorrida pela Igreja desde o Vaticano II até aos nossos dias. Dificilmente poderia ter sido de outra forma: "a celebração eucarística está no centro do processo de crescimento da Igreja";4 na verdade "a Igreja vive da Eucaristia. Esta verdade não exprime apenas uma experiência cotidiana de fé, mas encerra sinteticamente o núcleo do mistério da Igreja".5

O Concílio ainda não tinha sido concluído e Paulo VI já publicara a carta encíclica Mysterium Fidei (3 de setembro de 1965) sobre a doutrina e o culto da Santíssima Eucaristia: "os Padres do Concílio" - escrevia o Papa - "tiveram sobretudo a peito exortar os féis a participarem ativamente, com fé íntegra e com a maior piedade, na celebração deste sacrossanto Mistério".6

Foi, porém, no longo magistério de João Paulo II que se registrou "uma extraordinária concentração no sacramento da Eucaristia".7 Nos primeiros anos de seu magistério ele escreveu a carta apostólica Dominicae Cenae (24 de fevereiro de 1980), em que realçava "alguns aspectos do mistério eucarístico e da sua incidência na vida de quem é o seu ministro".8 Mais tarde, "para sublinhar a presença viva e salvífica na Igreja e no mundo" João Paulo II quis que, por ocasião do grande Jubileu, se realizasse em Roma um Congresso Eucarístico Internacional; "o Dois mil - esperava - será um ano intensamente eucarístico".9 Três anos depois, em 2003, na Encíclica Ecclesia de Eucharistia (17 de abril de 2003) fez questão de recordar-nos que "o olhar da Igreja está continuamente dirigido ao seu Senhor, presente no Sacramento do Altar, no qual ela descobre a plena manifestação do seu imenso amor".10 No ano seguinte, com a Carta apostólica Mane nobiscum Domine (7 de outubro de 2004), João Paulo II proclamou um ano inteiro no qual desejou a Igreja "particularmente empenhada em viver o mistério da Santa Eucaristia... na caminhada dos nossos questionamentos e das nossas inquietações, às vezes das nossas ardentes desilusões".11 O Congresso Eucarístico Internacional, realizado em Guadalajara (México) de 10 a 17 de outubro de 2004; a Assembléia Ordinária do Sínodo dos Bispos sobre o tema: "A Eucaristia fonte e cume da vida e da missão da Igreja", realizado no Vaticano de 2 a 23 de outubro de 2005; e a Jornada Mundial da Juventude, celebrada em Colônia, Alemanha, de 16 a 21 de agosto de 2005, para fazer da Eucaristia "o centro vital" ao redor do qual os jovens deviam recolher-se "para alimentar sua fé e seu entusiasmo",12 foram os eventos que marcaram esse Ano da Eucaristia, com o qual culminava uma caminhada específica "no sulco do Concílio e do Jubileu".13

Duas dessas iniciativas, "desenvolvimento natural da direção pastoral" que João Paulo II quis imprimir à Igreja no início do Terceiro Milênio14, foram assumidas de bom grado e levadas a termo por Bento XVI.

Durante a vigília de 20 de agosto de 2005, na esplanada de Marienfeld, o Papa voltava a conclamar os jovens à adoração do mistério, antes de convidá-los na celebração eucarística do dia seguinte a participar do mistério e identificar-se em Cristo: "pão e vinho - disse o Papa - tornam-se seu Corpo e Sangue. A esta altura, porém, a transformação não se deve deter, antes é aqui que deve começar plenamente. O Corpo e o Sangue de Cristo são-nos dados para que nós mesmos sejamos transformados por nossa vez. Nós mesmos devemos nos tornar o Corpo de Cristo, consangüíneos dele... A adoração [...] torna-se união. Deus não está mais apenas diante de nós, como o Totalmente Outro. Está dentro de nós, e nós estamos nele".15

Bento XVI, que presidira pessoalmente os momentos relevantes da Assembléia sinodal, publicou depois a Exortação Apostólica pós-sinodal Sacramentum caritatis (22 de fevereiro de 2007), para "retomar a multiforme riqueza de reflexões e propostas [...], com a intenção de explicitar algumas linhas fundamentais de empenho tendentes a despertar na Igreja novo impulso e fervor eucarístico".16 Além de aceitar e citar expressamente tantas intervenções valiosas dos Padres sinodais, o Papa quis "colocar esta Exortação na linha da sua [minha] primeira Carta Encíclica — a Deus caritas est —, na qual várias vezes falou [falei] do sacramento da Eucaristia pondo em evidência a sua relação com o amor cristão, tanto para com Deus como para com o próximo: «O Deus encarnado atrai-nos todos a si. Assim se compreende por que motivo o termo ágape se tenha tornado também um nome da Eucaristia; nesta, a ágape de Deus vem corporalmente a nós, para continuar a sua ação em nós e através de nós»".17

A caminhada da Igreja, nestes últimos anos, particularmente a partir do ano Jubilar, "foi, sem dúvida, caracterizado em sentido fortemente eucarístico".18 Não poderia ser de outro modo: "a Eucaristia é Cristo que se entrega a nós edificando-nos continuamente como seu corpo... A Eucaristia é, portanto, constitutiva do ser e do agir da Igreja";19 se é verdade que "a Igreja vive do Cristo eucarístico, por Ele é nutrida, por Ele é iluminada",20 é igualmente verdade que "graças à Eucaristia a Igreja sempre renasce de novo!".21 A Igreja não pode permanecer fiel às suas origens, nem pode crescer sem a celebração da Eucaristia: "quanto mais viva for a fé eucarística no Povo de Deus, tanto mais profunda será a sua participação na vida eclesial". Mais, "toda grande reforma está, de algum modo, ligada à redescoberta da fé na presença eucarística do Senhor em meio ao seu povo".22



1.2 A Eucaristia na caminhada atual da Congregação



"Também para nós", escrevia-nos há alguns anos o P. Vecchi, "a renovação pessoal e comunitária, espiritual e apostólica [...] compreende a redescoberta convicta e alegre das riquezas que a Eucaristia nos oferece e das responsabilidades a que nos chama".23 Faço minhas as suas palavras e vo-las proponho de novo como tarefa inderrogável para assumir e realizar o programa espiritual e apostólico de Dom Bosco que, assim espero, nos garantirá "reencontrar a origem do nosso carisma, a finalidade da nossa missão e o futuro da nossa Congregação".24

Na verdade, eu vos confiava na carta de convocação do próximo Capítulo Geral que "amadureci há algum tempo a convicção de que hoje a Congregação precisa despertar o coração de cada irmão com a paixão do "Da mihi animas". Ela poderá ter então a inspiração, a motivação e a energia para responder às expectativas de Deus e às necessidades dos jovens".25 Nossos corações haverão de despertar somente se conseguirmos realmente sentir a paixão de Deus pelos seus, ou melhor, a senti-la com Ele. E não há caminho mais rápido e eficaz do que a celebração eucarística; pois "a Eucaristia é fonte e ápice não só da vida da Igreja, mas também da sua missão... Não podemos abeirar-nos da mesa eucarística sem nos deixarmos arrastar pelo movimento da missão que, partindo do próprio Coração de Deus, visa atingir todos os homens; assim, a tensão missionária é parte constitutiva da forma eucarística da existência cristã".26

Sem vida eucarística não há, portanto, vida apostólica. Dom Bosco, "homem eucarístico",27 é, para nós, paradigma exemplar, a prova decisiva: "ele prometeu a Deus que até seu último suspiro seria pelos jovens. E foi verdadeiramente assim. A participação sacramental no sacrifício de Cristo leva a nos identificarmos em seus sentimentos apostólicos e em sua dedicação generosa pelas exigências do Reino". Assim escrevia o P. Vecchi, e acrescentava: "o elemento mais revelador, porém, de até que ponto o mistério eucarístico marca a vida de Dom Bosco [...] é a relação com a caridade pastoral que ele expressou no lema Da mihi animas, cetera tolle. Essas palavras [...] constituem o propósito e o caminho de Dom Bosco para configurar-se a Cristo, que oferece ao Pai a própria vida pela salvação dos homens".28 Como ele, o salesiano haure da Eucaristia "conforto e impulso para ser, também em nosso tempo, sinal do amor gratuito e fecundo que Deus tem pela humanidade".29 "Mantende, portanto, os olhos sempre fixos em Dom Bosco - encorajava-nos o saudoso João Paulo II -. Ele vivia inteiramente em Deus e recomendava a unidade das comunidades ao redor da Eucaristia".30

Se tornar-se missionários dos jovens, apaixonados pela salvação deles, leva-nos a viver eucaristicamente, o fato de sermos consagrados a Deus, apaixonados por Ele, obriga-nos a sermos homens da Eucaristia por "coerência eucarística, à qual a nossa existência é objetivamente chamada".31 É fácil de entender: “memória viva do modo de existir e de agir de Jesus como Verbo encarnado diante do Pai e diante dos irmãos”,32 os consagrados vivem para fazer memória sacramental, eficaz, portanto, do sacrifício de Cristo ou, melhor ainda, para ser memória do Cristo que se sacrifica e continua a entregar-se por nós e pelos outros através de nós. A eficácia sacramental da memória eucarística não se limita a recordar a entrega pro vobis de Jesus, mas tende também, e aqui se joga a sua eficácia real, à entrega da própria vida por parte daqueles que fazem memória dele. Como todos os batizados, mas de maneira mais apropriada e exigente, os religiosos, "participando do sacrifício eucarístico, fonte e ápice da vida cristã, oferecem a Deus a Vítima divina e a si mesmo com ela";33 e é através dessa oferta de si que se tornam memória viva de Cristo: a entrega de sua vida repete, e por isso mesmo, 'recorda' o sacrifício de Cristo. Os consagrados vivem eucaristicamente não tanto se celebram freqüentemente a Eucaristia, mas porque gastam a vida pelos outros.

Nós salesianos, enquanto consagrados que escolheram Cristo como único sentido da própria existência, não podemos deixar de desejar instaurar com Ele uma mais plena comunhão existencial, que se atualiza no dom da própria vida. A Eucaristia, celebrada no sacramento quando recebemos o dom do Corpo entregue de Jesus e, sobretudo, celebrada com a vida sempre que nos entregamos de corpo e alma aos outros, "é viático cotidiano e fonte da espiritualidade do indivíduo e do Instituto. Nela, todo consagrado é chamado a viver o mistério pascal de Cristo, unindo-se com Ele na oferta da própria vida ao Pai através do Espírito".34

Caros irmãos, não consigo pensar em nós como salesianos consagrados se não conseguirmos encontrar "na celebração eucarística e na adoração, a força para o seguimento radical de Cristo obediente, pobre e casto".35 Como poderíamos responder à nossa vocação pessoal e comunitária, se não vivermos da e pela Eucaristia?



