2.1. Os antecedentes imediatos


2.1. Os antecedentes imediatos

ATA DE FUNDAÇÃO DA SOCIEDADE DE S. FRANCISCO DE SALES,

18 DE DEZEMBRO DE 1859


Jesús-Graciliano González




Introdução

Em 18 de dezembro de 1859 deu-se a reunião de fundação da Sociedade de São Francisco de Sales. Dom Bosco reuniu em seu escritório 17 de seus auxiliares e, com eles, deu origem oficial à Congregação que vinha projetando há algum tempo. Na reunião, foi eleito o primeiro Conselho diretivo e, desde esse momento, deu início à caminhada da Sociedade. Os participantes da reunião tiveram uma clara visão histórica da transcendência do acontecimento e determinaram que se fizesse uma ata precisa com tudo o que ali acontecia. A ata foi lida em público e aprovada por todos. Determinou-se também que o original da ata fosse conservado e que, para garantir sua autenticidade fosse assinado por Dom Bosco, recém designado Reitor-Mor, e pelo P. Alasonatti, nomeado primeiro Prefeito da Sociedade. Acreditamos que é justo fazer a edição dessa ata, que se conserva no Arquivo Central Salesiano, no ano em que se completa o 150º aniversário da fundação da Congregação.



1. Ambiente fundacional no Oratório nos anos 1855 a 1859



Desde 1855, ano em que a lei contra as Ordens religiosas foi aprovada em Turim, até 1865, quando os primeiros salesianos fizeram a profissão perpétua, viveu-se no Oratório um verdadeiro ambiente fundacional de grupos e associações. Dom Bosco estava num momento de plenitude vocacional e de iniciativa educacional, dedicado a obras de caridade e apostolado juvenil e popular. Suas atividades eram inúmeras, e ele logo percebeu que precisava de colaboradores para garantir seu funcionamento e continuidade, assim como a unidade de orientação, direção e métodos. Ninguém melhor do que os mesmos jovens que eram educados em seu Oratório, entre os quais havia muitos com vocação sacerdotal e muito ligados à sua pessoa.

Data desses anos a conhecida Introdução ao Plano de Regulamento, em que Dom Bosco traça o ideal que queria ver plasmado nos novos sacerdotes que se propunha a formar. Segundo ele, o sacerdote devia ser pai, irmão e amigo dos jovens.1 Era o tipo de sacerdote que ele mesmo praticava e que nos deixou literariamente descrito no colóquio após o episódio exemplar do encontro com Bartolomeu Garelli.2

Para tanto, começou a dar vida a uma série de associações ou grupos, que deviam ajudá-lo na tarefa de assistência e educação dos meninos que atendia em seus oratórios: associações de caráter religioso, de tipo caritativo, ou grupos comprometidos em atividades coletivas, como companhias, scola cantorum, banda de música, grupos de teatro etc.

Logo começou a funcionar no Oratório a Companhia de São Luís, que serviu de modelo para a criação das outras companhias, que foram surgindo nesses anos. A peste que assolou a cidade de Turim em 1854 deu ocasião à companhia de colaborar ativamente na assistência aos empestados. Passada a peste, organizaram-se nos Oratórios de S. Francisco de Sales, S. Luís e Santo Anjo da Guarda, as conferências juvenis de S. Vicente de Paulo, que faziam obras de caridade e assistência aos jovens dos oratórios.3

A companhia da Imaculada foi fundada em 1856, com a colaboração ativa de alguns alunos do Oratório aspirantes ao sacerdócio, entre outros Domingos Sávio, que foi um fervoroso animador; o dinâmico clérigo José Bongiovanni, que redigiu o regulamento; e José Rocchietti que, apesar da saúde frágil, estava sempre disposto a colaborar no Oratório. A companhia orientava-se especialmente a honrar a Virgem, colocando-se sob o seu patrocínio e entregando-se inteiramente a serviço dela. Inspirava-se naquela que mais tarde será definida como "espiritualidade juvenil salesiana", que comporta alguns elementos distintivos fundamentais: observância rigorosa das normas da casa; ajuda espiritual aos colegas, principalmente com o bom exemplo, mas também com outras obras de caridade; frequência dos sacramentos; alegria etc. Padre Braido, ao falar dessa companhia, assinala como princípio seguro de ascese prática, a união íntima entre caridade e o binômio obediência-castidade: "A caridade estabelece-nos na perfeição, mas só com a obediência e a castidade podemos adquirir esse estado que tanto nos aproxima de Deus".4 As práticas de piedade eram aquelas comuns a todos os alunos do Oratório, só que os sócios deviam fazê-las com maior perfeição. É também importante o fato de a coesão do grupo manter-se firme graças à subordinação de tudo ao juízo dos Superiores.

Não resta dúvida de que se tratava de um embrião de associação juvenil religiosa, com clara orientação para uma Congregação de vida consagrada. De fato, os primeiros salesianos surgiriam entre seus sócios.5

Em 1857, o clérigo José Bongiovanni, instituía a companhia do SS. Sacramento, com caráter essencialmente piedoso. O pequeno "clero", que se encarregará de manter o decoro e a solenidade das celebrações litúrgicas, surgirá mais tarde entre os mais velhos e mais fervorosos sócios dessa companhia.

Impulsionada pelo clérigo João Bonetti, surgiu em 1859 entre os aprendizes do Oratório a companhia de São José.

Essas companhias converteram-se em valiosíssimo instrumento educativo nas mãos de Dom Bosco, que se serviu de seus dirigentes e sócios para levar adiante a obra final que estava a criar ao seu redor.







2. Primeiros passos até a fundação da Sociedade de São Francisco de Sales



No ambiente de caridade ativa, piedade sincera e obediência às normas estabelecidas, vividos por esses grupos de seus colaboradores mais diretos, Dom Bosco sentia-se sempre mais animado a levar a cabo a ideia, acariciada a algum tempo, de fundar uma Sociedade que garantiria a continuidade das obras caritativas e educacionais do Oratório. Ali ele tinha fundamentalmente as bases e o elemento humano. Tratava-se de começar a dar os primeiros passos.

A experiência demonstrara a Dom Bosco que o pessoal voluntário não garantia a estabilidade, continuidade e homogeneidade da sua obra. Era preciso uma organização que proporcionasse o pessoal necessário para manter viva a ideia e o espírito original do Oratório. O melhor era uma congregação religiosa. Contudo, corriam tempos difíceis para as congregações desse tipo. As leis promovidas em Turim por Cavour e Rattazzi suprimiram muitas das ordens religiosas e confiscaram seus bens. Para fundar alguma associação, ela deveria ser uma das que foram permitidas pelas novas leis. Parece que foi numa conversa com Urbano Rattazzi, o ministro que mais propugnara e defendera as leis anticlericais, que este sugerira a Dom Bosco fundar uma sociedade contra a qual o Estado não tivesse nada a objetar. Para ele, era necessário que os membros conservassem seus direitos civis, se submetessem às leis e como livres cidadãos pagassem seus impostos ao Estado. Ninguém poderia fazer nada contra ela, porque se tratava de uma associação de livres cidadãos que se uniam e viviam em comum para uma finalidade benéfica, como outros o faziam para finalidades comerciais ou de auxílio mútuo. Dispôs-se que se esses sócios em seu foro interno aceitavam também a autoridade do Papa ou dos bispos, ou se uniam com votos privados, isso era uma questão pessoal, que não importava em nada ao Estado, desde que respeitassem suas leis.

Com essas ideias em ebulição na cabeça, Dom Bosco foi a Roma em 1858. A crônica da Viagem a Roma, que o padre Rua, companheiro de Dom Bosco, nos deixou,6 deixa-nos bastante bem informados da viagem de Dom Bosco, de suas andanças pela cidade nos passos dos primeiros papas e dos mártires, dos quais escrevia em sua História Eclesiástica, das visitas e contatos com personagens importantes do Estado e da Cúria papal. Fazem o mesmo as resenhas que encontramos nas Memórias Biográficas, nos estudos de Stella, Desramaut e Braido e em outras biografias de Dom Bosco.

Segundo Braido, sem dúvida, "Não é de todo aceitável o que se refere à finalidade principal que levara Dom Bosco a Roma, ou seja, o início da caminhada que levaria à fundação da Sociedade de S. Francisco de Sales. Podem-se avançar conjecturas, mais do que certezas, sobre os aspectos essenciais".7 Segundo essas conjecturas que tomamos de Braido, Stella e Desramaut, parece bastante claro que Dom Bosco foi a Roma para conhecer e fazer-se conhecido. Era muito importante que se tomasse conhecimento na Cúria romana daquilo que ele estava a fazer: oratórios, escolas, oficinas, internato, publicações catequéticas e apologéticas, as Leituras Católicas. A questão da consolidação e continuidade de todas essas obras seria solucionada por si mesma ao se chegar a compreender a sua extraordinária importância.

Já eram muitos em Turim, de D. Fransoni ao ministro Rattazzi, que conhecendo o bem que Dom Bosco fazia se perguntassem sobre o futuro dos oratórios, cuja continuidade eles viam como necessária. Dom Bosco, muito sensível ao problema, esperava que ao tornar conhecidas as suas obras e as dificuldades encontradas surgisse espontaneamente também em Roma a pergunta sobre o futuro das mesmas, e que fosse inclusive instado a fundar uma instituição que garantisse a sua continuidade.

