351-400|pt|383 “Vós sois uma carta de cristo, escrita não com tinta, mas com o espírito do deus vivo” (2Cor 3,3)

VÓS SOIS UMA CARTA DE CRISTO, ESCRITA NÃO COM TINTA, MAS COM O ESPÍRITO DO DEUS VIVO” (2Cor 3,3)


Informações e reflexões sobre as últimas viagens



Visita à Albânia (IME) – O Borgo Ragazzi Don Bosco, de Roma – Exercícios espirituais em Fátima – Exercícios espirituais do Reitor-Mor e do Conselho – Visita à Inspetoria de Portugal –Visita à Terra Santa – Sessão intermédia do Conselho Geral – Encíclica sobre a Eucaristia – Visita à Inspetoria da Grã-Bretanha – Presenças de Treviglio e Chiari (ILE) – Visita à Inspetoria Sícula – Visita à Inspetoria de Bilbao – Visita à Inspetoria de Munique – Visita à Inspetoria de Colônia – Festas em honra de Maria Auxiliadora, em Turim – Visita à Inspetoria de Verona (IVO) – Participação na Assembléia Semestral da USG – Visita à Inspetoria Adriática – Conclusão: o aniversário de Dom Bosco.



Roma, 8 de setembro de 2003.

Festa da Natividade da B. V. Maria


Caríssimos irmãos,


Saúdo-vos com afeto, em qualquer parte do mundo onde vos achais, especialmente em regiões distantes e isoladas ou em situa­ção de dificuldade e risco. Acompanhamos com preocupação o decorrer dos acontecimentos em vários países da África: Costa do Marfim, República do Congo, Ruanda, Burundi, Libéria, que foram – e continuam a ser cenários de violência, guerra e inquietação social. Há necessidade de reconciliação e de paz, de estabilidade e tranqüilidade para poder construir as condições de uma vida realmente humana. Se a morte de tantas pessoas inocentes provoca horror, causa comoção a sorte de meninos adolescentes e jovens, privados de esperança e de futuro. Quereria estar com todos e dizer-vos ainda que estou perto de vós e que aprecio vossa generosa dedicação. Encorajo-vos, pois, a dar testemunho do amor que Deus tem pelos jovens.


Escrevendo à comunidade de Corinto, São Paulo responde aos opositores que lhe contestavam a autoridade de apóstolo e a legitimidade do seu evangelho. A credibilidade da sua ação não provém do testemunho de outros e de experiências esotéricas, mas do Espírito que age nos corações dos homens para mudá-los e torná-los dóceis à palavra evangélica. É a própria existência da comunidade a sua “carta de recomendação”. A fé sólida e a operosa caridade da comunidade são as melhores credenciais: “Vós sois uma carta de Cristo, escrita por mim não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo” (2Cor 3,2-3). A primeira metáfora já era ousada, a segunda é surpreendente: no nascimento da comunidade age a força vivificante do Espírito; e o resultado é a criação de pessoas novas, abertas e dóceis ao projeto salvífico de Deus.

Estou certo de que o nosso amado Pai Dom Bosco, sentindo-se orgulhoso de seus filhos, das presenças educativas e pastorais espalhadas por tantos países do mundo, do serviço prestado aos jovens pobres mediante uma variegada multiplicidade de obras, parafraseando as palavras de São Paulo poderia repetir para vós: “Vós é que sois a minha carta de recomendação. Vós sois uma carta de Cristo, escrita por mim, mas não com a tinta, mas com o espírito do Deus vivo” (2Cor 3,3). Quanto a mim, é-me dada melhor recomendação diante de Deus e diante do mundo do que vós mesmos? Não, porque também para mim vós sois a minha carta de Cristo.


Depois da minha última carta circular, que provocou em muitos irmãos, comunidades e inspetorias o desejo de fazer uma avaliação do modelo de vida consagrada que estamos vivendo, com a vontade de converter-se sempre mais a Cristo e ao seu Evangelho e o compromisso de realizar uma vida mais autêntica e significativa, mais profética e eficaz, dirijo-me de novo a vós com o desejo de partilhar algumas notícias e reflexões de minhas últimas viagens.

O escopo, como sabeis, é sempre o de dar a conhecer e valorizar tudo o que sois e estais fazendo, recolher os desafios que a missão salesiana encontra, refletir em voz alta, procurando haurir em nosso rico patrimônio salesiano, para responder-vos com a mente, o espírito e a capacidade empreendedora de Dom Bosco.

Será a última carta desse tipo porque, como já havia anunciado, alternarei as cartas de conteúdo doutrinal com a apresentação das oito Regiões da Congregação. Não vos preocupeis, pois, se não falo de todas as inspetorias que visitei. Não é, por certo, sinal de esquecimento, nem falta de estima.


Visita à Albânia (IME)


Na primeira parte de fevereiro, num fim de semana, fiz uma visita à Albânia. Celebrava-se o décimo aniversário da presença salesiana nessa parte dos Bálcãs, que inicialmente havia sido confiada pelo padre Egídio Viganó à responsabilidade das quatro inspetorias italianas IME, IRO, ISI e ISA e que desde 1997 depende somente da Inspetoria Meridional.

Chegados em 24 de setembro de 1992, os primeiros salesianos empenharam-se por um lado no setor catequético, a fim de ajudar as Igrejas de todo o país a superar decênios de propaganda atéia, e por outro no setor da formação profissional e no oratório-centro juvenil, para dar ao menino educação integral, formação profissional e encaminhamento ao trabalho, independentemente de sua situação cultural, religiosa, social.

Em 1999, durante a guerra em Kosovo muitos fugitivos encontraram no nosso campo de refugiados de Tirana uma acolhida fraterna e conheceram um centro que despertou neles o desejo de ter uma obra semelhante em Kosovo. A resposta do padre Juan Vecchi foi positiva, e assim iniciou-se a nossa presença de Prístina, que nos próximos meses abrirá o centro profissional.


Desde minha chegada a Tirana fui surpreendido pela acolhida dos jovens que freqüentam o oratório e o centro de formação profissional Don Bosco. Superado o período difícil da guerra, hoje com 500 alunos, tornou-se o centro de formação mais significativo do país. A presença de Tirana compreende um complexo de obras, que inclui entre as outras uma experiência de empresa juvenil. O Projeto Pony-Express, com efeito, dá trabalho a 70 jovens escolhidos entre os órfãos que vivem em estruturas estatais, a meninos de rua, a deficientes. Na paróquia Maria Auxiliadora, ao norte de Tirana, o oratório-centro juvenil, juntamente com as costumeiras atividades de educação e animação, empenha-se em favor dos meninos nômades rom em colaboração com o Unicef. Aqui há muito ainda o que fazer para poder prestar um serviço mais sistemático a este arrabalde necessitado.

Na capital da Albânia pude verificar o alcance da nossa presença, vendo a grande estima que dele têm as autoridades. Elas estiveram presentes ao debate público sobre: “Os desafios educativos dos jovens num mundo globalizado”, no qual pude esclarecer o motivo da nossa presença na Albânia, isto é, a vontade da Congregação e da Família Salesiana de estar presente onde houver jovens por educar. Está aí uma das flores na lapela do Voluntariado Internacional para o Desenvolvimento (VIS), que se empenhou na reconstrução do país por meio do centro de Tirana, não somente com dinheiro, mas também com voluntários, que estão realizando uma experiência muito positiva e entusiasmante.


Durante a visita celebrou-se outro importante acontecimento: a consagração da igreja intitulada a Dom Bosco em Scutari. É um belo templo, que animará toda essa presença, que compreende a casa de formação para aspirantes e noviços, o oratório-centro juvenil, a paróquia e, sobretudo, como elemento caracterizante, o centro catequético, antes nacional e agora diocesano. A nova igreja é um sinal de gratidão a Deus pelos dez anos de presença salesiana na Albânia e estímulo de renovação do compromisso educativo dos salesianos e da Família Salesiana nessa nação. Na situação atual de transição do país, é urgente concentrar todas as forças para preparar os jovens albaneses a serem co-responsáveis e atores da mudança.

É também satisfatório o estímulo que a Família Salesiana tem em ambas as obras de Tirana e Scutari. Após dez anos encontramo-nos com uma presença salesiana fecunda, onde a Família de Dom Bosco está se desenvolvendo bem. Apareceram também vocações salesianas locais, que ajudarão a consolidar e fazer crescer esta delegação.


Uma presença como esta faz ver a capacidade da Congregação de responder aos novos desafios, eclesiais e sociais, a sua contribuição específica pela educação num país em reconstrução, a novidade na forma de vir ao encontro das necessidades, isto é, o trabalho em rede que cria sinergia, envolvimento das ONGs, para o financiamento, o empenho do voluntariado, o esforço da inculturação do carisma, o cuidado das vocações do lugar. Vendo essa presença que apenas nasceu, fica-se surpreso diante da criatividade carismática salesiana: faltam recursos e pessoal, mas não fé e iniciativa.


Além da visita na Albânia, estive novamente, em meados de junho, na Inspetoria Meridional, para a celebração do centenário da obra de Portici. Como em outros lugares, também aí foi-me conferida a cidadania honorária, que aceitei de boa mente em nome dos irmãos que durante cem anos trabalharam para o bem da juventude pobre e necessitada. Eles é que merecem a cidadania. A eles vai o reconhecimento! Podereis talvez perguntar por que falar do consenso e apreço que a obra salesiana conseguiu despertar na cidade. Pois bem, porque todos os blocos políticos presentes na prefeitura expressaram-se unanimemente em termos tão encorajadores que me senti orgulhoso de ser salesiano e agradecido aos irmãos que aí trabalharam. Em Portici, Dom Bosco estaria muito à vontade!

Momento de grande comunicação foi o encontro com os jovens do MJS, provenientes de toda a inspetoria. Fico sempre admirado diante da abertura e da sensibilidade dos jovens; quanto bem podemos fazer, se formos capazes de fazer propostas de qualidade! Assim magistralmente operava Dom Bosco e assim nós também somos chamados a fazer.


O Borgo Ragazzi Don Bosco, de Roma


O fato de a Casa Geral encontrar-se em Roma torna possível a participação do Reitor-Mor em freqüentes encontros, reuniões e celebrações na Inspetoria Romana. Ainda que tenha visitado diversas presenças, vou falar do Borgo Ragazzi Don Bosco, que há cinqüenta anos presta serviço a centenas de adolescentes e jovens da periferia de Roma e que visitei no começo de março. Estavam presentes muitas autoridades civis.

Uma coisa digna de atenção, além do envolvimento das forças políticas e sociais que encontram no Borgo uma obra muito válida, hoje como cinqüenta anos atrás quando foi criada por impulso da Igreja e da Congregação para cuidar dos sciuscià, é descobrir a vontade dos irmãos de continuar a “sonhar” com e pelos jovens em dificuldade, aos quais se oferecem diversos tipos de programas educativos: a casa-família para meninos e meninas mães, o centro de formação profissional com 300 meninos, os projetos SOS “ascolta giovani”, a semi-autonomia, a entrega familiar, a animação territorial e a capacidade juvenil de empreender. Há, pois, uma expressão eloqüente dessa sensibilidade social que muito me espantou, ou seja, a criação da “Operação Argentina” para ajudar os meninos pobres daquele atribulado país. Diria que não é habitual ver uma obra social, que vive justamente de subsídios de outros, preocupar-se em ajudar a quem está mais necessitado. Esta é solidariedade cristã!