1.3 A Eucaristia na vida dos irmãos



Tenho a impressão, vo-lo confesso um tanto preocupado, que nem todos dentre nós conseguimos fazer a caminhada que a Igreja e a Congregação esperavam de nós. Do estudo dos relatórios das visitas extraordinárias às Inspetorias, como também em minhas visitas de animação, cheguei a compreender que há na Congregação, certo déficit de vida eucarística, situação anômala, embora não nova; o P. Vecchi, de fato, já a identificara e descrevera com exatidão;36 por exemplo, olhando tão somente para a qualidade de nossas celebrações comunitárias, ele acenava «à confusão, às exaltações da espontaneidade, à pressa, à subestima da gestualidade e da linguagem simbólica, à 'secularização' do domingo»".37

Sendo correta a minha percepção, haveria motivo fundado de preocupação. Certamente este estado não é exclusivo nosso; atinge toda a comunidade cristã; manifestava-o com "profunda dor", João Paulo II que escreveu a Encíclica Ecclesia de Eucharistia justamente para "contribuir eficazmente para dissipar as sombras de doutrinas e práticas não aceitáveis, para que a Eucaristia continue a resplandecer em todo o fulgor do seu mistério".38 Em nosso caso, porém, uma malograda ou insuficiente vida eucarística atingiria em cheio um elemento basilar do carisma e da pedagogia salesiana; chamados como somos "todos e em qualquer ocasião, a ser educadores da fé [...] caminhamos com os jovens para conduzi-los à pessoa do Senhor ressuscitado" (Const. 34).

E bem sabemos que para Dom Bosco "o fascínio e o desejo da Eucaristia são [...] o lugar onde é possível descobrir o enraizamento da fé e da caridade, o gosto pelas coisas celestes e, conseqüentemente, o grau de perfeição cristã". Jesus, sobretudo Jesus eucarístico, "domina a vida espiritual de Dom Bosco e do ambiente que tem nele o centro [...]. É este o Jesus com quem o próprio Dom Bosco conversa na visita cotidiana, feita à tarde na igreja, o Jesus diante do qual coloca seus jovens em oração enquanto vai à cidade mendigar por eles. Tratando com Ele nos últimos anos da velhice, nos quais já não consegue controlar-se plenamente, Dom Bosco trai o próprio afeto e suas Missas são banhadas de lágrimas".39

Como educador, Dom Bosco elevou a "princípio de pedagogia"40 aquela que era sua convicção e experiência pessoal: "a confissão freqüente, a comunhão freqüente, a missa cotidiana são as colunas que devem reger o edifício educativo, do qual se quer manter distante a ameaça e o chicote". Com percepção educativa, acrescentava: "jamais obrigar os jovenzinhos a freqüentar os santos Sacramentos, mas simplesmente encorajá-los e oferecer-lhes a oportunidade de se servirem deles".41 Estes princípios de pedagogia eucarística foram aplicados 'literalmente' em Valdocco, e "como orientação geral" envolveram todo o sistema educativo.42

O déficit de vida eucarística que, segundo meu modo de ver, pode esconder-se e crescer por trás de uma vida comunitária regular e de uma práxis apostólica às vezes frenética, manifesta-se basicamente, em primeiro lugar, com a incapacidade de fazer da celebração da Eucaristia "o ato central cotidiano de toda a comunidade salesiana, vivido como festa" (Const. 88). E, em segundo lugar, a ausência daquela "surpresa pelo mistério de Deus",43 que nasce na contemplação assídua do seu amor sem limites revelado no Cristo eucarístico, cuja presença "em nossas casas é para nós, filhos de Dom Bosco, motivo de freqüentes encontros" (Const. 88). O mistério eucarístico, porém, "não permite reduções nem instrumentalizações; deve ser vivido em sua integridade, tanto no evento celebrativo, quanto no colóquio íntimo com Jesus logo que recebido na comunhão, como também no momento orante da adoração eucarística fora da Missa. A Igreja, então, é edificada solidamente".44

Determinar os sintomas do mal-estar ainda não é diagnosticar a sua verdadeira causa. Estou pessoalmente convencido de que as falhas que surgem em nossa práxis eucarística são inerentes, em certo sentido, à mesma essência do sacramento eucarístico, mas crescem na intimidade do nosso coração, e ali permanecem. "A possibilidade que a Igreja tem de 'fazer' a Eucaristia está radicada totalmente na doação que Jesus lhe fez de si mesmo [...]. Deste modo, também nós confessamos, em cada celebração, o primado do dom de Cristo [...]. Ele é, por toda a eternidade, Aquele que nos ama primeiro".45 Esta "precedência, não só cronológica, mas também ontológica", do amor de Deus nos embaraça. A Eucaristia é mistério porque nela nos é revelado tanto amor (cf. Jo 15,13), um amor tão divino que, ultrapassando as nossas capacidades, nos consterna e nos deixa aturdidos. Embora nem sempre estejamos conscientes disso, temos normalmente dificuldade para receber o dom da Eucaristia, o amor de Deus que se tornou manifesto na entrega do corpo de Cristo (cf. Jo 3,16) que excede a nossa capacidade e desafia a nossa liberdade; Deus é sempre maior do que o nosso coração e chega lá onde não podem chegar os nossos desejos melhores.

Alguns, precisamente por entenderem como não possível, não racional, desmesurada essa vontade de entregar-se de Deus, acumulam desculpas para não recebê-lo na celebração sacramental e evitam contemplá-lo no silêncio que adora. Um amor tão extremo assusta-nos, revela a pobreza radical do nosso ser; e a necessidade profunda de amar não nos deixa tempo, nem energias, para nos deixarmos amar. Preferimos, então, ficar azafamados, refugiar-nos no fazer tanto pelos outros e dar-lhes tanto de nós,46 privando-nos da surpresa de sermos tão amados por Deus. Perceber isso obrigaria a nos sentirmos, e nos querermos, em débito para sempre com Deus, de cujo amor adorado na contemplação e recebido na comunhão eucarística, jamais estaremos livres.



2. RECORDANDO A EXPERIÊNCIA DOS DISCÍPULOS



Não nos admiremos. Esta incapacidade não é nova; antes, é conatural a quem segue Jesus de perto. Quem a sente - não quem a consente! - confirma-se como verdadeiro discípulo, pois a adverte só quem recebe Cristo, em corpo e sangue, como dom inesperado, gratuito e incompreensível. Quem nos disse que aceitar a Cristo, pão da vida, é coisa pacífica, que podemos dar por certa, que não exige preparação, que não leva a conseqüências? Ninguém em absoluto! Não é esse o testemunho do Novo Testamento.



2.1 A primeira defecção dos discípulos (Jo 6,66-71)47



No-lo recorda o quarto evangelho. Quando Jesus identificou-se, na sinagoga de Cafarnaum, como pão do céu e ofereceu a sua carne como verdadeiro alimento e o seu sangue como verdadeira bebida (cf. Jo 6,55.59), "muitos discípulos", pela primeira vez, manifestaram publicamente a própria incapacidade de "digerir estas palavras" (Jo 6,60).

Não nos esqueçamos que no evangelho de João os discípulos começaram a seguir um Jesus que passava, advertidos pelo Batista e curiosos sobre o lugar de sua morada (Jo 1,35-38); não foram chamados pessoalmente por Jesus (cf. Mc 1,16-20), eles é que desejaram estar com Ele (Jo 1,39). Só começaram a crer nele quando, tendo faltado vinho durante um casamento em Caná da Galiléia, Jesus interveio para providenciá-lo com abundância para os convidados (Jo 2,1-11). Aquela fé, contudo, nascida num banquete, fenece quando foi anunciada outra nova e estupenda refeição, na qual Jesus não seria mais dono de casa ou comensal, mas alimento e bebida à mesa. Jesus revela-se não tanto como alguém que dá de comer, mas como alguém que se entrega como alimento (Jo 6,55-56).

Jesus faz esta surpreendente promessa depois de ter saciado a fome de uma multidão imensa, "aproximadamente cinco mil homens" (Jo 6,10), apresentando-se no dia seguinte como "o pão da vida" (Jo 6, 35), justamente porque, se comido, fará viver para sempre (Jo 6,58). Acrescenta-se à incredulidade do povo o escândalo dos discípulos e a deserção de muitos.48 Pela primeira vez, não última infelizmente, Jesus pão do céu, provocou dissenso entre os seus e o abandono de muitos: a fidelidade dos seguidores foi posta à prova quando Jesus lhes anunciou a entrega do seu corpo como verdadeiro alimento e do seu sangue como verdadeira bebida. Os discípulos, que viram Jesus multiplicar o pão (Jo 6,9.13) e caminhar sobre o mar (Jo 6,19), não podiam entender que a vida eterna fosse alcançada alimentando-se da sua carne. Então, enquanto Jesus anuncia a entrega de si mesmo, os discípulos murmuram (Jo 6,19) e a maioria volta atrás (Jo 6,66).

Casual? Não, em absoluto! Este discurso (Jo 6,60a), a oferta de si, foi - e continua a ser - verdadeiro obstáculo, pedra de escândalo para os mais íntimos. Será sempre mais fácil ao discípulo seguir a Jesus do que se alimentar dele; será mais digerível acompanhá-lo do que tê-lo como alimento. Não bastou ao discípulo de então, e jamais bastará, seguir o Mestre; ele deverá alimentar-se da sua palavra e do seu corpo. Que Jesus ofereça o seu corpo como verdadeiro alimento é árduo, inadmissível (Jo 6,51-58), a ponto de pôr à prova a nossa capacidade de escuta.

O evangelista afirma que, desde o início, Jesus conhecia a incapacidade à fé de muitos de seus discípulos (Jo 6,60.66). A desilusão pessoal do discípulo, consumada por muitos, primeiramente no abandono e depois na traição, é explicada teologicamente por Jesus. O enigma da infidelidade do discípulo recebe assim uma resposta paradoxal: não crê quem o quer, mas aquele a quem é concedido crer; a fé e a fidelidade são decorrência da graça de Deus (Jo 6,64-65). Mais escandaloso ainda: não basta a simples permanência com Jesus, a convivência com ele; na verdade, o evangelista recorda-nos que, entre os que ficaram com Jesus, estava também o traidor. E Jesus o sabia (Jo 6,64; cf. 13,27): aquele que não lhe é entregue pelo Pai (Jo 6,65), vai entregá-lo (Jo 6,70-71). A eleição pessoal da parte de Jesus ainda não constitui uma salvaguarda contra a defecção.