Para Dom Bosco, era evidente a necessidade de fazer alguma coisa que garantisse a consolidação e continuidade de suas obras, pois vivera as dificuldades surgidas nos anos anteriores, quando tentara conseguir entre seus colaboradores unidade de critérios, finalidades, ação, métodos etc.; estes, embora dotados de boa vontade e zelo apostólico, tinham mentalidade e estilo diferentes do seu; por outro lado, ocupados como estavam em outras atividades e cargos, não dispunham nem de tempo nem da estabilidade exigidos, sempre mais imperiosamente, pela crescente atividade das obras. Por isso, há algum tempo estava a pensar numa solução, mas queria ouvir a opinião das altas hierarquias da Igreja sobre as diversas possibilidades que se ofereciam: uma simples associação de eclesiásticos e leigos? uma sociedade de membros ligados ao superior com promessa ou votos simples? ou uma verdadeira congregação religiosa de caráter diocesano ou pontifício? Embora não por escrito,8 já desenhara em sua mente um esboço de regulamento sobre uma hipotética associação religiosa.

Uma vez em Roma, e atendendo às observações feitas pelo Card. Gaude, ele o completou, redigiu e submeteu ao exame do superior geral dos Rosminianos, padre João Batista Pagani.9

É muito provável que Dom Bosco tenha falado disso tudo com Pio IX e lhe tenha exposto a conversa tida com o ministro Rattazzi. O Papa não descartou a ideia, mas aconselhou-o que os sócios se ligassem entre si com verdadeiros votos religiosos.10 Havia outras associações que mais ou menos caminhavam dessa mesma forma: os Irmãos das Escolas Cristãs, os Rosminianos, os Oblatos de Maria etc.




Ao retornar a Turim, Dom Bosco começou a dar corpo a suas ideias, que não eram apenas ideias, mas fatos concretos realizados nos anos anteriores. Com efeito, há alguns anos ele orientava alguns de seus melhores alunos para o sacerdócio. Primeiramente, Bellia e Reviglio, que chegaram a ser sacerdotes, embora tenham se integrado depois em suas respectivas dioceses; mais tarde foram vestindo o hábito talar em diversos momentos: João Cagliero em 2 de novembro de 1851; João Batista Francesia em 22 de junho de 1852; Miguel Rua e José Rocchietti em 24 de setembro do mesmo ano; e outros ainda nos anos seguintes. Com estes clérigos Dom Bosco garantia a assistência nos diversos ambientes dos oratórios.

Em 5 de junho de 1852, de acordo com aquilo que o padre Rua deixou escrito, Dom Bosco reuniu Ângelo Guanti, Tiago Bellia, José Buzzetti, Francisco Bosco, João Cagliero, João Batista Francesia, Germano Giovanni, Gianinati, Luís Marchisio, Ângelo Savio, Estevão Savio, Miguel Rua e João Turchi; que se comprometeram a rezar todos os domingos, a sós, as sete alegrias de Maria.11 Excetuando-se o padre Ângelo Guanti, de 38 anos, a idade ia dos 20 anos de Buzzetti aos 12 de Marchisio; Rua tinha 15, Cagliero e Francesia, 14, e Ângelo Savio, 17. Em 23 de março de 1855, diante de Dom Bosco, Miguel Rua fazia de modo privado os votos de pobreza, castidade e obediência. Em 26 de janeiro de 1854, Dom Bosco propunha a Tiago Artiglia, João Cagliero, Miguel Rua e José Rocchietti fazerem um "exercício prático de caridade", que na linguagem do Oratório significava o trabalho de animação oratoriana. O compromisso poderia ser confirmado posteriormente com voto. "Desde aquele dia, escreve o padre Rua, foi dado o nome de salesianos aos que se propuseram e se propunham tal exercício".12 Rua, Rocchietti, José Bongiovanni, Pettiva e Momo foram com Dom Bosco, nos dias 14 a 23 de julho de 1856, para um curso de Exercícios Espirituais em Santo Início (Lanzo). Em 1857 outros jovens muito ligados a Dom Bosco vestiram a batina: João Bonetti e Celestino Durando.

Estes são alguns dos fatos pelos quais Dom Bosco foi preparando sabiamente o ambiente, para, dessa forma, poder plasmar mais segura e facilmente suas ideias de fundar uma Sociedade religiosa.



2.2. O momento decisivo: dezembro de 1859



1859 foi um ano muito importante para Dom Bosco. Durante o ano sucederam-se vários fatos de fundo diverso: publicação da vida de Domingos Sávio; nova edição da História da Itália, acolhida com duras críticas pela imprensa oficial e defendida pela imprensa católica; e, sobretudo, a segunda guerra da independência italiana (26 de abril de 1859 a 12 de julho de 1959) quando se enfrentaram o exército franco-piemontês e o do império austríaco, que terminou com a união da Lombardia ao Reino da Sardenha, pondo assim as bases para a criação do Reino da Itália. Dom Bosco tinha pressa de estabelecer solidamente o grupo de seus colaboradores para que não acontecessem os fatos de 1848. Desramaut suspeita que o ato de desobediência de um grupo de músicos do Oratório13 fez com que ele refletisse sobre possíveis atos de rebeldia em relação aos acontecimentos políticos que se aproximavam. Por isso, começou a fazer uma série de reuniões com seus colaboradores, alguns dos quais tinham feito voto de permanecer com Dom Bosco, outros uma simples promessa. Nessas reuniões passou a explicar-lhes e esclarecer-lhes sobre o era uma sociedade religiosa e a ideia que tinha de fundar uma nova. No dia da Imaculada, à tarde, anunciou publicamente que no dia seguinte, sexta-feira 9 de dezembro, faria uma reunião especial em seus aposentos, depois que os meninos tivessem ido repousar. Os que deviam participar entenderam perfeitamente a que se referia o convite e pressentiram a importância daquela reunião.

De fato, reuniram-se em 9 de dezembro e, depois de invocarem a luz do Espírito Santo e a assistência de Maria Santíssima, Dom Bosco fez uma breve alusão ao que dissera nas reuniões anteriores; descreveu o que era uma congregação religiosa, sua beleza, a honra imortal de quem se consagrava inteiramente a Deus, a facilidade de salvar a própria alma, o acúmulo inestimável de merecimentos que se pode adquirir com a obediência, a dupla coroa que espera o religioso no paraíso. E, com visível comoção, anunciou que chegara o momento de dar forma àquela congregação, na qual estava pensando há muito tempo. Esclareceu-lhes que, de certo modo, a congregação já existia, pois a maioria deles já lhe pertencia com o espírito ou mediante uma promessa ou voto, e com a observância das regras tradicionais, mas que, em consciência, não se podia declarar obrigatória. Acrescentou que seriam inscritos nessa congregação somente os que, depois de madura reflexão, tivessem a intenção de emitir, no devido tempo, os votos de castidade, pobreza e obediência.14

Chegara, portanto, o momento da decisão para todos os que quisessem fazer parte da Pia Sociedade de S. Francisco de Sales. Todos teriam uma semana para refletir e tratar do assunto com Deus. Dom Bosco pedia aos que não quisessem aderir à Sociedade, que não fossem mais às reuniões. Recordemos que nesse tempo de reflexão, segundo narra o P. Lemoyne, o clérigo Cagliero, que já se decidira anteriormente a ficar para sempre com Dom Bosco, depois de uma agitada e profunda reflexão respondeu a alguém que dizia "Dom Bosco quer-nos fazer frades": "Frade ou não frade, é a mesma coisa. Estou decidido como sempre estive a jamais me separar de Dom Bosco". E escreveu a Dom Bosco colocando-se inteiramente à sua disposição.15 Provavelmente, a maior parte do outros fez a mesma reflexão. Dom Bosco já se tinha encarregado anteriormente de mostrar-lhes as vantagens da vida religiosa sobre a vida dos que preferiam exercer o próprio sacerdócio em suas cidades ou perto de suas famílias.16



1 2.3. Primeira redação das Constituições da Sociedade de S. Francisco de Sales

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A reflexão dos colaboradores não partiu do zero, nem só das palavras dirigidas a eles nos meses anteriores à reunião de 9 de dezembro. Dom Bosco já contava com um projeto claro das futuras constituições plasmado num texto. Nele havia todos os elementos para saber aquilo que, na realidade, Dom Bosco pretendia fazer. Segundo F. Motto, que estudou criticamente o desenvolver-se das Constituições Salesianas,17 o texto mais antigo que possuímos data de 1858, ou seja, mais de um ano antes da data que nos ocupa. Esse texto é o ponto de chegada de mais de uma década de experiência educativa feita por Dom Bosco e, por sua vez, o texto base das sucessivas redações, com acréscimos e correções, que virão. Ele está contido num manuscrito copiado pelo padre Rua e corrigido por Dom Bosco. Tratava-se, contudo de mero projeto, pois não tinha qualquer aprovação eclesiástica, mas recolhia, sem deixar dúvidas, as intenções de Dom Bosco; nele também estavam claramente traçadas as linhas do que seria a futura congregação idealizada por ele: a origem, a finalidade e a forma; os votos de obediência, pobreza e castidade; o governo interno; a aceitação de sócios. Os colaboradores conheciam o texto e sabiam, portanto, até onde Dom Bosco os queria levar.



