301-350|pt|302 - A Comunicação Social nos interpela

Egídio Viganò



A “Comunicação Social” nos interpela



Atos do Conselho Superior



Ano LXII – outubro-dezembro, 1981



N. 302







Missão salesiana e Comunicação Social. A Comunicação Social é “novidade de presença”. — Dom Bosco homem da Comunicação Social. — Compreender a mudança sociocultural que nos envolve. — Exigências concretas para o Salesiano. — Capacidade de evangelização através da Comunicação Social. — Formação do Salesiano para a Comunicação Social. — Promoção da informação salesiana. A Comunicação Social envolve-nos a todos. — Concluindo.





Roma, 1º de outubro de 1981



Caros Irmãos,



uma saudação cordial a vós e a todos os amigos da Família Salesiana. Mando-a desde o Capítulo Geral XVII das Filhas de Maria Auxiliadora.

O Capítulo foi aberto oficialmente a 15 de setembro, depois do recolhimento e da oração de uma semana de Exercícios Espiri­tuais. Eu mesmo quis pregá-los como expressão do delicado serviço do ministério de Reitor-Mor. Concentrei a atenção das 150 Capitulares no sonho de Dom Bosco em S. Benigno, cujo cen­tenário ocorria precisamente naqueles dias: foi um aprofundamento do espírito salesiano atra­vés da consideração do Personagem dos dez diamantes.

Nossas Irmãs capitulares estão trabalhando intensamente na revisão definitiva das Consti­tuições do seu Instituto. Na segunda metade do mês de outubro farão a eleição das Superioras. Acompanhemo-las, durante seus trabalhos, com muitas orações e sacrifícios, individuais e co­munitários.

O Capítulo Geral das Filhas de Maria Auxi­liadora é um acontecimento significativo na vida da Igreja e é particularmente importante para toda a Família Salesiana de Dom Bosco. Sejamos, pois, generosos e constantes no apoio fraterno.



Missão salesiana e Comunicação Social



Em minha recente viagem à América do Sul ofereceram-me, em Montevidéu, a cópia de uma curiosa carta inédita de Dom Bosco escrita em 1877 ao P. Lasagna. Podereis tê-la neste número na seção “documentos”. A carta confirma a extraordinária e criativa preocupação do nosso Pai por um setor da Comunicação Social como vem a ser a imprensa.

Em fins de junho passado, pude acompanhar o interessante “Seminário internacional” para a formação dos quadros dirigentes das Editoras salesianas realizado em Turim. Um aconteci­mento que me obrigou a refletir sobre o quanto os nossos dois últimos Capítulos Gerais dizem a respeito da importância da Comunicação So­cial na nossa ação pastoral.

Pus-me a meditar a instrução pastoral “Communio et Progressio” de maio de 1971.

Voltei também a pensar no que se elaborou no Conselho Superior sobre esse tema durante a preparação da “Ratio”.

E dessa maneira julgo útil convidar-vos a avivar na consciência a importância que devemos dar à Comunicação Social na nossa vida e missão. A Comunicação Social sempre foi uma área de peculiar atuação salesiana, na qual Dom Bosco e, a seu exemplo, os seus filhos trabalha­ram com empenho, servindo-se de vários dos seus “instrumentos” com vistas à evangelização e à promoção humana dos seus destinatários: os jovens, as classes populares, as populações das Missões. Hoje, porém, não basta, e para o futuro é preciso empenhar-se ainda mais; exige-se uma “novidade de presença”, porque a incidência da comunicação social no mundo cresce continuamente. “Ela — disse-nos o Ca­pítulo Geral 21 — possui em si mesma uma enorme capacidade de persuasão que enriquece, para o bem e para o mal, as mensagens que transmite”.

A Comunicação Social torna-se cada vez mais uma presença educativa de massa, plasmadora de mentalidades e criadora de cultura. Por meio dela se elaboram e difundem as evidências coletivas que se encontram na base dos novos modelos de vida e dos novos critérios de julga­mento. Sua eficácia incisiva e sua presença sempre mais maciça fazem da Comunicação Social uma verdadeira e autêntica escola alter­nativa para grandes camadas da população mundial, especialmente juvenis e populares.1

O progresso acelerado destes anos apresenta-nos a Comunicação Social como um campo privilegiado de criação de opinião pública, porque “assumiu e exerce um papel decisivo na dialética cultural, na vida social e no costume”.2

Ora, sabemos que a missão salesiana está intimamente ligada à área cultural. Toda a nossa atividade evangelizadora vive e desenvolve-se no âmbito da cultura. Colaboramos humildemente na Igreja para superar o dramá­tico dissídio que se constata em nosso século entre Evangelho e cultura.

Urge impregnar de espírito cristão o con­junto dos valores e não-valores que vão estru­turando a mentalidade das pessoas: as várias novidades dos sinais dos tempos, destacadas pela Comunicação Social, atingem de alguma maneira a esfera própria da fé, antes penetram-na intimamente.

Por outra parte a missão de Cristo e os conteúdos da fé são, justamente pela sua natureza específica, objetos privilegiados de co­municação.

Cristo é a “Palavra” e a “Imagem” do Deus invisível, e se fez homem para “comunicar” a todos um grande projeto, muito concreto e histórico, de libertação e amor. Ele — diz-nos a Communio et Progressio — “revelou-se per­feito comunicador... falava plenamente inserido nas condições reais do seu povo”.3 Nele a capacidade de comunicação implica a verdadeira doação de si mesmo sob o impulso do amor, como o vemos na cruz, na Eucaristia e nos sa­cramentos. Os conteúdos da sua comunicação (a “Revelação”) não são esquemas doutrinais de elucubração abstrata, mas são fatos, pessoas, acontecimentos. Constituem o Evangelho: ou seja, um conjunto de “boas- notícias”, concretas e objetivas, que têm o poder de guiar o modo de proceder e os princípios de julgamento.

Toda a missão da Igreja está na comunicação destas boas notícias: por isso dizemos que Ela é “evangelizadora”. Os agentes da sua missão, os apóstolos, são comunicadores: “pregai o Evangelho a toda criatura”;4 com razão São Paulo exclama: “Como haveriam de crer naquele a quem não ouviram? E como ouviriam sem alguém que lhes pregasse? E como haveriam de pregar se não fossem enviados para isso? Conforme está escrito: Quão belo é ver chegar os que anunciam boas notícias”.5

Evangelizar significa, pois, ser comunica­dores de boas notícias. Para fazê-lo é necessária uma linguagem adequada, o apro­fundamento da objetividade das notícias, a dedicação em comunicá-las pelo valor de impac­to que têm em si mesmas, a arte de dirigir para elas o interesse do público.



