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V. CONDIÇÕES ORGANIZATIVAS E ESTRUTURAIS PARA VIVER E TRABALHAR JUNTOS



Muitos prodígios e milagres eram feitos pelas mãos dos Apóstolos entre o povo. Os fiéis reuniam-se todos no pórtico de Salomão. .... Agrupavam-se em número cada vez maior, uma multidão de homens e mulheres que acreditavam no Senhor” (At 5,12.14).



A. CHAMADO DE DEUS


66. Deus nos chama a “viver e trabalhar juntos” nas variadas situações sociais, culturais e religiosas nas quais vivem os jovens e a sermos nelas, como comunidade salesiana, sinais proféticos do seu amor e testemunhas dos valores do Reino dos Céus.

Estamos conscientes de que Deus nos pede de assumir e atuar a nossa missão em primeiro lugar como comunidade inspetorial e local.1


67. Desenvolveram-se na Congregação diferentes modalidades de vida comunitária salesiana. Elas, enquanto nos empenham a repensar e a renovar as modalidades operativas e organizativas da comunidade religiosa salesiana, nos convidam a avaliar continuamente as condições fundamentais que tornam possível uma vida comunitária significativa no cumprimento da nossa missão.


B. SITUAÇÃO


68. As Comunidades salesianas experienciam situações diversificadas e, em parte, novas quanto ao “viver e trabalhar juntos”. As novas situações de vida comunitária salesiana hoje se apresentam com as seguintes tipologias:

- Comunidades com um número reduzido de irmãos e empenhadas em animar uma pluralidade de obras e presenças, quer em terra de missão, quer em realidades com carência de pessoal.

- Comunidades inseridas em obras complexas, com desproporção entre trabalho e recursos e conseqüente fragmentação dos ritmos comunitários;

- Comunidades inseridas plenamente no tecido social até à partilha do estilo de vida do povo; que trabalham em estreita colaboração com a Igreja local; que colaboram com membros de outras religiões.

- Comunidades com presenças de leigos e de jovens dentro da vida comunitária.


Em muitas comunidades há experiências positivas nas quais transparece uma vida fraterna de sabor tipicamente evangélico, a compartilha comunitária e o sentido de responsabilidade e de participação na missão.


69. Existem alguns aspectos que influenciam negativamente a significatividade do nosso “viver e trabalhar juntos”. Permanece em alguns casos um modelo operativo de comunidade que exige uma séria reconsideração do relacionamento Comunidade-Missão:

- elementos estruturais que influenciam o relacionamento comunitário, como a prevalência das relações funcionais sobre as fraternas; a pouca valorização do projeto comum e dos momentos destinados ao encontro fraterno; a falta de organização do trabalho e sua setorialização;

- horários, hábitos, esquemas que tornam a comunidade afeita a modalidades de ação pastoral, a respostas tradicionais que estão muito distantes da realidade e da cultura dos jovens de hoje;

- presenças que não provocam nenhum questionamento, que não ativam comunhão e colaboração com aqueles que partilham o espírito e a mesma missão salesiana.


Essas condições constituem riscos concretos e reais para alguns irmãos, favorecendo cansaço físico e espiritual, situações de mal-estar psicológico e relacional, independência nas iniciativas, fragmentação no exercício da missão, dificulddes entre gerações, acúmulo de papéis e de funções.


70. O processo rumo a uma comunidade de salesianos religiosos com a tarefa de animação por dentro de uma realidade mais ampla – a Comunidade Educativo-Pastoral – é irreversível.2

Participam cada vez mais, no interior do núcleo animador da CEP, outros agentes (jovens, leigos, membros da FS, representantes da Igreja local e do território), os quais compartilham conosco a nossa espiritualidade e missão, empenhando-se na animação. Nesse núcleo, a comunidade salesiana desempenha o papel de referência carismática na qual todos se inspiram.