2.4. 18 de dezembro de 1859



Chegou o dia marcado para a reunião decisiva de 18 de dezembro. Na ata da reunião consta claramente quem participou (segundo as MB faltaram somente dois, sem que seus nomes sejam citados18) e o que nela se fez. Tratava-se de promover e conservar o espírito de verdadeira caridade requerida na obra dos oratórios em favor da juventude abandonada e periclitante. Decidiram, por isso, constituir-se numa Sociedade ou Congregação, que levando em conta a ajuda recíproca para a própria santificação, se propunham a promover a glória de Deus e a salvação das almas, especialmente das mais necessitadas de instrução e educação. Constituída a Sociedade, passou-se à eleição dos membros que a deviam dirigir: o Superior Maior, o Prefeito, o Diretor Espiritual, o Ecônomo e três Conselheiros. Terminada a eleição, lida a ata, aprovada por unanimidade, deu-se por concluída a sessão histórica de fundação da nova Sociedade de São Francisco de Sales.

Os que faltaram à reunião ficaram livres para seguir a própria vocação. As fontes conhecidas até agora não nos dão a conhecer os nomes dos dois que faltaram à reunião, mas é de se supor terem seguido o exemplo dos que trabalharam no Oratório sem se inscreverem na Sociedade de S. Francisco de Sales e, uma vez concluídos os estudos, reintegraram-se em suas dioceses de origem. Conhecem-se muitos que, tendo saído do Oratório, mantiveram-se sempre amigos de Dom Bosco.

3. Os passos seguintes (1860-1884)



Embora a sociedade constituída tivesse um caráter privado e fosse carente da aprovação eclesiástica, sua fundação supunha um passo fundamental para o que seria depois a Congregação Salesiana. Por isso iniciou imediatamente sua marcha ascendente. Nos anos seguintes, a partir de 2 de fevereiro de 1860, o Capítulo da Sociedade eleito na reunião fundacional começou a reunir-se para admitir novos sócios "à prática das regras dessa sociedade", ou seja, a prova da prática do exercício da caridade no Oratório. Nas atas do Capítulo que publicamos no apêndice* apresentamos os nomes dos primeiros admitidos a essa prática.

Em 11 de junho de 1860, 26 sócios da Sociedade dirigiam uma carta a D. Luís Franzoni, Arcebispo de Turim, que se encontrava desterrado em Lyon, na qual lhe enviavam as regras da nova Sociedade e lhe pediam que as lesse, corrigisse, alterasse, suprimisse ou acrescentasse aquilo que o Senhor lhe inspirasse para a maior glória de Deus. Assinaram a carta: os sacerdotes padre João Bosco, padre Vitório Alosonatti, padre Ângelo Savio; o diácono Miguel Rua; os clérigos João Cagliero, João Bonetti, Carlos Ghivarello, João Batista Francesia, Segundo Pettiva, José Bongiovanni, Domingos Ruffino, Celestino Durando, João Batista Anfossi, Francisco Vaschetti, Antonio Rovetto, Francisco Cerrutti, José Lazzero, Francisco Provera, Luís Chiapale, João Garino, Pedro Capra, Eduardo Donato, Gabriel Momo; o estudante Paulo Albera; e os coadjutores José Rossi e José Gaia. Dos que participaram da reunião de fundação só falta Luís Marcellino. Acrescentaram-se Vaschetti, Garino, Capra, Donato, Momo, Albera, Rossi e Gaia.19

D. Fransoni respondeu, depois de ter lido as Constituições, que se reservava um tempo para ponderar melhor a sua resposta.

As primeiras profissões de votos privados, porque a Congregação ainda não tinha sido aprovada como também as Regras, aconteceu no dia 14 de maio de 1862. Nela emitiram os votos trienais os sacerdotes: padre Vitório Alasonatti, padre Miguel Rua, padre Ângelo Savio, padre José Rocchietti, padre João Cagliero, padre João Batista Francesia, padre Domingos Ruffino; e os clérigos Celestino Durando, João Anfossi, João Boggero, João Bonetti, Carlos Ghivarello, Francisco Cerruti, José Lazzero, Francisco Provera, Luís Chiapale.

Em 1863, a nova Sociedade começou a expandir-se para fora de Turim abrindo uma casa em Mirabello, diocese de Casale Monferrato a cerca de cem quilômetros de Turim. Foi nomeado diretor o P. Miguel Rua, e catequista o clérigo João Bonetti; por isso foi necessário nomear dois novos membros do Capítulo geral, que supriram os que iam para Mirabello. Por isso, reuniram-se no dia 15 de novembro daquele ano todos os sócios da Sociedade que deram a aprovação ao candidato proposto por Dom Bosco, o sacerdote padre Domingos Ruffino, e elegeram por unanimidade o padre João Batista Francesia como Conselheiro geral em substituição a João Bonetti, nomeado catequista de Mirabello.

Entretanto foram chegando nesses anos cartas de recomendação de bispos que pediam a aprovação da Pia Sociedade Salesiana: de D. Modesto, bispo de Acqui, em 18 de dezembro de 1983; de D. Clemente, bispo de Cuneo, em 23 de novembro de 1863; de D. G. Antonio, bispo de Susa, em 18 de janeiro de 1864; de D. João Tommaso, bispo de Mondoví, em 10 de fevereiro de 1864; de D. Luís, bispo de Casale, em 11 de fevereiro de 1864.20

Em 23 de julho de 1864, a Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos emanava o Decretum Laudis, ou seja, o decreto que aprovava a existência e o espírito da nova Sociedade, mas deferia para mais tarde a aprovação das Constituições. Constituía Dom Bosco como Superior Geral de modo vitalício, enquanto se limitava a 12 anos a duração do seu sucessor.21 Embora ainda não se tratasse da aprovação formal da Congregação, era sem dúvida o primeiro documento oficial que reconhecia sua existência e dava fundadas esperanças para o futuro.

Reconhecido oficialmente como Superior Geral, Dom Bosco podia aceitar profissões perpétuas na nova Congregação. A primeira aconteceu no dia 10 de novembro de 1865, e foi a do sacerdote João Batista Lemoyne, admitido diretamente aos votos perpétuos. Seguiram-nas, cinco dias mais tarde, em 15 de novembro, as do padre Rua, padre Cagliero, padre Francesia, padre Ghivarello, padre José Bonetti, padre Henrique Bonetti, a do clérigo Pedro Racca e as dos coadjutores José Gaia e Domingos Rossi, todos eles já professos de votos temporais.

A aprovação oficial da Sociedade de S. Francisco de Sales deu-se em 1869. Recebeu primeiramente a aprovação "tamquam Dioecesanam Congregationem" pelo bispo de Casale, D. Pedro Maria Ferrè com decreto de 13 de janeiro de 1868.22 A aprovação pontifícia deu-se por meio de um decreto da "Secret. S. Congr. Episcoporum et Regularium" de 1º de março de 1869, assinado pelo Card. Quaglia, Prefeito. O decreto adiava a aprovação das Constituições, mas concedia a Dom Bosco a faculdade de admitir às ordens sacras os jovens que, antes dos 14 anos, tivessem entrado como alunos numa casa salesiana.23

Enfim, no dia 13 de abril de 1874 chegou a esperada e definitiva aprovação das Constituições por meio de um decreto da "Secretaria da Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos", assinado pelo Card. Bizzarri, então Prefeito da Congregação. Nele se diz que sua Santidade o Papa Pio IX na audiência concedida ao Secretário da Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos [...] "approbavit et confirmavit, prout praesentis Decreti tenore, approbat atque confirmat" as Constituições, tal como estão contidas no exemplar que se conserva no Arquivo da Congregação dos Bispos e Religiosos.24 O projeto inicial de Dom Bosco sofrera muitos cortes nas longas negociações com as hierarquias eclesiásticas e, no final saiu diferente do que ele desejara. "Minha intenção era fazer algo bastante diverso do que é, mas obrigaram-me a fazer assim e assim será".25 Deu-se, porém, por satisfeito: "O Senhor serviu-se de nós para propor um novo modelo de voto de pobreza, segundo as necessidades dos tempos. Seja tudo para glória de Deus, porque é Ele quem fez tudo".26

Em 1877 aconteceu o primeiro Capítulo Geral da Sociedade de São Francisco de Sales e a Congregação seguiu sua caminhada normal. A aprovação das Constituições foi o grande ponto de partida da dilatação da Congregação na Itália e fora da Itália. Na Itália, os salesianos expandiram-se também a várias regiões, além de pelo Piemonte e Ligúria onde já estavam: Lazio, Toscana, Sicília, Emília Romanha (Parma); Trento, que na época ainda estava sob o poder da Áustria. Fora da Itália: em 1975, partiu para a Argentina a primeira expedição missionária, à qual se seguiram muitas outras: 12 no tempo de Dom Bosco e 139 até hoje. Na América, nos tempos de Dom Bosco, os salesianos iniciaram sua atividade na Argentina, Uruguai, Brasil, Chile e Equador. Em 1875, abriu-se também a primeira casa na França (Nice) à qual logo se seguiram outras. Em 1881, os salesianos fundaram a casa de Utrera, a primeira na Espanha, e, ainda durante a vida de Dom Bosco, a de Sarriá, em Barcelona. Em 1886, os salesianos abriram uma casa em Londres, Inglaterra.27 Após a morte de Dom Bosco, a Congregação foi-se tornando sempre mais internacional, estando expandida hoje praticamente pelo mundo todo.