A Comunicação Social é “novidade de presença”


Convida-nos o Vaticano II a saber ler os sinais dos tempos. E olhando ao nosso redor, e confrontando este nosso tempo com os séculos ou mesmo só com os decênios que nos prece­dem, ficamos impressionados pela profunda transformação em ato nas condições de vida do indivíduo e da sociedade. Transformação que tem muitas causas; entre elas, como ponto de aceleração, a presença cada vez mais incisiva da Comunicação Social.

O fato interessa-nos já como pessoas envolvidas indi­vidualmente, mas ainda mais porque os efeitos da nova situação atingem de maneira cada vez mais aguda, e com resultados por vezes perturbadores, os que são destinatários da nossa missão: os jovens, as classes populares.

Todavia, a constatação não basta: um senti­do de responsabilidade salesiana leva-nos a procurar formas mais atuais de aproximação, renovação de métodos pastorais, novidade de presença. Eis um campo muito concreto e exi­gente para as “novas presenças” das quais nos falaram os dois últimos Capítulos Gerais!

A programação de uma “novidade de pre­sença” apostólica supõe capacidade de leitura dos sinais dos tempos e inteligência penetrante dos núcleos estratégicos de influência cultural.

Trata-se de não nos alienarmos, de não permanecermos passivos, de não continuarmos como se nada de novo houvesse acontecido nas estruturas da sociedade. Se pretendemos ser contemporâneos dos homens de hoje, que somos chamados a evangelizar, devemos esforçar-nos antes de tudo por penetrar os dinamismos que movem a atual transformação cultural.

Estamos plenamente conscientes de que se trata de uma matéria de todo aberta às pesqui­sas, à inventiva e às propostas: matéria “in fieri” ainda. Com a humildade e a atenção de quem acompanha os seus contínuos aperfeiçoamentos, queremos convidar a refletir na Comunicação Social para incentivar a entrar ativamente na sua criatividade de linguagem com uma praxe apostólica e educativa nos níveis de hoje, mas com igual abertura para toda conquista ulterior e desenvolvimento possível.

Estimule-nos a isso a atitude aberta e co­rajosa que Dom Bosco assumiu ainda no século passado no tocante à Comunicação Social. O fenômeno dos “mass media” e dos “group media” era então assaz reduzido (limitava-se pratica­mente ao setor do papel impresso), mas ele intuiu a sua importância, e agiu nessa área como protagonista. Vejamos, brevemente, como a im­prensa se tornou em suas mãos um instrumento dócil, que ele dominou com eficácia para a realização do seu Projeto Pastoral.



Dom Bosco homem da Comunicação Social



Dom Bosco deixou que a Comunicação Social do seu tempo — das formas mais simples às mais elevadas —invadisse a sua vida, sempre pronto a obter para si e transmitir aos outros.

Soube ser receptor atento, desejoso de co­nhecer os acontecimentos, leitor obstinado, de­vorador de livros, e muito capaz de memorizar.

Foi bom comunicador, desde menino, a começar pelas formas mais modestas de comu­nicação, quando repetia aos colegas de brinque­do os episódios das suas leituras e as instruções do pároco, quando durante o inverno lia no estábulo para os adultos livros da cultura popu­lar. Para proveito dos seus meninos, inventará mais tarde o “boa-noite”, ocasião amigável e cordial para transmitir notícias de família.

Foi ainda autor precoce de livros. Seu primeiro livro saiu aos 29 anos (e pensar que o camponês dos Becchi chegara em Chieri com 15 anos para concluir com notável atraso seu atormentado curso elementar). Mas tornou-se logo autor versátil nos gêneros mais diversos, do artigo de jornal ao livro, da biografia à história, da hagiografia ao teatro, da divulga­ção científica à religiosa e à apologética, gênero muito em moda então. A concretude “históri­ca” era uma dimensão por ele preferida; sua habilidade de escritor foi a do “narrador”.

Foi autor fecundo: a recente reimpressão anastática das suas “Opere edite” compreende 37 grandes volumes, e aí se contam 1.174 escri­tos próprios. Foi autor muito lido, procurado, reim­presso, com toda uma série de invejáveis “best sellers” (como diríamos hoje).

Para a sua família espiritual inventou também a informação salesiana. Em 1867, quando a sua Congregação compreendia ao todo 3 casas e 44 salesianos, e ainda não fora aprovada pela Santa Sé, fez multiplicar três cópias da primeira das suas “Cartas Circulares”. A partir de então saíram regularmente sem nenhuma interrupção, e hoje tornaram-se os “Atos do Conselho Superior”. E dez anos depois, transformava o noticiário bibliográfico da sua livraria no “Bollettino Salesiano”, para que os seus Cooperadores e todos os amigos de Dom Bosco pudessem acompanhar de perto o desen­volvimento da realidade salesiana no mundo.

Aos poucos, foi depois se transformando de autor em editor, com escolhas de evidente modernidade. Soube criar em primeiro lugar o ciclo completo da atividade editorial: da fábrica de papel (comprou uma, em Mathi Torinese), ao contato fecundo com os autores, às tipogra­fias e impressoras, às livrarias, a uma rede de distribuição toda sua para distribuir a produção periódica.

Como editor, aos 34 anos, tentou o caminho do jornal (em 1849 subscreveu os 61 números do “Amico della gioventù, giornale politico-religioso”, que durou 8 meses). Coleções e biblio­tecas eram a novidade daqueles anos, e Dom Bosco recolheu nelas em bela ordem os livros da sua editora, conseguindo difundi-los aos montes (a centenas de milhares de cópias): a “Bibliote­ca della gioventù” com 204 títulos superou em muito a tiragem total de um milhão; e a coleção das “Letture cattoliche” passou, ainda em sua vida, de dois milhões, e atingiu 9.200.000 de exemplares no primeiro meio século.

Empreendeu com grande êxito a impressão de publicações periódicas, pois tais se conside­ram com pleno direito tanto o Boletim Sale­siano como as Leituras Católicas. Fez imprimir e difundir o Boletim Salesiano em várias lín­guas (3 à sua morte; 9 no tempo do P. Rua). E quanto às “Leituras Católicas”, observamos que tinham em comum com os “pocket books” (livros de bolso) de hoje os requisitos funda­mentais: eram livros, publicados periodicamente, em formato pequeno, com baixo custo, distribuídos tanto por assinatura como na li­vraria. Em suma, Dom Bosco soube preceder.