O Borgo pertence àquele tipo de obras que são significativas em si mesmas, pela colocação geográfica, pelos destinatários, pela variedade das ofertas educativas, pela identificação dos numerosos colaboradores, e ao mesmo tempo pelo envolvimento das autoridades políticas e das instituições privadas, para resolver em sinergia um problema social e oferecer esperança e futuro aos jovens. Não se deve esquecer o fato de que o bispo aceitou a proposta de fazer da nossa igreja a primeira paróquia juvenil, portanto com um sentido menos territorial e mais pastoral a serviço dos jovens, em linha com o artigo 40 das Constituições, segundo o qual toda casa salesiana “é paróquia que evangeliza” os jovens. Espero possamos merecer esse gesto de confiança e realizar um modelo do que poderia significar uma paróquia juvenil na cidade, que é sede do vigário de Cristo.


Exercícios espirituais em Fátima


De 16 a 22 de março preguei os exercícios espirituais aos diretores SDB e às diretoras FMA das inspetorias meridionais da Itália. Conquanto não seja a única experiência em que diretores e diretoras fazem os exercícios juntos, gostaria de destacar positivamente. A Família Salesiana cresce em unidade como fruto da escuta comum da Palavra, da iluminação partilhada dos critérios de vida e de missão salesiana, da oração conjunta. Evidentemente esta não é a única forma. Nem se está dizendo que o resultado esteja garantido: ele depende da preparação e das atitudes. Certamente, é um sinal de comunhão não indiferente.

Pude constatar a boa preparação da experiência espiritual, para que não fosse preciso improvisar. Isso ajuda fazer com que as coisas saiam bem, a garantir a “estética” da liturgia, não em sentido formalista, mas em sentido mistagógico, a criar um clima favorável ao encontro com Deus. Certamente, no fim, tudo depende de cada participante. Mas a atmosfera ajuda e muito!

Gostaria de lembrar o lugar dos exercícios: Fátima, junto ao Santuário e à capelinha das aparições, com uma enorme praça, que impressiona pelo recolhimento e pelo clima de oração; é de fato um lugar “sagrado”. Impressionou-me verificar o que havia conseguido gerar um acontecimento simples e humilde, que teve como protagonistas três crianças pastorinhas. Hoje em Fátima pode-se experimentar a força da presença de Deus. Não há dúvida: o humilde atrai o Deus de Jesus Cristo.


O que me faz refletir é o fato que toda a Congregação, ou seja, os cerca de 17 mil irmãos e noviços, todos os anos durante uma semana vivem uma forte experiência, como a dos exercícios espirituais. O mesmo se diga das FMA e de quase todos os grupos da Família Salesiana. Trata-se certamente do compromisso institucional e da oportunidade pessoal mais importante para a renovação e o relançamento espiritual. É mister lembrar, porém, que o proveito pessoal, comunitário e institucional depende da atitude de cada um para acolher essa graça e progredir na vida espiritual e pastoral, impulsionado pelo Espírito Santo, que opera maravilhas naqueles que lhe são dóceis e o tomam como guia.

O artigo 91 das Constituições, ao descrever a natureza e os objetivos do retiro mensal e dos exercícios espirituais, traz este título: “momentos de renovação”. Os retiros e os exercícios, unidos ao esforço constante de vigilância e prática freqüente do sacramento da Reconciliação, são como os três elementos de base do nosso caminho penitencial. Trata-se de uma pedagogia e de uma disciplina – no melhor sentido da palavra, que é o de itinerário ascético para tornar-se discípulos – que nos colocam na “escola” de Jesus, deixando que Ele seja o Mestre e pondo-nos a seus pés para ouvi-lo como fez Maria de Betânia, que escolheu a parte melhor. Não nos aconteça cair na tentação de Marta, que queria ensinar a Jesus o que devia fazer, invertendo os papéis: “Dize à minha irmã...” (cf. Lc 10,38-42). Acolhida e escuta estão a serviço da realização da vida cristã e religiosa, que se deveria considerar – como diz Karl Rahner – um processo de conversão permanente.


Dois termos bíblicos podem ajudar-nos a precisar melhor a natureza desse processo e, por conseguinte, a viver com maior consciência esses “momentos de renovação”.

No Antigo Testamento, a forma típica para falar da conversão se exprime com o verbo “shub”, que significa “voltar”, aludindo claramente à experiência originária da relação amorosa de aliança entre Javé e Israel. Ele tem uma evidente conotação personalista: reencontrar o amado. O texto mais eloqüente é o de Oséias: “Então dirá: ‘Voltarei do meu primeiro marido porque para mim então era melhor que agora’... Por isso [diz Javé], a seduzirei, a conduzirei ao deserto e falarei ao seu coração... Lá ela responderá como nos dias da sua juventude, como o dia em que saiu da terra do Egito” (cf. Os 2,9.1-17).

No Novo Testamento, ao invés, o termo usado invariavelmente é “metanoia”, traduzido ordinariamente por “conversão”, mas que à luz dos muitos textos em que se encontra, significa melhor “inversão da mente”, isto é, uma mudança na maneira de ver, de julgar e de viver. Trata-se, afinal, de uma “nova avaliação” como a chamada “conversão de São Paulo” (At 9; Gl 1,15; Fl 3,7-14; 1Tm 1,12-16), na qual tudo o que antes se julgava valor e ganho, agora é considerado perda e coisa digna de desprezo, diante do encontro do que vale de fato: Cristo, o Senhor.

Penso que os dois termos “volta” e “transformação” não se excluem mutuamente. De fato, nós que fizemos uma opção de fé nele e de seguimento e imitação dele, isto é, nós que nos “convertemos a Ele”, somos convidados constantemente a “voltar a Ele”.

Converter-se a Cristo é, pois, “partir novamente de Cristo”, isto é, “reencontrar o primeiro amor, a centelha inspiradora da qual se iniciou o seguimento. É seu o primado do amor” (RdC 22).

À luz desses textos, torna-se mais compreensível o artigo constitucional que afirma que os exercícios “são tempo de retomada espiritual”. A expressão evoca a “memória bíblica” e nos lembra outra passagem evangélica: a cena de Jesus com os seus discípulos, que voltam de sua primeira experiência apostólica entusiasmados com “tudo o que tinham feito e o que haviam ensinado”. Jesus responde a essa euforia com o convite: “Vinde também vós à parte, num lugar solitário, para descansar um pouco” (Mc 6,30-31). Esse texto é parte daquela passagem que por excelência indica o que chamamos de “caridade pastoral” (Mc 6,30-44). Com efeito, como se pode conseguir amar como verdadeiros pastores os nossos destinatários, sem repousar antes, sozinhos, com Jesus? De quem e como aprender a ter compaixão do povo extraviado, se não de Cristo, como Dom Bosco aprendeu (cf. Const. 11)?

A chave de compreensão do texto é oferecida tanto por aquele “também vós” como por aquele “para repousar”. Com efeito, os evangelistas constataram unanimemente que Jesus se retirava para rezar. Pois bem, isso é o que Jesus chama “repousar”, “recuperar-se”, uma expressão com profunda ressonância antropológica e mística, como mostra a nossa experiência humana, que nos diz que nada é tão reconfortante como a intimidade, o entrar em comunhão profunda com Deus. A esse tipo de repouso Jesus convida “também a eles”.

O nosso tipo de vida, que apresenta várias atividades e reduzidas práticas de piedade em comum, corre o risco de fazer-nos cair no frenesi do ativismo, com a sua tríplice conseqüência: cansaço físico, estresse psíquico e superficialidade espiritual que, em vez de converter-nos em “contemplativos na ação” faz que sejamos, no melhor dos casos, o que se diz “workaholic”, manía­cos do trabalho, ou no pior dos casos, simples “funcionários” mais que missionários.

A única maneira de enfrentar tais conseqüências negativas do ativismo é dar profundidade à nossa vida, ganhar em significatividade e enchê-la de dinamismo que nos faça viver não “burocraticamente”, fazendo o que devemos fazer, mas “cria­tivamente” à imagem do nosso Deus e Pai Criador (cf. Jo 5,17-18) e “salvificamente”, prolongando a ação salvífica do Senhor Jesus (cf. At 3,1-10), é o tornar-se antes “contemplativos na oração”. Na intimidade com o Senhor voltaremos a lembrar que o “patrão” da vinha e da messe é Ele, que quem “faz crescer a semente” é Ele, que quem marca os ritmos é Ele. Assim também na intimidade com Ele aprenderemos os segredos do seu Reino, aprofundaremos o seu plano de salvação, faremos nossa a sua caridade pastoral.


Sempre segundo o artigo 91 do nosso Projeto de Vida, retiros e exercícios espirituais oferecem-nos três meios privilegiados:

Escutar a Palavra de Deus. O artigo 87 atribui à escuta a capacidade de ser “fonte de vida espiritual, alimento para a oração, luz para conhecer a vontade de Deus nos acontecimentos, força para viver em fidelidade a nossa vocação, com a condição de que como a Virgem Maria acolhamos a Palavra incondicionalmente, guardemo-la no nosso coração e façamo-la frutificar.

Purificar o coração. Isso exige retificar e amadurecer motivações e significados, conscientes do valor e do dinamismo estimulante que têm hoje os “significados”, os que dão sentido à vida, e purificar sentimentos, especialmente os desordenados quer por causa da dependência excessiva das manifestações externas de afeto, estima e valorização, quer por ressentimento, amargura e frustração.

Discernir a sua vontade. Isso em última instância é o que importa: disso depende a nossa felicidade. Também aqui, Maria na anunciação se apresenta como modelo de busca da vontade de Deus na própria vida (cf. Lc 1,26-38). O discernimento, mais que fato pontual – como recurso nos momentos de crise ou na tomada de decisões importantes – deve ser uma atitude de vida que nos leva a buscar “a vontade de Deus, o que é bom, agradável a Ele e perfeito” (Rm 12,2b).


O fruto é duplo e não poderia ser mais apetecível: antes de mais, o de ganhar em unidade interior, justamente quando tudo favoreceria a desintegração, às vezes até levando a situações patológicas. Em segundo lugar, o de reavivar a espera do Senhor, que tardando a sua vinda poderia levar-nos a deixar de esperá-lo e a procurar simplesmente sobreviver. De alguma maneira é a isso que nos leva este tempo em que se proclama a “morte das utopias”.


Exercícios espirituais do Reitor-Mor e do Conselho


Porque ligado ao tema acima desenvolvido, desejo dar meu testemunho pessoal do curso de exercícios espirituais do Conselho Geral, pregado pelo padre Pietro Braido na última semana de junho. Foi mesmo um “itinerário espiritual” sob a guia sábia de um genuíno cultor e enamorado de Dom Bosco, que nos tomou pela mão, nos fez percorrer as grandes etapas do caminho exterior e interior do nosso amado Pai, aquecendo-nos o coração. Enquanto nos recordava a biografia, o pregador nos oferecia alguns critérios para “Caminhar para o futuro com Dom Bosco ‘pai dos jovens’”; esse era o tema dos exercícios.

Foi ponto de partida a afirmação do princípio que Dom Bosco é para nós SDB não somente ponto de referência, mas modelo de vida; o que nos estimula a conhecê-lo e compreendê-lo na totalidade da sua existência.