Em 9 de maio de 1876, com um breve do Papa Pio IX, reconhecia-se a União dos Cooperadores Salesianos, que vinham a ser uma espécie de Salesianos externos, que, de certa maneira, substituiriam o primeiro projeto de Dom Bosco de admitir membros externos na Congregação, projeto que não foi aprovado pela Santa Sé. As Filhas de Maria Auxiliadora tinham sido fundadas em 1872.28

Só restava obter o privilégio da isenção, como o possuíam as principais Congregações religiosas de então. Demorou 10 anos para chegar. Com um decreto de 28 de maio de 1884, assinado pelo então Prefeito da Sagrada Congregação dos Bispos e Religiosos, Card. Ferrieri concedia-se a Dom Bosco "omnia et singula Indulta, Privilegia, Exemptiones et Facultates Congregationi SS. Redemptoris concessa".29

Entretanto, a Congregação começara também a organizar-se em inspetorias e reunir-se em Capítulos Gerais, primeiramente com ritmo de três anos e depois a cada seis anos. O primeiro aconteceu em 1877, o 26º, último até agora, em 2008.



4. A ata de Fundação



4.1. O conteúdo



Examinando detidamente a ata, podemos distinguir nela várias partes:

  1. A minuciosa e detalhada indicação do momento da reunião: são indicados com precisão o ano (1859), o dia (18), o mês (dezembro), o lugar genérico (o Oratório), o lugar específico (os aposentos de Dom Bosco), e a hora (às 9 da noite). Ao comparar-se esta precisão com o descuido de algumas das outras atas do manuscrito, que são transcritas no apêndice, pode-se facilmente deduzir que todos os presentes estavam conscientes da transcendência do ato. Assim também o farão ver no final da sessão, quando pedem que se conserve a ata original da reunião.

  2. A lista dos presentes com nome e sobrenome. Essa lista apresenta-se seguindo a ordem de dignidade eclesial: sacerdotes (2), diácono (1), subdiácono (1), clérigos (13), estudante (1). Na apresentação dos clérigos não se segue nem a ordem alfabética, nem a de idade.

  3. Segue a declaração da intenção dos reunidos: promover e conservar o espírito de caridade exigida na obra dos Oratórios em favor da juventude abandonada e periclitante. Todos os componentes do grupo já tinham praticado essa obra de caridade ajudando Dom Bosco no Oratório; trata-se agora de comprometer-se a continuar trabalhando unidos para promover e conservar melhor o que já se estava fazendo. Cumpria-se assim o que Dom Bosco vinha pretendendo e preparando há muito tempo, ou seja, contar com colaboradores fixos e fieis à sua pessoal e ao seu espírito.

  4. Assinala-se, embora muito genericamente, a finalidade da Sociedade que está sendo constituída nesse momento: a própria santificação e a promoção da glória de Deus e a salvação das almas. Trata-se de um breve resumo do que se estabelecia no esboço de constituições sobre a finalidade da Congregação: "Lo scopo di questa congregazione si è di riunire insieme i suoi membri... a fine di perfezionare se medesimi (1) [...] i congregati cominceranno a perfezionare se stessi colla pratica delle [...] virtù [...] di poi si adopereranno a beneficio del prossimo (2) [...] Il primo esercizio di carità sarà di raccogliere giovani poveri e abbandonati [...] siccome si pratica [...] nell’ oratorio di S. Francesco di Sales, di S. Luigi e in quello del Santo Angelo Custode» (3)30. È de se notar a formulação da finalidade da nascente Congregação: a ajuda recíproca para a própria santificação, a promoção da glória de Deus, a salvação das almas e o aspecto educativo da sua atividade. Isso se concentraria mais tarde no lema: "Da mihi animas cetera tolle", mas a primeira formulação têm uma tonalidade um pouco diversa: a maior glória de Deus e a salvação das almas, a começar pela própria, e o exercício da caridade na instrução e educação dos jovens mais necessitados dela.

  5. Passa-se, em seguida, à eleição dos membros da diretoria. Nesse aspecto dão-se algumas correções ao modo estabelecido no primeiro esboço escrito de constituição. Lê-se no capítulo do esboço sobre o governo: "A Congregação será governada por um capítulo formado por um reitor, prefeito, ecônomo, diretor espiritual ou catequista, e dois conselheiros", mas uma das correções feitas pelo próprio Dom Bosco já indica o número de três conselheiros.31 Segundo essa correção foram eleitos três conselheiros. Nas sucessivas fases de correção das Constituições, esta de Dom Bosco foi aceita e já aparecem três conselheiros.

Nessa primeira redação das Constituições não existe uma norma precisa sobre o modo de eleição do Superior Maior; fixavam-se apenas as condições que o eleito deveria ter; entre elas, uma referia-se à idade fixada com o mínimo de 35 anos, e essa condição só se cumpria em Dom Bosco que tinha 44 anos e no padre Alasonatti, que tinha 47; e que estivesse, ao menos, há seis anos na congregação, condição que, logicamente, não ocorria em nenhum de seus membros no momento da fundação. Por isso, todos pediram a Dom Bosco que aceitasse esse cargo "que em tudo Lhe era conveniente".

As normas mudarão em redações futuras, tanto em relação à idade, quanto em relação aos anos de vida na congregação: 30 e 8 respectivamente na redação de 1864; 35 e 10 nas redações seguintes até 1875. Nada se dizia também nas Constituições de 1858 sobre a maneira de eleger os outros membros do conselho, pelo que a maneira com que se fez foi em parte proposta por Dom Bosco, que pôs como condição para sua aceitação como Superior Maior a de reservar-se a faculdade de eleger diretamente o Prefeito.32

A maneira de eleger os demais membros foi decidida ali mesmo: "Pensou-se então no modo de eleição dos outros Sócios que concorrem à Direção, e se concordou em adotar a votação com sufrágio secreto como o mais breve caminho para constituir o Conselho". Até a redação latina de 1873, não se codificou a forma de eleição dos membros do conselho, muito parecida com a empregada na primeira eleição: "Praefectus et spiritualis Director creantur a Rectore. Oeconomus vero et tres consilarii suffragiis eligentur a socis...". Acrescentar-se-á que os sócios eleitores devem ser de votos perpétuos, condição que não se dava nesta primeira votação.33

  1. Leitura e aprovação do que se fez e acordo unânime para que se conserve a ata original desta sessão fundamental da Sociedade de São Francisco de Sales.



4.2. Os primeiros sócios



Estando à ata de fundação, os primeiros sócios eram 18, incluindo Dom Bosco. Indicamos seus nomes a começar por Dom Bosco e seguindo a ordem alfabética para os demais, com uma breve nota sobre suas vidas.34

1. Bosco Giovanni. 44 anos. Nasceu em 16 de agosto de 1815. Foi ordenado sacerdote em 5 de junho de 1841. Fundador do Oratório de São Francisco de Sales. Superior Maior da Congregação a partir de 18 de dezembro de 1859 até sua morte, acontecida no dia 31 de janeiro de 1888. Para os dados de sua vida e obra remetemos às numerosas biografias escritas sobre ele.

2. Alasonatti Vittorio. 47 anos. Nasceu em Avigliana (Turim) em 15 de novembro de 1812. Frequentou o colégio eclesiástico de Turim. Foi ordenado sacerdote em 13 de junho de 1835. Mestre escolar em sua cidade e de gramática em Turim. Entrou no Oratório como ajudante de Dom Bosco em 1854. Em 1855 fez votos privados anuais perante Dom Bosco. Em 18 de novembro de 1859 foi escolhido pelo recém nomeado Reitor-Mor da Sociedade de S. Francisco de Sales como Prefeito do Conselho Superior, cargo que conservou até sua morte. Professou como salesiano em 14 de maio de 1862. Morreu em Lanzo no dia 7 de outubro de 1865.

3. Anfossi Giovanni Battista. 19 anos. Nasceu em Vigone (Turim) em 1840 e entrou no Oratório em 23 de dezembro de 1853. Foi um dos alunos mais próximos de Dom Bosco, que o mandou inscrever-se na Universidade. Ensinou no Oratório. Foi sócio das Conferências de São Vicente de Paulo agregadas ao Oratório. Foi um dos que assinou a carta a D. Fransoni com a petição de reconhecimento da Sociedade de S. Francisco de Sales. Fez votos trienais em 14 de maio de 1862. Ordenado sacerdote deixou a Congregação em 1864, mas continuou como sacerdote diocesano até a morte em Turim no dia 15 de fevereiro de 1913.

4. Bonetti Giovanni. 21 anos. Nasceu em Caramagna (Cuneo) em 5 de novembro de 1838. Entrou no Oratório em 10 de julho de 1855. Foi eleito conselheiro no primeiro Conselho Superior da Sociedade. Fez a primeira profissão por três anos em 14 de maio de 1862. Em 1863 fez um exame extraordinário para obter a habilitação de professor do ginásio. Foi ordenado sacerdote em 21 de maio de 1864 e em 1865 fez a profissão perpétua. Foi o primeiro diretor do Boletim Salesiano. Escreveu várias obras, entre as quais a História do Oratório, publicada aos poucos no Boletim Salesiano sob o atento exame de Dom Bosco. Em 1886 foi eleito Diretor Espiritual da Congregação no lugar deixado por D. Cagliero. Morreu prematuramente aos 53 anos no dia 5 de junho de 1891.