E o que mais conta: Dom Bosco serviu-se da Comunicação Social como de um setor de atividade que lhe permitia realizar seu projeto educativo. Com a Comunicação Social utilizada em várias formas e em diversos níveis, favore­ceu a promoção humana e cristã da juventude pobre e das classes populares, e sustentou também a ação missionária.

Para a juventude fez-se escritor, preparando textos escolares (as três Histórias: Sagrada, da Igreja, da Itália), livros de orações (basta lem­brar o “Jovem Instruído”), livros formativos (das biografias dos seus melhores alunos a muitos tratados pequenos e fáceis de espiritua­lidade), livros de teatro e de leituras amenas. Pre­cisamente para eles tentou o jornalismo (o seu jornal intitulava-se “L'Amico della gioventù”).

E para as classes populares? Aos 31 anos Dom Bosco já se preocupava com os agricultores com “L'enologo italiano”, e três anos depois escrevia “O sistema métrico decimal... para uso dos aprendizes e do povo do campo”. E, depois, a avalanche dos outros livros, de conteúdo sa­grado e profano, da “Coleção de livros amenos” à “Biblioteca dos operários”, ao almanaque popular, o “Galantuomo”.

Dom Bosco era fascinante por temperamento, e não admira que seus filhos tenham seguido a sua esteira. Muitíssimos dos primeiros salesianos foram escritores, ou pelo menos en­contraram a maneira — entre suas muitas atividades — de dar a lume algum livro de valor. Entre os escritores de profissão ou quase, devem ser lembrados Lemoyne, seu biógrafo, Bonetti, o primeiro diretor do Boletim Salesiano, Bar­beris, Francesia, Trione, Cerruti...

Sobretudo no campo das Comunicações Sociais, Dom Bosco incluiu os Salesianos Coadjutores. Os leigos de Dom Bosco vinham a calhar numa atividade sob tantos aspectos leiga. Tornaram-se chefes de oficinas de tipografia e encadernação, tornaram-se livreiros, e alguns também editores: em pequena e, às vezes, grande escala. Escritores também. Em suma, encontraram na Comunicação Social uma ade­quada realização vocacional.

Graças ao esforço de todos, a imprensa sa­lesiana penetrava nos diversos ambientes com sua feição serena, com a preocupação da pro­moção humana, do anúncio evangélico.

Como se vê, o quadro é sugestivo.

Dom Bosco, homem da Comunicação So­cial, intuiu a importância que ela ia assumindo, e inseriu-se nela como protagonista, fazendo dos “mass media” do seu tempo — praticamente a imprensa — os instrumentos dóceis e eficazes em ordem à realização do seu projeto apostólico.

Diante dessa atitude do nosso Pai e de tão grande atividade, constante e corajosa, não podemos evitar uma dupla pergunta:

Por que o fez? Como o fez?

São perguntas penetrantes, que nos de­safiam.

O “por que” ilumina o âmbito da nossa missão; o “como” estimula-nos o espírito de iniciativa perante as condições da civilização atual.

Particularmente significativa, a propósito, é a circular que enviou às casas na festa de São José, de 1885, pouco antes de partir para a França. O argumento nela tratado é a difusão dos bons livros, “um dos meios adequados para conservar o reino do Salvador em tantas almas”, e “um dos fins principais da nossa Congregação; “eu vos peço e esconjuro que não descuideis essa importantíssima parte da nossa missão”. “Foi essa uma das principais empresas que a Divina Providência me confiou, e vós sabeis como tive de dedicar-me a ela com grande empenho, não obstante tantas outras ocupações”. “Persuadi-vos, meus caros filhos, que tais indústrias atrairão sobre vós e sobre nossos meninos as mais escolhidas bênçãos de Nosso Senhor”.6

Eis aí: o “por que” Dom Bosco se empenhou na Comunicação Social é claro e permanece hoje ainda mais vivo: trata-se de uma “parte impor­tantíssima da nossa missão”.

Como” o fez liga-se especificamente à imprensa segundo as possibilidades da época.

Evidentemente, aqui, a lembrança de Dom Bosco não pode ser uma espécie de visão pa­norâmica da nossa situação sobre quanto estão realizando vertiginosamente os agentes cultu­rais de hoje. A imprensa ainda é muito impor­tante, mas é uma ótica mais que parcial. O “como” de Dom Bosco é, pois, claramente limi­tado; é uma iniciativa, poderíamos dizer, “in­trodutória”, adequada a seu tempo, que hoje devemos saber rever e ampliar segundo as novas exigências da Comunicação Social. É importante que o saibamos fazer com a mesma dedicação, ousadia e inteligente constância de Dom Bosco.

Para fazê-lo será indispensável cultivar em nós a ductilidade mental que caracterizou o seu espírito de iniciativa.


Compreender a mudança sociocultural que nos envolve


A exemplo do nosso Pai, também devemos procurar compreender o que está acontecendo atualmente, para inserir-nos com eficácia e magna­nimidade na elaboração de uma nova cultura aberta ao espírito do Evangelho.

Entre as maravilhosas invenções da técni­ca — diz-nos a Communio et Progressio — que garantem a comunicação social entre os ho­mens, o cristão encontra os instrumentos pre­parados pela Providência de Deus para facilitar a união entre os que são peregrinos nesta terra; eles, com efeito, promovem novas relações e fazem surgir, poder-se-ia dizer, uma nova lin­guagem que permite aos homens conhecerem-se mais intimamente e facilita a abertura aos outros”.7

Neste sentido, antes de tudo, é preciso tomar consciência do movimento vertiginosamente acelerado com o qual se desenvolve nestes anos a realidade da Comunicação Social.

Segundo Marshall McLuhan (os estudiosos do setor estão-nos habituando a uma linguagem bastante curiosa), saímos da longa “fase tribal” da comunicação preponderantemente oral, para entrar primeiro na “galáxia Gutenberg” do papel impresso, depois na “galáxia Marconi” da telecomunicação: já começamos a viver como numa “aldeia cósmica”, ou global, isto é, num globo terrestre reduzido — pela sempre maior facilidade das comunicações — nas dimensões de pequena aldeia.