C. DESAFIOS


71. Como resposta ao chamado de Deus e à situação acima ilustrada, quatro são os desafios que pedem uma modalidade nova de organizar o nosso trabalho apostólico e a própria vida da Comunidade salesiana:

. Como superar a tendência ao individualismo, ao setorialismo e à pouca capacidade de partilha, que comprometem o nosso viver e trabalhar juntos?

. Como garantir uma consistência qualitativa e quantitativa da comunidade salesiana, como condição prévia para a vida fraterna, o testemunho evangélico e a presença entre os jovens?

. Como repensar o relacionamento entre as obras e a Comunidade salesiana, para assegurar-lhe o papel de garantia do carisma, de animação e de envolvimento de quantos compartilham o espírito e a missão de Dom Bosco?

Como racionalizar o conjunto das presenças salesianas num determinado território com o objetivo de assegurar as condições suficientes para uma vida comunitária e fraterna, e a animação da CEP?



D. ORIENTAÇÕES OPERACIONAIS


1.

Trabalhar segundo um projeto comunitário



72. Cada Comunidade partilha e elabora o próprio projeto comunitário e anualmente o avalia.

Dá-se deste modo consistência à capacidade de “viver e trabalhar juntos”, superando a progressiva dispersão do trabalho individual e o risco da fragmentação. Trata-se de levar os Irmãos a se convencerem da necessidade de trabalhar de acordo com um mesmo projeto, que não significa necessariamente fazer juntos as mesmas coisas.


73. A Comunidade se habilita a trabalhar segundo uma mentalidade de projeto:

▪ Desenvolvendo entre os Irmãos uma visão partilhada do projeto comunitário e ajudando cada um a descobrir e valorizar dons e qualidades. A Comunidade aceita cada Irmão com sua riqueza e os seus limites e atribui a cada um papéis de co-responsabilidade.

▪ Vivendo o projeto como um processo comunitário, que parte da vida concreta dos Irmãos. O objetivo não é só a redação final do projeto, mas sobretudo levar a efeito um confronto permanente sobre visões, valores, esperanças, que leve os Irmãos a um real viver e trabalhar juntos.

▪ Promovendo momentos de diálogo (assembléia dos Irmãos, Conselho local), de discernimento da vontade de Deus (momentos de oração, escuta da Palavra de Deus por meio da “lectio divina”, de confronto com o Magistério da Igreja e da Congregação), em sintonia com o Projeto Orgânico Inspetorial, cada Comunidade partilha, elabora e avalia todos os anos o caminho do próprio projeto.

▪ Questionando-se, particularmente, sobre os seguintes aspectos: O que queremos ser hoje como comunidade local? Como podemos, enquanto comunidade local, estar presentes de modo salesiano e religioso, animar a CEP e dar um testemunho evangélico? Quais as conseqüências concretas que brotam disso para a Comunidade? Quais as opções a que devemos proceder agora? De que formação pessoal e comunitária estamos precisando?


74. A elaboração do projeto comunitário empenha a comunidade nos seus diversos componentes:

▪ Envolvendo cada Irmão para além da função que desempenha e fazendo apelo à sua co-responsabilidade. O diálogo fraterno facilita a participação de todos, harmonizando o projeto pessoal de vida com aquele comunitário.

▪ Apontando, por meio da programação anual, objetivos, metas e ações que a própria comunidade se compromete a alcançar e a avaliar.

▪ Organizando de modo adequado e coerente o ritmo da vida comunitária, as atividades e os horários da vida religiosa e do serviço educativo pastoral, salvaguardando-lhe sempre o estilo salesiano.

▪ Garantindo ao diretor, a quem compete animar estes processo com a ajuda de seu Conselho, o necessário apoio por parte do Inspetor e dos organismos de animação inspetorial, valorizando a contribuição das ciências humanas.


▪ Convidando o Inspetor com o seu Conselho à avaliação do itinerário de realização dos projetos de cada Comunidade e a sua consonância com o projeto inspetorial.


