251-300|pt|291 - Atos do Conselho Superior como instrumento de animação

Egídio Viganò


OS ATOS DO CONSELHO SUPERIOR COMO INSTRUMENTO DE ANIMAÇÃO


Atos do Conselho Superior


Ano LX – JANEIRO-MARÇO, 1979


N. 291



Introdução. – Os Atos do Conselho Superior como instrumento de animação.Um pouco de história. – Inicia-se uma nova série dos ACS. – Importância de um bom uso dos Atos. – Convite à valorização da recente alocução do Papa à União dos Superiores Gerais.

Roma, 24 de novembro de 1978.



Queridos Irmãos,



envio a todos uma saudação fraterna no começo deste novo ano marcado, para nós, pela lembrança sobre o Sistema Preventivo de Dom Bosco. Faço votos para que todas as Comunidades aprofundem e vivam quanto nos ofereceu o CG21 sobre o Projeto educativo salesiano, do qual vos falei na última circular.



Os ACS como instrumento de animação



Com este número dos ACS, o primeiro de 1979, inicia-se, podemos dizer, uma nova série. O CGE já havia definido, no art. 149 das Constituições renovadas, o signi­ficado substancial do “órgão oficial para a promulgação das diretrizes do Conselho e para as informações salesianas”, confiado aos cuidados do Secretário geral.

O CG21 insistiu de maneira particular no aspecto vivo e animador desejado para os Atos “em sinal de unidade e como interpretação autorizada da nossa identidade”.1 Deviam ser um instrumento válido do “ministério da animação comunitária” do Conselho Superior e oferecer subsídios práticos sobretudo para favorecer uma “direção espiritual” atualizada e critérios apostólicos para as comu­nidades e para os Irmãos.2

Pensando nos quase 60 anos de história dos ACS vemos que nasceram para ajudar a desenvolver de maneira unitária em toda a Congregação o serviço de animação próprio do Conselho Superior. O significado espiritual e indispensável do ministério da autoridade religiosa foi descrito recentemente, com louvável sentido eclesial, pelo documento da S. Sé sobre as relações mútuas entre os Bispos e os Religiosos.3 Ao apresentar, no n. 13, as características do serviço “carismático” dos Superiores em favor dos Irmãos do próprio Instituto, o documento confirma em primeiro lugar “sua tarefa de serviço e de guia dentro do Instituto religioso em conformidade com sua índole própria”;4 e depois sublinha-se o múnus de ensinar observando que “os Superiores Religiosos têm a competência e a autoridade de mestres de espírito em relação ao projeto evangélico do próprio Instituto; nesse âmbito devem, por conseguinte, desempenhar uma verdadeira direção espiritual de toda a Congregação e de cada uma das suas Comunidades, e a farão em sincera consonância com o magistério autêntico da Hierarquia, conscientes de que devem exercer um manda­to de grave responsabilidade na área do plano evangélico querido pelo Fundador”.5

E, mais adiante, lembra o documento queos Supe­riores dos Religiosos têm o grave dever, assumido como responsabilidade prioritária, de velar com todo o empenho pela fidelidade dos Irmãos ao carisma do Fundador, promo­vendo a renovação prescrita pelo Concílio e exigida pelos tempos”.6



Um pouco de história



Desde os tempos de Dom Bosco procuraram os Supe­riores da Congregação transmitir aos Irmãos orientações e diretrizes nesse sentido. A 24 de maio de 1867, Dom Bosco escrevia de próprio punho uma carta que se pode conside­rar a primeira desse tipo de circulares: “A nossa Sociedade – dizia – talvez dentro de pouco tempo será definitivamente aprovada e por isso eu teria necessidade de falar aos meus amados filhos com frequência. Não podendo fazê-lo sempre pessoalmente procurarei fazê-lo ao menos por carta”.7

A Congregação contava então 44 professos e 36 noviços. Dom Bosco fez tirar várias cópias da sua carta e, mudando a data, escreveu de próprio punho os endereços. Tratava do fim que se deve ter em vista para ser salesiano. Um tema em plena consonância com quanto afirma o recente documento da Santa Sé; e o argumento é tratado com tão grande clareza e convicção que faz dessa carta um verdadeiro modelo de circular para os Atos. Recomendo que a leiais outra vez.

A partir dessa data, o próprio Dom Bosco e posterior­mente o P. Rua enviaram circulares aos Irmãos, sem periodicidade regular.

Em 24 de janeiro de 1905, o P. Rua introduz o uso da “Carta mensal”, datada regularmente no dia 24 do mês, com intervenções do Reitor-Mor e dos demais Superiores. Além disso, porém, ele e de modo especial o P. Albera, escrevem circulares e cartas edificantes de maior fôlego, em deter­minadas circunstâncias.