5. Bongiovanni Giuseppe. 23 anos. Nasceu em Turim no dia 15 de dezembro de 1836. Entrou no Oratório em 1854 e distinguiu-se pela sua atividade e por ser um dos grandes animadores do Oratório; amigo de Domingos Sávio, fundou com ele e com G. Rocchietti a Companhia da Imaculada. Em 1857, com Dom Bosco, foi o fundador da companhia do SS. Sacramento e organizou o Pequeno Clero. Professou em 1862 e foi ordenado sacerdote em 21 de dezembro de 1862. Escrevia para o teatro poesias jocosas em piemontês. Ensaiava as cerimônias litúrgicas no Oratório. Preparou o clero com entusiasmo para a solene inauguração da nova igreja de Maria Auxiliadora em 9 de junho de 1868, e morreu oito dias depois da inauguração, no dia 17 de junho de 1868.

6. Cagliero Giovanni. 21 anos. Nasceu em Castelnuovo d'Asti em 11 de Janeiro de 1838. Entrou no Oratório em 1851. Foi um dos quatro primeiros "salesianos" que aderiram à ideia de Dom Bosco de fundar uma Sociedade. Foi eleito conselheiro no primeiro Conselho Superior. Professou temporariamente em 1862 e foi ordenado sacerdote no mesmo ano. Bem dotado para a música, frequentou a escola de harmonia do Prof. Cerruti e compôs inúmeras peças musicais. Em 1873 obteve a láurea em Teologia pela Universidade de Turim. Em 1875 foi o chefe da primeira expedição de missionários salesianos. Em 1877, foi eleito Diretor Espiritual da Congregação e, em 1884, o Papa Leão XIII nomeou-o bispo titular de Magida e confiou-lhe o Vicariato Apostólico da Patagônia. Em 1907, Pio XI nomeou-o arcebispo de Sebaste e, mais tarde, Delegado Apostólico da América Central. Em 1915, Bento XV concedeu-lhe o título de Cardeal. Morreu em Roma no dia 28 de fevereiro de 1926.

7. Cerruti Francesco. 15 anos. Nasceu em Saluggia (Vercelli) em 28 de abril de 1844. Entrou no Oratório em 12 de novembro de 1856. Professou temporariamente em 1862 e fez a profissão perpétua em 11 de janeiro de 1866. Foi ordenado sacerdote em 22 de dezembro de 1866; nesse mesmo ano obtivera a láurea em letras pela Universidade de Turim. Foi o primeiro diretor da casa de Alassio, inspetor da Inspetoria Lígure e, em 1885, nomeado Conselheiro escolar geral, contribuindo decisivamente na organização dos estudos da Congregação. Morreu em Alassio no dia 25 de março de 1917. Para maior conhecimento do padre Cerruti, remetemos à introdução de J. M. Prellezo ao volume: F. Cerruti, Lettere circolari e programmi di insegnamento. Roma, LAS 2006.

8. Chiapale Luigi. 16 anos. Nasceu em Castigliole Asti em 13 de fevereiro de 1843. Entrou no Oratório em 1857. Era bom cantor e frequentou a escola de música do clérigo Pettiva (frequentada também pelo padre Cagliero). Fez votos trienais em 1862 e renovou-os em 1867, mas não chegou a fazer a profissão perpétua; por isso, Dom Bosco pôde dizer mais tarde que ele nunca tinha pertencido à Congregação. Retornou à diocese de Saluzzo, onde exerceu seu sacerdócio. Em 1889, sendo Capelão Mauriciano deixou escrito um valioso testemunho sobre os sofrimentos de Dom Bosco diante das acusações que lhe chegavam de Roma.35

9. Durando Celestino. 19 anos. Nasceu em Farigliano de Mondoví (Cuneo) em 29 de abril de 1840, e foi um dos amigos de Domingos Sávio; fez a primeira profissão em 1862 e a perpétua em 1865. Foi ordenado sacerdote em Mondoví em 21 de maio de 1864. Foi professor do primeiro curso ginasial do Oratório. Em 1865 passou a fazer parte do Conselho Superior, do qual foi membro até a morte em 27 de março de 1907. Dom Bosco encarregou-o de iniciar a Biblioteca della Gioventù italiana. Foi autor de varias obras, entre elas, os Vocabolari latino-italiano e italiano-latino. De 1886 a 1903 foi o superior de uma espécie de Inspetoria que compreendia as casa que ainda não tinham sido agregadas a inspetorias regulares.

10. Francesia Giovanni Battista. 21 anos. Nasceu em San Giorgio Canavese (Turim) em 3 de outubro de 1838. Entrou no Oratório em 1852 e em 1853 vestiu a batina. Professou em 1862 e foi ordenado sacerdote em 14 de junho de 1863. Em 1865 fez a profissão perpétua e no mesmo ano laureou-se em letras pela Universidade de Turim. Foi diretor de vários colégios salesianos, membro do Conselho Superior e Diretor Espiritual; de 1878 a 1902 foi Inspetor da Inspetoria Piemontesa-Lombarda. Iniciou a coleção Selecta ex latinis scriptoribus, na qual se publicaram os melhores textos clássicos para uso da juventude com suas oportunas notas. Morreu em Turim no dia 17 de janeiro de 1930.

11. Ghivarello Carlo. 24 anos. Nasceu em Pino Torinese em 17 de setembro de 1835. Entrou no Oratório em 1857 e foi colega de Domingos Sávio; fez a primeira profissão em 1862. Foi ordenado sacerdote em Turim em 1864 e fez a profissão perpétua em 1865. Eleito Conselheiro geral em desempate de votos com o clérigo Provera, foi nomeado secretário do Conselho, cargo que ocupou até 1876 quando foi nomeado Ecônomo Geral. Em 1880 foi enviado por Dom Bosco como diretor de Saint-Cyr (França) e mais tarde passou a ser diretor de Mathi, Itália. Teve grandes qualidades de construtor; são obras suas o coro da Basílica de Maria Auxiliadora, a capela dos aposentos de Dom Bosco, como também a capela de San Benigno Canavese. Foi entusiasta da agricultura. Morreu em San Benigno Canavese no dia 28 de fevereiro de 1913.

12. Lazzero Giuseppe. 22 anos. Nasceu em Pino Torinese em 10 de maio de 1837; seguindo o exemplo de seu concidadão Ghivarello, entrou no Oratório em 1857 com o desejo de ser sacerdote. Vestiu a batina em 1859, fez a primeira profissão em 1862 e a perpétua em 1870. Foi ordenado sacerdote em Turim em 10 de maio de 1865. Dom Bosco nomeou-o membro do Conselho Superior à morte do padre Provera em 1874 permanecendo no cargo até 1898. Foi o primeiro a ter o título de Conselheiro Profissional. A partir de 1885 ocupou-se de manter a correspondência com os missionários. Em 1897, gravemente enfermo, retirou-se a Mathi, onde morreu 13 anos mais tarde no dia 7 de março de 1910.

13. Marcelino Luigi. 22 anos. Nascido em 1837, sabe-se muito pouco dele. Estava no Oratório em 1856 quando um grupo de alunos decidiu alternar-se para que todos os dias, ao menos um deles comungasse e não acontecesse de novo que ninguém comungasse num determinado dia. Eram eles Bonetti, Durando, Rocchietti, Vaschetti, Marcellino e Rua, praticamente o grupo ao qual mais tarde Domingos Sávio aderiu, e do qual surgiu a Companhia da Imaculada à qual pertenceu. Aparece na ata de fundação da Sociedade de S. Francisco de Sales, mas não voltou a aparecer nem na lista dos que assinaram a carta de petição a D. Fransoni, nem em qualquer outra lista de profissões temporárias ou perpétuas. O padre Marcelino, citado no vol. XIX das MB, que teve graves conflitos com D. Gastaldi, não parece ter tido alguma coisa a ver com este Marcelino Luigi do Oratório.

14. Pettiva Secondo. 23 anos. Nascido em Turim em 1836, aparece na ata de fundação e também é um dos que assinam a carta de petição a D. Fransoni. Não está, porém, em nenhuma lista de profissões. Esteve no Oratório de 1856 a 1863, e em 1858 era Professor da primeira série do ginásio. Tinha muita aptidão para a música e durante vários anos foi diretor da escola de música do Oratório; nela se formaram, entre outros, padre Cagliero, padre Lazzero, Buzzetti, Dogliani e muitos outros que, por sua vez, foram mestre de muitos outros alunos. Em 1863 deixou o Oratório, mas de vez em quando visitava o seminário de Mirabello, onde prestava pequenos serviços. Caiu gravemente enfermo e foi hospitalizado. No hospital, pediu com insistência a visita de Dom Bosco, que foi visitá-lo duas vezes. Morreu em 1868.36

15. Provera Francesco. 23 anos. Nasceu em Mirabello em 4 de dezembro de 1836. Entrou no Oratório em 1858 e distinguiu-se pelo seu grande zelo apostólico. Emitiu os votos trienais em 1862, foi ordenado sacerdote em 25 de dezembro de 1864 e em 1866 fez a profissão perpétua. Em 1863 começou sua carreira de prefeito, cargo para o qual tinha muito boas qualidades. Foi prefeito em Lanzo, Mirabello, Cherasco e no Oratório. Uma ferida no pé, com que padecia há muitos anos, revelou-se mortal e depois de alguns meses de grande sacrifício morreu em Turim no dia 13 de abril de 1874. Dom Bosco, que estava em Roma, escreveu sobre ele: "A Sociedade perde um de seus melhores sócios".