A perspectiva do pregador, que queria ajudar-nos a olhar para Dom Bosco no seu devir histórico, permitiu-nos compreender melhor seu amadurecimento pessoal, a iniciativa de Deus que o guiava, o desenvolvimento da sua obra. Ofereceu-nos também uma visão de conjunto do que é a vida salesiana em seus componentes fundamentais: identidade, lugar na Igreja e papel social, missão entre os jovens e método educativo, comunidade de vida e de ação, estilo dos conselhos evangélicos, especificidade da espiritualidade, perfil do salesiano em formação, tipo de animação e governo.


Apresentando um pequeno comentário ao tema, gostaria de partilhar convosco alguns pontos da mais ampla reflexão feita pelo pregador e as ressonâncias que em mim despertaram.

Caminhar. Para Dom Bosco, como para todos os salesianos, a vocação não é algo abstrato, mas um pôr-se em movimento e uma experiência de vida semelhante à de que fala o evangelho de João: “Vem e vê” (cf. Jo 1,39). Dom Bosco plasmou os seus salesianos, mais narrando que dissertando. Isso significa que a vocação salesiana deve continuar a ser entendida, apresentada e vivida desse modo. É uma experiência que se torna imediata, fascinante, convincente, propositiva. Talvez fosse isso que o padre Viganó queria mostrar ao escrever que “o nascimento do salesiano dos tempos novos começou com Dom Bosco”: ele é o nosso “incunábulo”. Hoje, como ontem, precisamos realizar a pastoral vocacional e plasmar os salesianos “narrando”, reportando-nos com maior freqüência e explicitamente a Dom Bosco, à maneira do padre Barberis, um dos seus biógrafos, que enquanto narra as “antiguidades” do Oratório de Valdocco, oferece-nos as razões delas: elas nos instruem nas nossas coisas, nos nossos métodos, no nosso espírito de família. Ao mesmo tempo fazem crescer em nós o sentido de pertença, fazem-nos sentir membros da família, tornam-nos protagonistas.

Para o futuro. É verdade que os jovens são o nosso futuro, mesmo que se deva dizer que eles não são puro sonho ou utopia, porque trazem consigo herança e experiências. Pois bem, Dom Bosco conseguiu ser jovem e assim estar em sintonia com o futuro à custa de estar no meio dos jovens. As exigências dos jovens, suas necessidades, determinaram o futuro de Dom Bosco e ainda hoje orientam e devem orientar as decisões da nossa Congregação.

Com Dom Bosco. É claro que houve na experiência de Valdocco um amadurecimento da missão e, pois, uma passagem da alegria de “ficar com Dom Bosco” ao “ficar com Dom Bosco para os jovens”, do “ficar com Dom Bosco para os jovens de forma estável” ao “ficar com Dom Bosco para os jovens de forma estável com votos”. O ficar com Dom Bosco não exclui a priori a atenção aos seus tempos, que o modelaram ou condicionaram, mas exige que se viva com o seu compromisso, suas opções, sua dedicação, o seu espírito empreendedor e de vanguarda.

Padre dos jovens. O genitivo “dos jovens” é ao mesmo tempo objetivo e subjetivo: isto é, Dom Bosco é padre para os jovens, está para eles e a serviço deles. Ao mesmo tempo é padre dos jovens, pertencendo a eles e sendo solicitado por eles. Ele é todo para os jovens e está sempre com os jovens. O estar com os jovens e ser disponíveis para eles conota profundamente o nosso ser salesianos como Dom Bosco. Nós não podemos pensar-nos distantes, separados, indiferentes em relação aos jovens. A proximidade dos jovens é o primeiro passo que hoje todos nós devemos dar com decisão.


Tudo isso faz de Dom Bosco um homem fascinante, e no nosso caso um pai para amar, um modelo para imitar, mas também um santo para invocar. Merece lembrar, a esse respeito, a carta escrita pelo padre Ricaldone após a canonização de Dom Bosco, na qual se diz: “seria apequenar pensar que Deus mandou Dom Bosco somente para os salesianos ou para a Família Salesiana. Não! Deus o mandou como um dom para toda a Igreja, para todo o mundo. E nós devemos torná-lo conhecido e promover sua devoção”.


No fim dos exercícios estávamos deveras satisfeitos com a experiência realizada. Se para todos os salesianos é importante conhecer Dom Bosco, para tê-lo como ponto normativo de referência, isso se torna uma tarefa imprescindível para o Reitor-Mor e os conselheiros gerais, chamados precisamente a serem seus continuadores na direção da Congregação. Damo-nos conta de que quanto mais aumenta a distância do Fundador tanto mais real é o risco de falar de Dom Bosco com base em “lugares comuns”, em episódios, sem um verdadeiro conhecimento do nosso carisma. Daí a urgência de conhecê-lo através da leitura e do estudo; de amá-lo afetiva e efetivamente como pai e mestre por sua herança espiritual; de imitá-lo procurando configurar-nos a ele, fazendo da Regra de vida o nosso projeto pessoal. Esse é o sentido da volta a Dom Bosco, à qual convidei a mim e a toda a Congregação desde minha primeira “boa noite”, mediante o estudo e o amor que procuram compreender, para iluminar nossa vida e os desafios de hoje. Juntamente com o evangelho, Dom Bosco é o nosso critério de discernimento e a nossa meta de identificação. Aproveito a ocasião para encorajar-vos a ter sempre mais Dom Bosco como referência para a renovação espiritual e pastoral nas inspetorias.


Visita à Inspetoria de Portugal


Logo após os exercícios em Fátima, também para aproveitar a presença em Portugal, fiz uma visita de animação a essa inspetoria, na qual me encontrei, além dos diretores e do conselho inspetorial, com irmãos, grupos da Família Salesiana, alunos das nossas escolas, professores e colaboradores leigos, nas obras de Porto, Mogofores, Lisboa, Manique, Estoril.

Se é verdade que algumas dessas obras impressionam pela qualidade das estruturas prediais, pelo tipo de destinatários, pelo nome que têm na sociedade e diante das autoridades civis, todavia a inspetoria conta um leque de presenças diversas e significativas, também no campo da marginalização e da promoção social.

Lembro três elementos que caracterizam de modo particular a Inspetoria de Portugal. Conhecendo sua história, o que mais se destaca é a sua missionariedade. É oportuno lembrar que essa inspetoria foi, também por razões políticas, responsável pelo nascimento e pelo desenvolvimento salesiano em Goa, em Timor Leste, em Macau, em Moçambique, em Cabo Verde e nas Ilhas Azuis. Embora tenha deixado os três primeiros lugares, continua a levar adiante as obras nos outros três países.

Uma segunda característica é a devoção mariana do Portugal salesiano, devida em parte à influência de Nossa Senhora de Fátima, o que não poderia ser diversamente, mas também pela difusão que lá teve a devoção a Maria Auxiliadora. Para nós salesianos, a piedade mariana é prova e garantia de fidelidade carismática.

Por fim, pode-se destacar a intensa religiosidade popular de todo o país, que oferece grandes possibilidades para uma fecunda pastoral juvenil e vocacional de qualidade. Exatamente porque começa a difundir-se o secularismo, é importante que os salesianos possam ajudar os meninos a enfrentá-lo mediante uma educação da fé que leve ao encontro com Cristo e amadureça opções de vida cristã. A próxima beatificação da Venerável Alexandrina da Costa deverá ser um motivo de relançamento da proposta de santidade juvenil salesiana. Será uma maneira eficaz de agradecer a Deus esse dom.


Visita à Terra Santa


No começo de abril visitei a Terra Santa, por ocasião da celebração do centenário da Inspetoria do Oriente Médio, fundada pelo padre Rua em 1902, ano em que o primeiro Sucessor de Dom Bosco erigiu juridicamente 32 inspetorias. A celebração havia sido programada para 12 de maio de 2002, mas a intifada e o toque de recolher obrigaram a adiá-la por duas vezes. Ainda que a situação política continuasse a mesma, antes se houvesse agravado com a guerra no Iraque, decidi estar com os irmãos, que vivem nessa atmosfera pesada já há muito tempo.

A visita foi preparada pelo inspetor com o seu Conselho como uma peregrinação. Por isso estive em Nazaré, onde celebrei a Eucaristia na Gruta da Anunciação com a participação dos irmãos da comunidade, das Filhas de Maria Auxiliadora, de um pequeno grupo de Cooperadores e Ex-alunos. Foi uma ocasião para refletir sobre a vocação à luz de Maria e para aprender dela a responder positivamente ao projeto que Deus tem sobre nós. Isso é possível na medida em que desenvolvemos as atitudes fundamentais de Maria: a contínua busca da vontade de Deus, a acolhida dela como projeto de vida, a docilidade à ação do Espírito Santo de modo que Ele seja nosso guia.

Houve também um encontro com alunos e professores, e um momento de festa com a participação dos membros da Família Salesiana, da comunidade educativa e de autoridades eclesiásticas e civis. O clima de hostilidade contínua e de terrorismo, que privou os lugares santos da presença de turistas e peregrinos, colocou de joelhos a recém-nascida economia palestinense e tornou pesada a atmosfera social.


Prosseguimos com a visita à comunidade de Beitgemal, um lugar belíssimo e de grande valor, situado em contexto hebraico, onde a nossa missão se reduz ao testemunho e à acolhida. Aí celebramos a Eucaristia, na igreja de Santo Estêvão, na qual tomaram parte também a comunidade das Irmãs de Belém e da Virgem Assunta e São Bruno e três irmãos sacerdotes dessa mesma Congregação. Trata-se de duas comunidades religiosas de vida contemplativa, que foram acolhidas na nossa propriedade para nela instalar seu convento.

De Beitgemal dirigimo-nos à Basílica do Santo Sepulcro, onde tivemos um tempo breve, mas intenso de oração diante do Calvário e no próprio Santo Sepulcro. O poder da morte e o triunfo final da vida encontram aí seu melhor ícone. O santuário está todo ele cheio de Cristo e Cristo inteiro está ali, porque tomou sobre si as nossas culpas e a nossa morte, e porque Ele é o primogênito dos que ressuscitam dos mortos. Não posso calar a comoção profunda que senti, como Jesus diante da tumba do amigo Lázaro, pressentindo a força da morte, que tira o sentido à vida, e ao mesmo tempo o dinamismo do amor que vence a morte. Pena que o tempo tirano não nos tenha permitido permanecer mais demoradamente; tinha mesmo necessidade disso.


Fomos então a Cremisan para o encontro com os irmãos do Estudantado, formadores e formandos. Foi um momento muito bonito, como bonito é o ambiente de família que lá encontrei.

Por fim fomos a Belém, onde visitamos a Gruta da Natividade. Dispus aí de um tempo mais longo para rezar. Posso garantir-vos que vos lembrei a todos, enquanto levava comigo as preocupações do mundo, as necessidades da Congregação e da Família Salesiana, as expectativas e as necessidades dos jovens. O Deus encarnado, que fez experiência do que significa ser homem exceto no pecado, é um sacerdote compassivo que intercede por nós junto ao Pai.

Em Belém houve depois um encontro com jovens do oratório e do centro de formação profissional, e com os irmãos da comunidade da Casa do Pão, que realmente honra seu nome, porque, mesmo nas circunstâncias atuais com a economia reduzida a zero, continua a distribuir gratuitamente pão todos os dias.