Entretanto, onde se consumou o abandono, lá pode solidificar-se a fidelidade. Os discípulos serão incapazes de compreender e permanecer fiéis, continuando apegados às próprias evidências, às aparências superficiais; haverão de crer, porém, aqueles aos quais "foi concedido pelo Pai" (Jo 6,65): aqueles que não forem levados a ele por Deus não poderão sentir-se atraídos por Jesus nem ser seus comensais. Acolher Cristo como pão entregue é dom do Pai; e somente o crente que souber ser dom de Deus a Cristo poderá comer do corpo de Cristo e beber do seu sangue sem pôr em risco a própria vida.

A graça da fidelidade foi concedida a alguns poucos, aos doze49 que permanecem. O seu porta-voz, Simão Pedro, reconhece que não sabem para onde ir; ficam porque - eis o motivo autêntico da fé - só Jesus tem palavras de vida, só Ele promete vida sem fim (Jo 6,68). "Nós cremos e reconhecemos" (Jo 6,69), diz em nome de todos; porque conhecer Jesus é simultâneo ao crer nele: ele torna-se conhecido ao se crer nele, ao se confiar nele; e só quem confia, permanece fiel. A fidelidade não floresce na boa vontade pessoal, nem nos melhores desejos; nasce da vontade de Deus, que nos amou sempre, por primeiro. A fidelidade torna-se possível apenas quando recebida como graça.



2.2. O abandono consumado pelos Doze (Mc 14,17-31)50



Fidelidade prometida ainda não é fidelidade comprovada. Os Doze, em Cafarnaum, optaram por ficar com Jesus; mas, embora advertidos durante a última ceia, no Getsêmani "abandonando-o, todos os discípulos fugiram" (Mc 14,50). Tinham-se compromissado em permanecer com quem se lhes oferecera como pão de vida; mas quando Jesus tornou realidade a sua promessa (Mc 14,22-25), teve que prenunciar a traição de um deles (Mc 14,17-21), a negação de outro (Mc 14,29-30) e o escândalo e fuga de todos os demais (Mc 14,26-27).

É realmente trágico, e nisto os quatro evangelhos são concordes, que a infidelidade dos discípulos, o seu anúncio (Mc 14,17-21; Mt 26,20-25; Lc 22,14.21-23; Jo 13,21-30) e a sua realização (Mc 14,26-42; Mt 26,30-46; Lc 22,33-34.40-46; Jo 13,37-38), tenham como contexto um ágape com Jesus, a última ceia (Mc 14,22-25; Mt 26,26-29; Lc 22,15-20), em que Jesus colocou em ação a sua promessa de entregar-se como pão e vinho (Mc 14,22.24). O anúncio da traição nesse contexto, além de unir morte de Jesus e Eucaristia, dom da vida e do pão de vida, faz com que a entrega de si na cruz seja o último, e o mais difícil, dos escândalos que os discípulos deverão enfrentar. Durante a última ceia, a primeira Eucaristia, a treva ainda estava no coração dos discípulos: só a hora da cruz dissipará a noite (Jo 13,1.27).



2.2.1 Seguir Jesus não nos garante que não iremos traí-lo



Marcos, o primeiro cronista da paixão e morte de Jesus, descreve a traição de Judas em três cenas escandidas ao longo da narração do último dia de Jesus, antes de sua morte (Mc 14,1-72). Com neutralidade surpreendente, o narrador mostra a vontade decidida de Judas de entregar Jesus às autoridades e o empenho resoluto de Jesus de entregar-se a si mesmo. O plano é concebido por "Judas Iscariotes, um dos Doze", que se oferece aos sumos sacerdotes "para lhes entregar Jesus… e procurava uma oportunidade para entregá-lo" (Mc 14,10). Jesus, "enquanto estavam à mesa comendo" (Mc 14,18), antes ainda de instituir a Eucaristia (Mc 14,22-25), revela a próxima traição e o traidor. Mais tarde, no Getsêmani, em plena noite, Judas apresentar-se-á "acompanhado de uma multidão com espadas e paus" e paradoxalmente trairá Jesus com um beijo, como se fosse seu amigo (Mc 14,43-49).

O compromisso assumido de trair Jesus não faz com que Judas renuncie a tomar lugar à mesa com Jesus; nem o fato de ser comensal com ele (Mc 14,18) e ter molhado a mão no único prato (Mt 14,20) faz com que desista de seu propósito (Mc 14,45-46). Admira, por isso, que enquanto Judas se prepara para entregar Jesus, Jesus entrega-se a si mesmo aos seus no pão partido e no vinho derramado. Se a presença à primeira celebração da ceia eucarística não salvou Judas da perfídia de trair o seu Mestre, a presença do traidor não impediu a Jesus de entregar-se por todos. Isso quer dizer que, hoje como ontem, pode-se participar da Eucaristia e, ao mesmo tempo, alimentar no coração deslealdade e má fé. Também Judas deixara tudo, um dia, para ficar com Jesus (cf. Mc 3,13); mas, depois, acabou por deixá-lo, por dinheiro, nas mãos dos inimigos (Mc 14,11).

Entretanto, pior ainda que a traição de um, talvez seja a insegurança de todos: os outros discípulos, superada a surpresa inicial, ficam tão incertos em relação à própria fidelidade que, um após outro, perguntam a Jesus se não fosse ele o traidor anunciado: "Acaso, serei eu?" (Mc 14,19). Na última ceia todos recebem o pão que é o seu corpo e o vinho que é o sangue da nova aliança (Mc 14,22-23); um deles, porém, continua a pensar em trair Jesus e os outros não estão seguros de permanecer-lhe fiéis.

A passagem do evangelho de Marcos é realmente perturbadora, não só porque descreve o que aconteceu entre Jesus e seus amigos, mas, sobretudo porque continua atual ainda hoje. Ter sido eleito pessoalmente como companheiro de Jesus (Mc 3,13), ser comensal à mesa onde Jesus serve um pão que é o seu corpo, não é garantia de fidelidade. Os Doze, aqueles que ficaram com Jesus porque tinha palavras de vida (Jo 6,68), caíram todos naquela noite da última ceia. Perguntemos-nos: como será possível que estar com ele não seja suficiente para permanecer com ele? Como será possível que comer com ele não baste para permanecer fiel?



2.2.2 Prometer muito a Jesus não nos livra de renegá-lo



Não basta nem mesmo a prometida expressão de amor entusiasmado, autêntico sim, mas imaturo. Na verdade, logo depois de ter acabado de comer, já instituída a Eucaristia, no caminho para o monte das Oliveiras, Jesus anunciou que Pedro o renegaria por bem três vezes (Mc 14,26-31); Pedro, porém, negava-o com insistência, e "o mesmo diziam também todos os outros" (Mc 14,31). Por um lado Jesus quis preveni-los, mas por outro eles se obstinam em declarar a própria disponibilidade, até mesmo a morrer com o Mestre. O mais dramático é que aquele que mais prometeu, mais renegará.

Pedro, que aqui não fala como porta-voz dos Doze, confirma o seu apego pessoal a Jesus: "mesmo que todos..., eu não" (Mc 14,29). Confiante em si, crê que pode prometer fidelidade, transformando sua segurança em temeridade; ama tanto o seu Senhor, que não consegue ouvir e acolher suas predições: "Ainda que eu tenha que morrer contigo, não te negarei" (Mc 14,31). Ele não se opõe à morte anunciada de Jesus (Mc 8,32), antes, diz-se disposto a morrer ao seu lado. Dificilmente se poderia pensar num maior amor (cf. Jo 15,13) e fidelidade; mas, na verdade coloca-se em evidência a distância que os separa. Jesus sabe que será renegado por Pedro, reiteradas vezes; Pedro, reiteradamente, recusa-se a aceitar essa advertência. O discípulo que promete fidelidade deveria lembrar-se de Pedro: a fidelidade é fruto não das promessas, mas da graça, porque é a prova do amor até ao extremo.

Marcos, com habilidade magistral, coteja as negações de Pedro no pátio com a confissão de Jesus diante do sinédrio; paralelamente a Jesus, que põe em risco a própria vida, Pedro nega tudo a fim de salvá-la (Mc 14,50-52). O único discípulo que ainda seguia Jesus não consegue enfrentar as perguntas de alguns servos. Pedro, o único que se negou a abandonar Jesus, acabará por negar que fora seu seguidor. Pedro personifica dessa forma os discípulos que renegam o próprio Senhor desde que não se reneguem a si mesmos (cf. Mc 8,34): atitude tudo mais que eucarística!



2.2.3 A aliança, traída tão logo instituída, deve, contudo, ser recordada



O corpo entregue e o sangue derramado de Jesus selam a aliança e anunciam o reino de Deus (Mc 14,24-25). A aliança instaurada na ceia não se circunscreve àqueles que a sancionaram pouco antes. O sacrifício de Jesus é para muitos (Mc 14,24; Mt 26,28). Os Doze foram os primeiros, mas não serão os únicos.

Ao narrar a instituição da Eucaristia, a tradição evangélica não quis dissimular, para nossa advertência, que todos os que comeram e beberam à mesa com Jesus na última ceia abandonaram-no logo depois (Mc 14,27.50). O fato de terem sido dignos de receber por primeiro o corpo e o sangue do seu Senhor não fez deles mais fiéis.

O caminho de Jesus para o calvário começa, não quando os inimigos o capturam, mas quando os discípulos o abandonam. A proximidade da cruz revelou a fragilidade dos discípulos e a pobreza de suas motivações no seguimento de Jesus. Não é possível a alguém seguir a Jesus e dar a vida por ele, se Jesus não entregou a sua por primeiro. Os Doze, que comeram com Jesus, quando se lhes entregou no pão e no vinho, não sabiam disso, mas poderão recordar, depois de Jesus ter morrido e ressuscitado, que entregar a vida por Ele é a tarefa de quem o recebeu na mesa eucarística.

Esta é a "memória" a ser feita (1Cor 11,24), a recordação de Jesus a reavivar continuamente até que Ele volte (1Cor 11,26). E fazer memória não é questão de livre escolha; é um mandato explícito de Jesus, transmitido àqueles que comiam com ele, antes de entregar-se. Embora Jesus soubesse que seus discípulos não seriam fiéis, não obstante vinculou-os a fazerem memória dele e do seu gesto. Este comportamento de Jesus é no mínimo curioso! Não espera que os discípulos permaneçam fiéis para ordenar-lhes que façam memória dele. Entretanto, também isso é graça: para fazer a Eucaristia não é preciso ser perfeito, basta sentir-se amado por Jesus até ao extremo.