16. Rovetto Antonio. 17 anos. Nascido em Castelnuovo d'Asti em 1842, entrou no Oratório em 1855. Foi colega de Domingos Sávio e destacou-se pela boa conduta. Inscreveu-se na Conferência de S. Vicente de Paulo. Participou da reunião de fundação da Congregação e é um dos signatários da carta a D. Fransoni, sendo estudante do segundo ano de Filosofia. Professou por três anos em 18 de janeiro de 1863 e deixou o Oratório em setembro de 1865.

17. Rua Michele. 22 anos. Nasceu em Turim em 9 de junho de 1837. Entrou no Oratório em 24 de setembro de 1852 e esteve sempre muito próximo de Dom Bosco, a quem acompanhou na viagem de 1858 a Roma. Participou da reunião de 26 de janeiro de 1854 na qual se deu o nome de "salesianos" aos seguidores de Dom Bosco. Em 25 de março de 1855 fez votos privados anuais perante Dom Bosco. Foi eleito Diretor Espiritual da nascente Congregação na reunião de fundação. Foi ordenado sacerdote em Caselle no dia 29 de julho de 1860. Fez os votos trienais em 15 de maio de 1862 e os perpétuos em 15 de novembro de 1865. Obteve o diploma de professor de ginásio na Universidade de Turim. Foi o primeiro diretor do colégio salesiano de Mirabello, o primeiro fora de Turim, de 1863 a 1865. Nesse ano retornou a Turim com o cargo de Prefeito geral. Em 1884 foi nomeado por Leão XIII Vigário e sucessor de Dom Bosco. Foi Reitor-Mor da Congregação desde 1888 até a morte em 6 de abril de 1910. Sobre sua vida e personalidade remetemos às biografias escritas sobre ele por Amadei, Ceria, Auffray, Desramaut etc.

18. Savio Angelo. 24 anos. Nasceu em Castelnuovo d'Asti em 20 de novembro de 1835. Entrou no Oratório em 4 de novembro de 1850. Na reunião de fundação era diácono e foi eleito Ecônomo Geral da Sociedade de S. Francisco de Sales e permaneceu no cargo até 1875. Entretanto foi ordenado sacerdote em Turim no dia 2 de junho de 1860. Fez os votos trienais em 1862 e os perpétuos em 16 de setembro de 1869. Encarregou-se das construções de Alassio, Vallecrosia, Marselha e da igreja do Sagrado Coração de Roma. Em 1885 acompanhou o padre Cagliero em excursões pela América. Em 1892, foi ao Equador como missionário e morreu numa viagem de exploração no dia 17 de maio de 1893.37

Várias coisas chamam a atenção nesta lista dos sócios:

  1. A idade do grupo. Excetuando-se Dom Bosco, 44 anos, e o padre Alasonatti, 47, a idade dos demais vai dos 15 anos de Francisco Cerruti aos 25 de Francisco Provera, com uma idade média inferior a 21 anos.

  2. O fato de que muitos deles foram colegas de Domingos Sávio e, com ele, foram membros da Companhia da Imaculada: Rua, Cagliero, Bonetti, Durando, Marcellino, Bongiovanni, Francesia, Lazzero, Ângelo Sávio.

  3. O valor e o elevado índice de perseverança desses primeiros sócios: além de Dom Bosco, 12 continuaram na Sociedade até a morte, contando-se entre eles um Reitor-Mor que, além disso, chegou à gloria dos altares, o Beato Miguel Rua; um Cardeal da Santa Igreja, João Cagliero; vários que, por muitos anos, participaram do Conselho Superior da Sociedade e outros que ocuparam cargos de responsabilidade como inspetores ou diretores; três deles chegaram a professar na Congregação, mas deixaram-na depois; dois deles continuaram a exercer o sacerdócio em suas dioceses de origem e permaneceram ligados aos salesianos; só dois não chegaram a professar.

  4. O fato de a Congregação Salesiana começar a consolidar-se com meninos e jovens educados diretamente e modelados espiritualmente pelo Fundador, com quem se identificavam e em quem tinham plena confiança. Serão eles a transmitir inalterado o espírito genuíno de Dom Bosco às gerações posteriores.



Quadro de presença dos signatários da ata fundacional no processo de preparação e criação da Sociedade Salesiana.

Sócios fundadores com Dom Bosco

Grupo de oração

1856

Nome de Salesianos

1854


Membros da Companhia da Imaculada

185638

Fundação

1859

Carta D. Fransoni

1860

Profissão temp.

1862-63

Mortos como salesianos

Alasonatti Vittorio




Bonetti Giovanni



Bongiovanni Gius.



Cagliero Giovanni

Cerruti Francesco




Durando Celestino



Francesia Giov. B.


Ghivarello Carlo




Lazzero Giuseppe



Provera Francesco




Rua Michele

Savio Angelo


Anfossi Giov. Bat




Sac. Dioc.

Chiapale Luigi




Sac. Dioc

Marcellino Luigi





Rovetto Antonio





Pettiva Secondo







4.3. O texto da ata39


O texto da ata que possuímos está escrito com caligrafia boa e clara, sem podermos identificar com segurança quem é o autor material da redação. Ao ler o conteúdo dir-se-ia que a ata foi escrita pelo padre Alasonatti, que se apresenta a si mesmo como "quem escreve" e assina-a como "Secretário", contudo a grafia da ata não corresponde a que temos em outros documentos do mesmo padre Alosonatti. Por sua vez, o padre Berto afirma em nota colocada no final da sua cópia da ata: "a caligrafia da Ata acima nomeada, como das seguintes, é do padre Carlos Ghivarello, exceto a assinatura do Superior Maior e do Secretário que são de próprio punho", mas não cremos que tenha razão, pois a grafia da primeira é diferente da grafia das atas que a seguem, escritas certamente pelo padre Ghivarello.

Em relação às assinaturas, parece claramente autógrafa a do padre Alasonatti, que é quem autentica a veracidade da ata; a assinatura de Dom Bosco, apesar do que diz o padre Berto em sua nota, segundo a minha opinião, avalizada pela assessoria de bons conhecedores da caligrafia de Dom Bosco, tem todas as aparências de não ser autógrafa, mas uma imitação feita por outra pessoa que, pela intensidade da tinta, semelhante à da sua assinatura, poderia ser do mesmo padre Alasonatti.40

Esta ata original está contida num pequeno caderno de papel de 24 páginas numeradas de tamanho 21 cm x 14,5 cm, bem conservado, que contém também outras atas do Conselho Superior até 1869. A ata fundacional ocupa as três primeiras páginas, escritas com caligrafia bem cuidada. As páginas 4 a 23 são escritas pelo padre Carlos Ghivarello, que substituiu o padre Alasonatti como secretário a partir da reunião seguinte do Capítulo; a página 24 está em branco. O manuscrito encontra-se no Arquivo Salesiano Central com a classificação ASC D 8680101. Não tem título e começa logo com o texto.

Possuímos outras duas cópias da ata, uma do padre Berto, que reproduz com exatidão a ata original, embora, como dissemos, ele a considere, equivocadamente segundo o nosso parecer, escrita pelo padre Ghivarello. A outra cópia manuscrita de autor desconhecido também está escrita com boa caligrafia. Tem-se a impressão de que se trate de uma cópia para estudo, porque bastante sublinhada a lápis de várias cores. Dir-se-ia que foi utilizada para não estragar ou deteriorar a original. Não traz nenhuma novidade.

A ata foi acolhida, também, com pequenos retoques, carente de interesse filológico, tanto nos Documenti, quanto no volume VI páginas 335-336 das MB. Foi ainda reproduzida por Arthur Lenti em Don Bosco History and Spirit41.

O texto é aqui reproduzido integralmente, sem alterar nem o conteúdo nem a pontuação. Dado que as cópias manuscritas são tomadas certamente do original e reproduzem o texto ao pé da letra, com mínimas variantes na grafia das maiúsculas e na pontuação, acreditamos que não vale à pena levá-las em conta, pois com toda segurança a ata é anterior a essas cópias.

Assinalamos, apenas por mera curiosidade, as pequenas variantes que aparecem na edição impressa das Memórias Biográficas, embora não contribuam em nada para o texto manuscrito da ata, como se pode comprovar facilmente: nostro em lugar de Nostro; 18 por diciotto; 9 por nove; Giov. por Gio.; tempi calamitosi por calamitosi tempi; Ufficio por uffizio, ufficiali por Ufficiali; soci por Soci; consiglieri por Consiglieri; assumere por assumersene; pur ora nominati por per ora nominati; si sottoscrive il Superiore maggiore e il redattore come segretario por sottoscrisse il Superiore Maggiore e come Segretario. Algumas outras alterações na pontuação, mas sem importância.


A ATA


No Nome de Nosso Senhor Jesus Cristo

Amém


1859. No ano do Senhor de mil oitocentos e cinquenta e nove, em dezoito de Dezembro, neste Oratório di S. Francisco di Sales, no aposento do Sacerdote João Bosco, às 9 horas da noite, se reuniam, ele, o Sacerdote Vitório Alasonatti, os clérigos Ângelo Savio - Diácono, - Miguel Rua - Subdiácono, - João Cagliero, João Batista Francesia, Francisco Provera, Carlos Ghivarello, José Lazzero, João Bonetti, João Anfossi, Luís Marcellino, Francisco Cerruti, Celestino Durando, Segundo Pettiva, Antônio Rovetto, César José Bongiovanni, o jovem Luís Chiapale, todos com o escopo e em um só espírito de promover e conservar o espírito de verdadeira caridade que se requer na obra dos Oratórios para a juventude abandonada e periclitante, a qual nestes tempos calamitosos é de mil maneiras seduzida, com prejuízo da sociedade, e precipitada na impiedade e na irreligião.