Ponto culminante da visita foi a celebração do centenário, dia 6 de abril, domingo. Desejou-se privilegiar o reconhecimento a Deus mais que a festa, mesmo porque não seria justo festejar em meio a tanto sofrimento. Na Celebração Eucarística participou um grande número de sacerdotes, salesianos e outros religiosos. Na saudação inicial disse que a visita do Reitor-Mor não queria ser uma simples comemoração, mas queria sobretudo significar o renovado compromisso da Congregação com os jovens da Terra Santa, dos quais queremos continuar a ser companheiros de caminho, como o peregrino de Emaús.

Autoridades civis e eclesiais estiveram presentes à comemoração que se seguiu no salão e teatro da escola salesiana. Valeria a pena conhecer a história da presença salesiana na Terra Santa, que nos foi apresentada, porque foi quase sempre uma história atribulada, o mais das vezes por conflitos externos, que de qualquer maneira nos tocavam de perto. Igualmente se deve conhecer o trabalho feito antes de nós pelo padre Antonio Belloni, que entregou suas obras de Belém, Cremisan e Beitgemal, e a sua fundação Obra da Sagrada Família a Dom Bosco, na pessoa de padre Rua. Somos herdeiros de um grande homem conhecido de todos, com razão, como “Abulyatama”: o pai dos órfãos.


Na minha fala para concluir a visita, indicava aos irmãos as seguintes linhas de futuro.

Dom Bosco e o padre Belloni foram dois padres sensíveis às necessidades dos jovens pobres e em dificuldade. O exercício ministerial tornou-os padres para os jovens e educadores dos jovens, para ajudá-los a amadurecer, a desenvolver todas as suas dimensões, a encontrar o sentido da vida, a ser cidadãos deste mundo, abertos a Deus e aos outros. Não tendes patrimônio melhor do que este: os jovens e a educação.

O padre Belloni caracteriza-se – entre outras coisas – pela sua capacidade de inculturação, que o levou a aprender a língua, a penetrar na cultura dos seus destinatários, a fazer-se um deles. Para nós salesianos, isso vem a ser uma concretização do Sistema Preventivo, que insiste na necessidade de que os meninos não somente sejam amados, mas que saibam e sintam que são amados; o amor torna-se amorevolezza no encontro do outro, na proximidade, na semelhança, no pensar e no falar com o outro e como ele. A inculturação é, por isso, uma tarefa essencial da evangelização e da educação salesiana.

O segredo da fecundidade educativo-pastoral de Dom Bosco e do padre Belloni está no fato de que o estar totalmente dedicados à missão entre os jovens desaguou naturalmente no cultivo das vocações. Elas são fruto de fatores diversos, o mais decisivo dos quais é o ambiente que se consegue criar entre os meninos, de modo que se desperte neles o desejo de partilhar a nossa paixão juvenil e educativa como consagrados apóstolos. As vocações devem ser, pois, uma prioridade da nossa missão nestas terras.

Tanto Dom Bosco como o padre Belloni, conscientes das exigências que comporta o trabalho em favor dos adolescentes e dos jovens pobres, enxergaram tão longe e abriram-se tanto à sociedade civil que souberam envolvê-la em seus projetos e obras para poder ir ao encontro de todo tipo de necessidade daqueles meninos. O caminho está aberto; ele deveria levar-nos a continuar esse empenho, trabalhando mais em rede.

Por fim, essa história atribulada, significativa por colocação, destinatários e missão, foi marcada por um irmão a caminho da beatificação, o venerável coadjutor Simão Srugi, uma figura que ainda em vida impressionou o padre Rua. A santidade é um dos sinais de que houve uma boa encarnação do carisma e continua a ser o melhor dom que possamos oferecer aos jovens.


Sessão intermédia do Conselho Geral


Em abril fizemos a primeira reunião intermédia do Conselho Geral deste sexênio. A iniciativa de realizar todos os anos dois Conselhos intermédios foi promovida pelo padre Vecchi, que sentia a necessidade de maior reflexão por parte do Reitor-Mor e do Conselho sobre temas importantes para a vida da Congregação. Ao mesmo tempo, o Conselho intermédio garantia a possibilidade de encontrar um número significativo de Conselheiros presentes na sede, entre as duas sessões plenárias, para poder resolver os pedidos de autorização, que exigem presença de pelo menos seis Conselheiros.

Embora tenha participado duas vezes no sexênio anterior nesse tipo de reunião e visto seu funcionamento e os objetivos, agora me dei conta do grande valor dessa iniciativa, porque efetivamente nos oferece a possibilidade de um estudo que prepara a reflexão mais ampla em nível de todo o Conselho. Desta vez examinamos concretamente diversos temas.


Promoção da vocação do salesiano coadjutor

Quisemos aprofundar e concretizar novamente o apelo do padre Vecchi às inspetorias, após a beatificação do senhor Artêmides Zatti, de assumir um compromisso renovado, extraordinário e específico em relação à vocação do salesiano coadjutor. Tratava-se de passar dos aspectos comemorativos, que caracterizaram o ano da beatificação, à atenção operativa, com indicações e sugestões bem precisas. Aproveito a ocasião para estimular os inspetores, os diretores e todos os irmãos a estudar a orientação do Conselheiro para a Formação, nos Atos do Conselho Geral (cf. ACG 382, p. 35-49).


Modalidades de realização do Capítulo Geral

Começamos a estudar as possíveis modalidades de realização do Capítulo Geral, para responder à orientação operativa do CG25 (n. 136), que pede ao Reitor-Mor e ao seu Conselho que faça “uma apreciação e proponha uma modalidade de desenvolvimento mais ágil e que vise, além de realizar as disposições constitucionais, a desenvolver um exame da situação da Congregação e a delinear as linhas fundamentais de política congregacional a ser realizada no sexênio seguinte”. Damo-nos conta da necessidade de fazer um Capítulo Geral que, mais que se dedicar ao estudo de um tema particular, como aconteceu nos CG23, CG24 e CG25, parta do estado da Congregação, das suas tendências, dos seus desafios, das suas oportunidades, para definir juntos seu projeto. Já refletimos bastante e estamos chegando à conclusão que será enviada às inspetorias.


Fragilidade vocacional dos jovens irmãos

Examinamos um tríplice aspecto: um psicológico, diante de qualquer problema, dificuldade ou frustração; outro moral, que se evidencia na dificuldade de organizar toda a vida em torno das grandes opções; outro extremo, como é a perda do sentido da vida. Embora já tenhamos feito uma primeira reflexão, o tema merece um aprofundamento maior, tendo presente que o que importa é a maior consistência e solidez, fruto do crescer “humildes, fortes e robustos”.


Temáticas para os próximos Capítulos inspetoriais

Pensamos em alguns temas dos Capítulos inspetoriais, que por um lado devem enfrentar problemas locais e por outro devem responder às solicitações do CG25. Entre os temas apontados, lembro: a elaboração do Plano Orgânico Inspetorial; a atualização da seção formação do Diretório inspetorial, a fim de adequá-lo à nova edição da Ratio, e da seção pobreza e administração; a promoção da vocação do salesiano coadjutor.


Don Bosco International (DBI)

Essa associação é o rosto civil da Congregação Salesiana, promotora de vários tipos de redes de ONGs, como a das Procuradorias Missionárias, e de associações para a realização das diversas dimensões do carisma salesiano. Don Bosco International existe desde o sexênio anterior, com sede em Bruxelas, e deve funcionar sempre melhor para estarmos presentes como salesianos onde quer que se tomem decisões que interessam aos jovens e à educação, e ao mesmo tempo ter acesso a financiamentos para as obras de fronteira.


O Boletim Salesiano

Deve continuar o seu processo de renovação, procurando desenvolver todas as suas potencialidades, e favorecer a ulte­rior coordenação.


Instituto Ratisbonne, de Jerusalém

Havia sido criado para facilitar o diálogo cristianismo-judaísmo; agora essa tarefa foi transferida para outro lugar pela Santa Sé, que nos ofereceu esta sede para nela colocar um Instituto Teológico ou um importante Centro de estudo. Ratisbonne promete vantagens não indiferentes por ser uma presença em Jerusalém, mas implica também conseqüências, como seriam as do futuro de Cremisan. Desde o primeiro momento foi envolvida a Inspetoria MOR através do inspetor e do seu Conselho, como também a comunidade de Cremisan. Neste momento encontramo-nos em fase de tratativas.


Esses mesmos temas foram retomados com uma reflexão mais ampla e aprofundada, durante a sessão plenária do Conselho Geral de junho e julho; a eles acrescentaram-se outros, como a Estréia para a Família Salesiana e a Proposta pastoral para os salesianos em 2004, a revisão do Estatuto da ADMA, a avaliação do projeto Fusagasugá, o “logo” da Direção Geral, o balanço de 2002.


Encíclica sobre a Eucaristia


Na Quinta-feira Santa deste ano, em vez da costumeira mensagem dirigida a todos os sacerdotes, por ocasião do vigésimo quinto aniversário de pontificado, o Santo Padre apresentou a nova encíclica Ecclesia de Eucharistia, uma meditação sobre o mistério eucarístico que evidencia a estreita e inseparável relação entre Igreja e Eucaristia.

O texto é em alguns momentos muito pessoal, com trechos meditativos, alusões à situação pastoral e considerações teológicas. É principalmente uma declaração dirigida à Igreja Católica, pedindo que ela na reflexão sobre a Eucaristia fortaleça o sentido do mistério, sua ligação com a cruz e com a oferta da vida de Jesus, o respeito e a solenidade. Isso a levará a evitar usos impróprios, ambigüidades e instrumentalizações na celebração.

Alguém definiu a encíclica como um pequeno catecismo da fé da Igreja sobre a Eucaristia. A coisa mais importante é, talvez, a insistência sobre lugar central que a Eucaristia deve ocupar na vida pessoal de fé de cada um e na prática litúrgica das comunidades.


Para nós deverá ser um instrumento precioso de renovação para a celebração da Eucaristia e também de ação pedagógica, como foi para Dom Bosco. O convite à admiração diante da manifestação do amor em Jesus para conosco levado até ao extremo (n. 11) é acompanhado pela sinalização dos indicadores que nos fazem ver uma perda de valorização desse sacramento, que vão do abandono da adoração eucarística à redução da celebração a um momento convivial, do desleixo na celebração à perda do sentido do “mistério’’. Não se deveria esquecer que nós somos chamados a ser “mistagogos”, verdadeiros iniciadores dos jovens para o encontro com Deus.

A encíclica, em primeiro lugar, volta a reafirmar que a Eucaristia é o dom por excelência de Jesus, que se oferece por nós e pela nossa salvação. Em segundo lugar, que a Eucaristia realmente edifica a Igreja, não somente porque a Igreja nasce dela, mas porque dela se nutre e nela cresce. Em terceiro lugar, justamente porque é mistério de comunhão, a Eucaristia está necessariamente vinculada à reconciliação, no sentido que nada nos pode separar de Jesus, como diz Paulo, nem mesmo a morte, exceto o pecado, que é negação e ruptura dessa comunhão. Fará bem a todos nós estudar essa encíclica para continuar o impulso dado pelo padre Vecchi, que havia escrito uma carta sobre a Eucaristia, na qual alguns desses elementos já haviam sido expressos.


Convido os irmãos das nossas três regiões européias a começar a aprofundar a Exortação Apostólica pós-sinodal Ecclesia in Europa, sobre a comunicação do evangelho da esperança neste continente: ela será objeto de particular atenção por ocasião da reflexão que faremos com os inspetores dessas Regiões, de 1º a 5 de dezembro de 2004.