2.3 O gesto da hora de Jesus: amar ao extremo (Jo 13,1-20)51



O quarto evangelho oferece-nos novamente a resposta. É bem conhecido o fato, singular e ainda não bem explicado que João, na narração da paixão de Jesus, não nos tenha transmitido as palavras da instituição da ceia; ele preferiu centrar-se no cumprimento da hora de Jesus e do seu amor extremo (Jo 13,1) "dando ênfase à relação do indivíduo crente com Jesus Cristo",52 relação que é exemplificada no gesto feito pelo Mestre de lavar os pés de seus discípulos "durante a ceia" (Jo 13,2). O evangelista revela assim "o sentido da instituição da santa Eucaristia [...]. Jesus se abaixa para lavar os pés de seus discípulos como sinal do seu amor que chega ao extremo. Esse gesto profético antecipa o despojamento de si até à morte na cruz".53

O gesto de Jesus, inesperado e surpreendente,54 só pode ser explicado por ele (Jo 13,6-20); e ele o faz no diálogo com Pedro, antes ainda de efetuar o lava-pés (Jo 13,6-11) e depois, como mestre, sentado novamente à mesa, instruindo todos os discípulos (Jo 13,12-20). Segundo Jesus, o gesto simboliza o dom total de si, o amor extremo aos seus,55 tendo chegado a hora da passagem deste mundo ao Pai (Jo 13,1). O amor aos seus arremata sua vida, uma vez que a entrega; a vida entregue prova o seu amor sem limites. O lava-pés não é outra coisa que a figura e o sinal desse amor último (Jo 13,5). E, na verdade, a ação de Jesus, antes ainda de ser descrita (Jo 13,4-5), foi definida como um ato concreto de amor (Jo 13,1), de fidelidade extrema (cf. Jo 10,17-18).

Com a humilde ação de serviço prestado aos seus, Jesus estabelece a comunidade dos discípulos:56 quem quiser ter parte com ele deverá deixar-se servir como senhor pelo seu Senhor (Jo 13,9.14). A "comunhão com Cristo", que se realiza na bênção do cálice e no partir o pão (1Cor 10,16), é apresentada agora como "ter parte" com ele (Jo 13,8); o preço a pagar é, justamente, deixar-se servir pelo próprio Mestre e Senhor. As objeções de Pedro são mais do que razoáveis (Jo 13,8), embora continue a não entender e a pensar de modo humano (Jo 13,7; cf. Jo 7,24; 8,15). Ele tenta recusar um gesto impróprio que humilha o seu Senhor (Jo 13,6) e contraria a imagem, os desejos, que alimenta por ele (cf. Mt 16,22). Mas, quem não se deixar servir até esse modo extremo - garante Jesus – corre o risco de não compartilhar a sua sorte (Jo 13,8). O discípulo chegará à herança do seu Senhor só se permitir ser servido por ele.

Que Jesus fale seriamente a Pedro torna-se evidente quando acrescenta: é possível ser lavado, mas não purificado (Jo 13,10; cf. 1Cor 11,26); pode-se comer com Jesus e levantar o calcanhar contra ele (Jo 13,18). A purificação não é automática, deve ser aceita, mesmo quando realizada com um humilhante lava-pés. Quem não se deixa purificar por Jesus servo, quem não o acolhe como ele é, como ele quer ser para nós (Jo 13,20), não merece permanecer com ele, e será excluído da comunidade dos crentes (Jo 13,27-30). O traidor continua impuro, porque incrédulo, e é incrédulo porque não aceita Jesus como dom (Jo 13,11; 6,64.70.71). Quem não se deixou servir por Jesus não permaneceu por muito tempo em sua comunidade; antes, continuou a comer das mãos de Jesus, mas o seu alimento foi satanás (Jo 13,26-27a; cf. Lc 22,3)! Só quem permite que Cristo se entregue no pão eucarístico, só quem se deixa servir pelo seu Senhor, será seu companheiro, não mais à mesa, mas por toda a vida. Não é fortuito que somente depois de Judas ter saído do cenáculo, Jesus se 'sentisse na glória' (Jo 13,31) e ordenasse aos seus que se amassem como ele os tinha amado (Jo 13,34-35). Jesus deu o mandamento do amor àqueles que se deixaram amar ao extremo.

"Depois de lavar os pés dos discípulos e vestir o manto" (Jo 13,12a), Jesus senta-se, recobra sua autoridade e se põe a instruir os discípulos. O gesto feito por ele não deve ser conservado como excepcional; é modelo de conduta, norma de comportamento entre eles (Jo 13,12b-14). Jesus não quer que fique como uma bela reminiscência; exige que se transforme em lei da existência cristã. O gesto é mais do que um sinal, é uma demonstração do novo modo de viver o discipulado de Jesus em comum: quem nela comanda, serve a todos (Jo 13,15; 1Jo 3,16).

Quem se reconhece como servo não pode sonhar em ser patrão; quem está consciente de ser enviado não pode evitar deixar-se enviar; para os enviados de Cristo o serviço recíproco não é de livre opção, mas norma obrigatória de comportamento (Jo 13,16). A prática do serviço fraterno constitui, além disso, a alegria do cristão, a sua bem-aventurança (Jo 13,17). É notável que a primeira bem-aventurança joanina (cf. Jo 20,19) esteja vinculada ao fazer como Jesus. O gesto extraordinário deve converter-se em prática habitual; porque não é exemplo a ser imitado, mas dom a ser acolhido. O como da ação de Jesus fundamenta o mandamento: a pessoa de Jesus, o seu gesto, é norma a seguir nas relações interpessoais em comunidade. Uma comunidade que nasceu de um ato de serviço de Jesus não pode manter-se em vida se não repetir nela esse serviço.57

Sendo assim, o "fazei isto em memória de mim" (Lc 22,19; 1Cor 11,24), a anamnese eucarística de execução obrigatória na Igreja, torna-se em João "fazei também vós como eu vos fiz ". O gesto 'eucarístico' a ser repetido pelas comunidades cristãs será sempre a entrega da própria vida até o fim, ao extremo, recordado no partir do pão e no serviço aos irmãos. Por que, então – eu ousaria perguntar - o lava-pés não conseguiu ser memória eucarística do Senhor Jesus até que ele volte? O serviço aos irmãos é, também, um modo eficaz de fazer memória de Cristo. Viver servindo os irmãos deve ser a outra forma concreta de recordar Cristo eucarístico.



3. 'FAZER-SE EUCARISTIA' HOJE



Partir de Cristo, programa espiritual para a Igreja do Terceiro Milênio,58 deve ser o "centro de qualquer projeto pessoal e comunitário", recordava João Paulo II aos religiosos, e acrescentava: "encontrai-o e contemplai-o de modo especial na Eucaristia, celebrada e adorada todos os dias, como fonte e cume da existência e da ação apostólica".59 Não lhe faltavam razões. Além de "aderir sempre mais a Cristo", partir dele "significa proclamar que a vida consagrada é [...] 'memória viva do modo de existir e de agir de Jesus'".60

Pois bem, vo-lo repito, não há outra memória tão eficaz como a da eucaristia: só ela torna presente o Cristo rememorado. É verdade, "na celebração eucarística e na adoração" nós consagrados, encontramos "a força para o seguimento radical de Cristo". Mas não só; o mistério da Eucaristia, "viático cotidiano e fonte de espiritualidade do indivíduo e do Instituto",61 "arrasta-nos no ato oblativo de Jesus. Não é só de modo estático que recebemos o Logos encarnado, mas ficamos envolvidos na dinâmica da sua doação".62 Fazer a eucaristia chama-nos a "viver o mistério pascal de Cristo, unindo-nos com Ele na oferta da nossa própria vida"; isto é, somos convidados a nos identificarmos com Ele, fazendo da própria vida entregue memória viva de Cristo. "Com efeito, participando do Sacrifício da Cruz, o cristão comunga com o amor de doação de Cristo e fica habilitado e compelido a viver essa mesma caridade em todas as suas atitudes e comportamentos de vida".63 Dom Bosco exprimia-o com aquelas palavras que nos são tão caras: "Eu por vós estudo, trabalho, santifico-me". Em suma, "no próprio 'culto', na comunhão eucarística, está contido o ser amado e o amar por sua vez aos outros. Uma Eucaristia que não se traduza em amor praticado concretamente é em si mesma fragmentária.64

"'Fazer-se eucaristia', que é fazer-se dom de amor pelos outros"65 é, justamente, "a contribuição essencial que a Igreja espera"66 de nós. Não nos será possível dar essa contribuição à Igreja se não vivermos fazendo a eucaristia e fazendo-nos eucaristia; a Eucaristia está, na verdade, "na origem de toda forma de santidade [...]. Quantos santos tornaram autêntica a própria vida graças à sua piedade eucarística!"67 entre os quais, bem o sabemos, também Dom Bosco.

Para melhor vos animar a partir de Cristo Eucaristia no caminho para a nossa santidade, "a nossa tarefa essencial",68 "o dom mais precioso que podemos oferecer aos jovens" (Const. 25), permiti-me outra reflexão sobre a essência da vida consagrada e uma existência eucarística.

A vida consagrada encontra sua identidade quando espelha em suas obras a memória viva do modo de existir e agir de Jesus. Sendo peculiar à pessoa consagrada, viver estes valores evangélicos do mesmo modo como Jesus os viveu, é bom sublinhar que este Jesus, morto e ressuscitado, é por nós encontrado vivo e presente na Eucaristia; portanto, "a Eucaristia, pela sua própria natureza, está no centro da vida consagrada, pessoal e comunitária".69 Mais ainda, poderíamos dizer que a vida consagrada, se quiser permanecer coerente consigo mesma, deve ter uma forma de ser plenamente eucarística. Na verdade, os consagrados encontram na Eucaristia o próprio modelo e a perfeita realização das exigências fundamentais de suas vidas.



3.1 A vida consagrada, "vida eucarística"



"Neste quadro" (da espiritualidade eucarística e da vida cotidiana) - e cito uma proposição, a 39ª, do recente Sínodo sobre a Eucaristia - "resplende o testemunho profético das consagradas e dos consagrados, que, na celebração eucarística e na adoração, encontram a coragem para o seguimento radical de Cristo, obediente, casto e pobre. A vida consagrada tem aqui a fonte da contemplação, a luz para a ação apostólica e missionária, o sinal último do próprio trabalho com os pobres e marginalizados e a força da realidade do Reino".