Aprouve, portanto, aos mesmos Congregados erigir-se em Sociedade ou Congregação que, tendo em mira a ajuda recíproca para a própria santificação, se propusesse promover a glória de Deus e a salvação das almas especialmente das mais necessitadas de instrução e de educação │ e aprovado de comum acordo o projeto proposto, feita breve oração e invocadas as luzes do Espírito Santo, procediam à eleição dos Membros que deviam constituir a direção da sociedade para esta e para novas Congregações, se aprouver a Deus favorecer seu desenvolvimento.42

Pediram, portanto, unanimemente que Ele, iniciador e promotor, aceitasse o cargo de Superior Maior como aquele que em tudo Lhe era conveniente; o qual tendo aceito com a reserva da faculdade de nomear o prefeito, como ninguém se opôs, pronunciou que lhe parecia não se devesse remover do cargo de prefeito quem escreve, o qual exercia tal encargo até agora na casa.

Pensou-se então no modo de eleição dos outros Sócios que concorrem à Direção, e se concordou em adotar a votação com sufrágio secreto como o mais breve caminho para constituir o Conselho, o qual devia ser composto por um Diretor Espiritual, pelo Ecônomo e por três Conselheiros, em companhia dos dois já eleitos, descritos acima.

Tendo agora sido feito Secretário para este fim quem escreve, ele protesta que cumpriu fielmente o encargo │ que lhe fora confiado pela confiança comum, atribuindo o sufrágio a cada um dos Sócios à medida que era anunciado na votação; e assim resultou na eleição do Diretor Espiritual por unanimidade a escolha do Clérigo Subdiácono Miguel Rua que não se recusava a aceitar. O que se repetiu para o Ecônomo, foi eleito e reconhecido o Diácono Ângelo Savio o qual prometeu também assumir o relativo encargo.

Faltava ainda eleger os três conselheiros; como primeiro dos quais, tendo-se feito como de costume a votação foi eleito o clérigo João Cagliero. Como segundo conselheiro saiu o clérigo João Bonetti. Para o terceiro e último, tendo saído iguais os sufrágios a favor dos clérigos Carlos Ghivarello e Francisco Provera, feita outra votação a maioria resultou para o clérigo Ghivarello, e assim foi definitivamente constituído o corpo de administração para a nossa Sociedade.

O qual fato, como veio complexivamente exposto até aqui, foi lido em plena reunião de todos os acima mencionados Sócios e superiores por agora nomeados, os quais uma vez reconhecida a sua veracidade, concordes fixaram que se conservasse esse original, o qual para a autenticidade assinaram o Superior Maior e como Secretário


Sac. Bosco Gio.

Alasonatti Vittorio Sac. Prefeito


Trad.: jav

Salesiano, membro do Instituto Histórico Salesiano.


1 Cf. Pietro Braido, Dom Bosco padre dos jovens no século da liberdade. Vol. I. São Paulo, Editora Salesiana, 2008, p. 306.

2 Cf. João Bosco, Memórias do Oratorio. São Paulo, Editora Salesiana 2005, pp. 122-123. Ediç. cuidada por Antonio da Silva Ferreira.

3 Cf. Francesco Motto, Le conferenze annesse di S. Vincenzo de’ Paoli negli oratori di don Bosco. Ruolo storico di una esperienza educativa, em José Manuel Prellezo [ed.], L’impegno di educare. Roma, LAS 1991, pp. 472-476.

4 Cf. p. Braido, Dom Bosco padre dos jovens..., vol. I. p. 318.

5 Uma das atas mais antigas que se conserva, de junho de 1856, diz assim: "Nós Bonetti Giovanni, Vaschetti Francesco, Savio Domenico, Marcellino Luigi, Durando Celestino, Momo Giuseppe, Bongioanni Giuseppe, a fim de garantir para nós o Patrocínio de Maria, tanto em vida quanto na morte, e nos dedicarmos inteiramente ao seu santo serviço, no dia [sem o dia no original - NdT] do mês de junho, munidos todos com os S.S. Sacramentos e decididos a professar para com a Santíssima Virgem Maria uma devoção constante, prometemos diante do nosso Diretor Espiritual e diante do Seu altar que, porquanto o permitirem nossas forças, queremos imitar Luís Comollo. Por isso nos obrigamos: 1. A observar rigorosamente as regras da casa. 2. Edificar os companheiros admoestando-os caridosamente e excitando-os ao bem com as palavras, mas muito mais com o bom exemplo. 3. Ocupar escrupulosamente o tempo...". ASC E 452. No final do Regulamento aparecem os nomes de Rua Michele, Bongiovanni Giuseppe, Savio Domenico, Marcellino Luigi, Momo Giuseppe, Rocchietti Giuseppe, Bonetti Giovanni, Vaschetti Francesco, Durando Domenico. Nas atas de sessões posteriores aparecem os nomes de outros sócios: Cagliero Giovanni, Francesia Giovanni Battista, Savio Angelo, Reano Giuseppe, Turchi Giovanni. O primeiro presidente foi o clérigo Miguel Rua.

6 Cf. ASC A 2230101.

7 Cf. P. Braido, Dom Bosco padre dos jovens..., vol. I, p. 389.

8 As fontes não estão de acordo neste ponto, como se pode ver pela carta de Dom Bosco e pela História do Oratório escrita pelo padre Bonetti, reproduzidas nas notas a seguir.

9 Assim consta numa carta de 4 de março de 1858 ao "Muito Reverendo e Veneradíssimo Padre Geral, Preciso que me demonstre um sinal de bondade: que leia o breve plano de congregação religiosa anexo, e que, depois, me faça as observações que, no Senhor, lhe parecerem melhores. Eu esperava falar só com palavras sobre este propósito; mas o Cardeal Gaude aconselhou-me a pô-lo por escrito. Por isso, nestes dias trouxe-o à memória do modo que pude como ele é praticado na casa do Oratório. Agradeço-lhe de toda a caridade que tem para conosco nestes dias e, enquanto desejo copiosas bênção do céu sobre o Senhor e sobre toda a Congregação entregue aos seus cuidados paternos, professo-me com gratidão e estima De V. S. Muito Reverenda e Veneradíssima. Obrigadíssimo servidor. Sac. Bosco Gio": Giovanni Bosco, Epistolario. Vol. I (1835-1863). Introdução, textos críticos e notas aos cuidados de Francesco Motto. Roma, LAS 1991, p. 339.

10 Na Storia dell'Oratorio, escrita pelo padre Bonetti, um dos implicados em todo o período de formação da Congregação e, portanto, conhecedor direto de muitos acontecimentos e bem informado sobre outros, publicada aos poucos no Boletim Salesiano, do qual o padre Bonetti foi o primeiro diretor e o era na ocasião, encontra-se no Cap. XII de julho de 1883 a viagem de Dom Bosco e do padre Rua a Roma. As notícias são tomadas da Memória inédita, completada com aquilo que o autor da história do Oratório soube diretamente do padre Rua. Ao falar da audiência com o Santo Padre, diz-se: "[...] fazendo cair o discurso sobre os Oratórios, a certo ponto [o Papa] saiu espontaneamente nesta pergunta a Dom Bosco: – Mas, se viésseis a morrer, o que seria da vossa obra? – Dom Bosco, que estava para entrar em seu argumento principal, colheu logo da ocasião propícia, e replicou que viera a Roma justamente para prover ao futuro dos Oratórios, e apresentou-lhe a carta de recomendação de D. Fransoni. O Vigário de Jesus Cristo, tendo lido a recomendação do intrépido exilado, e tendo conhecido a intenção de Dom Bosco, demonstrou-se muito contente e disse: – Vê-se que nós três estamos de acordo. – Pio Nono exortou, então, a Dom Bosco que redigisse as regras da Pia Sociedade segundo a finalidade que tinha concebido, e deu-lhe sugestões importantes a respeito. Entre outras coisas, disse-lhe: – É preciso que crieis uma Sociedade, que não possa ficar encalhada no Governo, mas ao mesmo tempo não vos deveis contentar em ligar os seus membros com simples promessas, porque jamais ficareis seguro dos vossos sujeitos, nem podereis contar muito com a vontade deles". E mais adiante: "– Iluminado pelos conselhos e confortado pelas palavras do Vigário de Jesus Cristo, Dom Bosco retocou, nos dias em que permaneceu em Roma, as regras da Pia Sociedade de S. Francisco de Sales, já escritas no ano anterior, e que levara consigo; retomou-as, acrescentando outras mais para tornar a sua essência mais de acordo com os sentimentos de Pio IX, que as tendo depois nas mãos dignou-se lê-las atentamente, fazendo algumas observações de próprio punho, e enviou-as ao Eminentíssimo Cardeal Gaude. O insigne purpurado, ilustre filho de S. Domingos e glória do Piemonte, tendo ido no ano anterior a Cambiano, sua pátria perto de Turim, também viera visitar o nosso Oratório. Ele, por isso, já conhecia esta obra, e Dom Bosco estava em ótima relação com ele. Por isso, antes de partir de Roma, Dom Bosco fez com ele diversas reuniões sobre o assunto, e concordou-se que as regras fossem praticadas por algum tempo, como tinham sido modificadas, e enfim remetidas a Sua Eminência, que as apresentaria à Santa Sé para a aprovação. Entretanto, infelizmente, o benemérito Cardeal Gaude deixava de viver. A morte deste leal conselheiro e grande protetor de Dom Bosco, acontecida em 14 de dezembro de 1860, foi motivo para que se protelasse a dita aprovação, sobre a qual diremos a seu tempo": BS, julho de 1883, p. 116.