Visita à Inspetoria da Grã-Bretanha


No último fim de semana de abril estive na Inspetoria da Grã-Bretanha para visitar algumas comunidades, encontrando os irmãos, e participar em duas reuniões com a Família Salesiana, em Bolton e em Chertsey, onde falei sobre a vocação do salesiano hoje, a começar pela narração de minha vocação e da minha experiência em convidar outros a serem salesianos. Além disso, tive a possibilidade de deter-me sobre a identidade, papel e missão da Família Salesiana hoje.

Fiquei impressionado pela acolhida fraterna e amigável dos irmãos e de todos os membros da Família Salesiana, expressão não apenas da renomada gentileza britânica, mas também do amor e adesão filial a Dom Bosco. As jornadas foram preparadas cuidadosamente por um grupo constituído por diversos membros da Família Salesiana e tiveram grande participação. Estou convencido de que no futuro se deverá trabalhar, em toda a parte, cada vez mais em rede, como Família de Dom Bosco, com plena sintonia, sinergia solidariedade fraterna, como vi acontecer aqui.

Notei com surpresa que a inspetoria, mesmo possuindo duas casas para os irmãos idosos ou doentes, tem um belo número de sacerdotes jovens, com os quais se pode contar para uma presença sempre mais significativa e para uma pastoral vocacional mais fecunda. Gostaria, neste ponto, em linha com quanto escreve João Paulo II na Exortação Apostólica Ecclesia in Europa, exprimir uma palavra de estima, de gratidão, de proximidade e de encorajamento a todos os jovens salesianos, padres e coadjutores, que são um verdadeiro dom de Deus, sinal do seu amor e esperança de futuro (cf. EiE 36-37), e convidar todos a empenhar-se como resposta a esse dom em ser com os jovens e para eles sinal de esperança.


Presenças de Treviglio e Chiari (ILE)


No fim de abril fiz uma visita a duas comunidades da Inspetoria Lombardo-Emiliana: Treviglio e Chiari. Ambas prepararam um programa muito intenso. Em Treviglio deram-se encontros com os estudantes e professores da escola superior e da escola média, com o prefeito da cidade, a visita à Caixa Rural, que ofereceu ao Reitor-Mor o financiamento para a perfuração de alguns poços de água na Etiópia, e a Celebração Eucarística no Santuário de Nossa Senhora das Lágrimas.

Em Chiari iniciou-se o dia com a Eucaristia para os meninos da escola, após a qual houve um encontro com os jovens, a inauguração do prédio da nova escola superior e do oratório-centro juvenil. Dediquei a tarde a um encontro com os cooperadores e os voluntários e a conhecer a realidade do Auxilium, uma obra com forte valência social e missionária; causou-me maravilha ver o que se conseguiu fazer nos corações e na vida pessoal, antes da ação social, por parte de tantos leigos e profissionais, que se tornaram verdadeiros e modernos samaritanos na ajuda aos imigrados e às missões. Concluímos o dia na praça de esportes com o espetáculo “O jardim do gigante”, que me fez pensar na necessidade de fazer renascer e qualificar a educação para a arte e para as expressões artísticas, como caminho tipicamente salesiano de educação e evangelização.

Devo dar graças a Deus pelo zelo pastoral dos irmãos e por todas as iniciativas que levam adiante na educação e no campo social, com grande preocupação pelos mais pobres do território e do mundo.


Visita à Inspetoria Sícula


Durante o ano visitei a Inspetoria da Sicília duas vezes. No começo de maio estive em Caltanissetta, por ocasião do 50º aniversário da presença salesiana; somaram-se outros dois encontros, o primeiro em Zafferana e o segundo em Palermo, onde se deu a reunião com toda a Família Salesiana da Sicília. Pude assim encontrar-me com a maior parte dos irmãos.

Voltei depois àquela inspetoria no fim de agosto para a reunião do Movimento Juvenil Salesiano, que foi uma nova oportunidade de encontro com os irmãos.

As duas visitas permitiram-me conhecer essa realidade, valorizar o que fazem os irmãos no campo da formação salesiana, da escola, da formação profissional, da paróquia, da margi­na­li­zação e promoção humana.

Reconhecida por todos é a dedicação de alguns dos nossos irmãos em defesa das crianças seviciadas, maltratadas e violentadas no bairro Santa Chiara, de Palermo, que forçou a denúncia pública e o fechamento do Oratório, para reabri-lo novamente com maior conhecimento por parte da sociedade civil e das autoridades. Visitando Santa Chiara, dizia ser ele um lugar em que os salesianos devem estar presentes com um tipo de obra mais propositiva, envolvendo toda a Família Salesiana. Faço votos por que, pouco a pouco, esse sonho se torne realidade para o bem de todas as crianças, adolescentes e jovens de um bairro socialmente em risco, para as famílias que aí moram e para o número crescente de imigrados.


Visita à Inspetoria de Bilbao


Na segunda semana de maio, dentro do 75º aniversário da casa de Pamplona, visitei a Inspetoria de Bilbao, onde conheci quase todas as casas, em Bilbao, Santander, Pamplona, Logroño, Burgos, Vitoria, Urnieta, Azkoitia. A agenda dos encontros previa a visita à sala de salesianidade, muito bem cuidada, várias entrevistas no rádio e na televisão, o encontro com bispos, autoridades civis, irmãos, jovens, professores, colaboradores, membros da Família Salesiana e simpatizantes.

Os eventos que mais me impressionaram foram os encontros com os jovens, como o que se deu na Casa de Deusto, no qual participaram numerosos jovens do MJS vindos das diversas presenças salesianas da inspetoria. A alegria, as qualidades artísticas manifestadas na representação do grupo musical Namaskar, a acolhida da mensagem do Reitor-Mor, a vontade de comprometer-se socialmente e de viver com responsabilidade e intensidade a vida cristã lembra-nos o imenso potencial que os jovens representam para a Igreja e para a sociedade, tal como Dom Bosco descobriu, que sempre soube crer neles.

Acrescentam-se ainda os encontros com a Família Salesiana, com as comunidades das Filhas de Maria Auxiliadora, com os centros de cooperadores e ex-alunos bem organizados e empenhados, com os florescentes grupos ADMA, unidos pela Eucaristia e pela devoção a Maria Auxiliadora, muito em sintonia com as bases originais de Dom Bosco.

Não posso deixar de citar um dos salesianos mais afamados dessa inspetoria, o padre José Luis Carreño Echandía, o grande missionário da Índia e das Filipinas a exemplo de São Francisco Xavier, cuja sepultura fui visitar, com veneração, admiração e gratidão, na Casa do Missionário que ele mesmo construiu em Alzuza. Foi um salesiano rico de qualidades humanas, músico, poeta, de inteligência viva e aguda, um sonhador e um realizador, com um espírito de empreendedor à Dom Bosco, de quem se sentia um digno filho.


Sinal de estima por parte das autoridades civis foi a Medalha de Ouro de Navarra que quiseram conferir aos salesianos de Pamplona. Dispõem-se agora a colaborar para a construção do novo centro de formação profissional, como reconhecimento a quanto a Congregação fez no passado e faz no presente pelo desenvolvimento tecnológico de Navarra, com a formação profissional dos jovens. Talvez valha a pena lembrar que é uma inspetoria que se interessou muito, como, aliás, quase todas as inspetorias da Espanha, pelos centros de formação profissional. A relação com as autoridades e seu envolvimento, onde é factível, não é indiferente, porque a educação é uma realidade que diz respeito também ao Estado e devemos trabalhar com a maior colaboração possível, mantendo ao mesmo tempo a autonomia e a liberdade próprias da Congregação. Também este é um critério salesiano importante.


Por fim, uma última lembrança desses dias foi a visita a Loyola, à casa-museu de Santo Inácio, com um momento de oração na “capela da conversão”. O que mais me causou admiração foi a sua experiência espiritual e o seu caminho interior. Com efeito, voltou para casa ferido na guerra, pensando em sua “namorada”, e partiu de sua casa enamorado somente de Deus. Que acontece entrementes? A graça infinita do encontro com Deus! Orgulhoso de si mesmo, pensando conquistar o mundo, tinha pedido alguns livros de “cavalaria” para se inspirar nos grandes heróis. Providencialmente não havia naquela casa senão dois livros: uma história dos santos e uma vida de Jesus. Embora lhe causassem enfado, começou a lê-los. Quanto mais conhecia os grandes santos, mais perguntava: “Se São Francisco de Assis foi tão radical, porque não poderia sê-lo eu também? Se São Domingos de Guzman fez assim, por que não poderia fazê-lo eu também?”. À medida que lia a história de Jesus mais comovido ia-se sentindo, disposto a começar uma vida nova, a tornar-se seu discípulo, e a fazer parte da sua “companhia”. Não queria fazer outra coisa que não a vontade de Deus e procurar somente a sua glória. Aprendeu assim a arte do discernimento espiritual, os critérios para distinguir o que procede de Deus e a Ele nos leva daquilo que, mesmo parecendo bom, não provém dEle e não leva a Ele. Uma vez curado, deixou a sua casa completamente transformado. Que pode sugerir-nos Santo Inácio a nós salesianos no nosso compromisso de levar os jovens ao encontro com Deus e com Jesus? Penso que se quisermos estar à altura de nossa missão, temos necessidade de nos tornarmos pessoas que buscam a Deus e guias competentes para conduzir os jovens a Jesus.


Visita à Inspetoria de Munique


Em meados de maio, logo após a visita à Inspetoria de Bilbao, estive na Inspetoria de Munique, onde tive a possibilidade de visitar algumas comunidades e conhecer algumas obras, como a Editora Dom Bosco, que está desenvolvendo um programa interessante de publicações junto com outras editoras da Região Europa Norte, e a casa de Waldwinkel, em favor de meninos portadores de deficiências, obra muito significativa, de alta qualidade educativa, em colaboração com o Estado, com uma diversidade de propostas que a tornam muito válida.

Os motivos principais da minha visita foram a participação no Curatorium de Benediktbeuern e o encontro com a Família Salesiana da inspetoria. Em Benediktbeuern pude admirar a beleza e a nobreza do antigo mosteiro, uma verdadeira jóia, mas sobretudo admirei a variedade de seções e de programas e, em particular, o que tornou afamado este centro de estudo no mundo salesiano, isto é, a Faculdade de Teologia e a Faculdade de Pedagogia. Na minha intervenção, além do agradecimento pelo serviço desenvolvido na formação de numerosos irmãos, convidei a fazer de Benediktbeuern um centro de teologia para toda a Região. É um objetivo que se deve levar adiante num momento em que a Congregação está promovendo comunidades formadoras e centros de estudo interinspetoriais, como um serviço às inspetorias que não podem ter todas as etapas formativas, com espírito de co-responsabilidade e com vontade de sinergia.

O encontro com a Família Salesiana, no qual tomaram parte cerca de mil pessoas, foi mesmo um momento de festa, a começar pela Eucaristia, à qual se seguiu o almoço, e depois o evento musical e alegre no teatro. Como não agradecer a Deus o dom da Família Salesiana, que cresce em toda a parte, sempre mais sólida e aberta aos novos desafios? E como não receber esse dom empenhando-nos em cuidá-lo atentamente e transmiti-lo fielmente?