A velocidade com que uma comunicação, correndo de boca em boca, espalhava-se outrora na pequena aldeia da floresta, verifica-se agora em escala mundial, em todo o globo terrestre. O homem de hoje já não pode ignorar o que acontece não só ao seu redor, mas por toda a parte. Acontecimentos culturais, esportivos, grandes catástrofes, conflitos sociais, guerras, personagens do bem e do mal, e até os aconte­cimentos mais fúteis da crônica ou das divas, entram em sua fantasia e de alguma maneira o envolvem. A distância já não é obstáculo: são todos “vizinhos”, ou melhor, entram em casa.

A Comunicação Social apresenta-se, com linguagens inéditas, como uma novidade sedu­tora; mas apresenta, ao lado das luzes, muitas sombras. E o debate sobre suas luzes e sombras é muito vivo hoje.

É um discurso de fatos, de ideias e de pers­pectivas, que nos interessa de perto justamente porque a Comunicação Social tem imensa in­fluência sobre o povo e os nossos jovens, sobre o amadurecimento da sua personalidade, a opção dos valores fundamentais, suas atitudes perante Deus e o Homem, sua orientação vocacional. Vejamos, pois, como um voo veloz de pássaro, as incidências que a Co­municação Social pode ter sobre os nossos des­tinatários (e, não esqueçamos, também sobre nós mesmos).

Impressiona a chuva de mensagens de todos os gêneros que hoje nos atinge, e nos atingirá cada vez mais à proporção que penetramos na “aldeia global”: a Comunicação Social vai-se tornando o “clima” em que se respira e vive.

Essa chuva de mensagens tem sem dúvida aspectos positivos. O cidadão comum, o jovem, sobretudo, está hoje infinitamente mais infor­mado sobre a realidade em que vive do que as gerações anteriores. A soma de seus conheci­mentos e experiências filtradas através dos ins­trumentos de Comunicação Social é enorme. O Card. Gilroy, num documento, reconhecia ao homem o direito-dever de ter uma “visão do mundo” pessoal, e essa tarefa é facilitada pela Comunicação Social, quer se dê a essa expressão um significado somente material, quer sobretudo em sentido ideológico e espiritual. A intensifi­cação da rede de comunicação aumenta a expe­riência e a consciência.

A escola também se beneficia com o pro­gresso realizado no campo da Comunicação Social: os meninos da “galáxia Gutenberg” eram forçados a um aprendizado mais limitado, ao passo que os meios modernos introduzem na sala de aula sons, cores, figuras em movimento. Com o advento da “linguagem total”, a escola pode dar um grande passo à frente, com grande proveito para os meninos, que têm dessa ma­neira um aprendizado muito facilitado.

Os “mass media”, porém, com a invasão de informações — muitas vezes heterogêneas, con­traditórias e alternativas entre si — estão de­molindo a estrutura unitária no interior das várias culturas (bem diversa era a situação quando, por exemplo, só havia o pároco, o pre­feito e a professora para sugerir orientações ao povo de uma aldeia...). Isso está na origem de tanta confusão na esfera dos costumes civis e religiosos, e convém sabê-lo.

Os “mass media”, nestes anos em grande desenvolvimento e também mais prepotentes, comunicam sobretudo através da imagem e do espetáculo, expondo o receptor ao risco bem real da superficialidade (O homem audiovi­sual!). A coisa é muito mais inquietante para o educador salesiano, quando o rádio, o cinema, a televisão se mostram, na realidade, pouco abertos ao que mais lhe interessa, isto é, a evan­gelização.

Com razão dá-se aos “mass media”, como lembrou o Capítulo Geral 21, a qualificação de “escola paralela”, pois podem influir sobre os meninos pelo menos tanto quanto (e talvez mais de quanto) a escola. Basta pensar nas horas que os meninos passam todos os dias durante o ano escolar, e mais ainda nas férias, sentados diante do televisor, para compreender quão frequentada é a escola paralela e... com que interesse assistem a ela.

A Comunicação Social, como concretamente se está realizando, não é nunca desinteressada ou gratuita; todo centro de difusão das mensa­gens tem atrás de si grandes organizações eco­nômicas, que muitas vezes são também centros de poder ideológico impregnados de costumes não evangélicos. A difusão das mensagens é assim habitualmente instrumentalizada. Não é imaginário o perigo de uma incidência deformadora.

Neste ponto, é fácil constatar que às extra­ordinárias capacidades dos instrumentos de Comunicação Social nem sempre de fato — raramente até — corresponde uma utilização deles em sentido verdadeiramente positivo e construtivo. Por si, tais meios são certamente capazes de promover o desenvolvimento in­dividual e social, de favorecer o exercício da liberdade, a autonomia, a participação, a soli­dariedade humana e cristã. Mas o fato é que — como o demonstra a experiência quotidiana — eles muitas vezes não têm essa finalidade.

Se hoje quisermos deveras educar e evan­gelizar, não podemos proceder como tempos atrás, prescindindo dos impactos da Comunica­ção Social como se não existissem; ao contrário somos convidados a inserir-nos nas novas situa­ções, a aceitar o novo tipo de jovem e de socie­dade, a mergulharmos nela com coragem e plena disponibilidade, e com a criatividade de Dom Bosco.



Exigências concretas para o Salesiano



É, pois, necessária uma nova presença na área vasta e importante da comunicação social, e devemos promovê-la em diversos níveis.

Ela é mais do que nunca urgente e alcança o Salesiano nos seus vários aspectos, quer de indivíduo-receptor, quer de mestre-educador, como também de apóstolo-comunicador. A Comunicação Social não só o envolve com a sua problemática geral como um habitante qualquer da “aldeia global”, mas exige dele uma revisão e um repensamento que enriqueça com novas luzes sua inteligência crítica e sua própria consagração religiosa.

Eis aí um primeiro ponto ao qual devemos dar atenção: a Comunicação Social não se identifica, com efeito, com os “media” (“mass media” ou “group media”). Numa visão cristã, a Comunicação Social tem “como finalidade primordial a comunhão e o progresso da socie­dade humana”,8 e orienta o uso das “mídias” a “dar a conhecer os problemas e aspirações da sociedade humana, para que sejam satisfeitos o mais rapidamente possível, contribuindo assim para estreitar os laços de união entre os homens”.9

Ou seja: “Pela sua própria natureza, a co­municação social contribui para que os homens, multiplicando os intercâmbios recíprocos, adquiram uma maior cons­ciência no empenho comunitário da vida”.10

Por isso, a Comunicação Social é uma di­mensão da convivência humana de altíssimo valor, constitutiva da própria cultura, ainda que fortemente ligada ao progresso técnico e ao tipo de civilização em que se faz.