Em 24 de junho de 1920 o P. Albera dá início aos “Atos” propriamente ditos.8

Formulava com clareza a sua finalidade, ao escrever: “Para favorecer e facilitar o desenvolvimento orgânico da nossa Pia Sociedade, e avivar nos ânimos e nos corações o espírito do nosso Pai, os Superiores Maiores sempre transmitiram (...) as suas deliberações e conselhos por meio de Cartas Circulares”. Fazia notar, porém, que para tomar mais estável e orgânica essa importante comunicação aos Irmãos, o Conselho Superior havia deliberado reunir periodicamente num fascículo os seus “Atos”, porque confiava em que “este novo meio (poderia) concorrer para o bem de toda a Pia Sociedade, estreitando cada vez mais os vínculos que unem os Irmãos aos Superiores Maiores e reavivando continuamente o espírito de Dom Bosco, que deve animar todas as nossas obras”.9



Inicia-se uma nova série dos ACS



O novo Conselho Superior eleito no CG21, conside­rando diversas sugestões autorizadas, pensando nas exigências atuais e urgentes de animação e assumindo a modalidade de um estilo mais colegial nos serviços do Conselho Superior, estudou (já desde os primeiros meses de 1978) uma como reestruturação dos ACS, a iniciar-se no novo ano de 1979. Atendendo à finalidade própria dos ‘Atos’ e partindo da vontade capitular de melhorar a sua capacidade de comunicação, quisemos voltar a uma estruturação e apresentação de estilo mais explicitamente “colegiado”, com a corresponsabilidade de todo o Conselho nas orientações apresentadas e com a participação direta do Vigário do Reitor-Mor bem como dos Conselheiros encarregados pelas Constituições de zelar por alguns importantes aspectos mundiais da vida salesiana dos Irmãos.

É a modalidade já empregada nas “cartas mensais” iniciadas em 1905 e nos próprios “Atos” de 1920 até o CG19 de 1965.

Cada fascículo da nova série compreenderá substan­cialmente duas partes: a primeira, mais ágil e vária, compreenderá serviços de animação mediante uma carta do Reitor-Mor e algumas intervenções qualificadas do Vigário ou dos Conselheiros, não de todos simultaneamente no mesmo fascículo, é claro. Numa segunda parte apresentar-se-ão serviços de comunicação acerca de disposições e normas, atividades do Conselho, informações e documentos de interesse especificamente salesiano, em consonância com a natureza própria dos ACS, evitando que se tornem um duplicado de outras publicações que circulam nos nossos ambientes.

A carta do Reitor-Mor será ordinariamente breve, reservando a exposição mais ponderada de um tema a situações especiais. A periodicidade dos fascículos será trimestral: 4 números por ano.



Importância de um bom uso dos Atos



Queria, caros Irmãos, que fosse dada importância vital aos ACS em cada Inspetoria e em cada Comunidade, utilizando-os pessoal e comunitariamente10 como instru­mento realmente qualificado de animação salesiana. O CG21 lembrou-nos a importância da animação com indicações penetrantes e sugestivas.11

O Conselho Superior tem consciência do delicado mandato recebido da Congregação e da responsabilidade assumida no ministério da autoridade religiosa. Quer exprimir a sua vontade de serviço numa animação oportuna e atualizada, mergulhando as diretrizes e orientações no rico álveo do carisma do Fundador com amplos contextos de espírito religioso e de missão salesiana. Desejaria provocar uma atenção simultânea à tradição viva e aos sinais dos tempos.

É tarefa peculiar do Reitor-Mor com o seu Conselho guiar este urgente discernimento para ler uma realidade humana complexa e ambígua, com o objetivo de traduzir na vida de hoje o mesmo espírito de Dom Bosco: confron­tando os valores permanentes da mais genuína tradição salesiana com os apelos do que é novo.

Fazemos votos para que saibamos caminhar com inteligência e atenção nessa linha!



Convite à valorização da recente alocução do Papa à União dos Superiores Gerais.12



E, antes de concluir, quero oferecer-vos uma breve reflexão sobre o discurso que o S. Padre João Paulo II fez justamente hoje a nós, Superiores Gerais reunidos em sessão de estudo e oração.

Falou-nos da indispensabilidade da Vida Religiosa e de suas contribuições positivas para a obra de salvação de todo o Povo de Deus; sem ela “a Igreja não seria plenamente ela própria”.

Urge, pois, zelar pelos valores da Vida Religiosa com solicitude e fazê-los “funcionar” convenientemente “no conjunto da vida da Igreja contemporânea”.

Para atingir tão importante escopo o S. Padre destaca alguns grandes valores e põe em guarda contra insídias bem conhecidas.