Visita à Inspetoria de Colônia


Dia 23 de abril fui a Bonn para participar da festa em honra do padre Karl Oerder, que celebrava 75 anos de vida, 50 de profissão religiosa e 25 como diretor da Procuradoria Missionária Salesiana. Ainda que não seja normal que o Reitor-Mor participe desses momentos particulares – seria impossível poder acompanhar todos os irmãos em suas diversas celebrações – a minha presença nessa ocasião queria expressar gratidão em nome de toda a Congregação pelo trabalho incansável, generoso, eficaz, com grande sentido de instituição, em favor dos missionários da América Latina, Ásia, África e Europa Leste.

A participação de autoridades civis e eclesiais, de representantes de importantes organismos do governo e da Igreja na Alemanha, de muitíssimos irmãos e amigos pôs em evidência a grande estima e o apreço por quanto o padre Oerder fez nesses anos. Conseguiu fazer da Procuradoria de Bonn uma verdadeira janela, através da qual o mundo alemão pôde observar a Congregação Salesiana e esta, por sua vez, olhar a Alemanha.

Por iniciativa do inspetor, aproveitei a ocasião para um encontro com os diretores da Inspetoria de Colônia, os quais me apresentaram a situação de suas comunidades e obras, dando depois oportunidade a perguntas e respostas. Numa sociedade que sente, talvez pela primeira vez após a Segunda Guerra Mundial, os limites do seu progresso econômico e social, o processo de profunda secularização apresenta novos desafios à evangelização e à nossa presença entre os jovens. Neste momento as duas inspetorias da Alemanha estão encaminhando um processo de unificação, que se completará em 2005.


Festas em honra de Nossa Senhora Auxiliadora, em Turim


Como de costume, em 24 de maio fui a Turim para a celebração da Festa de Maria Auxiliadora. Em 17 de maio já tinha sido precedida pela celebração da coroação de sua imagem, que depois culminou no IV Congresso Internacional de Maria Auxiliadora, realizado em Turim nos primeiros dias do mês de agosto com participação de mais de 800 congressistas vindos de 30 países.

Mais uma vez fui testemunha do amor da cidade de Turim à Madonna di Don Bosco, fruto da grande devoção que o nosso amado Pai cultivou e soube difundir. A basílica esteve sempre cheia e a procissão, presidida pelo cardeal Severino Poletto com os seus bispos auxiliares, viu Maria “caminhar” ao longo das ruas abençoando as famílias.

Um acontecimento realizado nessa mesma data, nas “camerette di Don Bosco”, foi a inauguração do novo portal da Direção Geral, que vem a ser um modo muito significativo para entrar em comunicação com todos quantos estejam interessados em conhecer quem somos, o que fazemos, onde trabalhamos, qual a nossa proposta no campo da educação, da evangelização, da marginalização, da cultura, da ação missionária, da comunicação, da formação, com que métodos e objetivos, como estamos organizados. Tudo isso está dentro do pensamento de Dom Bosco, para quem não basta fazer o bem, mas é importante que ele seja conhecido. O novo site tem mais potencialidade que a versão anterior, com uma variedade de serviços, um motor de pesquisa e sobretudo uma interação mais ampla. O novo portal é uma via de acesso pela qual os salesianos querem entrar em diálogo com o mundo, especialmente o juvenil, e com quantos quiserem navegar dentro do nosso site. Faço votos por que possa ser fecundo o esforço de servir-nos da internet para renovar nosso compromisso em favor dos jovens, de sua educação e evangelização, da criação de uma cultura da preventividade.


Fiz outra visita à Inspetoria do Piemonte-Valle d’Aosta na ocorrência centenária do nascimento de São Calisto Caravário; nessa oportunidade fui a Cuorgnè, sua terra natal, no Canavese. A coincidência com a festa de Pentecostes permitiu-me destacar a ação fecunda do Espírito Santo, quando encontra uma natureza bem disposta como a desse jovem salesiano. A comemoração civil salientou, além do agradecimento ao importante concidadão, a grande estima por tudo o que fez a Congregação em favor de Cuorgnè com a obra que lá mantemos. Três dias antes, em Oliva Gessi, havia sido feita a comemoração do 130º aniversário do nascimento de São Luís Versiglia.


Visita à Inspetoria de Verona (IVO)


Em fins de maio fui a Verona. Queria estar presente nessa inspetoria antes da já iminente unificação com a Inspetoria Vêneta Leste de Veneza. Quando esta carta for publicada, a nova Inspetoria do Nordeste da Itália já terá começado.

Fiquei apenas um dia, mas com uma agenda bem cheia de compromissos. Visita aos irmãos doentes recolhidos na casa de Negrar; encontro com os 800 meninos e professores do centro de formação profissional São Zeno, com a vizinha paróquia salesiana Domingos Sávio; bênção da nova Capela do Instituto São Zeno; visita ao Instituto Dom Bosco, onde tive um encontro com os jovens da escola média, a assembléia dos irmãos e a Eucaristia lembrando os jubileus.

Às vezes poderíamos perguntar se visitas tão breves têm algum significado; penso que vós é que deveis responder. De minha parte devo atestar que são momentos de grande comunhão afetiva, espiritual, pastoral e vocacional, porque não há nada que construa tanto como a comunicação pessoal. Recolhendo as ressonâncias que deixam as visitas do Reitor-Mor, percebo que os irmãos, os jovens, os colaboradores, os membros da Família Salesiana ficam motivados, como cheios de espírito salesiano; e isso acontece justamente pelo fato de ser o Sucessor de Dom Bosco. Lembro quanto o padre Vecchi, já doente e muito limitado, insistia na necessidade de participar em alguns eventos das inspetorias e da Congregação; dizia-nos que o Reitor-Mor conta não por aquilo que faz, mas por aquele que representa.


Participação na Assembléia Semestral da USG


De 28 a 31 de maio deu-se, no Salesianum de Roma, a reunião semestral da União dos Superiores Gerais (USG), tendo como tema: “O religioso, homem de diálogo a serviço da Igreja e com a Igreja”. Houve três conferências que explanaram o tema e seguiram-se os trabalhos de grupo, antes por idiomas e depois por encargo: superiores gerais e vigários.

A escolha do argumento queria ser uma resposta a uma realidade muito fácil de constatar, isto é, a dificuldade do diálogo em todos os níveis: dentro de uma comunidade religiosa e de um Instituto religioso, entre vida consagrada e comunidade eclesial, entre Igreja e mundo.

O tema acentuou claramente que o diálogo é difícil, mas muito urgente, precisamente num contexto cultural e eclesial como o nosso. É uma dimensão absolutamente necessária para o desenvolvimento da pessoa humana, que é um ser relacional, para a vida das comunidades, para a missão, que é essencialmente comunicação e testemunho, para inserção no mundo. É uma realidade penosa, também porque implica saber mudar os próprios pontos de vista, as próprias convicções, as próprias maneiras de agir; mas é indispensável se queremos tornar crível e eficaz o nosso testemunho de discípulos de Jesus, que seremos conhecidos e reconhecidos se nos amamos, se somos um, se temos um só coração e uma só alma.


Partindo da Encíclica Ecclesiam Suam (1964), na qual Paulo VI dizia que “o diálogo é o novo nome da caridade” e aludia às suas quatro características fundamentais, ou seja, a clareza, a mansidão, a confiança e a prudência, os relatores mostraram como o diálogo entre as culturas, entre homens e mulheres, entre nós e os pobres, é possível somente ouvindo o outro com atenção, procurando ver o outro na melhor luz possível, tratando os outros com um respeito extraordinário, enfim olhando os outros com os próprios olhos de Deus.

A medida da saúde de uma comunidade local ou provincial é diretamente proporcional à maneira com que os membros são capazes de partilhar uns com os outros os respectivos pontos de vista e os respectivos esforços espirituais e pessoais.


Nessa linha, a primeira ficha do CG25 quis encorajar os irmãos e as comunidades a promover uma relação interpessoal profunda e, depois, a partilhar a própria experiência de vida e de Deus, para chegar a formar uma comunidade muito mais sólida e robusta. A isso visa também o projeto da comunidade salesiana local, que quer favorecer a comunhão dos irmãos mediante um processo de partilha e discernimento, começando pelo chamado de Deus, desenvolvendo depois a leitura da realidade e dos desafios em que vivemos e operamos, e concluindo com a escolha das grandes opções e objetivos a serem atingidos. Com efeito, a verdadeira comunhão é fruto do amor que se exprime num projeto comum, contra toda tendência ao individualismo e ao egoísmo.

Dom Bosco foi ao encontro dessa necessidade, procurando fazer da própria comunidade uma casa e criar um espírito de família que permeasse todas as relações. Dessa maneira são assumidas seja a vida da comunidade, suas alegrias e esperanças, suas fadigas e temores, sua dinâmica interna e o seu itinerário espiritual, seja a questão candente da qualidade da presença educativa pastoral, a capacidade de responder aos desafios, o envolvimento e a formação dos leigos colaboradores.


O diálogo com a Igreja, com os bispos e com os outros religiosos, conquanto nem sempre fácil, torna-se hoje mais do que nunca indispensável e exigente, porque demanda superar medos e desconfiança e enfrentar juntos grandes problemas como os da evangelização, da promoção humana, da justiça social, da cultura.

É fora de dúvida que o diálogo é um valor que se deve aprender e desenvolver ao longo dos anos de formação. É uma expressão da espiritualidade de comunhão, indispensável para nós chamados a ser artífices de comunhão.


Visita à Inspetoria Adriática


Nos últimos dias de maio fiz uma visita de fim de semana à Inspetoria Adriática. O primeiro encontro foi em L’Aquila, onde dia 30, sexta-feira, o prefeito conferiu a cidadania honorária a toda a comunidade salesiana pelos setenta anos de presença e a influência sobre a cidade e sobre o território. No dia seguinte, pela manhã, deu-se o encontro com a comunidade inspetorial. À tarde e à noite celebrou-se a festa de Maria Auxiliadora com a Família Salesiana, compreendendo a procissão e um festival. O segundo encontro foi em Vasto, onde recebi a cidadania honorária, inaugurei o pavilhão esportivo, presidi a Eucaristia da Ascensão do Senhor e participei no festival organizado pelos meninos das obras da inspetoria.

Encontrei uma inspetoria que demonstra vivacidade e vitalidade, na qual também os irmãos idosos parecem viver com o entusiasmo dos primeiros tempos, ancorados na tradição salesiana sentida e vivida. Vi a presença de um grupo de jovens irmãos, que faz pensar na possibilidade de uma pastoral vocacional fecunda, sobretudo se as comunidades continuarem a ser abertas, acolhedoras e inseridas em meio aos jovens, se o Movimento Juvenil Salesiano se consolidar e tiver a capacidade de fazer amadurecer projetos de vida. Esperamos que assim seja.


Conclusão: o aniversário de Dom Bosco


Nos dias 15 e 16 de agosto estive no Colle Don Bosco para as celebrações da Assunção de Maria, a entrega das crianças a Nossa Senhora, como fez Mamãe Margarida com Joãozinho, a procissão da Madonna del Castello, em Castelnuovo, e para a festa do 188º aniversário do nascimento de Dom Bosco. Era a primeira vez que se celebrava essa festa e, não obstante, teve uma participação significativa de irmãos das comunidades da inspetoria, e a presença também das autoridades civis no aniversário de seu mais glorioso cidadão.