2. Garantir a consistência qualitativa e quantitativa da Comunidade salesiana


75. A consistência qualitativa e quantitativa da Comunidade salesiana é condição fundamental para que cada Comunidade torne possível a experiência de vida fraterna, de testemunho evangélico, de presença animadora entre os jovens, de formação permanente, e realize de modo significativo a sua tarefa de animação na CEP, segundop o modelo operativo descrito pelo CG24.3


76. Isto se realiza:

▪ Cuidando do equilíbrio das novas fronteiras da missão salesiana e a consolidação ou o redimensionamento das atuais, em nível mundial e inspetorial.

▪ Promovendo na comunidade inspetorial e local a consciência de uma missão comum, garantindo-lhe a qualidade espiritual e educativo-pastoral mediante a formação permanente e o funcionamento dos organismos da comunidade (Conselho da Casa, Assembléia dos Irmãos, encontros fraternos regulares).



77. Para alcançar este objetivo:

▪ O Inspetor e o seu Conselho avaliam a consistência qualitativa e quantitativa das Comunidades existentes:

- à luz do critério dos Regulamentos Gerais, artigos 20 e 150;

- avaliando as concretas oportunidades de desenvolvimento que permitam alcançar, em tempos razoáveis, uma vida comunitária significativa;

- definindo em diálogo com as comunidades que vivem situações particulares relativamente à consistência quantitativa, as modalidades relativas ao exercício da autoridade e dos organismos da vida comunitária.


▪ O Inspetor e seu Conselho, ao iniciar novas presenças e ao formar novas Comunidades, garantem a adequada consistência qualitativa e quantitativa a fim de que se realize:

- uma vida fraterna de qualidade, segundo o estilo do espírito de família;

- a programação e avaliação comunitária da missão confiada à comunidade;

- a animação das obras e presenças e das respectivas CEPs.


▪ O Reitor Mor e o seu Conselho, durante o sexênio, promovem um processo de avaliação nas Inspetorias e Regiões que, por causa das novas situações, devem re-estruturar a presença salesiana.


3. Redefinir a relação Comunidade e Obra


78. A relação entre Comunidade e Obra deve permitir à Comunidade salesiana viver e trabalhar juntos e ser ponto de referência carismática no núcleo animador da CEP, o que supõe que o projeto comunitário esteja em sintonia com o Projeto Orgânico Inspetorial e com o de cada CEP.


16. A Comunidade salesiana realiza sua tarefa de animação da CEP amadurecendo a convicção de que:

▪ todos os salesianos religiosos, de acordo com suas possibilidades, são membros do núcleo animador, conscientes de que ele não se reduz à Comunidade SDB. Na linha de interpretação do artigo 5 dos Regulamentos Gerais e no espírito do CG24 e das sucessivas orientações4, deve ser maiormente incentivada a consciência de que a responsabilidade da animação da CEP deve ser partilhada com os leigos, superando resistências e entrando na perspectiva da co-responsabilidade carismática e pastoral;

▪ toda a Comunidade, ainda que representada por um só Irmão, se sente participante do núcleo animador da obra;

▪ o viver e trabalhar juntos da comunidade encontra uma perspectiva mais ampla, em nível de relações e de co-responsabilidade, no contexto da CEP;

▪ o relacionamento entre as estruturas de governo da comunidade religiosa e as estruturas de governo da obra deve ser harmonizado, evitando superposições.


80. A comunidade salesiana vive a sua vocação de ser ponto de referência para a identidade carismática do núcleo animador da CEP, assumindo o modelo operativo descrito pelo CG24. Para tal fim, a Comunidade salesiana cresce:

▪ formando os jovens e os leigos no carisma salesiano;

▪ partilhando com os leigos a própria missão;

▪ vivendo o espírito de família;

▪ promovendo uma verdadeira co-responsabilidade na animação e no governo;

▪ garantindo fidelidade à intencionalidade pastoral de todos os aspectos da vida comunitária;

▪ tornando-se promotora de paz e de justiça, e capaz de respostas concretas às necessidades dos pobres.