Entre os grandes valores a cultivar para o refloresci­mento da Vida Religiosa hoje, o Papa enumera:



O carisma do Fundador, assumido com gratidão pela Igreja, não como “apelo ao passado”, mas como dinamismo de vida para os tempos novos.



A clareza evangélica da sequela de Cristo, não com espírito de “contestação”, mas como “testemunho” público na Igreja, alimentado pelo “espírito de maximalismo evangélico, que se distingue de qualquer radicalismo sociopolítico”.



Uma incorporação concreta na vida eclesial, a salva­guardar segundo os critérios diretivos do documento sobre as relações mútuas entre os Bispos e os Religiosos. Deve-se considerar nesse campo que o “caminho” característico para os Religiosos, onde quer que se encontrem no mundo, é o de serem “para a Igreja universal, mediante a (...) missão numa determinada Igreja local. (...) Unidade com a Igreja universal por meio da Igreja local”!



E o primado da dimensão contemplativa, com um cuidado especial do empenho na oração: “É este diz o Papa um dado ontológico que aspira subir à consciência e orientar a vida, não somente em benefício de cada pessoa, mas também para vantagem da comunidade inteira”.



Essas quatro grandes linhas de empenho para a genuini­dade e o reflorescimento da Vida Religiosa devem ser objeto da nossa consideração pessoal e comunitária; o Vigário de Cristo no-las propõe com autorizada preocupação após atenta consideração das exigências e dos problemas atuais. São reflexões e diretrizes dirigidas a nós, Religiosos de hoje, para que nos tornemos, de fato, na Igreja, testemunhas públicas da centralidade de Deus, do seu amor salvífico e da urgência de restituir à “santidade” o seu peso comuni­tário e social. É cultivando essa via de santificação específica, diz o Papa, que os Religiosos poderão evitar certos perigos muito atuais, como:



— “a tentação de particularismos e de contraposições”, que arruínam a unidade dos Institutos e das comunidades mediante a organização de grupos de pressão e de polarizações prejudiciais;



— “as radicalizações sociopolíticas”; por bem duas vezes o Papa no-las lembrou sublinhando-as com recorda­ções de sua experiência: “a opção pelos mais pobres e por toda vítima do egoísmo humano” deve ser claramente expressão de preocupação “evangélica”, bem diferente dos projetos temporalistas e radicalizações ideológicas “que ao longo do tempo se revelam inoportunas, contraproducentes e geradoras elas próprias de novas prepotências”;



e as atitudes de secularismo, pelas quais nos inse­rimos entre o povo, pondo em questão “a própria identidade religiosa” e ofuscando “a originalidade específica da própria vocação”.



Queridos Irmãos, entesouremos diretrizes tão concretas e atuais e recomendemo-nos à Virgem Maria para que as vivamos num testemunho crescente.

O próprio Papa lembrou aos Superiores Gerais que Nossa Senhora “continua a ser o modelo insuperável de toda vida consagrada. Seja Ela a vossa guia na subida, extenuante, mas fascinante, a caminho do ideal da plena assimilação a Cristo Senhor”.

Uma saudação cordial a todos, no espírito do nosso querido Fundador Dom Bosco.



P. Egídio Viganò

Reitor-Mor

1 CG21 19b.

2 CG21 61.

3 Mutuae relationes (MR), maio de 1978

4 MR, 13.

5 MR 13a.

6 MR 14c.

7 MB VIII, 828.

8 Pode-se resumir nas seguintes datas a crônica para ilustrar o que precedeu e preparou a criação dos ACS:

1867, 24 de maio: carta de Dom Bosco, considerada como o início das circulares formativas dos Irmãos;

1867-1888: circulares de Dom Bosco e de outros Superiores, sem data fixa (cópia datilografada nos arquivos);

1888-1905: o P. Rua continua a enviar cartas Circulares sem periodicidade fixa (recolhidas todas elas num volume);

1905-1920: o P. Rua inaugura a “Carta Mensal”, datada regular­mente no dia 24 de cada mês, com breves intervenções do Reitor-Mor e dos outros Superiores (todas conservadas no arquivo). Continua além disso a enviar cartas edificantes conforme as exigências e as circunstâncias;

1920, 24 de junho: o P. Albera inaugura o “número um” dos Atos do “Conselho” Superior. (Cf. ANS, novembro de 1974, p. 20).

9 ACS 1 (1920), p. 1-2.

10 Convém observar que um bom uso comunitário dos ACS implica, por parte do Diretor, ou de quem por ele, um critério de escolha para a leitura em comum. Nem tudo o que se inclui nas páginas dos Atos é, de per si, matéria apropriada para uma leitura espiritual comunitária

11 Cf. CG21 46, 584-586.

12 Cf. L’Osservatore Romano (edição portuguesa) de 3 de dezem­bro de 1978.

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