A menção sinodal à Eucaristia não alude primeiramente ao Sacramento em si mesmo, nem se refere apenas à sua celebração litúrgica, mas ao fato de nela encontrarmos, vivo e presente, Jesus Cristo, precisamente em sua existência no Mistério Pascal. Neste sentido, compreende-se perfeitamente a afirmação de João Paulo II de que a Eucaristia de Cristo "não é um dom, embora precioso, entre tantos outros, mas o dom por excelência, porque dom de si".70

Seguindo a sugestão do Sínodo, convido-vos, pois, a contemplar os elementos fundamentais da vida consagrada em chave eucarística, através de uma imagem, ao mesmo tempo simples e sugestiva: o coração. A profissão dos conselhos evangélicos, como coração da vida consagrada, bate segundo o duplo movimento da fraternidade (sístole) e da missão (diástole), vividos ambos segundo os diversos carismas. Parece-me encontrar, na verdade, uma semelhança muito profunda e significativa entre as grandes dimensões da Eucaristia, como "coração da vida eclesial",71 e este 'coração' da vida consagrada que constitui a profissão dos conselhos evangélicos. Como afirma João Paulo II, "a Eucaristia é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o memorial do sacrifício no qual se perpetua o sacrifício da Cruz e o sagrado banquete da comunhão no Corpo e no Sangue do Senhor".72



3.1.1 A vida consagrada, "memorial" mediante a obediência



"Memória viva do modo de existir e de agir de Jesus", a vida consagrada "é tradição viva da vida e da mensagem do Salvador".73

Bem sabemos que a categoria "memorial" não indica a "repetição" do evento, nem se limita simplesmente a "recordá-lo", mas torna-o presente e atual. Nossa mentalidade ocidental tem dificuldade em aceitar a atualização de um evento, mesmo quando se torna fundamental para compreender o sentido da festa nas culturas tradicionais.74

Descrever o memorial como "atualização de um evento" pode prestar-se a certa compreensão "mítica", como se a história da salvação não fosse composta por eventos únicos e irreproduzíveis, incluída a morte do Senhor (cf. Hb 7,27; 9,12; 10,10). Seria preferível falar mais de "acontecimento que se atualiza" do que de presença viva, real, do protagonista deste evento, Jesus Cristo morto e ressuscitado. A vida consagrada só poderá ser memorial de Jesus Cristo se continuar a tornar presente a mesma forma de vida em todos os tempos e lugares. Nisso está precisamente o núcleo da obediência consagrada, e que Dom Bosco exprimia com a sua renomada frase: "Eu sou sempre sacerdote...".

Uma leitura atenta da Exortação apostólica Vita Consecrata descobre que o fulcro e o centro dos conselhos evangélicos estão na obediência: isso não faz senão refletir o testemunho da tradição bíblica. Temos a obediência no Antigo Testamento como expressão principal da fé: os grandes crentes são conseqüentemente grandes obedientes. Nos umbrais do Novo Testamento temos Maria, Aquela que acreditou e aceitou colaborar plenamente com Deus em seu projeto de salvação. Sobretudo a vida de Jesus, toda ela, é um caminho contínuo de perfeita obediência desde a encarnação (cf. Hb 10, 5.7; Jo 6,38), a missão (cf. Mc 1, 38; Lc 4, 43, Jo 4, 34), e, principalmente, a paixão (cf. Mc 14, 36; Jo 12,27-28; Hb 5, 7-9).75

Ainda mais, segundo Vita Consecrata, tanto a virgindade quanto a pobreza são, de certa maneira, conseqüência da obediência: "Ele é o obediente por excelência [...] É nesta atitude de docilidade ao Pai que Cristo, embora aprovando e defendendo a dignidade e a santidade da vida matrimonial, assume a forma de vida virginal, e revela assim o valor sublime e a misteriosa fecundidade espiritual da virgindade. Sua plena adesão ao desígnio do Pai ainda se manifesta no desapego dos bens terrenos [...]. A profundidade da sua pobreza revela-se na perfeita oblação de tudo o que é seu ao Pai".76

O elemento memorial não se reduz simplesmente à celebração litúrgica na qual se repetem as palavras de Jesus: "Este é o meu corpo entregue em sacrifício por vós" e, portanto, não consiste em refazer sacramentalmente o evento que se deu uma vez por todas, mas em torná-lo presente na Eucaristia ("fazer eucaristia") e em tornar-se memória viva do seu modo de ser e agir ("fazer-se eucaristia"). O prolongamento da entrega total de Cristo na vida de cada consagrado realiza-se através do voto de obediência. O voto de obediência é aquele que melhor expressa a total pertença a Deus, a total entrega a Deus a ponto de não ter outra coisa a fazer senão identificar-se com a vontade do Pai. A espiritualidade eucarística não é, então, apenas celebrar com decoro, com devoção a Eucaristia. Deve ser traduzida numa vida de obediência, ali onde deveras se faz o memorial de Cristo e nos tornamos sua memória viva.



3.1.2 A vida consagrada, "sacrifício" mediante a castidade



A segunda grande dimensão da Eucaristia é o sacrifício. Não é o caso de entrar aqui na discussão se a reforma pós-conciliar ofuscou, ou até mesmo marginalizou, o caráter sacrifical da celebração eucarística.77 Os testemunhos bíblicos, quer na tradição sinótica quer na paulina, são concordes em atestar que

  • Jesus estabeleceu um paralelo entre o pão partido e o próprio corpo (Mc 14, 22; Mt 26,26; Lc 22,19; 1Cor 11, 24);

  • Jesus definiu uma comparação entre o vinho (que devia ser bebido durante a ceia pascal) e o seu sangue, acrescentando que mediante o seu sangue realiza-se a Nova Aliança (Mc 14,24; Mt 26,28; Lc 22,20; 1Cor 11,25).

  • A presença da expressão por, nos cinco textos, dirige toda a atenção ao "por quem" foi entregue o corpo e derramado o sangue (Mc 14,24; Mt 26,28; Lc 22,20).78

A história recente sobre o sentido sacrifical da Eucaristia - derivado, evidentemente, do Mistério Pascal - deixa-nos um ensinamento enriquecedor: não é o sofrimento, mas o amor, o centro da redenção como obra do Pai, através de Cristo, no Espírito: Jesus pode dar a sua vida, como expressão máxima do próprio amor, como seu dom maior! "Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos" (Jo 15,13).

Costuma-se afirmar que a Eucaristia é "memorial" da morte e ressurreição do Senhor, mas isso não é exato em referência à primeira Eucaristia, a Última Ceia. Na realidade, não foi anámnesis, memória, mas prolepsis, antecipação: precedeu, dando seu pleno sentido ao que sucederia no Gólgota. "Jesus deu a este ato de oferta uma presença duradoura através da instituição da Eucaristia durante a Última Ceia. Antecipa a sua morte e ressurreição entregando-se já naquela hora aos seus discípulos, no pão e no vinho, a si próprio, ao seu corpo e sangue como novo maná".79

Sem a celebração da Última Ceia, não teríamos a prova mais forte e imediata do sentido que Jesus quis dar à própria morte. Dito em outras palavras: o "sacrifício incruento" (por amor) precede o "sacrifício cruento" (a morte de Jesus na cruz). Este aspecto fundamental da Eucaristia enquanto sacrifício, expressão suprema do amor de Jesus por nós, está em íntima relação com a castidade consagrada.

O ser humano é chamado a realizar-se no amor, e, na expressão plena da entrega, isso implica a doação total do corpo. A forma costumeira dessa entrega é a "linguagem" sexual; nela, o corpo é protagonista, embora esteja sempre camuflado o perigo de que ela não implique na doação total da pessoa e, nesse caso, seria uma mentira, visto que por sua natureza é uma entrega exclusiva e excludente.80 A entrega sexual não é, portanto, o único modo de entregar o corpo como expressão do amor; encontramos em Jesus a entrega eucarística como a mais profunda expressão do amor, pois aqui o corpo é sinal e instrumento da entrega da pessoa, o verdadeiro protagonista do amor e, além disso, não tem limites de extensão: é "para os muitos". Jesus não vive seu amor e sua entrega total de si mesmo em "chave sexual", ele os vive em chave eucarística.

Eis, para nós consagrados, o caminho especial com que vivemos, em plenitude, o nosso amor e a conseqüente entrega que isso implica: nós nos abstemos de entregar o corpo e os afetos a uma só pessoa, para nos darmos inteiramente a todos. Sem dúvida, também aqui se pode incorrer no perigo "simétrico" à entrega sexual: ali se podia entregar o corpo sem entregar a pessoa; aqui se pode dar a falsa entrega da pessoa sem a entrega total do próprio corpo, sem aquele "consumar-se e gastar-se" também fisicamente, que é a expressão autêntica e irrenunciável do amor vivido em chave eucarística.

Dessa forma, realiza-se, então, a dupla dimensão da castidade consagrada: a 'sístole' da vida em fraternidade e a 'diástole' da entrega total na realização da missão. "Na Eucaristia, a virgindade consagrada encontra inspiração e alimento para a sua doação total a Cristo";81 a Eucaristia é, também fonte e cume da vida e missão da Igreja, pois "não podemos reter para nós o amor que celebramos no Sacramento. Ele exige, pela sua natureza, ser comunicado a todos".82 Em ambas as direções, como expressão de uma amor de ágape, que não ignora a realização do eros, mas que o assume de modo a converter-se num amor perceptível, afetuoso, e não somente objeto de fé, porque é impossível de se ver.83


3.1.3 A vida consagrada, "ágape" mediante a pobreza



Vejamos enfim a vida consagrada a partir da perspectiva da Eucaristia enquanto ágape. Do ponto de vista antropológico, é um dos temas bíblicos mais sugestivos: "comer em comum" é, para as culturas de todas as latitudes, uma das experiências de convivência e, ao mesmo tempo, de "fraternidade", mais intensas e significativas: "comunidade de mesa é comunidade de vida".84

Um dos traços mais característicos do ministério de Jesus foi ter feito do comer em comum uma prática habitual, de modo especial com os pequenos, pobres, marginalizados e, principalmente, "publicanos e pecadores" (Lc 5,29-3-; 15,2). Admitindo as pessoas religiosa e moralmente proscritas à comunidade da mesa, Jesus significava que Deus sente alegria em oferecer salvação aos pecadores e conceder-lhes o seu perdão.85

Encontramos a ágape como expressão da proximidade salvífica de Deus não só no fazer de Jesus; ela aparece também em sua pregação, sobretudo nas parábolas como símbolo privilegiado do Reino (Mt 8,11; 22,1-14; Lc 12,35-37; 14,12-24; 15,23-32; 19,5-10). Há nelas um elemento fundamental, que dificilmente será encontrado em outras atitudes de Jesus, que é a absoluta gratuidade de Deus no convite à ágape. Ninguém é digno de participar dela; por isso, a melhor atitude é a da criança (cf. Mc 10,15) que recebe com alegria e gratidão aquilo que lhe é dado, porque não o merece; é a atitude do pobre, do indigente, do abandonado, daquele que está pelas praças e pelas ruas porque não tem onde viver (cf. Lc 14,21; Mt 22,8-10). Aquele, porém, que se atém às rígidas normas da 'justiça' ficará indignado, e nem mesmo vai querer entrar no banquete da festa para o retorno do irmão (cf. Lc 15,25-32), ou terá tantos compromissos, que recusará orgulhosamente um convite tão gratuito quanto intempestivo (cf. Lc 14,18-20).