Os “mass media”, porém, são, em si mesmos, ape­nas instrumentos, ainda que muito aperfeiçoa­dos. Mas aqui não devemos ser superficiais e crer que com esta distinção, entre “Comunica­ção Social” e “mídias”, ajustemos as coisas. A distinção existe, sim, e é verdadeira, mas não comporta de fato a possibilidade de uma mútua separação deles. “Comunicação Social” e “mídias” compenetram-se reciprocamente de forma inseparável: dessa inseparabilidade nas­ceram linguagens novas que movem com particular eficácia a cultura emergente. O segredo positivo dessa compenetração estaria em saber conservar o primado da natureza e da finalida­de própria da “Comunicação Social”: seria pre­ciso que se olhasse para as “mídias” e se sou­besse fazê-las funcionar com a intencionalidade reta e humanizadora da “Comunicação Social”. Mas esta é uma obra imensa de educação e de evangelização a ser intensificada e aperfeiçoada.

De qualquer maneira os “mass media” con­correm, como a palavra indica, para transmitir dados justos e ideias a um grande número de pessoas; evidentemente comunicam de fato muitas mensagens: deveriam fazê-lo, como di­zíamos, procurando aproximar-se cada vez mais do escopo primário e da natureza própria de uma justa comunicação social.

O elenco das “mídias” é muito amplo: vai do livro ao jornal, à revista, à publicidade, ao cinema, ao rádio, à televisão, ao disco, aos cas­setes, ao vídeo, etc., com uma perspectiva de ficção científica na “temática” espacial. Pensemos, por exemplo, no mundo de conheci­mentos a que nos poderão abrir os “bancos universais de dados”, que podem ser consulta­dos por telefone ou videofone.

O perigo fácil de identificar praticamente a “Comunicação Social” com o funcionamento atual das “mídias”, leva inconscientemente a deixar-se dominar por esses instrumentos ou a proscrevê-los indiscriminadamente, com prejuízo da compreensão e do reto entendimento da natu­reza e do fim da “Comunicação Social”. Assim, muitos receptores acabam por ser fortemente condicionados pelo fascínio e pela novidade que as novas técnicas trazem consigo, sem aprender a julgar o valor de suas mensagens, muitas vezes negativas, que provocam superficialidade, acostumam a modelos de comportamento defa­sados e propagam a hegemonia de diferentes ideologias de poder.

Outros, embora poucos, prescindem asceticamente do seu uso, acabando praticamente, se não por desprezá-los, ao menos por desconhecer-lhes a importância, excluindo dessa maneira toda inventiva e responsabilidade apostólica no campo da “Comunicação Social”.

O cristão comprometido, e particular­mente o religioso de vida ativa, deve aprimo­rar e intensificar tanto a acuidade crítica da sua fé acerca do atual funcionamento dos “mass media”, como os dinamismos apostólicos da sua esperança para que o Evangelho penetre a nova cultura através do uso adequado dos instrumentos oferecidos pela atual civilização tecnológica.

Certamente, uma sadia atitude crítica tem hoje particular urgência para que não sejam des­qualificados os valores permanentes do Evan­gelho, nem no coração dos indivíduos, nem na opinião pública da sociedade.

Valha, como pequeno estímulo crítico, a sugestão dum conhecido escritor. Pergunta-se, por exemplo, como é que um cristão deve ler o jornal, e responde: como Cristo leria. Depois insiste: e Cristo, como leria? Para dar então uma resposta peremptória: “Procuraria nele as notícias do seu Reino!”.11

Pode parecer uma tirada de efeito; se entre­tanto procurarmos realizá-la para nosso uso pessoal das “mídias”, em nossas leituras quoti­dianas, no tempo passado diante do vídeo, havemos logo de nos dar conta de que sua atuação prática exige profunda mudança de menta­lidade, como também ilimitada inquietude sobre como as “mídias” manipulam a comunicação. De aí um sincero e concreto propósito de reação apostólica, e também um verdadeiro empenho ascético, com autocrítica no uso e também com uma inteligente mortificação no não-uso.

Não é exagerado infelizmente reconhecer que há no uso das “mídias” muito tempo per­dido e muito material alienante da fé, que sói alimentar uma fantasia anticonsagração.

Portanto, é mister tomar em consideração algumas exigências concretas da Comunicação Social hoje para o Salesiano.

À luz dos dois últimos Capítulos Gerais podemos descobri-las em três grandes prioridades, em diferentes níveis:

capacidade de evangelização através da Co­municação Social;

formação do Irmão para a Comunicação Social;

promoção da Informação salesiana.




Capacidade de evangelização através da Comunicação Social


A relação entre Comunicação Social e evangelização ou, se se quiser, mais concretamente, entre a utilização das linguagens e das “mídias” da Comunicação Social para o Evangelho e o nosso estilo apostólico de “evangelizar educando”, incide profundamente sobre a atividade salesiana. O Capítulo Geral 21 traçou algumas linhas a respeito.12 Trata-se não só de educar para as “mídias”, isto é, à leitura crítica das suas men­sagens, mas também de evangelizar com as “mídias”. Abre-se assim vasto campo de inicia­tivas para as nossas atividades didáticas, educa­tivas e culturais, para a animação cristã dos grupos juvenis, para a catequese, para a liturgia da Palavra...

Uma sadia “pedagogia das mídias” exige séria competência para a sua utilização, a clare­za dos objetivos a serem propostos, o estímulo eficaz à criatividade, a aquisição de uma capacidade emancipada e crítica diante das suas mensagens, uma tomada de consciência da sua influência, a possibilidade de exprimir-se com elas, dominando-lhes a lin­guagem e a tecnologia. Interessa também o papel fundamental que os pais e todos os educa­dores podem e devem desenvolver neste campo, sobretudo se se considera a condição da socie­dade de hoje, pluralista ou totalitária.


Neste campo queria destacar dois aspectos do nosso compromisso educativo.

O primeiro é o de uma sensibilização cada vez mais clara e acurada da natureza e do escopo primário da “Comunicação Social”, en­quanto comunicação. Encontra-se aqui, como dizíamos, o segredo positivo da permeação mútua entre “Comunicação Social” e “media”. O que conta é o próprio relacionamento entre os homens, o crescimento na comunhão, no co­nhecimento mútuo, na compreensão das novas linguagens com a sua “literatura” para lá da sua “gramática”: com efeito, “a linguagem — dizia McLuhan — já é mensagem”!