Presença também de grupos de jovens vindos da Bélgica, da Eslovênia, da Croácia e da Polônia, guiados por irmãos salesianos. É estupendo ver como o Colle se torna cada vez mais centro de peregrinação para irmãos, jovens, membros da Família Salesiana, que vêm conhecer o berço do pai, mestre e amigo dos jovens: o prado dos sonhos que marcou sua vida, confiando-lhe uma missão, indicando-lhe um campo de trabalho, dando-lhe uma mestra; o lugar das nossas origens e da nossa comunhão espiritual e apostólica. É verdade que em Valdocco Dom Bosco amadureceu seu projeto apostólico e que lá se deu a fundação da Congregação Salesiana, do Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora, dos cooperadores, da ADMA; mas é igualmente verdade que a vida, início de todo dom, começou nos Becchi e lá deu seus primeiros passos, alguns dos quais definiram para sempre a vida de Dom Bosco.


A iniciativa da comunidade do Colle de celebrar o nascimento do nosso Pai pareceu-me adivinhada e em linha com quanto estamos promovendo, isto é, a valorização dos “lugares santos salesianos!”. Faltam ainda doze anos para o bicentenário do nascimento, e queremos iniciar um caminho de preparação que se deve traduzir num conhecimento melhor de Dom Bosco e, sobretudo, em tornar operativo o seu carisma e a sua missão no contexto hodierno, por vários aspectos tão diversos do seu. A mensagem do dia 16 de agosto passado estava precisamente nesse rumo. O mês de agosto é, em muitos lugares da nossa Congregação, o mês de Dom Bosco, por isso essa lembrança mostrou-se oportuna.

São passados já 188 anos do nascimento de Dom Bosco, homem de Deus e dos jovens. A prodigiosa expansão do seu carisma em 126 países do mundo, graças a uma legião de consagrados e consagradas, que fizeram próprio seu projeto de vida, e a um batalhão de colaboradores leigos, atingindo milhares e milhares de meninos, permite a Dom Bosco dizer como São Paulo: “Vós sois uma carta de Cristo, escrita por mim não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo” (2Cor 3,3).


A Virgem Maria, na festa da sua Natividade, nos ensine a abrir-nos sem limites ao plano de Deus para acolhê-lo com generosidade e alegria de ser seus colaboradores para o bem dos jovens.







Pe. Pascual Chávez V.

Reitor-Mor

2.1 O DELEGADO E A COMISSÃO

INSPETORIAL PARA A FORMAÇÃO


Pe. Francesco CEREDA

Conselheiro geral para a Formação


A figura do delegado inspetorial de formação está assumindo um papel cada vez mais decisivo na animação da vida das inspetorias, sobretudo por causa da reconhecida importância da formação para o crescimento vocacional dos irmãos, pela qualidade da ação educativa pastoral, para a identidade carismática. O delegado é quem “dá vida” à formação na inspetoria: ele a anima, estimula, acompanha de perto, avalia; o mesmo se diga da comissão inspetorial de formação, que ele coordena.


As recentes orientações da Congregação atribuem novas tarefas a essa figura. A Ratio fala em várias ocasiões do seu papel e apresenta uma visão dos seus compromissos, pondo-os em relação com os do inspetor (FSDB 246-247). O CG25 pede sua intervenção de estudo e de animação para o projeto pessoal de vida, o projeto comunitário, o programa anual de formação permanente da inspetoria, o plano de qualificação dos irmãos (CG25, 16.60). O conselheiro para a formação pede-lhe, enfim, uma atenção especial ao cultivo e promoção da vocação do salesiano coadjutor (cf. ACG 382).


Julgo, por isso, importante que as inspetorias tomem consciência da nova figura do delegado inspetorial de formação que se está delineando e das atuais exigências da formação, cuja realização será preciso garantir. Neste momento, a aplicação da Ratio passa principalmente através da qualificação e da valorização do delegado e da comissão inspetorial de formação. Eles estão a serviço do inspetor e do seu Conselho, da animação das comunidades, do crescimento dos irmãos. Apresento aqui uma visão de conjunto de suas tarefas; as inspetorias poderão assim gradualmente valorizar melhor as competências e servir-se de suas potencialidades.


1. Refletir


Primeira tarefa do delegado é refletir sobre a formação na inspetoria. Essa tarefa exige que esteja atualizado no campo da formação; nas áreas conexas a ela, como a vida consagrada, a maturação humana, a vida espiritual, os “estados de vida do cristão”, os desafios da evangelização; nas orientações da Igreja, dos Capítulos Gerais e do Reitor-Mor com o seu Conselho. Exige também que o delegado esteja em contato com a realidade da Inspetoria, especialmente com os jovens em formação inicial, os formadores, as comunidades formadoras, mas também com todas as comunidades, os irmãos, as iniciativas de formação permanente.

1.1 Ele reflete sobre a Ratio e sobre “Critérios e normas de discernimento vocacional salesiano”. A Ratio oferece orientações carismáticas, espirituais e pedagógicas que acompanham a normativa, dão o quadro geral da formação, identificam as suas dimensões. Ela apresenta uma síntese da vocação salesiana e do modo de crescer nela, acolhendo as principais orientações da Igreja e da Congregação e prestando atenção à metodologia formativa. Ela é um documento estratégico; merece, pois, ser meditada, estudada e feita própria por todo salesiano, particularmente por aqueles que têm encargos de animação e governo, de formação inicial e permanente, e sobretudo pelo delegado e pela comissão inspetorial de formação.


1.2 Tendo assimilado a Ratio e os demais documentos da Igreja e da Congregação sobre a formação, o delegado reflete sobre a práxis formativa da inspetoria, ou seja, pergunta-se constantemente se os processos formativos e sobretudo os seus resultados correspondem realmente às expectativa da Igreja e da Congregação, às circunstâncias atuais, às exigências locais. Dessa maneira, toma consciência dos pontos válidos dos processos formativos que se realizam na inspetoria, mas também de suas carências e dificuldades.


1.3 Não é suficiente que ele reflita juntamente com o inspetor, seu Conselho e a comissão para a formação; é preciso que saiba responsabilizar e fazer refletir toda a inspetoria, todo irmão e as comunidades. Dessa forma, ajuda a realizar uma das orientações da Ratio que afirma: “O inspetor empenha-se num processo contínuo de reflexão sobre a situação dos irmãos e das comunidades e sobre sua formação, e se torna um ambiente animador, estimulante e exigente de fidelidade vocacional” (FSDB 226).


2. Projetar


Refletindo com a comissão inspetorial para a formação sobre as orientações da Igreja e da Congregação, verificando a práxis formativa e fazendo refletir toda a inspetoria, nasce a segunda tarefa do delegado de formação, a de projetar.


2.1 O delegado e a comissão colaboram para preparação da seção formação do diretório inspetorial. Nele se encontram as normas e as grandes opções formativas da inspetoria. Cabe ao Capítulo inspetorial elaborar o diretório que, uma vez aprovado pelo Reitor-Mor com o seu Conselho, se torna o códice legislativo particular da inspetoria. Compete depois ao delegado, juntamente com a comissão para a formação, estimular sua atuação e verificar regularmente sua aplicação concreta.


2.2 A inspetoria empenha-se na elaboração, atuação e revisão do projeto inspetorial de formação. É errado ver o projeto inspetorial como um documento que o delegado e a comissão devem preparar. O projeto é o processo de discernimento e de convergência da comunidade inspetorial sobre a própria formação, é responsabilidade de todos, o delegado é quem ajuda a inspetoria a assumir responsabilidades.

Trata-se de criar uma visão partilhada entre os irmãos da inspetoria sobre o tipo de salesiano que se entende formar, no ponto em que nos encontramos, no percurso que resta ainda por fazer, sobre como se entende realizá-lo. O projeto compreende as áreas da formação permanente, formação inicial, qualificação dos irmãos, formação ao mesmo tempo de salesianos e leigos. Nesse tem-se especial cuidado de oferecer os diversos elementos do currículo formativo do salesiano coadjutor (cf. FSDB 424).

Feito o projeto e aprovado pelo inspetor com o seu Conselho, cabe ao delegado acompanhar sua atuação, a avaliação e a eventual revisão. É ele, pois, que acompanha a sua realização por parte de todos, da comissão de formação, do inspetor com o seu Conselho, dos formadores, dos irmãos e das comunidades. Ele faz do projeto o meio para o contínuo crescimento e renovação da inspetoria.


2.3 O CG25 pede ao inspetor e ao seu Conselho, com a ajuda do delegado e da comissão para a formação, que sugiram modalidades e ofereçam subsídios para elaborar o projeto pessoal de vida e o projeto da comunidade salesiana (CG25, 16). O projeto pessoal de vida, já solicitado pela Ratio a todos, é um modo de “unificar as próprias aspirações, energias e valores, assumindo a responsabilidade do próprio crescimento e vivendo com plenitude as motivações profundas da própria vocação” (FSDB 69). Nele o irmão delineia o tipo de salesiano que se sente chamado a ser e o caminho para se tornar tal. O projeto da comunidade salesiana é um meio eficaz para dar consistência à capacidade de “viver e trabalhar juntos” e superar a dispersão do trabalho individual e o risco da fragmentação. A comunidade se interroga sobre a vontade de Deus em relação a ela, vê a sua situação, descobre o caminho a ser tomado para chegar à meta; desse modo cresce entre os seus membros a comunhão e o sentido da responsabilidade comum.


2.4 Enfim, segundo as orientações apresentadas nos ACG 382, compete ao delegado juntamente com a comissão inspetorial de formação projetar e estimular uma ação de promoção da vocação do salesiano coadjutor, que envolva toda a inspetoria, as comunidades educativas pastorais, a Família Salesiana. Essa ação propõe-se realizar as quatro linhas de ação indicadas pelo conselheiro para a formação: melhor conhecimento e apreço da identidade do salesiano coadjutor, a começar pelos irmãos e pelas comunidades salesianas; empenho forte na promoção dessa vocação. A isso deve acrescentar-se a animação de uma oração constante. O delegado e a comissão devem envolver toda a inspetoria seja no projetar seja no realizar tais compromissos. Mas a iniciativa de estímulo e coordenação cabe a eles.


3. Acompanhar a formação inicial


A formação inicial requer atenções específicas, conforme as fases que os jovens irmãos estão vivendo. O delegado de formação presta uma atenção especial a momentos, pessoas, situações.


3.1 O projeto inspetorial de formação tem uma parte que diz respeito à formação inicial, que se chama precisamente plano de formação inicial. O delegado e a comissão inspetorial para a formação devem cultivar a articulação dos vários processos e das diversas experiências, intervenções, operadores, momentos, conteúdos, ambientes, fases, de modo que convirjam para metas claras. Deve-se notar que o acento não é colocado sobre a quantidade de coisas por fazer, mas sobre suas finalidades. Se, por exemplo, no projeto inspetorial de formação uma inspetoria tem como objetivo dar um forte impulso entre os jovens irmãos à atenção aos mais pobres ou à formação de uma mentalidade missionária, o delegado procurará envolver os esforços de todos nesse objetivo. Para isso ajuda fazer no começo do ano uma boa programação de formação inicial, baseada no projeto inspetorial.


3.2 O delegado cuida ainda da continuidade do processo formativo durante a formação inicial. A maneira de assegurar tal continuidade pode assumir formas diversas. Pode haver encontros periódicos entre os formadores das diversas fases para refletir sobre o andamento do processo formativo (FSDB 239); a Ratio sugere a ligação entre os formadores do pós-noviciado, noviciado e tirocínio (FSDB 425) e entre os formadores do pós-noviciado e o mestre dos noviços (FSDB 345). Pode-se promover encontros de partilha entre os formadores para o conhecimento e a aplicação convergente de critérios e normas para o discernimento vocacional salesiano (FSDB 297), ou então iniciativas para garantir a continuidade da pedagogia formativa ou da metodologia de ensino nos diversos momentos. É necessário também especificar como garantir que o jovem irmão durante as diversas fases realize um verdadeiro caminho contínuo e unitário.