A dimensão da refeição reflete-se na vida religiosa, em seu significado mais verdadeiro, na vida de pobreza, não como carência natural ou privação voluntária, mas como partilha do que se é e do que se tem, como algo totalmente gratuito; tanto é verdade que a primeira narração da instituição da Eucaristia (1Cor 11,17-34) tem como Sitz im Leben uma situação da comunidade em que se celebrava a Ceia do Senhor sem compartilhar os próprios bens com quem tinha necessidade deles; os Coríntios estavam distantes do ideal lucano de comunidade, em que "todos os que abraçavam a fé viviam unidos e possuíam tudo em comum [...]. Freqüentavam diariamente o templo, partiam o pão pelas casas e tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração" (At 2,44.46; cf. 4,32).

A pobreza da pessoa consagrada não exprime nenhum tipo de recusa aos bens materiais, nem crê que o despojamento total dos bens seja um ideal a alcançar, como pode sê-lo em alguns tipos de religiosidade oriental. O pobre, porque crente, aceita com simplicidade e sobriedade os dons de Deus, partilhando-os como expressão do seu amor, num duplo movimento: no interior da comunidade fraterna, repartindo todos os seus bens, e, para fora dela, no convite a participar do "banquete do Reino", com uma predileção evangélica pelos mais pobres e abandonados, pelos marginalizados, pelos pecadores, por todos os humanamente insignificantes, que é a opção do Deus revelado. Não é o convite interessado aos amigos e parentes (cf. Lc 14,12-13; Mt 5, 46-47), o que não teria nada de mal, mas que não se torna 'sinal evangélico', nem produz o escândalo salutar de reconhecer que isso "também fazem os pagãos" (Mt 5,47). A pobreza evangélica torna-se liberdade de convidar os distantes para o banquete do Reino, ardor missionário que só nasce no coração do pobre, que literalmente "nada tem a perder" e tudo a ganhar... por Cristo e pelo seu Reino.


3.2 O salesiano, homem da Eucaristia


Entre mistério da Eucaristia e vida consagrada há uma relação tão íntima que uma não se explica sem a outra. O consagrado deve ser homem da Eucaristia, se quiser ser e permanecer tal; a consagração religiosa tem, na verdade, "uma estrutura eucarística: é oblação total de si" e, por isso, está "estritamente associada ao sacrifício eucarístico".86

Afirmada a centralidade da Eucaristia para cada um de nós e para a Congregação, gostaria de acenar, embora brevemente, ao modo com que ela, "viático cotidiano e fonte de espiritualidade",87 modela "a forma eucarística da existência", isto é, como ela favorece a conformação a Cristo, tornando-nos pessoas eucarísticas. Parto da dinâmica interna do próprio Sacramento, que leva da celebração de um rito à conformação com o mistério; da adesão efetiva, a mais intensa que se possa dar na entrega da própria vida, à adoração do Senhor crucificado e ressuscitado presente na Eucaristia; da contemplação do Cristo oferecido, à missão de transformar-se em pão partido para os outros.



3.2.1 Da celebração à conformação



Na Eucaristia, "o ato central cotidiano de toda a comunidade salesiana" (Const. 88), revela-se o desígnio de amor que orienta toda a história da salvação (cf. Ef 1,10; 3,8-11). Nela, "o Deus Trinitas, que é amor em si mesmo (1Jo 4, 7-8), envolve-se plenamente com a nossa condição humana. No pão e no vinho [...],é toda a vida divina que nos alcança e se comunica a nós na forma do Sacramento. [...] Trata-se de um dom absolutamente gratuito, devido apenas às promessas de Deus cumpridas para além de toda e qualquer medida".88

Quem celebra a Eucaristia não só confessará o primado absoluto do dom de Cristo com admiração e reconhecimento, como também permitirá que o seu Senhor entre em sua vida, ou seja, "deixar-se possuir pelo amor de Deus".89 Em Cristo eucaristia Deus não é possuído como idéia abstrata, nem como programa de vida, mas como "Alguém com quem cultivo uma relação pessoal forte e de amizade filial, adulta e responsável, uma relação de aliança e empenho incondicionado na missão de salvar a humanidade".90 É assim que acontece "em plenitude a intimidade com Cristo, a identificação com Ele, a total conformação a Ele à qual os consagrados são chamados por vocação":91 "a verdade do amor de Deus em Cristo nos alcança, fascina e arrebata, fazendo-nos sair de nós mesmos e atraindo-nos dessa forma à nossa verdadeira vocação: o amor".92

Conquistado pelo amor, amado pessoalmente por Ele, o salesiano torna-se capaz de amar e entregar-se a si mesmo, primeiramente a Deus, e, com Deus, aos outros. E, nessa entrega de si, identifica-se com Cristo, porque comungando com seu Corpo e Sangue, apropria-se daquela forma eucarística de existência que caracterizou a vida e a morte de Jesus. Celebrar então a Eucaristia todos os dias "mesmo quando não é possível que os fiéis a assistam",93 tem uma singular eficácia espiritual além do seu valor objetivamente infinito; precisamente por isso, o CG25 levava-nos a desenvolver a dimensão comunitária da vida espiritual "celebrando a Eucaristia cotidiana com alegria, criatividade e entusiasmo".94 A celebração da Eucaristia "é formativa no sentido mais profundo do termo, enquanto promove a conformação a Cristo".95 Como ousou dizer Santo Agostinho: "não só nos tornamos cristãos, mas nos tornamos o próprio Cristo". Pois no pão e no vinho eucarístico, "Cristo Senhor nos quis confiar o seu corpo e o seu sangue, derramado por nós para remissão dos pecados. Se bem o recebestes, vós mesmos sois aquele que recebestes".96

Justamente, porém, porque Deus nos entrega o seu Filho na Eucaristia celebrada "em obediência ao mandamento de Cristo", "a liturgia eucarística é essencialmente actio Dei", e "o seu fundamento não está à disposição do nosso arbítrio e não pode sofrer a chantagem das modas passageiras".97 Somente o respeito dócil da estrutura própria da celebração tornará efetivo o nosso reconhecimento do dom inefável, e autêntico o empenho de acolhê-lo com gratidão. É impensável que aquele que deseja identificar-se com Cristo, que se lhe entrega totalmente, celebre a Eucaristia sem se preocupar com a sua configuração ritual. Não há dúvida: "a ars celebrandi é a melhor condição para a actuosa participatio".98



3.2.2 Da conformação à adoração



O desafio de viver "a adesão 'confirmativa' a Cristo de toda a existência",99 está precisamente no que fazer para que o rito que celebramos todos os dias "como festa" (Cont. 88) não fique reduzido a mera mímesis de quanto aconteceu no Cenáculo, repetindo os mesmos gestos exteriores de Jesus, mas seja uma verdadeira anámnesis, que faz memória enquanto atualiza e torna presente o fato recordado. Isso é possível na medida em que a celebração leve à contemplação do mistério que se atualiza. Com efeito, "a adoração eucarística não é senão o óbvio desenvolvimento da celebração eucarística, que, em si mesma, é o maior ato de adoração da Igreja. Receber a Eucaristia significa colocar-se em atitude de adoração para com Aquele que recebemos".100

A contemplação leva necessariamente à admiração pelo dom que Deus nos concedeu em Cristo, à surpresa de quem se sente amado de tal forma e em tal medida que não pode explicar nem sabe agradecer devidamente. "Dificilmente - afirmava Paulo admirado - alguém morrerá por um justo... Pois bem, a prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós, quando ainda éramos pecadores" (Rm 5,7-8). Quem se percebe amado de modo tão divino não consegue senão deixar-se amar sem limites e será capaz de entregar-se ao extremo. Um amor tão grande não é merecido, nem se entende; admira-se e adora-se em silêncio reconhecido.

Adorar a Deus "não è ver o mundo que nos circunda, somente como a matéria-prima com que nós podemos fazer algo", mas "descobrir nele a 'caligrafia do Criador', a razão criadora e o amor o amor de que o mundo nasceu e de que o universo nos fala [...]. Antes de cada atividade e de cada mudança do mundo deve haver a adoração. Só ela nos torna verdadeiramente livres; somente ela nos oferece os critérios para o nosso agir. Precisamente num mundo em que, de modo progressivo, definham os critérios de orientação e existe a ameaça que cada um faça de si mesmo o próprio critério, é fundamental ressaltar a adoração". Para o cristão, porém, adorar a Deus é, sobretudo, adorar o seu Senhor, "presente na Eucaristia com a carne e o sangue, com o corpo e a alma, com a divindade e a humanidade". Na Eucaristia, Cristo não é apenas pão para ser comido, mas amor para ser contemplado; mais ainda, o sinal eucarístico não teria razão nem sustentação sem o amor ofertado. "De fato, não é que na Eucaristia nós simplesmente recebemos uma coisa qualquer. Ela é o encontro e a unificação de pessoas; porém a pessoa que vem ao nosso encontro e deseja unir-se a nós é o Filho de Deus. Tal unificação somente pode realizar-se segundo o modo de adoração. Receber a Eucaristia significa adorar Aquele que recebemos. Precisamente assim e somente assim nos tornamos um só com Ele".101 "Ninguém - escreveu Santo Agostinho - come desta carne sem antes adorá-la; pecaríamos se não a adorássemos".102

Quanto a nós, "chamados pela própria consagração a uma contemplação mais prolongada [...] Jesus no Sacrário espera por nós junto d'Ele, para derramar em nossos corações aquela experiência íntima da sua amizade que é a única que pode dar sentido e plenitude à nossa vida e à missão".103 Como gostaria, então, caros irmãos, que se reforçasse entre nós, e se recuperasse onde necessário aquela devoção eucarística, simples, mas eficaz, tão salesiana, que tem na visita e adoração do Santíssimo Sacramento uma das expressões mais preciosas e tradicionais! E não só porque gostaria que nos deixássemos plasmar pela presença real do Senhor adorado, mas porque corresponde a um traço característico da nossa vivência carismática.