O segundo, para nós particularmente caro, é o do “ativismo juvenil”, que é possível tam­bém em relação ao cinema, a televisão, o rádio, a música (discos e cassetes...), a imprensa, as histó­rias em quadrinhos... e assim por diante. Uma referência especial deve-se fazer ao teatro, “que é — como diz a “Communio et Progressio” — uma das formas mais antigas e eficazes de co­municação entre os homens”.13 “A contribuição dada ao teatro pelos recursos próprios dos outros meios de comunicação abriu à arte dramática novas possibilidades, justamente chamadas de multimídia”.14

A Igreja tem grande apreço pelo teatro que, nas suas origens, estava muito relacionado com manifestações de caráter religioso. Também, atualmente, os cristãos devem mostrar interesse semelhante, de modo a poderem usar as suas grandes possibilidades”.15

Nós Salesianos deveríamos por certo apre­ciar mais e reatualizar melhor essa atividade, que é parte não insignificante da nossa tradição educativa.

O cuidado de um sadio ativismo juvenil dedica-se a suscitar iniciativa, fantasia, respon­sabilidade comunicativa entre os jovens. Ele deveria ser como o “específico” que caracterize a ação educativa salesiana, respeitando sempre o discurso cultural, técnico e gramatical de base. Dom Bosco — em tempos de teatro “pré-fabricado” — liberou a criatividade teatral, as formas dramatúrgicas espontâneas. Poder-se-ia falar de maneira análoga para abrir aos jovens outros tipos de espontaneidade e intervenção sobre as “mídias” atuais.

Feitos esses dois destaques, lembro também que “Communio et Progressio” quer que saibamos promover e apoiar as “vocações para a profissão de comunicador cristão” e também colaborar, nas Igrejas locais, para que surjam centros de produção e emissoras de rádio e te­levisão. Para nós permanece fundamental, tam­bém neste campo, a predileção pelos jovens e o interesse pelas classes populares.

Já surgiram em várias Inspetorias diversas iniciativas, algumas delas qualificadas: centros de produção de audiovisuais, editoras, rádio e televisão salesiana, revistas para jovens, esco­las de formação para a Comunicação Social... Mas são ainda poucas e (olhando para nossa presença no mundo) insuficientemente expres­sivas da nossa missão. Entretanto Dom Bosco nos havia profeticamente colocado na vanguarda.

Um sentido atualizado da nossa fidelidade deve levar-nos a atualizar hoje o carisma de Dom Bosco com a mesma magnanimidade de doação e inventiva com que ele inseriu a sua ação pastoral no contexto e nas possibilidades da época.

Devemos considerar o vasto campo da Co­municação Social como um lugar de interessantes e eficazes “novas presenças” para a Con­gregação e para a Família Salesiana.

Serão iniciativas genuinamente nossas e promissoras, ainda que não sejam fáceis nem improvisadas.

Abrem-se aqui horizontes de esperança: há um espaço especial para o Salesiano Coadjutor, há uma exigência de programação mais coorde­nada com as Filhas de Maria Auxiliadora, há um grande apelo, com a intensidade de um brado, à toda a Família Salesiana: “... filhos de Dom Bosco, unamo-nos!”.

É preciso que levemos realmente a sério a criatividade incansável do nosso Santo Fun­dador para a salvação da juventude e do povo.



Formação do Salesiano para a Comunicação Social

É um tema tratado explicitamente pela “Ratio”, que também apresenta, de maneira orgânica, linhas orientadoras para um plano básico, a começar das etapas iniciais até a formação permanente.16

Trata-se de “uma preparação séria para a Comunicação Social, ao menos e sobretudo no que concerne à formação de receptor e comu­nicador. O salesiano receptor e comunicador é uma pessoa capaz de colocar-se em atitude críti­ca e, portanto, livre e dialógica, no plano lin­guístico e cultural, com os conteúdos e as men­sagens que lhe sejam ofertadas pela imprensa, pelo rádio, pelo cinema e pela TV; é, além disso, capaz de exprimir, propor e testemunhar a própria fé e transmitir em dimensão educativa aos jovens os conteúdos teológicos, éticos, so­ciais e culturais, utilizando adequada e corretamente a linguagem e os instrumentos da comu­nicação de massa e da comunicação de grupo”.17

É um compromisso formativo muito atual que toca o nosso coração.

O coração de consagrados: enquanto a fé de “religiosos-no-mundo” nos faz conhecer e distinguir com clareza e julgar com coragem evangélica o trigo e o joio; e enquanto o seguimento de Cristo, ou seja, de “religiosos-não-do-mundo”, exige de nós o bom senso da temperança e a pedagogia de tuna ascese e mortificação concre­tas, tanto pessoais como comunitárias.

Toca também e de maneira muito parti­cular o coração de evangelizadores, enquanto a caridade pastoral nos impele a ajudar os jovens e o povo no reto uso das linguagens e das “mídias” na crítica, na percepção dos valores, na pro­posta supletiva e complementar; o Salesiano deve saber promover iniciativas inteligentes que es­timulem a atividade e o protagonismo dos des­tinatários para torná-los agentes de comunicação sadia e educativa nos nossos ambientes.

Este empenho de formação do nosso pes­soal deve agora ultrapassar a fase do diletan­tismo e da boa vontade para evitar as improvi­sações e concretizar-se em programas orgânicos que assegurem um mínimo de com­petência pessoal nos Irmãos. O Capítulo Geral 21 convida-nos a deixar certas reservas e ati­tudes puramente negativas que na prática mostraram-se inaceitáveis e apostolicamente estéreis.

Por analogia com o que fez Dom Bosco no século passado, devemos ultrapassar a pas­sividade de um critério unicamente defensivo e realizar verdadeira mudança de mentalidade. Não esqueçamos que a Comunicação Social entra na nossa missão como um dos seus servi­ços principais. Convido-vos a reler a respeito também os artigos 27, 28 e 29 dos Regulamentos.

É importante, pois, que assumamos nos nossos centros de formação e nas Inspetorias o plano básico formativo da “Ratio”. Assumi-lo com seriedade, ainda que gradualmente, com objetivos concretos a serem alcançados (salesiano-receptor, salesiano-comunicador, salesiano-especialista, salesiano-produtor de programas); com conteúdos formativos distribuídos nas várias faixas de formação; com metodologia adequada e descoberta de bons professores, servindo-se com inteligência da colaboração de pessoas capacitadas.