11 Este fato é narrado assim nas MB: "Dom Bosco tinha grande cuidado em preparar para aquele suspirado dia alguns entre os melhores e mais fervorosos habituando-os a algum pio costume das sociedades religiosas. Por isso, de vez em quando, continuava a fazer alguma conferência só para eles. Entre eles estava o diácono Guanti Gioachino que dava aulas de latim. Em 5 de junho de 1852, Dom Bosco os reunia e exortava a escolherem um monitor secreto entre os colegas que advertisse caridosamente aquele que o tinha escolhido para esse ofício dos defeitos nos quais tivesse caído a fim de evitá-los. Miguel Rua escolheu Reviglio para seu monitor secreto; e garantia-nos que os avisos dados pelo amigo serviram-lhe imensamente. Desta conferência temos memória numa pequena folha escrita por Miguel Rua nestes termos: D. Bosco, D. Guanti, Bellia, Buzzetti, Gianinati, Savio Angelo, Savio Stefano, Marchisio, Turchi, Rocchietti 1°, Francesia, Bosco Francesco, Cagliero, Germano, Rua. Reuniram-se estes para a conferência no sábado à noite de 5 de junho de 1852. Nessa conferência ficou estabelecido que se rezasse todos os domingos as sete alegrias de Maria SS. No ano seguinte observar-se-á quem destes terá perseverado na realização do que se estabeleceu até o sábado pré-fixado, isto é, o primeiro sábado do mês de maio. Oh! Jesus e Maria, fazei santos todos os que se inscreveram nesta pequena folha. O motivo não revelado dessas orações era poder dar vida à Pia Sociedade Salesiana. E foram observantes perseverantes do que Dom Bosco lhes aconselhara; persuadidos de que disso viria um grande bem". Cf. ASC E 452.

12 ASC A 4630102.

13 Numa carta de Dom Bosco ao Barão Feliciano Ricci des Ferres, datada de 3 de novembro de 1859, em que recomendava o jovem Francisco Rossi, faz-se alusão clara ao fato: "Este pobre rapaz, além de outras coisas, comprometeu-se com outros desta casa que, contrariamente à minha proibição, foram almoçar fora em lugar que não se deve tolerar. Mandei chamá-los enquanto almoçavam, fiz repetir o chamado depois do almoço, porque me doía muito tomar medidas pesadas contra cerca de vinte jovens desviados. Quatro apenas afinal renderam-se e humilharam-se; os outros se demonstraram muito mais orgulhosos. Após o almoço foram andar pela cidade; à noite, foram jantar no mesmo lugar e voltaram para casa tarde da noite meio embriagados; entre estes últimos estava o Rossi. Como os havia ameaçado muitas vezes, caso se demonstrassem obstinados, de expulsá-los da casa, assim tive de fazê-lo com o meu maior pesar. Entretanto, depois da carta terei o Rossi aqui na casa por alguns dias e verei se consigo, como espero, colocá-lo em outro lugar". G. Bosco, Epistolario. Vol. I..., p. 385. Cf. Francis Desramaut, Don Bosco en son temps. Turim, SEI 1996, p. 571s.

14 As notícias dessas reuniões estão recolhidas nas MB VI 327ss. Entretanto, Desramaut que fala delas, acrescenta "Il ne subsiste, sur cette proposition datée du 9 décembre par don Lemoyne, qu’une realiton d’origine ancore incertaine, en Documenti, VII, 35. Elle a été reprise en MB VI, 335-336". Cf. F. Desramaut, Don Bosco en son temps..., p. 600.

15 MB VI 335. Levando-se em conta que neste momento a primeira redação das Constituições já estava feita e que Dom Bosco tinha explicado nas reuniões anteriores o que significava ser religioso, parece estranha esta dúvida de Cagliero narrada por Lemoyne, mas sem citar nenhuma fonte. O normal parece ser que, durante esses dias, os companheiros do grupo tenham conversado sobre a transcendência do passo que iam dar.

16 Ibid., 330 ss.

17 Cf. Giovanni Bosco, Costituzioni della Società di S. Francesco di Sales. 1858-1875. Textos críticos preparados por Francesco Motto. Roma, LAS 1982. Citado aqui como: F. Motto, Costituzioni...

18 MB VI 335.

19* Os apêndices não constam desta tradução (NdT)


? O original encontra-se no ASC A 1710525; Cf. MB VI 631-633

20 Cf. MB VII 565, 887-890.

21 Ibid., 705-707. Cf. Motto, Costituzioni..., p. 231.

22 Cf. MB IX 65-66.

23 O decreto com escritura autenticada pela cúria arquiepiscopal de Turim encontra-se no ASC D 4750309; Cf. MB IX pp. 358-359; F. Motto, Costituzioni..., pp. 239-240.

24 O decreto encontra-se no ASC: D 4750604; Cf. MB X 802. F. Motto, Costituzioni..., p. 253.

25 MB XIV 46.

26 MB IX 502.

27 Segundo as estatísticas, em fins de 1887, ou seja, praticamente à morte de Dom Bosco, os salesianos professos eram 715, os noviços, 257 e as casas, 53. Cf. Morand Wirth, Da don Bosco ai nostri giorni. Roma, LAS 2000, pp. 529-530.

28 Cf. a Ata de fundação do Instituto das FMA em Piera Cavaglià - Anna Costa (preparada por), Orme di vita, tracce di futuro. Fonti e testimonianze sulla prima comunità delle Figlie di Maria Ausiliatrice (1870-1881). Roma, LAS 1996, pp. 38-41.

29 O Decretum foi reproduzido em MB XVII 721.

30 Cf. F. Motto, Costituzioni..., p. 72ss.

31 Ibid., p. 120ss

32 O padre Desramaut suspeita que a condição posta por Dom Bosco tenha sido para prevenir qualquer eventualidade de os jovens membros não elegessem por unanimidade o padre Alasonatti para o cargo de Prefeito Cf. F. Desramaut, Don Bosco en son temps..., p. 573.

33 Cf. F. Motto, Costituzioni..., p. 143.

34 Os dados biográficos foram tirados de diversas fontes: Memórias Biográficas, Dizionario biografico dei salesiani. Turim, Ufficio Stampa Salesiano 1969; Pietro Stella, Don Bosco nella storia economica e sociale (1815-1870). Roma, LAS 1980, p. 528ss.

35 Cf. MB VIII 788-791. Veja-se o que se diz em MB X 759 e XI 96 sobre a sua situação como sacerdote.

36 Cf. MB IX 87-88.

37 Padre Pedro Stella acrescenta o nome do coadjutor José Gaia de 35 anos, tomado, segundo ele, de um manuscrito do padre Barberis, mas este nome não aparece na ata, lida e aprovada pelos presentes. Portanto deve-se ater a ela. Cf. P. Stella, Don Bosco nella storia economica e sociale..., p. 296. Gaia foi um dos que assinaram a carta a D. Fransoni, professou com o primeiro grupo de salesianos que fizeram os votos trienais em 14 de maio de 1862 e os perpétuos em 15 de novembro de 1865. Foi coadjutor e morreu em Collegno no dia 14 de setembro de 1892.

38 Assinalamos aqui somente os sócios da Companhia da Imaculada que aparecem nas atas das primeiras reuniões. Com eles a Companhia foi fundada e afirmou-se. Mais tarde entraram outros.

39 Verbali dei Capitoli - Adunanze Capitolo Superiore, ASC D 8680101, pp. 1-3.

40 O fato de alguém assinar um documento no lugar de Dom Bosco não é nada estranho, pois são muitas as cartas e outros documentos nos quais se fez assim. Neste caso, não nos parece demasiado arriscado avançar uma hipótese, mais ou menos verossímil, do que aconteceu: possivelmente, no final da reunião, o secretário padre Alasonatti leu o rascunho ou as notas tomadas durante ela, que todos, incluído Dom Bosco, aprovaram, pedindo, também, que se fizesse uma ata de acordo com as regras e se conservasse o original. Mais tarde, o padre Alasonatti redigiu e passou (ou mandou passar) a limpo a ata e assinou-a de próprio punho e grafia para dar-lhe autenticidade. Ele mesmo, ou outro, imitou a assinatura de Dom Bosco, contando, naturalmente, com sua aprovação previamente manifestada.

41 Arthur J. Lenti, Don Bosco History and Spirit. Vo. III. Don Bosco educator, spiritual master, writer and founder of the Salesian Society. Roma, LAS 2008, pp. 337-338.

A tradução da Ata é do P. Antonio da Silva Ferreira (NdT)


42 Não tem sentido pensar que se aluda aqui à possível criação de outras sociedades ou congregações análogas àquela fundada nesta reunião; entre outras coisas, seria ilógico que o conselho eleito no Oratório de Valdocco para a Sociedade de S. Francisco de Sales fosse o mesmo para essas outras possíveis congregações futuras. Cremos que novas congregações referem-se a novas seções ou grupos de sócios pertencentes à recém fundada Sociedade que poderiam ser criadas em outros lugares. Pertencendo todos à mesma sociedade, era natural que fossem dirigidas pelo mesmo Conselho Superior.

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