Como todos bem sabemos, freqüentar o Santíssimo Sacramento era uma das práticas de piedade que a "pedagogia eucarística"104 de Dom Bosco privilegiava na educação de seus jovens e na formação espiritual dos salesianos. Sobre Domingos Sávio, escreveu que "era para ele uma verdadeira delícia poder passar alguma hora diante de Jesus sacramento",105 e durante um curso de Exercícios Espirituais, em Trofarello, 1868, recomendava aos irmãos a visita ao Santíssimo Sacramento entre as práticas diárias: "vá-se aos pés do Tabernáculo só para dizer um Pater, Ave e Gloria quando não se puder fazer mais. Basta isso para ser forte contra as tentações".106 Resta-nos que "a presença da Eucaristia em nossas casas é para nós, filhos de Dom Bosco, motivo de freqüentes encontros com Cristo". É do Cristo eucarístico visitado com assiduidade que "haurimos dinamismo e constância em nosso trabalho em favor dos jovens" (Const. 88)? Seremos então capazes de "vencer toda a dispersão ao longo do dia, encontrando no sacrifício eucarístico, verdadeiro centro da nossa vida e da nossa missão, a energia espiritual necessária para enfrentar as diversas tarefas pastorais. Assim, os nossos dias tornar-se-ão verdadeiramente eucarísticos".107



3.2.3 Da adoração à missão



Caros irmãos, como "só na adoração pode amadurecer a acolhida profunda e verdadeira" do Cristo eucarístico, é justamente "neste ato pessoal de encontro com o Senhor que, depois, amadurece também a missão social que está encerrada na Eucaristia".108 Quem adora o amor de Deus na Eucaristia sente-se amado, faz experiência do amor recebido, gerando a força de dar a vida na medida do Cristo adorado e recebido sacramentalmente. "A ágape de Deus vem-nos corporalmente para continuar o seu agir em nós e através de nós";109 o amor, antes de ser ordenado, foi doado; e porque doado, pode ser pedido.

Como celebrar dignamente a entrega da carne de Cristo para muitos e só com Ele identificar-se, se depois se fica na indiferença de uns para com os outros? Como receber de Deus o seu dom por excelência, Cristo eucaristia, sem haurir a capacidade de dar a própria vida por muitos? Como adorar o Cristo presente no sacramento e não renovar o empenho de dar a vida no serviço aos mais necessitados? Uma devoção esvaziada da entrega trai o espírito e a letra da Eucaristia cristã.

A adoração leva ao desejo de corresponder com o mesmo amor, extremo (Jo 13,1), e produz como fruto a conversão da pessoa; há uma estreita "ligação entre forma eucarística da vida e transformação moral [...] Com efeito, ao participar no sacrifício da cruz, o cristão comunga do amor de doação de Cristo, ficando habilitado e comprometido a viver esta mesma caridade em todas as suas atitudes e comportamentos de vida".110 Ao permitir que Cristo se lhe entregue, o crente converte-se em seu comensal; e o comensal transforma-se, por identificação, nele mesmo, em pão partido para a vida do mundo, tornando atual em seu corpo o que falta à paixão do Senhor (cf. Cl 1,24).

Dessa forma, a identificação mais perfeita com Cristo acontece quando quem se sente amado por Ele ama por sua vez os outros: "uma Eucaristia que não se traduza em amor concretamente praticado é em si mesma fragmentada".111 Não nos iludamos: "do amor mútuo e, em particular, da solicitude por quem passa necessidade, seremos reconhecidos como verdadeiros discípulos de Cristo (cf. Jo 13,35; Mt 25,31-46). Com base neste critério, será comprovada a autenticidade das nossas celebrações eucarísticas".112 Não seria autêntica a participação na Eucaristia que não levasse a empenhar-se concretamente na edificação de um mundo mais fraterno e solidário; pois, precisamente na Eucaristia "o nosso Deus manifestou a forma extrema do amor, invertendo todos os critérios de domínio que muitas vezes regem as relações humanas e afirmando de modo radical o critério do serviço".113

"O enlevo pelo dom que Deus nos concedeu em Cristo" empenha-nos "a sermos testemunhas do seu amor". E o somos quando "através das nossas ações, palavras e modo de ser, é outro que aparece e se comunica", Cristo. Alimentar-se dele leva naturalmente a testemunhá-lo com a vida; o testemunho que surge da nossa forma eucarística de viver, de fazer-nos eucaristia, pode chegar "até ao dom de si mesmo, até ao martírio, (que) sempre foi considerado, na história da Igreja, o apogeu do novo culto espiritual".114 "Não podemos reservar para nós o amor que celebramos neste sacramento: por sua natureza, pede para ser comunicado a todos. [...] Por isso, a Eucaristia é fonte e ápice não só da vida da Igreja, mas também da sua missão: 'Uma Igreja autenticamente eucarística é uma Igreja missionária' [...]. Não podemos abeirar-nos da mesa eucarística sem nos deixarmos arrastar pelo movimento da missão que, partindo do próprio Coração de Deus, visa atingir todos os homens; assim, a tensão missionária é parte constitutiva da forma eucarística da existência cristã".115

Precisaríamos perguntar-nos seriamente, caros irmãos, de onde nasce em nós, e como fazê-la renascer, a caridade apostólica, "caracterizada por aquele dinamismo juvenil que tão fortemente se revelava em nosso Fundador e nas origens da nossa Sociedade" (Const. 10). Nossa missão não terá eficácia nem futuro se não brotar da sua fonte, "o coração mesmo de Cristo, apóstolo do Pai" (Const. 11), revelado e adorado na Eucaristia.



Conclusão



Quero concluir confiando-vos a Maria, mestra de espiritualidade eucarística. Embora à primeira vista os evangelhos não falem sobre esse tema, "Maria pode guiar-nos para o Santíssimo Sacramento porque tem uma profunda ligação com ele". É verdade, como afirma João Paulo II, que, "a narração da instituição, na noite de Quinta-feira Santa, não fala de Maria". Na realidade não havia necessidade. E isso porque, para além da sua incerta participação na refeição eucarística, pode-se delinear "a relação de Maria com a Eucaristia indiretamente a partir da sua atitude interior. Maria é mulher 'eucarística' na totalidade da sua vida".116 Melhor, "de certo modo, Maria praticou a sua fé eucarística ainda antes de ser instituída a Eucaristia"; acolheu na fé o Verbo e o fez corpo em seu seio "antecipando nela o que se realiza sacramentalmente em alguma medida em cada crente quando recebe, no sinal do pão e do vinho, o corpo e o sangue do Senhor. Existe, pois, uma profunda analogia entre o fiat pronunciado por Maria, em resposta às palavras do Anjo, e o amen que cada fiel pronuncia quando recebe o corpo do Senhor".117 Os meus votos mais sentidos são para que Deus nos dê a capacidade de acolhê-lo como Maria, de fazê-lo carne e sangue da nossa carne e de dá-lo aos jovens como o seu Salvador.



Com afeto, em Dom Bosco



Reitor-Mor




1 Juan E. Vecchi, “Este é o meu corpo, oferecido por vós”: ACG 371 (2000), p. 5.

2 Sacrosanctum Concilium. Constituição Conciliar sobre a Sagrada Liturgia. 4 de dezembro de 1963, 10.

3 Paulo VI, Mysterium fidei. Carta Encíclica sobre a doutrina e o culto da Santíssima Eucaristia. 3 de setembro de 1965, 1.

4 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 21.

5 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 1.

6 Paulo VI, Mysterium fidei. Carta Encíclica sobre a doutrina e o culto da Santíssima Eucaristia. 3 de setembro de 1965, 2.

7 Giovanni Marchesi, “L’Eucaristia: ‘Sacramento della Carità’. L’Esortazione Apostolica postsinodale di Benedetto XVI”: La Civiltà Cattolica 3764 (2007) p. 171.

8 João Paulo II, Dominicae Cenae. Carta Apostólica sobre o mistério e culto da Eucaristia. 24 de fevereiro de 1980, 2.

9 João paulo II, Tertio Millennio Adveniente. Carta sobre a preparação do Jubileu do ano 2000. 10 de novembro de 1994, 55.

10 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 1.

11 João paulo II, Mane nobiscum Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaritia. 7 de outubro de 2004, 2.

12 João Paulo Ii, Mane nobiscum Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaristia. 7 de outubro de 2004, 4.

13 Cf. João paulo II, Mane novibuscom Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaristia. 7 de outubro de 2004, 6-10. Aos ensinamentos propostos por João Paulo II acrescentaram-se sugestões preciosas da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos: Redemptionis Sacramentum (25 de março de 2004): AAS 96 (2004) p. 549-601; Anno dell'Eucaristia: suggerimenti e proposte (15 de outubro de 2004): L'Osservatore Romano, 15 de outubro de 2004. Suplemento.

14 Cf. João Paulo II, Mane nobiscum Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaristia. 7 de outubro de 2004, 4.

15 Bento XVI, Homilia de Colônia, Esplanada de Marienfeld. Domingo, 21 de agosto de 2005.

16 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 5.

17 Bento XVI, Ibidem.

18 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 4.

19 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 14-15.

20 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 14-15.

21 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 14-15.

22 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 6.

23 Juan E. Vecchi, “Este é o meu corpo oferecido por vós”: ACG 371 (2000), p. 4.

24 Pascual Chávez, “‘Da mihi animas, cetera tolle’. Identidade carismática e paixão apostólica. Partir de Dom Bosco para despertar o coração de cada Salesiano, ACG 394 (2006), p. 6.

25 Pascual Chávez, Ibidem..

26 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 84.

27 Juan E. Vecchi, “Este é o meu corpo oferecido por vós”: ACG 371 (2000), p. 31.

28 Juan E. Vecchi, “Este é o meu corpo oferecido por vós”: ACG 371 (2000), p. 37.39.

29 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 81.

30 João Paulo II, Mensagem para o início do Capítulo Geral XXV. CG25, 144: ACG 378 (2002) p. 117.

31 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 83.

32 Giovanni Paolo II, Vita Consecrata. Exortação pós-sinodal. 25 de março de 1996, 22.

33 Concílio Ecumênico Vaticano II, Lumen Gentium. Constituição dogmática sobre a Igreja. 21 de novembro de 1964, 11.

34 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 95.

35 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 81.