Promoção da informação salesiana



Em julho de 1977, ano centenário do Bo­letim Salesiano, o P. Luís Ricceri escreveu uma circular sobre “As notícias de família”,18 em que insistiu egregiamente na indispensabilidade da chamada “informação salesiana”. As suas reflexões são importantes e válidas ainda hoje.

Ante o crescimento acelerado da Comunica­ção Social, o P. Ricceri descobria infelizmente a crise da nossa informação, que atenua de maneira perigosa o nosso sentimento de pertença à Congregação e à Família Salesiana. Sublinhava a urgência de um empenho unânime e efetivo que nos ponha em mútua comunicação “sem triunfalismos, mas serena e objetivamente”... “Há um provérbio — escrevia — que vale não só para os noivos ou os esposos, mas também para os religiosos perante sua Congregação e seu ideal: ‘Longe dos olhos, longe do coração’”.

Recentemente, a “Ratio”, preocupada também com o maior conhecimento dos valores de Família, apresentou um quadro rico e detalhado de sugestões sobre as chamadas “matérias salesianas”19 com abundância de indicações.

Sem uma informação substancial sobre as origens, a história e a vida atual da nossa Con­gregação e da Família Salesiana não há sufi­ciente circulação de linfa vital no organismo, faltam impulsos válidos de identidade e o senti­do de pertença se atrofia.

Ao contrário, com uma informação adequada (que seja circulação e comunicação de valores salesianos), cresce a vitalidade, enriquece-se a consciência e o entusiasmo pela própria vocação e cria-se a alegria familiar.20

Se considerarmos com atenção essas orientações autorizadas, perceberemos de imediato que são três os níveis sobre os quais devemos concentrar a informação salesiana:

elementos de história salesiana, dos quais têm absoluta necessidade os que perten­cem à Família de Dom Bosco. Sabemos que “o carisma dos Fundadores é uma experiência do Espírito Santo” transmitida no tempo com a sua tradição concreta;21

conteúdos de reflexão sobre a realidade salesiana: consciência teologal da nossa vocação na Igreja, aprofundamento do espírito de Dom Bosco, do seu Sistema Preventivo etc. Todos valores dos quais se tem absoluta neces­sidade para a ação, porque “nada há mais prático do que uma ideia clara”;

notícias de atualidade de família, sobre­tudo através das nossas publicações periódicas, para ligar o passado ao presente e superar as distâncias geográficas, colhendo assim a continui­dade e integridade do projeto de Dom Bosco que se realiza no tempo e no espaço.



Já estamos caminhando segundo essas linhas de informação salesiana, mas sempre neces­sidade de melhorar e crescer.

Com relação aos dois primeiros níveis, que se referem a quanto se vem chamando de “Salesianidade”, deve-se produzir, divulgar, traduzir, adaptar, intensificar a sua assimilação.22 Entre as causas de certo desânimo e obscurecimento dos valores do Sistema Preventivo nas nossas comu­nidades, o Capítulo Geral 21 nos diz que “uma explicação pode também ser dada pela escassa disponibilidade de documentação e literatura específicas na própria língua”.23 Por isso, entre as linhas de ação a promover, o Capítulo indica que “as Conferências ou Grupos linguísticos devem providen­ciar bibliografia salesiana suficiente e atualizada na própria língua. É também desejável a forma­ção, a nível regional, de grupos de estudos sa­lesianos, com possibilidade de serviços e publicações”.24

Quanto ao terceiro nível das “notícias”, reveja-se a citada carta do P. Ricceri. Também hoje Dom Bosco deve ser notícia: a Congrega­ção e a Família Salesiana têm necessidade das “notícias de família”.

Para tanto é preciso que haja instrumentos para divulgar essas informações e Salesianos preparados para fazê-lo. Pessoal, pois, no centro da Congregação (onde se criou o Secretariado da Comunicação Social), pessoal para os Bo­letins Salesianos locais e os Noticiários Inspetoriais... E ainda Irmãos e membros da Famí­lia Salesiana aos quais sejam confiadas outras publicações para a animação e o conhecimento da nossa vida.

Congratulo-me com os que já trabalham neste campo. Devemos reconhecer que a infor­mação salesiana já tem agentes beneméritos através de alguns canais autorizados que apre­sentam com periodicidade um material escolhido e válido:

  • os “Atos do Conselho Superior” (ACS) “órgão oficial para a promulgação das diretrizes do Conselho e para as infor­mações salesianas”,25 publicação trimes­tral confiada aos cuidados do Secretário Geral;26

  • o “Boletim Salesiano” em língua italia­na (BS), revista quinzenal de informação e de reflexão da Família Salesiana, “redi­gida segundo as diretrizes do Conselho Superior”;27 está sob a alta responsabili­dade do Conselheiro para a Família Salesiana;

  • a “Agência Notícias Salesianas” (ANS), noticiário mensal do Departamento de Imprensa do Secretariado central para a Comunicação Social; oferece as mais recentes informações da atualidade salesia­na no mundo;

  • o “Dossiê Boletins Salesianos” (DBS), publicado pelo Secretariado central da Comunicação Social, com material já elaborado para colaborar com os Bole­tins Salesianos locais;

  • os “Noticiários Inspetoriais” (NI), com notícias de família dentro das Inspetorias e sob a responsabilidade do Inspetor; há já alguns anos animam com re­sultado positivo a comunhão dos Irmãos e das comunidades.



Além disso tudo, será preciso cuidar também da formação salesiana “para fora”; aqui, sim, é preciso um despertador para acordar-nos! Hoje é necessário que não só no Centro, mas que onde quer que exista uma obra nossa, nos preo­cupemos em “construir, com a informação pro­fissionalmente correta, uma imagem positiva, isto é, agradável e significativa, da realidade salesiana local e mundial”.