81. A Comunidade salesiana favorece o seu relacionamento com a CEP:

▪ vivendo com confiança e alegria o diálogo com os jovens do território;

▪ facilitando a participação dos salesianos, dos jovens e dos leigos no trabalho em rede, por meio do envolvimento das estruturas locais e inspetoriais;

▪ realizando o discernimento dos sinais dos tempos;

▪ formando lideranças profissionais na pastoral juvenil, nas dimensões da evangelização, da educação, do social e da pastoral vocacional;

▪ organizando uma pastoral que coordene entre si a CEP e o seu Conselho com a comunidade local com o seu Conselho5.


4. Elaborar e avaliar o Projeto Orgânico inspetorial


82. A Comunidade inspetorial, por meio dos seus organismos, estude, elabore ou avalie, nos próximos três anos, o Projeto Orgânico Inspetorial.

O Projeto Orgânico Inspetorial apresenta as opções fundamentais que orientam o desenvolvimento da Inspetoria, assegurando-lhe a continuidade e a coerência das decisões. Compreende os campos de ação prioritários para os próximos anos, os critérios operativos que devem guiar os vários planos e projetos, as presenças a que dar atenção, as linhas gerais para a preparação do pessoal e o desenvolvimento econômico e estrutural, respondendo às urgências atuais e às previsões futuras emersas da análise do território.6


83. O Projeto Orgânico Inspetorial deverá buscar os seguintes objetivos:

▪ reforçar em cada Irmão e em cada Comunidade o sentido da missão comum e da sua co-responsabilidade nela;

▪ redimensionar ou a re-estruturar as frentes de empenho e de desenvolvimento da Inspetoria;

▪ superar situações comunitárias de fragmentação, de dispersão e de inconsistência numérica;

▪ priorizar realmente as presenças mais significativas e proféticas, e uma expressão mais autêntica da missão salesiana no território.


84. Na elaboração e revisão do Projeto Orgânico Inspetorial, o Inspetor e seu Conselho, ajudado por uma equipe operativa, avaliam a significatividade da missão de cada uma das obras/presenças a partir dos seguintes critérios:

a consistência qualitativa e quantitativa da Comunidade salesiana;

a possibilidade de uma vida religiosa fraterna no estilo salesiano, legível e significativa para os jovens e os leigos colaboradores;

a presença entre os jovens, especialmente os mais pobres e necessitados, vivendo intensamente o sistema preventivo;

a capacidade de oferecer respostas de qualidade educativa e evangelizadora aos desafios que chegam do mundo juvenil e do contexto social;

a capacidade de juntar outras forças (leigos, jovens, Família Salesiana, outras inspetorias e organizações) e de suscitar vocações eclesiais, especialmente para a Família Salesiana;

a promoção de presenças ágeis e leves, que permitam um dinamismo adequado à mudança das realidades;

a capacidade de colaborar e de incidir, de modo eficaz e profético, na transformação evangélica do território.


1 Cf. C 44. 49

2 Cf. Relação do Vigário do Reitor-Mor ao CG25, n. 321.

3 Cf. CG24 159.173.174

4 “O que entendemos por “núcleo animador”? Trata-se de um grupo de pessoas que se identifica com a missão, com o sistema educativo e com a espiritualidade salesiana e assume solidariamente a missão de convocar, motivar, envolver todos aqueles que se interessam por uma obra, para formar com eles a comunidade educativa e realizar o projeto de evangelização e educação dos jovens. O ponto de referência para o grupo é a comunidade salesiana. Isto quer dizer que os salesianos, todos e sempre, fazem parte do núcleo animador. Cada um, idosos ou jovem, diretamente empenhado em tarefas operativas ou em repouso, dá a contribuição permitida pela sua preparação ou situação.[...] Quer dizer que o núcleo local pode ser formado até mesmo por leigos, tendo sempre por trás um apoio suficiente por parte dos salesianos, na localidade ou na Inspetoria” (P. J. E. VECCHI, ACG 363, pp. 8-9).

5 Cf. CG24, n. 161

6 Cf. A pastoral juvenil salesiana. Quadro de referência fundamental, pág. 132.