36 Cf. Juan E. Vecchi, "Este è o meu corpo, oferecido por vós": ACG 371 (2000) p. 6-14. O Capítulo Geral 25 também lamentava "o enfraquecimento da fé, que se manifesta na fragilidade da vida de oração, da fidelidade à celebração eucarística cotidiana..." (CG25, 54: ACG 378 (2000), p. 57).

37 Cf. Luc van Looy, “A celebração eucarística da nossa comunidade. Para a revisão da qualidade": ACG 371 (2000) 53.

38 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 10.

39 Pietro Stella, Don Bosco nella Storia della Religiosità Cattolica. Vol. II: Mentalità religiosa e Spiritualità. Roma: LAS 19812, p. 105. 107.

40 Pietro Braido, L’esperienza pedagogica di Don Bosco. Roma: LAS 1988, p. 125.

41 Pietro Braido (ed.), Don Bosco educatore. Scritti e testimonianze. Roma: LAS 19973, p. 262.

42 Pietro Braido, Prevenire non reprimere. Il sistema educativo di don Bosco. Roma: LAS 1999, p. 259.

43 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 41.

44 João Paulo II, Ecclesia de Eucaristia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 6.

45 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 14.

46 "A contribuição essencial que a Igreja espera da vida consagrada é muito mais em ordem ao ser do que ao fazer" (Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal, 22 de fevereiro de 2007, 81)

47 Inspirei-me para estas reflexões em Juan J. Bartolomé, Cuarto evangelio. Cartas de Juan. Introdución y comentário. Madri: CCS 2002, p. 226-227.

48 A falta de compreensão do povo (Jo 6,41-45) e dos discípulos (Jo 6,60) torna-se protesto e escândalo. E é compreensível: Jesus repete por bem três vezes que se o deve mastigar (Jo 6, 54.56.58) e beber o seu sangue (Jo 6,53.54.55), afirmação, esta última, particularmente abominável para os judeus; o sangue é vida da qual só Deus pode dispor (cf. Gn 9,4; Lv 3,17; 17,10-16; Dt 12,16.23-25).

49 È a primeira vez que o evangelista indica os Doze (Jo 6,67.70.71;20,24), dos quais não narrou a eleição nem recordará os nomes (cf. Mc 3,13-19; Mt 10,1-4; Lc 6,12-16).

50 Cf. Juan J. Bartolomé, Jesús de Nazaret, formador de discípulos. Motivo, meta y metodología de su pedagogía en el evangelio de Marcos. Madri: CCS 2007, p. 219-263.

51 Cf. Juan J. Bartolomé, Cuarto evangelio. Cartas de Juan. Introducción y comentario. Madri: CCS, 2002, 283-289.

52 Xavier Léon-Dufour, Condividere il pane eucaristico secondo il Nuovo Testamento. Turim, Elledici 2005, p. 234.

53 Bento XVI, Mensagem da XI Assembléia Geral ordinária do Sínodo dos Bispos. "Eucaristia: Pão vivo para a paz do mundo", 22 de outubro de 2005, 18.

54 Lavar os pés era trabalho de escravos (1Sm 25,41), tão desprezível que não se podia exigi-lo de um escravo judeu (Lv 25,39); podia, isso sim, ser sinal de piedade pelo pai ou devoção pelo mestre (Bill I 707; II 557). Lavar os pés dos comensais era um gesto tão inusitado quanto o de Jesus colocar-se a servir durante a ceia (Jo 13,2.5).

55 A fórmula 'amar até o fim' pode ser entendida em sentido temporal, até ao último momento da vida, ou qualitativamente, até ao extremo, até a perfeição. Em todo caso, o fim é o cume da sua vida e do seu amor; amar é, em retrospectiva, sinônimo do agir histórico de Jesus e a explicação da sua morte (Jo 13,34; 15,9; 17 23; 19,28.30).

56 Xavier Léon-Dufour, Lectura del evangelio de Juan. Vol. III: Juan 13-17. Salamanca: Sígueme, 1995, 50.

57 Cf. Rudolf Bultmann, Das Evangelium nach Johannes. Gottinga, 196810, 365.

58 Cf. João Paulo II, Novo Millennio Ineunte. Carta Apostólica no final do Grande Jubileu do Ano Dois mil. 6 de janeiro de 2001, 29.

59 João Paulo II, Homilia na V Jornada da Vida Religiosa. 2 de fevereiro de 2001, 4.

60 CIVCSVA, Partir de Cristo. O compromisso renovado da Vida Consagrada no Terceiro Milênio. Instrução. 19 de maio de 2002, 21.22.

61 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 95.

62 Bento XVI, Deus Caritas est. Carta Encíclica sobre o amor cristão. 25 de dezembro de 2005, 13.

63 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 82.

64 Bento XVI, Ibidem.

65 Card. José Saraiva Martins, "Eucaristia: 'Sacramentum sanctitatis'": L’Osservatore Romano. 9 de maio de 2007, 5.

66 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 81.

67 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 94.

68 Cf. João Paulo II, "Discurso aos participantes do Capítulo Geral". CG25, 170: ACG 378 (2002) p. 138.

69 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 95.

70 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 11.

71 João Paulo II, Vita Consecrata,. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 95.

72 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 95.

73 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 22.

74 Cf. Mircea Eliade, Lo Sagrado y lo Profano, Madri, Paidós 1998, 53-85.

75 Cf. Juan J. Bartolomé, La obediencia de Cristo, filiación probada”: in Vida Religiosa 94 (2003) p. 38-45, demonstrou como a obediência ao Pai seja uma categoria evangélica apta a explicar todo o mistério pessoal de Cristo e a realização da sua obra.

76 João Paulo II, Vita Consacrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 22

77 Um programa que teria suas raízes na história teológica do protestantismo, segundo P. Stuhlmacher, Jesús de Nazaret – Cristo de la Fe. Salamanca, Sigueme 1996, 90

78 Cf. Joachim Jeremias, Abba. El Mensaje Central del Nuevo Testamento, Salamanca, Sígueme 19934, 270.

79 Bento XVI, Deus Caritas est. Carta Encíclica sobre o amor cristão. 25 de dezembro de 2005, 13.

80 Cf. Bento XVI, Deus Caritas est. Carta Encíclica sobre o amor cristão. 25 de dezembro de 2005, 6.

81 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 81.

82 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 84.

83 A primeira encíclica do Papa Bento XVI é particularmente rica neste aspecto. Recordo somente dois textos em relação ao eros e ao ágape: Quanto mais os dois encontrarem a justa unidade, embora em dimensões distintas, na única realidade do amor, tanto mais se realiza a verdadeira natureza do amor em geral. [...] Quando as duas dimensões se separam completamente uma da outra, surge uma caricatura ou, de qualquer modo, uma forma redutiva do amor. (Bento XVI, Deus Caritas est. Carta Encíclica sobre o amor cristão. 25 de dezembro de 2005, 7-8).

84 Joachim Jeremias, Abba. El Mensaje Central del Nuevo Testamento, Salamanca, Sígueme 19944, 259-260.

85 Cf. Juan J. Bartolomé, La Alegría del Padre. Estudio exegético de Lc 15. Estella: Verbo Divino, 2000.

86 CIVCSVA, Partir de Cristo. Um empenho renovado da Vida Consagrada no Terceiro Milênio. Instrução (19 de maio de 2002) 26.

87 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 95.

88 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 8.

89 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 80.

90 Card. Cláudio Humes, "Spiritualità presbiterale nella 'Sacramentum caritatis'", in L'Osservatore Romano. 16 de maio de 2007, 8.

91 CIVCSVA, Partir de Cristo. Um renovado empenho da Vida Consagrada no Terceiro Milênio. Instrução (19 de maio de 2002) 26.

92 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 35.

93 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucarisita em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 31.

94 CG25, 31: ACG 378 (2002) p. 38.

95 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 80.

96 Santo Agostinho, In Iohannis Evangelium Tractatus 21,8: PL 35,1568; Sermo 227,1: PL 38,1099. E lê-se nas Catequeses de Jerusalém: "Recebendo o corpo e o sangue de Cristo, tu te tornas concorpóreo e consangüíneo de Cristo" (22 1,3: PL 33, 1098).

97 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 37.

98 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 38.

99 João Paulo II, Vita Consecrata. Exortação Apostólica pós-sinodal. 25 de março de 1996, 16.

100 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 66.

101 Bento XVI, Discurso à Cúria Romana. 22 de dezembro de 2005: AAS 98 (2006), p. 44-45.

102 Santo Agostinho, Enarrationes in Psalmos 98,9: CCL XXXIX, 1385.

103 Cf. João Paulo II, Mane nobiscum Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaristia. 7 de outubro de 2004, 30.

104 Pietro Braido, Prevenire non reprimere. Il sistema educativo di don Bosco. Roma, LAS 1999, p. 261. Deve-se a ele, na verdade, que "se estabeleça no Oratório o uso da visita ao SS. Sacramento, sempre que estudantes e artesãos suspendiam o trabalho ou estudo para um pouco de recreação no pátio" (Pietro Stella, Don Bosco nella Storia della Religiosità Cattolica. Vol. II: Mentalità religiosa e Spiritualità. Roma, LAS 1981, p. 309).

105 Giovanni Bosco, Vita del giovanetto Savio Domenico, allievo dell'Oratorio di San Francesco di Sales. Turim 1959, 71: OE XI, p. 221. Francis Desramaut comenta: "O leitor da Vida de Domingos Sávio conhece as longas contemplações silenciosas deste jovem diante do sacrário e intui a relação existente entre elas e seu amor heróico a Deus" (Don Bosco y la vida espiritual. Madri, CCS 1994, p. 126).

106 Giovanni Battista Lemoyne, Memorie Biografiche del venerabile Don Giovanni Bosco. Vol. IX. Turim 1917, p. 355-356.

107 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 31

108 Bento XVI, Dicurso à Cúria Romana. 22 de dezembro de 2005: AAS 98 (2006) p. 45.

109 Paul Josef Cordes, L'Eucaristia e la carità": L'Osservatore Romano. 18-19 de março de 2007, p. 7.

110 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 82.

111 Bento XVI, Deus caritas est. Carta Encíclica. 25 de dezembro de 2005, 14: AAS 98 (2006), p. 229.

112 João Paulo II, Mane nobiscum Domine. Carta Apostólica para o ano da Eucaristia. 7 de outubro de 2004, 28.

113 João Paulo II, Ibidem.

114 Cf. Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 85.

115 Bento XVI, Sacramentum Caritatis. Exortação Apostólica pós-sinodal. 22 de fevereiro de 2007, 84.

116 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 53.

117 João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia. Carta Encíclica sobre a Eucaristia em sua relação com a Igreja. 17 de abril de 2003, 55.

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