É também importante escrever nos jornais, enviar fotografias, relatórios, crônicas vivas do que se faz a serviço dos jovens e nas missões, e informar também as emissoras de rádio, con­vidar a televisão a gravar algum “fato expressivo da nossa casa”. Devem-se evitar, é óbvio, atitudes triunfalistas, mas não fará mal alguma publici­dade do “bem”, num mundo tão cheio de reali­dades tristes; isso entra claramente no estilo de Dom Bosco: “Assim deve resplandecer a vossa luz diante dos homens, para que vejam o bem que fazeis e dê graças ao vosso Pai que está no Céu”.28



A Comunicação Social envolve-nos a todos



Vimos que a Comunicação Social atinge de certo modo toda a vida do homem de hoje, sendo motor particularmente eficaz de dina­mismo cultural. O Salesiano, agente de apos­tolado, encontra-se envolvido pela Comunicação Social quer nos aspectos positivos de informa­ção, educação, divertimento, estudo e aprofun­damento, ação social... quer nos aspectos ne­gativos de superficialidade, pressão ideológica, justificação do mal, pornografia, consumismo, vacuidade de ideais... Encontra-se, com efeito, continuamente com os instrumentos da Comu­nicação Social nas mãos, e usa-os da manhã à noite: livros, jornais, discos, cassetes, filmes, filminhos, rádio e televisor...

É verdade que algumas atividades no âm­bito da Comunicação Social são estritamente reservadas a poucos especialistas, mas em certo nível (como indicamos) a Comunicação Social compromete e responsabiliza a todos.

Partindo das especializações e descendo às atividades habituais de todos, a Comunicação Social pode envolver-nos nos seguintes papéis:

  • estudiosos pesquisadores no campo da Co­municação Social;

  • formadores dos educadores e dos agentes intermédios;

  • agentes de Comunicação para os nossos des­tinatários (escritores, jornalistas, editores, diretores, técnicos para cinema, rádio, te­levisão);

  • produtores da informação salesiana;

  • agentes intermédios (delegados inspetoriais, responsáveis de livrarias...);

  • educadores dos receptores (jovens e clas­ses populares);

  • simples receptores e usuários.


Como se vê, a Comunicação Social envolve a todos nós. E nos envolve precisamente enquanto Salesianos, porque nos permite mais eficaz evangelização dos jovens, das classes po­pulares e das missões. Não quereria por isso que alguém fizesse — talvez inconscientemente — uma injusta exclusão dos nossos Irmãos empenhados em atividades especializadas nesta área, por exemplo nas editoras salesianas, no rádio, nos audiovisuais. Seria um grave erro considerar tais Irmãos como salesianos de se­gunda categoria, empenhados em atividades marginais e, no fim de contas, pouco impor­tantes ou mesmo estranhas à finalidade da missão salesiana. Não é assim. Os Salesianos que trabalham na Comunicação Social podem contribuir, e de fato contribuem, para a realização da missão salesiana tanto quanto os Sa­lesianos empenhados nos colégios, nos oratórios, nas paróquias. Antes, trabalham com moda­lidades muito modernas e com grandes possibi­lidades de eficácia.

Procuremos, pois, interessar-nos mais pela Comunicação Social, e com largueza de vistas. Procuremos adquirir adequada competência nela e garantir nas Inspetorias e Casas a apli­cação das orientações da Igreja e dos nossos dois últimos Capítulos Gerais.


Concluindo


Queridos Irmãos, Dom Bosco, levado pela sua inata capacidade de prever o futuro, havia intuído o peso cada vez maior que a Comunica­ção Social estava assumindo. Pôs-se a trabalhar neste campo desde o início do seu apostolado, e disse a propósito da imprensa: “Nesta coisa Dom Bosco quer estar na vanguarda do pro­gresso”. Soube ser santamente audacioso, e, por causa do uso da Comunicação Social de forma incansavelmente voltada à sua missão, contra­riou os inimigos da Igreja e até sofreu atentados à sua vida.

Nós hoje não podemos ficar atrás. “Nós — escreveu o P. Ricceri na citada circular — somos filhos de um encadernador, tipógrafo, impressor, jornalista, escritor, editor”,29 e devemos honrar essa nobre herança.

Deveremos agir com a máxima seriedade e não com leviandade nem improvisação: hoje a Comunicação Social é ciência, é técnica e é arte difícil; requer cultores competentes e sa­crificados. É também arriscada: por muitos aspectos nasce pagã e precisa ser batizada, e pode seduzir e também afastar da vocação e da fé.

Mas é um caminho que nos cumpre percor­rer, segundo também a exortação explícita da Igreja: “Seria impossível, hoje em dia — lemos na Communio et Progressio, nº 126 —, cumprir o mandato de Cristo, sem utilizar as vantagens oferecidas por estes instrumentos que permitem levar a mensagem a um número muito superior de homens”.

Será, pois, conveniente que na “programa­ção inspetorial” tenha-se explicitamente em consideração a Comunicação Social, encar­regando alguém de a orientar e estimular. Na animação de cada comunidade não se es­queça este importante setor.

Peçamos luz e coragem à Virgem Auxilia­dora, que lançou Dom Bosco em tão exigente missão. Ela que profeticamente viu seu misté­rio comunicado nos séculos (“todas as gerações me chamarão bem-aventurada!”), faça com que nos dediquemos magnanimamente a esta atualíssima tarefa.

Sintamo-nos membros responsáveis e ativos do Povo de Deus, que “caminha na história. Chamado a comunicar ou a receber comunica­ção, olha com confiança e até entusiasmo para o futuro e para as promessas que uma idade espacial de comunicações lhe pode oferecer”.30

Queridos Irmãos, inspiremo-nos em Dom Bosco e aceitemos o desafio dos tempos!

Com grande confiança em Deus,


P. Egídio Viganó





1 CG21, 148.

2 Ib.

3 CP, 11.

4 Mc 16,15.

5 Rm 10,14-15.

6 Epistolario, vol. 4. P. 318-321.

7 CP, 12.

8 CP, 1.

9 CP, 6.

10 CP, 8.

11 MICHEL QUOIST, Appuntamento con Cristo, SEI, 1973, p. 23-24.

12 CG21, 1490153.

13 CP, 158.

14 CP, 159.

15 CP, 151.

16 Ratio – anexo n. 3, p. 322-326.

17 Ratio, n. 60.

18 Cf. ACS 287.

19 Ratio – Anexo n. 1, p. 305-313.

20 Cf. AA.VV., La Comunicazione e la Famiglia Salesiana – Collana “Colloqui sulla vita salesiana”, n. 8 – LDC, 1977.

21 Cf. MR, 11.

22 Cf. CG21, 19.

23 CG21, 99 e 153d.

24 CG21, 342.

25 Const. 149.

26 Cf. ACS 291.

27 Reg. 32.

28 Mt 5,16.

29 Carta sobre: As notícias de família, ACS 287.

30 CP, 187.

19