3.3 O delegado acompanha as comunidades formadoras e os centros de estudo. Isso quer dizer que ele os visita periodicamente, interessa-se pela sua orientação e programação, verifica sua ação formativa. Visita também as comunidades formadoras interinspetoriais, mantém contato com os formadores e se encontra com os jovens em formação inicial.


3.4 O delegado organiza adequadas iniciativas de animação e acompanhamento para os tirocinantes, segundo um programa já preparado. Para eles, tais iniciativas são ocasiões para o confronto direto, a comunicação de experiências, a reflexão partilhada e o apoio mútuo; elas ajudam a qualificar o percurso formativo individual (FSDB 439). O delegado mantém também contatos com os diretores dos tirocinantes e recolhe suas avaliações formativas trimestrais.


4. Acompanhar a formação permanente


A formação permanente apresenta um campo em que o delegado tem um papel importante. Ele sensibiliza os irmãos e as comunidades quanto à necessidade da conversão, renovação, atualização, crescimento contínuo. É questão de criar em todos uma mentalidade de abertura, reflexão, pesquisa, anseio pela santidade, responsabilidade com sua própria maturação, ou seja, uma mentalidade de formação permanente.


4.1 Em nível inspetorial, o delegado envolve irmãos e comunidades na formulação do plano de formação permanente, que é uma parte do projeto inspetorial de formação, em ordem à renovação espiritual, à qualificação pastoral, à competência educativa e profissional dos irmãos. A sua elaboração leva em conta os vários papéis, as diversas idades, a vocação específica, as situações da vida: qüinqüênio, maturidade, aniversários significativos, velhice (FSDB 556).

Ele se traduz num programa anual de formação permanente, que diz respeito à formação dos principais animadores: diretores, formadores, delegados, sem descuidar, porém, os doentes e os idosos, de modo que possam viver com serenidade e espírito de fé sua situação (CG25, 60). Elabora subsídios e organiza serviços apropriados: os exercícios espirituais, os dias e sessões de oração, os cursos de renovação, as reuniões de atualização por categorias, os encontros de estudo dos documentos eclesiais e salesianos, as referências bibliográficas (FSDB 549).

Ajuda as comunidades a terem o próprio programa anual de formação permanente e acompanha sua realização. Isso faz parte do projeto da comunidade salesiana. Vela por que a vida ordinária da comunidade seja formativa. Estimula os irmãos a cultivar a qualidade da oração pessoal, de modo especial a meditação, favorecendo o conhecimento e o exercício de métodos coerentes com a nossa espiritualidade (FSDB 120); a dar especial atenção à área afetiva e à capacidade de relações interpessoais (CG25, 60). A praticar a “lectio divina” (CG25, 31).


4.2 Hoje é sempre cada vez mais importante que na inspetoria o delegado para a formação ajude a criar interesse pela salesianidade e estimule as comunidades e os irmãos a aprofundá-la, promovendo iniciativas e proporcionando subsídios para o conhecimento das orientações da Congregação, as cartas do Reitor-Mor, os documentos salesianos. Interessa-se por que haja na inspetoria uma boa biblioteca salesiana (FSDB 51), para favorecer a efetiva possibilidade de acesso às fontes do nosso carisma (CG25, 60). Assegura que nas várias fases da formação seja realizado um programa sério e atualizado de estudos salesianos: história, espiritualidade, pedagogia, pastoral. De modo semelhante organiza experiências de salesianidade como parte da formação permanente (FSDB 50). Sua ajuda no aprofundamento da identidade vocacional do salesiano coadjutor e na tradução prática da sua visibilidade na comunidade salesiana e na comunidade educativa pastoral assume uma função importante.


4.3 O delegado ajuda o inspetor a projetar a qualificação de todos os irmãos para as tarefas educativo-pastorais e formativas. Dê-se atenção à preparação dos que devem assumir responsabilidades de animação, de governo e de formação na comunidade local e inspetorial. Trata-se de identificar as exigências prioritárias da inspetoria em vista da missão e da formação, de encontrar as modalidades para responder a essas exigências e de escolher as pessoas mais aptas segundo suas aptidões e propensões. Tudo isso está expresso no plano de qualificação dos irmãos, que faz parte do projeto inspetorial de formação e que é submetido pelo delegado ao inspetor com o seu Conselho para decisões. Cabe ao delegado verificar sua realização. Nesse processo, ele se preocupa com que se dê o devido peso aos estudos filosóficos, pedagógicos, teológicos, salesianos, profissionais e acadêmicos (CG25, 50). A Ratio recomenda que não se perca de vista a preparação de expertos em salesianidade para o serviço a irmãos e comunidades (FSDB 547).


4.4 O delegado garante que dentro do projeto inspetorial de formação se encontrem as linhas da formação conjunta de salesianos e leigos que devem prever conteúdos, experiências e tempos dedicados às atividades formativas (FSDB 547.560). Ele promove a colaboração com os grupos da Família Salesiana no campo da formação permanente, através de iniciativas extraordinárias ou mediante uma ação sistemática que pode ser proposta e animada por equipes integradas com membros dos diversos grupos (FSDB 547).


5. Trabalhar em equipe


É fundamental para a formação da inspetoria ter um núcleo animador; ele é normalmente constituído pelo delegado e pela comissão inspetorial para a formação (FSDB 18); sem um grupo de referência é difícil fazer progressos. A formação é uma realidade crucial para a vida da inspetoria. Ela compreende uma variedade de comunidades, programas, situações, pessoas, experiências, necessidades; diz respeito à formação inicial e à permanente, à qualificação dos irmãos e à formação conjunta de salesianos e de leigos É difícil pensar que uma pessoa só, por mais qualificada que seja, possa fazer todo o necessário e fazê-lo bem.


5.1 Por isso, o delegado tem a seu lado uma comissão, que colabora diretamente com ele no campo formativo. Com efeito, é com a comissão que o delegado reflete sobre a situação formativa da inspetoria, identifica os pontos nevrálgicos, procura as respostas mais adequadas, oferece propostas ao Conselho inspetorial, planeja os passos a serem realizados, organiza as atividades, coordena as várias iniciativas, realiza as propostas feitas, avalia o resultado. Desse trabalho de equipe deve emergir uma ação orgânica, programada e coordenada (FSDB 22).


5.2 É mister prestar atenção à composição da comissão. Ela deve ser constituída por pessoas que, seja pela preparação seja pela experiência, possam dar uma contribuição válida e que disponham do tempo necessário para os encontros, a reflexão, a colaboração nos serviços concretos. É oportuno que dela faça parte pelo menos um salesiano coadjutor.


5.3 A situação e as opções da inspetoria podem levar também a articulações da comissão. A animação dos vários âmbitos pode sugerir a constituição de grupos de trabalho para a formação inicial, para a formação permanente, para a formação de salesianos e leigos, para a ligação com a Família Salesiana; de qualquer modo, é necessário garantir uma colocação convergente, com referência quer ao único delegado quer à única comissão inspetorial de formação.


6. Trabalhar em rede


O delegado inspetorial de formação colabora com multíplices sujeitos: a formação é uma realidade que deve ter em conta numerosas contribuições e sinergias. Deve tornar-se uma figura de rede.


6.1 O delegado mantém contatos freqüentes com o delegado de pastoral juvenil e com a sua equipe, a fim de promover na inspetoria uma mútua colaboração entre pastoral juvenil e formação. Conhecendo o projeto educativo-pastoral inspetorial, toma consciência das linhas a serem seguidas na formação educativa pastoral dos irmãos e solicita a contribuição do delegado de pastoral juvenil no processo formativo. Em diálogo com o delegado de pastoral juvenil elabora um itinerário de atividades educativas pastorais para cada fase da formação inicial, organiza-as e avalia. Juntos tratam da animação vocacional, do aspirantado ou comunidade proposta, o pré-noviciado, a vocação do salesiano coadjutor; colaboram também para individuar as linhas de formação conjunta de salesianos e leigos. Uma forma de união entre pastoral juvenil e formação é a participação do delegado ou de um membro da comisssão inspetorial de formação na equipe de pastoral juvenil.


6.2 O delegado oferece estudos, sugestões e propostas ao inspetor e Conselho inspetorial. Convém que ele seja membro do Conselho inspetorial (FSDB 247); poderá assim manter o Conselho atualizado sobre questões que dizem respeito à formação e pode manter nele uma viva preocupação formativa. Quando, como acontece em muitas inspetorias, o delegado para a formação é o vigário inspetorial, ele dará mais consistência à sua figura diante dos irmãos, dará visível importância à formação, facilitará as suas intervenções na realidade formativa, criará a união com o Conselho inspetorial, favorecerá a proximidade com todas as comunidades.


6.3 O delegado mantém a ligação com os demais delegados de formação. Sendo muitas as exigências formativas, não é possível que uma inspetoria faça tudo sozinha; tornou-se, pois, necessária a colaboração interinspetorial, que o delegado pode facilitar.

A ligação entre os delegados de formação ajuda as inspetorias a refletir juntas, a promover o intercâmbio de experiências, a elaborar linhas comuns, a reforçar a colaboração, a valorizar a contribuição dos centros de estudo e de formação permanente. De modo especial, é necessária a ligação do delegado com o coordenador regional e com a comissão regional de formação; a Ratio recomenda o contato com os delegados de outras inspetorias e com o responsável da coordenação em nível interinspetorial (FSDB 549).

Além da constituição e fortalecimento das comunidades formadoras interinspetoriais, que é a forma de colaboração mais urgente, há numerosos modos de unir as forças a serviço da formação: vai-se da coordenação ocasional às equipes interinspetoriais, aos centros nacionais ou regionais; de encontros esporádicos a iniciativas periódicas, a programações orgânicas; da partilha de experiência à reflexão realizada juntos, à preparação de subsídios comuns; da formação dos formadores à formação por grupos de irmãos: diretores, padres e coadjutores do “qüinqüênio”, irmãos que se preparam para a profissão perpétua, salesianos coadjutores.


6.4 O delegado, enfim, mantém contato com o conselheiro geral para a Formação. Com efeito, ajuda o conselheiro estar a par da situação formativa das inspetorias: seus desafios emergentes, as experiências feitas, as orientações tomadas. Assim ele pode avaliar os problemas e as necessidades formativas da Congregação; recebe um estímulo para refletir sobre eles e encontrar a maneira de enfrentá-los. O conselheiro, além disso, juntamente com o Dicastério, está sempre disponível para apoiar o trabalho formativo que o delegado realiza na inspetoria e a oferecer-lhe ajuda.


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A Ratio mostra a diversidade das tarefas do inspetor e do delegado inspetorial de formação (FSDB 246-247); não são tarefas que se sobrepõem ou se excluem. O inspetor deve assumir a responsabilidade primária da formação, e o delegado, justamente por ser delegado, age em tudo no nome do Inspetor e de acordo com ele. Isso reforça a exigência de que as inspetorias reflitam sobre essa figura, a valorizem e façam crescer, tendo em vista uma animação qualificada e uma formação eficaz. Numerosas inspetorias encontram-se já nessa perspectiva; o delegado e a comissão inspetorial de formação vêm a ser um recurso para seu crescimento.